Fósseis enfileirados revelam a origem do comportamento de aglomeração de animais

Há cerca de 480 milhões de anos, um grupo extinto de artrópodes marinhos, parentes de insetos e lagostas, se reunia em grupos para atravessar o fundo do mar.

Por Michael Greshko
Publicado 6 de nov. de 2019, 17:30 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Fósseis recém-descobertos do trilobita Ampyx priscus confirmam que as antigas criaturas marinhas se agrupavam em filas, talvez para migrações em grupo ou encontros de acasalamento.
Foto de Jean Vannier, Université de Lyon

Quase meio bilhão de anos antes da primeira fila indiana, criaturas marinhas semelhantes aos atuais caranguejos da família Limulidae fizeram sua própria versão da fila. Os fósseis recém-descritos mostram grupos desses animais deslocando-se em filas pelo fundo do mar, talvez para migrações em grupo ou encontros de acasalamento. Os fósseis confirmam que os animais começaram a coordenar sua movimentação nos primórdios da história evolutiva da Terra, anunciaram os pesquisadores no periódico Scientific Reports.

Cerca de 520 milhões de anos atrás, as formas primitivas de vida desenvolveram sofisticados órgãos sensoriais, como antenas e olhos, além de cérebros capazes de processar todos os dados recebidos. Esses avanços permitiram que os animais sentissem uns aos outros e agissem em sincronia.

Os fósseis recentemente descritos, que datam de 480 milhões de anos, preservam vários Ampyx priscus, um tipo de criatura marinha chamada trilobita que viveu na região atual da França e do Marrocos. Surpreendentemente, esses fósseis específicos preservaram fileiras desses animais, que eram cegos, e a maioria dos indivíduos trilobitas estava voltada para a mesma direção.

“Isso mostra que o comportamento coletivo não é uma inovação evolutiva recente que surgiu há alguns milhões de anos”, afirma o autor principal do estudo, Jean Vannier, paleontólogo da Universidade de Lyon, por e-mail. “Pelo contrário, é muito mais antigo, remonta às primeiras ocorrências de biodiversificação da fauna.”

Os trilobitas são um grupo extinto de artrópodes marinhos parentes dos atuais insetos, aranhas e crustáceos. Atualmente, as lagostas espinhosas nas Bahamas migram em filas semelhantes, confiando, em parte, nas sutis variações no campo magnético da Terra para se orientar.

“Geralmente, quando assistimos a documentários da natureza (...) sobre diferentes tipos de comportamentos coletivos de animais, as pessoas não pensam na origem desses comportamentos”, afirma John Paterson, paleontólogo da Universidade da Nova Inglaterra, na Austrália, que analisou o estudo. “É fascinante, pois até aspectos como o comportamento podem ser preservados em registros fósseis.”

Filas curiosas

Com uma discreta semelhança com os atuais caranguejos da família Limulidae e os tatuzinhos-de-jardim, os trilobitas desempenharam um papel importante no passado da Terra. O grupo surgiu há pelo menos 521 milhões de anos e durou até 252 milhões de anos atrás, sucumbindo apenas para a pior extinção em massa da história da Terra. É um período de existência maior do que o dos dinossauros não aviários.

Durante esse período, os trilobitas se diversificaram consideravelmente. Alguns possuíam comprimento superior a 60 centímetros; outros eram ornados com espinhos curvos provavelmente para dissuadir gnatostomados ou peixes com mandíbula e outros eventuais predadores. Como demonstrado por pesquisas há muito tempo, os trilobitas se reuniam regularmente em grupos para acasalar, se alimentar e possivelmente se defender.

No entanto, na maioria dos fósseis com aglomerados de trilobitas, os indivíduos estão voltados para direções aleatórias — e é por isso que se destaca a fila única e organizada dos Ampyx. Em 2008, dois pesquisadores especularam que os aglomerados haviam sido formados quando vários Ampyx entraram em uma toca para fugir de um predador. Contudo, quando Vannier e seus colegas examinaram seus fósseis recém-descobertos, escavados perto de Zagora, no Marrocos, não encontraram nenhum indício de tocas.

“De certa forma, foi refutada essa hipótese”, afirma Paterson. Em vez dela, eles acreditam que os Ampyx em fila marchavam ao longo do fundo do mar quando foram rapidamente soterradas por sedimentos com pouco oxigênio, agitados pelo mar revolto durante tempestades.

Mas, nesse caso, como essas criaturas sem olhos se alinhavam? Os trilobitas possuem três espinhos distintos: um dianteiro e dois que se projetam na parte traseira e, em muitos dos restos mortais recém-descritos, os espinhos dos Ampyx adjacentes se tocam. A equipe de Vannier suspeita que os animais possam ter utilizado os espinhos para sentir uns aos outros enquanto marchavam. Também é possível que os trilobitas detectem secreções químicas uns dos outros.

Apesar da análise detalhada, alguns aspectos dos fósseis permanecem sem explicação. Por exemplo, em alguns fósseis, outros tipos de trilobitas ocasionalmente parecem se juntar à fila. Não se sabe ao certo por que outras espécies de trilobitas aproveitariam a oportunidade para furar a fila, ou se seu curioso alinhamento é uma mera coincidência do registro fóssil.

Vannier afirma que pode haver sinais ainda mais antigos de grupos semelhantes, o que poderia ajudar a resolver o mistério. Em 2008, os cientistas descobriram fósseis de 525 milhões de anos de idade com filas preservadas de criaturas semelhantes a camarões que se seguravam umas nas outras. Esses paleontólogos interpretaram o fóssil como um agrupamento que flutuava livremente na água — mas Vannier suspeita que, como os Ampyx, essas criaturas caminhavam em fila única pelo fundo do oceano.

“É um exemplo muito intrigante de comportamento coletivo”, afirma Vannier.

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