As vespas orientais podem lidar com concentrações de 80% de álcool, revela um novo estudo.

Como esses insetos toleram grandes quantidades de álcool sem ficar de ressaca? A ciência investiga

As vespas orientais podem ter desenvolvido uma mutação genética para lidar com o álcool, graças a uma relação benéfica com a levedura.

As vespas orientais podem lidar com concentrações de 80% de álcool, revela um novo estudo.

Foto de Nitzan Cohen
Por Jason Bittel
Publicado 2 de jun. de 2025, 06:58 BRT

Embriagado, alcoolizado ou “bêbado como um gambá”, como se diz mais popularmente: não importa como se queira chamar, os seres humanos geralmente bebem algo alcóolico para se divertirreduzir o estresse. Mas quando os animais “tomam uns copos a mais”, o que importa são as calorias.  

Na naturezafrutas, néctar e outras plantas podem produzir etanol à medida que apodrecem e fermentam. E inúmeros de animais – de elefantes africanos a cerca de 55 espécies de pássaros – aprenderam que os alimentos fermentados são fontes eficientes de nutrientes

De fato, o etanol tem quase o dobro do conteúdo calórico do açúcar. A ressalva, é claro, é que comer demais pode produzir alguns efeitos colaterais indesejáveis.  

Mas, aparentemente, não para a vespa oriental. Experimentos de laboratório revelam que a espécie encontrada em grande parte da Ásia, África e Europa pode suportar concentrações de etanol de 80%. Para se ter uma ideia de comparação, a maioria dos vertebrados sofre efeitos nocivos após consumir concentrações de etanol superiores a 4%.  

(Sobre o mundo animal, leia também: Quais são os principais predadores de escorpiões na natureza? Este sapo está na lista)

Três operárias adultas de vespas orientais se alimentam de um figo maduro, uma fonte potencial de ...

Três operárias adultas de vespas orientais se alimentam de um figo maduro, uma fonte potencial de etanol natural.

Foto de Eran Levin

Então, por que essas vespas têm uma tolerância tão alta? Pode ser porque elas têm uma relação mutuamente benéfica com a levedura de cerveja selvagem – o mesmo tipo usado para fazer cerveja e assar.

As leveduras não conseguem sobreviver ao clima frio, por isso vivem – e se reproduzem – nas barrigas de vespas e vespões durante o inverno. Em troca, elas fornecem energia para esses insetos, fermentando as frutas das quais elas se alimentam. 

Para lidar com as habilidades de fermentação da levedura, as vespas podem ter evoluído para carregar várias cópias de um gene conhecido por permitir a tolerância ao álcool, de acordo com o estudo, publicado em 21 de outubro na revista “Proceedings of the National Academy of Sciences” (PNAS), dos Estados Unidos.

Embora embebedar insetos possa parecer trivial, há várias razões pelas quais os cientistas estudam insetos embriagados: tanto essas espécies animais quanto os primatas provavelmente comem frutas fermentadas há milhões de anos.

De fato, a chamada “hipótese do macaco bêbado” sugere que a dieta rica em etanol de nossos ancestrais pode estar ligada à complicada relação que os humanos têm com a substância até hoje. 

É por isso que entender a genética da tolerância ao etanol nas vespas orientais pode resultar em tratamentos mais eficazes para dependência alcoólica, condição que afeta cerca de 30 milhões de pessoas somente nos Estados Unidos e cerca de 2.9% da população brasileira segundo dados do  Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA), uma organização não-governamental do país. 

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    “A vespa oriental pode suportar concentrações de etanol de 80%; a maioria dos vertebrados sofre efeitos nocivos após consumir quantidades superiores a 4%. ”

    Levando as vespas ao limite da bebedeira 

    Quando a líder do estudo, Sofia Bouchebti, ecologista comportamental da Universidade Ben Gurion, em Israel, e seus colegas alimentaram mais de 2 mil vespas orientais com essa solução de etanol semelhante ao absinto a 80%, “elas não conseguiram voar adequadamente nem andar direito”, diz ela.   

    Isso acontece com praticamente todos nós, é claro, mas o que realmente chocou os pesquisadores foi a forma como os insetos se recuperaram.  “Cheguei a ver alguns indivíduos deitados de costas. Eu tinha quase certeza de que eles iriam morrer, mas quando voltei a verificar alguns minutos depoisas vespas haviam se recuperado completamente”, diz Bouchebti. 

    O que é realmente notável é que, enquanto as vespas embriagadas metabolizavam o etanol e voltavam a construir seu ninho sem problemas, as abelhas europeias alimentadas com a mesma dieta alcoólica não só não funcionaram como morreram em 24 horas. 

    Baixas concentrações de etanol são benéficas para os animais, diz Bouchebti, mas em concentrações mais altas, o álcool se torna tóxico – como ilustram as abelhas mortas.  

    É por isso que os cientistas usaram apenas concentrações de etanol de 20% em seus experimentos iniciais – esse é o limite do que a levedura de cerveja pode produzir naturalmente.  

    “Ficamos tão impressionados com a ausência de efeitos negativos nessa concentração que decidimos aumentar as porcentagens para determinar a concentração máxima de etanol que as vespas poderiam suportar” – o que acabou chegando à marca de 80%. 

    “O que eu realmente gostaria de entender agora é por que [as vespas orientais] se adaptaram a concentrações tão altas”, diz Bouchebti.

    Por exemplo, é possível que a ingestão de etanol, que tem propriedades antimicrobianas, mantenha os insetos saudáveis e limpos – especialmente porque as vespas orientais são conhecidas por coletar pedaços de carne podre para alimentar suas larvas. 

    “A chamada 'hipótese do macaco bêbado' sugere que a dieta rica em etanol de nossos ancestrais pode estar ligada à complicada relação que os humanos têm com a substância até hoje. ”

    Insetos embriagados até as entranhas

     “Que estudo bacana!”, diz a entomologista Chris Alice Kratzer, que não está nem um pouco surpresa com o fato de algumas vespas terem desenvolvido a capacidade de metabolizar o etanol. Estas espécies de vespas (também conhecidas como vespões) são as maiores de seu grupo.

    “Muitas frutas amadurecem no outono, o que se alinha com o pico de desenvolvimento das colônias de vespas em climas temperados”, disse Kratzer, autora do livro “The Social Wasps of North America” (“As vespas sociais da América do Norte”, em tradução livre), por e-mail. “A capacidade de ingerir fluido de frutas podres é importante para sua sobrevivência.” 

    “A partir de observações pessoais, a maioria das espécies de vespas sociais não consegue ingerir etanol sem se embriagar com seus gastrópodes”, diz Kratzer. (Nas vespas, os “gástros” ou gasters é o termo científico para o abdômen posterior de formigas/vespas – semelhante às nádegas). 

    Uma outra vespa bastante comum na América do Norte conhecida como yellowjackets, as vespas-amarelas são particularmente notórias, pois ficam em pomares e consomem frutas apodrecidas até não conseguirem voar direito e, às vezes, colidem umas com as outras em pleno ar.   

    O que é fascinante, porém, é que as vespas orientais parecem fazer isso sem muito problema, diz ela. “Esse estudo é apenas o começo”, diz Bouchebti. “Ainda há muito a ser descoberto.”

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