Tubarões se orientam pelo campo magnético da Terra, confirma estudo inédito
Cientistas já suspeitavam os peixes podem navegar sentindo o campo magnético, mas ninguém sabia como – até agora.
Tubarão-de-pala nada sobre estruturas de coral no Tanque Gigante Oceânico no aquário da Nova Inglaterra, Estados Unidos.
Quando se trata de deslocamentos migratórios notáveis, é comum ouvir sobre pássaros ou salmões. Mas muitos tubarões também realizam jornadas impressionantes pelo oceano, desde os grandes tubarões-brancos – alguns que viajam ida e volta da África do Sul a Austrália – aos tubarões-limão que encontram o caminho de volta para casa em uma pequena ilha das Bahamas.
Por décadas, cientistas se perguntam como esses peixes conseguem fazer isso. Muitas espécies têm um olfato avançado, mas, embora possa ajudar no trecho final, é improvável que apenas o cheiro os guiem por grandes distâncias. É por isso que muitos especialistas acreditam que os tubarões se orientam sentindo o campo magnético da Terra, talvez usando os mesmos órgãos sensoriais eletromagnéticos que os ajudam a rastrear presas.
Como cada local na Terra tem uma assinatura magnética diferente, alguns pesquisadores supõem que os tubarões possam guardar, no cérebro, algum tipo de ‘mapa magnético’ que os informa sobre onde estão.
Para testar essa teoria, Bryan Keller, biólogo especialista em tubarões da Administração Oceânica e Atmosférica Nacional, levou 20 jovens tubarões-de-pala, uma espécie de tubarões-martelo que fielmente volta para casa para se reproduzir, em um laboratório da Universidade Estadual da Flórida, nos EUA.
Em um novo estudo, publicado na revista Current Biology esta semana, Keller e seus colegas confirmam que os tubarões-de-pala podem realmente usar o campo magnético da Terra para navegar.
“Houve outros documentos que demonstram que os tubarões detectam e respondem a campos magnéticos”, disse Keller, “mas esse é o primeiro estudo a mostrar que eles têm um sentido semelhante ao de um mapa.”
Aprender como os tubarões navegam pode nos ajudar a entender aonde eles vão e a proteger melhor essas áreas, já que muitas delas são altamente afetadas pela pesca predatória e poluição – populações de 18 espécies oceânicas de tubarões e raias caíram 70% desde 1970.
Enganando tubarões jovens
Para o experimento, a equipe colocou os tubarões jovens em um único tanque cercado por um cubo envolto em fio de cobre. “Quando você altera a quantidade de energia que atravessa os fios, ela muda o campo magnético”, revela Keller. Se os tubarões de fato tiverem um mapa magnético em suas cabeças, expô-los a um campo diferente deve redirecionar seus movimentos, justifica.
E foi exatamente isso que aconteceu, pelo menos por algum tempo. Quando os tubarões foram expostos ao campo magnético do lugar em que foram capturados, na costa do Golfo da Flórida, eles nadaram em várias direções. Mas quando eles foram expostos a um campo magnético imitando um local a cerca de 600 quilômetros ao sul de onde eles foram capturados, muitos deles tentaram nadar para o norte.
Isso certamente sugere que os animais estavam usando algum tipo de mapa magnético que os informava se estavam muito ao sul de onde deveriam estar, explica Keller. Mas ele não parou por aí. Keller também expôs os tubarões a um campo magnético imitando um lugar exatamente à mesma distância ao norte. Porém, quando fez isso, os tubarões não pareceram ter uma pista de onde estavam e não sabiam para que lado ir.
Muito enganados
Por que o mapa dos tubarões só funciona na direção sul? Um motivo, Keller destaca, pode ser que os tubarões nessa população nunca vão ao norte de onde foram capturados, já que só há terra por lá.
Ao sul, por outro lado, encontra-se o Golfo do México, onde os jovens provavelmente já tiveram a chance de nadar. Para Keller e seus colegas, isso mostra que os tubarões podem ter que aprender os seus mapas magnéticos, montando-os conforme nadam.
“As descobertas sugerem que os tubarões e tartarugas marinhas usam o campo magnético de forma semelhante”, diz Kenneth Lohmann, neurocientista sensorial na Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill, que estuda a navegação das tartarugas marinhas.
Até agora, ele explica, os mecanismos de navegação descobertos em tartarugas marinhas revelaram ser bem parecidos aos encontrados em outros migrantes oceânicos de longa distância, como o salmão.
“No oceano, há informações muito limitadas que podem ser usadas para guiar as migrações”, afirma Lohmann, que não estava envolvido na pesquisa. “Portanto, o campo magnético da Terra é uma dica particularmente útil.”
Um mapa mais elaborado?
Em tartarugas marinhas, pesquisas mostraram que parte da capacidade de ler o campo magnético é herdada, mas uma parte também é aprendida, de modo que uma combinação das duas ajuda os répteis a encontrarem seu caminho.
“Com tubarões, ainda não é possível determinar o que é herdado e que é aprendido, mas esse estudo fornece uma boa base”, diz ele.
Henrik Mouritsen, neurocientista sensorial da Universidade de Oldenburg, na Alemanha, concorda que é muito cedo para dizer se os tubarões aprendem os seus mapas, mas observa que, em aves, em cujo sentido magnético é mais bem estudado, eles são “definitivamente aprendidos”.
Em tubarões, acrescenta: “Eu me pergunto se, e como, seus sensores elétricos especiais estão envolvidos. Para mim, uma coisa realmente emocionante seria a explicação de como eles fazem isso”.
Uma experiência muito interessante para fazer a seguir, diz Keller, seria testar se os tubarões-de-pala que vivem ao longo da costa leste dos EUA, que viajam tanto para o norte como para o sul de onde nasceram, têm um mapa mais elaborado do que aqueles que vivem no Golfo do México.