Um vison transmitiu o coronavírus a uma pessoa? Veja o que sabemos
Não há necessidade de entrar em pânico com as últimas notícias da Holanda.
Autoridades holandesas dizem que um vison em uma fazenda de peles na Holanda pode ter transmitido o vírus a um funcionário. Em fazendas de vison na Holanda e em outros lugares da Europa — esta da imagem localizada na Polônia — milhares de animais são amontoados em gaiolas que ficam dispostas em fileiras.
AUTORIDADES HOLANDESAS ANUNCIARAM esta semana que suspeitam que um vison tenha transmitido coronavírus a um trabalhador em uma fazenda de peles na Holanda. Se confirmado, essa seria a primeira evidência concreta da transmissão do vírus de uma espécie específica a um humano.
A análise encontrou fortes semelhanças entre o vírus no trabalhador e nos visons, tornando plausível a possibilidade de o vírus ter se deslocado entre espécies. “Com base nessa comparação e na posição dessa forma do vírus na árvore genealógica, os pesquisadores concluíram que é provável que um funcionário de uma fazenda que abrigava visons portadores do vírus tenha sido infectado por um desses animais”, afirmou o governo holandês em uma declaração.
Visons testaram positivo para o coronavírus em pelo menos três fazendas na região sul do país, de acordo com Lisa Gaster, porta-voz do Ministério da Agricultura, Natureza e Qualidade dos Alimentos.
“A mensagem que fica clara agora é que ainda estamos aprendendo muito sobre a covid-19, esse coronavírus e os animais que podem ser infectados”, diz o virologista Brian Bird, veterinário e diretor associado do Instituto de Saúde Davis One, da Universidade da Califórnia. Bird, que não fez parte da equipe de resposta holandesa, adverte contra um alarmismo indevido. “O risco nesse caso está relacionado ao contato direto ou à proximidade com os visons criados em fazendas. Certamente, a população em geral tem muito pouco contato com esses animais nesses locais.”
Cães domésticos, gatos, tigres e leões também testaram positivo para o vírus, embora não haja evidências de que esses animais tenham transmitido a doença aos humanos.
Acredita-se que os morcegos sejam a provável fonte de contágio do novo coronavírus, uma vez que o genoma de um vírus estreitamente relacionado encontrado em morcegos-de-ferradura é 96% idêntico ao coronavírus que circula atualmente entre as pessoas. Mas os cientistas ainda não conseguem afirmar se o vírus se deslocou diretamente dos morcegos para os humanos. Isso pode ser impossível de comprovar, a menos que o SARS-CoV-2 — o coronavírus que circula entre as pessoas — seja constatado em um morcego na natureza. Também não se sabe se um hospedeiro intermediário, como o pangolim, pode ter transmitido o vírus às pessoas.
Existem mais de 800 mil visons em fazendas holandesas e, de acordo com o Ministério da Agricultura, Natureza e Qualidade dos Alimentos, a indústria fatura cerca de US$ 100 milhões por ano. Na natureza, esses animais que se assemelham a doninhas, vivem na água ou próximo dela. Seu pelo macio é cobiçado há muito tempo para a fabricação de roupas, principalmente na China, o principal importador de pele de vison.
Em 2016, havia mais de 150 fazendas de pele na Holanda que produziram seis milhões de peças feitas com pele de vison, de acordo com a Humane Society International, mas essas fazendas estão sendo fechadas. Em 2013, o governo proibiu a abertura de novas fazendas de vison e todas as instalações existentes devem fechar as portas até 2024. PJ Smith, diretor de política de moda da Humane Society International, afirma que o coronavírus encontrado nos visons pode acelerar o fechamento. Ele descreve as fazendas de vison em toda a Europa como semelhantes às fazendas industriais de aves e suínos. “Elas têm fileiras e mais fileiras de gaiolas dentro de galpões, com milhares de visons. Diversos animais são abrigados em uma única gaiola e seus detritos caem no chão através de frestas da gaiola.”
Mesmo que seja confirmado que um vison tenha contagiado uma pessoa e esse seja o primeiro caso conhecido de deslocamento do vírus de uma espécie animal para os humanos, as autoridades holandesas enfatizam que esse incidente ou as fazendas de pele em geral representam um risco muito baixo para a população. Testes realizados em fazendas de vison pelo Instituto Nacional de Saúde Pública e Meio Ambiente da Holanda, com sede em Bilthoven, não encontraram evidências do vírus em moléculas de poeira ou ar fora dos galpões que abrigam os animais.
No mês passado, depois que se descobriu que visons em algumas fazendas holandesas portavam o coronavírus, as autoridades proibiram a remoção de visons, estrume ou qualquer outro animal de fazendas infectadas. As autoridades inicialmente acreditavam que os visons nas fazendas haviam contraído o vírus das pessoas, mas com base na análise do genoma, eles agora acreditam que o trabalhador agrícola tenha contraído o vírus de um vison.
Nesta semana, o governo também informou que gatos selvagens podem transmitir o vírus de uma fazenda de pele a outra, observando que o patógeno identificado em duas fazendas infectadas parecia ser estreitamente relacionado e que três dos onze gatos que perambulavam pelas terras de uma fazenda tinham anticorpos contra o coronavírus. “Enquanto não obtemos mais informações, foi recomendado aos proprietários das fazendas de vison que impeçam a circulação de gatos no local”, disse o governo.
O trabalhador agrícola que contraiu o coronavírus se recuperou. Enquanto isso, as autoridades estão implementando novos regulamentos de saúde e segurança. Visons em todas as fazendas agora serão testados para detectar anticorpos contra o coronavírus e verificar a prevalência do vírus nesses locais. Nas fazendas que possuem animais infectados, os visitantes não podem entrar nos galpões dos visons e os funcionários devem usar equipamentos de proteção individual. Além disso, as fazendas devem informar ao governo qualquer caso de vison que apresente sintomas da covid-19.
Os pesquisadores holandeses estão agora comparando amostras genéticas coletadas do trabalhador agrícola doente, de pessoas infectadas na área em torno dessa fazenda e do vison infectado, em um esforço para rastrear a árvore genealógica do vírus e entender melhor a cadeia de transmissão.
O governo está tomando medidas apropriadas, mas outras espécies também podem exigir monitoramento no futuro se for constatado que outros animais foram infectados, afirma o virologista Brian Bird. “Precisamos ter a mente aberta e manter o nosso radar sintonizado.”