Primeiro milípede de verdade descoberto: espécie possui 1.306 pernas

Descoberto na Austrália a quase 60 metros abaixo do solo, o invertebrado tem mais pernas do que qualquer animal que já existiu na Terra, extintos ou vivos.

Por Jason Bittel
Publicado 2 de jan. de 2022, 07:00 BRT
millipede

Esta minúscula centopeia filiforme, com cerca de dez centímetros de comprimento, utiliza suas várias pernas para se movimentar subterraneamente.

Foto de Marek et al. 2021

Cientistas na Austrália descobriram uma nova espécie de centopeia que vive a 60 metros de profundidade no solo, não tem olhos e se movimenta rapidamente sobre 1.306 pernas.

Eles a chamaram de Eumillipes persephone em homenagem a Perséfone, a deusa grega e rainha do submundo. Mas o novo invertebrado merece ser coroado por outro motivo: ele tem mais pernas do que qualquer animal que já existiu na Terra, extintos ou vivos.

Na verdade, os oponentes dessa competição não chegam nem perto. O maior espécime da nova espécie, uma fêmea, tinha menos de dez centímetros de comprimento, mas superou facilmente o detentor do recorde mundial anterior, Illacme plenipes, um milípede que vive perto do Vale do Silício, na Califórnia, Estados Unidos, e tem 750 pernas.

Isso significa que a E. persephone é uma verdadeira milípede: millipede, em latim, significa “mil pés”, segundo novo estudo publicado em dezembro na revista Scientific Reports.

Embora a quantidade de pernas do novo animal não tenha precedentes, ainda pode haver animais com ainda mais pernas.

Muitas espécies de milípedes começam a vida com apenas oito pernas, mas conforme sua pele se modifica, adquirem novos segmentos corporais — ou anéis — e podem continuar desenvolvendo mais pernas, diz o líder do estudo Paul Marek, especialista em milípedes do Instituto Politécnico e Universidade Estadual da Virgínia.

“Provavelmente existe algum indivíduo com mais anéis e mais pernas, e isso chega a ser difícil até de imaginar”, diz Marek.

Indo mais a fundo

Em 2020, os colegas de Marek, liderados por Bruno Buzatto, da Universidade Macquarie, da Austrália, viajaram para a região de Goldfields, na Austrália Ocidental, para procurar centopeias e outros animais subterrâneos. 

Essa área é conhecida por ser rica em ouro e níquel, explorado por empresas de mineração que abrem buracos profundos na terra. Os buracos não chegam a quinze centímetros de largura, mas isso já é o suficiente para arriar armadilhas que capturam as minúsculas criaturas que habitam esses lugares.

Essas armadilhas — um pedaço de tubo de PVC preenchido com vegetação úmida e preso a um cordão de náilon — podem ser deixadas no subsolo por meses. Durante esse período, os habitantes do subsolo, como as centopeias, são atraídos pelas saborosas plantas podres e ficam presos. 

Foi assim que a equipe encontrou a E. persephone. De volta ao seu laboratório na Virgínia, Marek tirou o espécime da armadilha e, em seguida, obteve imagens microscópicas de alta resolução de seu corpo. Nessas imagens, ele marcou digitalmente as seções do corpo do animal em incrementos de 10, uma estratégia para garantir que ele não contasse duas vezes as pernas. A contagem final revelou 1.306 membros individuais. 

Mas para que tantas pernas? A equipe acredita que elas sejam responsáveis por permitir que a E. persephone caminhe em oito planos diferentes simultaneamente.

“Por ser um microhabitat subterrâneo com rochas, seixos e solo, elas precisam contornar esses obstáculos”, diz Marek, que recebeu financiamento da Fundação Nacional da Ciência.

“Parte do corpo da E. persephone pode estar de cabeça para baixo. Simultaneamente, a outra parte de seu corpo pode estar apontando para baixo e ainda outra parte apontando para cima. Tudo isso se baseia em uma espécie de matriz tridimensional”, afirma.

É provável que os ancestrais do milípede já tenham se espalhado pela superfície ou próximo a ela, mas o clima cada vez mais seco fez com que habitassem camadas cada vez mais profundas do solo, acrescentou o especialista.

Escondidas do sol, as criaturas evoluíram para serem incolores — uma característica compartilhada por diversas espécies adaptadas a cavernas. A espécie de mil pernas parece ter desenvolvido cabeças em forma de cone, antenas maciças e uma forma de locomoção poderosa, como de um verme, que permite com que se movam através de sedimentos e outros espaços apertados.

Um mundo desconhecido sob nossos pés

“A descoberta de uma nova espécie é sempre empolgante, seja você quem está estudando ou não”, diz Bruce Snyder, ecologista de solo da Georgia College and State University. “Mas, no que diz respeito às espécies milípedes, estamos constantemente encontrando novas espécies.”

Ainda assim, o fato de a E. persephone ter quase duas vezes mais pernas do que o milípede mais próximo em número de pernas é “espantoso”, diz Snyder, que não participou da pesquisa.

Snyder diz que é provavelmente ainda mais interessante cientificamente que a nova espécie venha de um grupo taxonômico completamente diferente do que o detentor do recorde anterior, l. plenipes. Isso sugere que as estruturas animais que contam com um número extremo de pernas estão evoluindo de forma independente, como uma adaptação bem-sucedida à vida subterrânea.

A profundidade do reino das E. persephone também é surpreendente.

“Frequentemente, me pergunto: até que profundidade elas podem chegar?” disse Snyder. “Elas conseguem chegar a profundidades muito maiores do que eu imaginava ser possível encontrar qualquer coisa.”

Em geral, o mundo subterrâneo é muito pouco estudado. Sendo assim, a distribuição geográfica dessa espécie e de seus parentes ainda é desconhecida.

“Isso mostra que, apesar de mais de 200 anos de exploração”, acrescenta Marek, “ainda existem ecossistemas inexplorados.”

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