Golfinhos aprendem a usar ferramentas com outros golfinhos, assim como os grandes primatas

Estudo contesta a crença de que apenas as mães ensinam habilidades de caça, o que aumenta as crescentes evidências da inteligência dos golfinhos.

Por Liz Langley
Publicado 22 de ago. de 2020, 08:30 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 01:56 BRT
Golfinhos-nariz-de-garrafa caçam no Canal de Rangiroa, na Polinésia Francesa. Esses mamíferos marinhos usam dois tipos de ...

Golfinhos-nariz-de-garrafa caçam no Canal de Rangiroa, na Polinésia Francesa. Esses mamíferos marinhos usam dois tipos de ferramentas para encontrar alimentos, um comportamento pouco comum na natureza.

Foto de Greg Lecoeur, Nat Geo Image Collection

Em Shark Bay, na Austrália, golfinhos-nariz-de-garrafa sem parentesco entre si foram observados trocando ensinamentos sobre uma nova maneira de usar uma ferramenta, comportamento que, até o momento, os cientistas haviam encontrado apenas em humanos e outros grandes símios.

Também é o primeiro exemplo conhecido de golfinhos transmitindo esse conhecimento dentro da mesma geração, e não entre diferentes gerações. Isso é importante, dizem os autores, porque esse aprendizado social entre colegas é raro na natureza.

Em uma prática denominada pesca com concha, eles forçam os peixes a buscarem refúgio em conchas de caramujos gigantes abandonadas no fundo do mar, depois levam as conchas para a superfície e usam o nariz para sacudi-las no ar, retirando a água e capturando os peixes que caem.

Geralmente, são as mães que ensinam seus golfinhos filhotes a caçar: as mamães golfinhos de Shark Bay, por exemplo, ensinam à sua cria a técnica da esponja, outra forma de uso de ferramentas em que os golfinhos colocam esponjas em seus bicos para protegê-los enquanto procuram alimentos nas rochas.

Um golfinho de Shark Bay pratica a pesca com concha, um dos dois únicos exemplos conhecidos de uso de ferramentas entre os cetáceos.

Foto de Sonja Wild, Dolphin Innovation Project

“O fato de a pesca com concha ser transmitida socialmente entre os golfinhos, e não de mãe para filho, estabelece um marco importante e destaca semelhanças com determinados primatas, que também dependem da aprendizagem vertical e horizontal do comportamento de forrageamento”, disse o autor principal do estudo, Michael Krützen, antropólogo da Universidade de Zurique, em um comunicado à imprensa.

Embora os golfinhos e os grandes símios tenham histórias evolutivas e habitats muito diferentes, ambos são mamíferos longevos e possuem cérebros grandes, com uma enorme capacidade de inovação e cultura, diz Krützen.

Maggie Stanton, psicóloga da Franklin & Marshall College, na Pensilvânia, Estados Unidos, que estudou golfinhos em Shark Bay e chimpanzés no Parque Nacional Gombe Stream na Tanzânia, concorda. Ela comenta que uma família de chimpanzés em Gombe pode ter aprendido a usar ferramentas para extrair formigas com uma nova chimpanzé fêmea que entrou para a comunidade.

Desvendando um mistério

Em 2007, Krützen publicou um estudo sobre os golfinhos de Shark Bay, identificando mais de mil golfinhos ao longo de 11 anos. Durante esse período, os cientistas observaram que a pesca com concha foi realizada 42 vezes entre 19 golfinhos. Metade desses eventos ocorreu após uma onda de calor no oceano em 2011, que pode ter causado um declínio no número de caramujos marinhos gigantes, resultando em mais conchas vazias no fundo do mar.

Devido à longa duração de seu estudo, os cientistas tinham um conhecimento profundo da história, idade, sexo e comportamento das famílias de cada golfinho, facilitando a análise dos 19 golfinhos que praticavam a pesca com concha. Por exemplo, observaram que os golfinhos que praticam a pesca com concha ficam com outros praticantes da mesma técnica, então é provável que eles copiem o comportamento dos animais com os quais convivem, diz a principal autora do estudo Sonja Wild, pesquisadora de pós-doutorado na Universidade de Konstanz, na Alemanha.

Esses golfinhos que pescavam com conchas eram sempre da mesma geração, de acordo com o estudo publicado em junho na revista científica Current Biology.

A equipe sabia que fatores ambientais poderiam explicar essa transmissão de indivíduo a indivíduo — especificamente, se os golfinhos praticantes da pesca com concha utilizavam a técnica apenas porque viviam em uma área com abundância de conchas. A presença de uma característica genética em um grupo familiar era outro possível motivo.

Dessa forma, os pesquisadores combinaram seus dados referentes a avistamentos de golfinhos, bem como dados genéticos e ambientais, em um modelo computadorizado que propunha várias maneiras pelas quais a técnica da pesca com concha poderia ser transmitida entre os golfinhos. De acordo com o estudo, o modelo que apoiava a transmissão horizontal era o resultado mais sólido.

Embora 42 observações sejam um pequeno conjunto de dados, os cientistas acrescentam que é provável que o comportamento seja realmente comum; como dura apenas alguns segundos, dificulta sua identificação por pessoas em um barco.

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    Livres e soltos

    Os golfinhos, assim como os chimpanzés, vivem em comunidades mais flexíveis, nas quais os membros se movem livremente entre os grupos. Isso significa que sempre ficam mais expostos a diferentes animais — e comportamentos — do que, por exemplo, um grupo de babuínos, cujos membros são fixos.

    É parecido com os humanos, pois “às vezes estamos com um grupo de amigos e, outras vezes, com um grupo de familiares, e isso muda ao longo do dia”, diz ela.

    Ela acrescenta que o escopo da nova pesquisa é notável, principalmente porque levou em consideração as razões ambientais e genéticas da pesca com concha.

    “Ter esses estudos de campo de longa duração proporciona dados inestimáveis — não é possível obter esses dados de outra maneira.”

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