Gestantes podem tomar a vacina contra a covid-19? Veja as recomendações

Mulheres grávidas podem hesitar em ser vacinadas devido à falta de dados conclusivos específicos para o caso delas. Especialistas da área médica divulgam o que se sabe até o momento e como cada pessoa pode avaliar seus próprios riscos e benefícios.

Por Amy McKeever
Publicado 12 de fev. de 2021, 07:00 BRT
Historicamente excluídas de ensaios clínicos, gestantes muitas vezes precisam decidir se irão receber vacinas e medicamentos ...

Historicamente excluídas de ensaios clínicos, gestantes muitas vezes precisam decidir se irão receber vacinas e medicamentos mesmo sem a existência de dados de segurança. Mas cientistas compilaram evidências claras sobre a segurança de vacinas anteriores — o que pode ajudá-las a decidir à medida que as vacinas de covid-19 são distribuídas.

Foto de GETTY IMAGES

Para as gestantes, a chegada das vacinas contra a covid-19 tem levantado dúvidas inquietantes sobre se é mais seguro tomar a vacina ou enfrentar os riscos de uma infecção. Apesar das evidências emergentes de que, em geral, as vacinas são seguras e eficazes, praticamente não há dados sobre se essas afirmações se aplicam a gestantes, embora apresentem maior risco de complicações caso contraiam a doença.

Os órgãos reguladores de diferentes países divulgaram recomendações contraditórias referentes às vacinas contra a covid-19 durante a gestação. O Centro para Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos reiterou que as vacinas devem ser disponibilizadas a gestantes, mas delega a decisão aos futuros pais e mães e seus médicos. A Organização Mundial da Saúde (OMS) não recomenda a vacinação nesses casos, a não ser que a gestante esteja em situação de alto risco.

Considerando essas questões, como tomar uma decisão baseada em evidências sobre a segurança de ser vacinada mesmo sem haver dados nesse sentido? “Tudo depende de qual é a sua realidade”, alega Ruth Faden, fundadora do Instituto de Bioética Johns Hopkins Berman, em Maryland. Cada pessoa deve ponderar os fatos conhecidos sobre a vacina com relação ao seu próprio risco de contrair covid-19.

Embora os especialistas sugiram que essas decisões sejam discutidas com seu médico, leia a seguir os fatos disponíveis, o que ainda está sendo esclarecido e por que há razões para otimismo.

O que sabemos sobre vacinas anteriores

Os cientistas costumam ter bastante informações sobre vacinas e gestação — embora, historicamente, essas evidências demorem mais para serem obtidas do que dados gerais de segurança. Devido às complexidades éticas envolvidas em uma gestação — em que os futuros pais e mães e seus fetos enfrentam riscos interligados — e preocupações com responsabilidade legal, as gestantes normalmente são excluídas dos ensaios clínicos randomizados, necessários para se obter a aprovação de um medicamento ou vacina.

Antigamente, só era possível reunir dados suficientes sobre o funcionamento das vacinas durante a gestação anos após serem aprovadas para o uso geral. Muitos desses estudos subsequentes são observacionais e envolvem menos participantes. Desse modo, as gestantes podem hesitar em tomar a vacina, e os médicos podem adiar a sua recomendação.

“O resultado disso foram décadas de injustiça com mulheres gestantes”, alega Faden, que também lidera o projeto Ética em Pesquisa durante a Gestação para Vacinas, Epidemias e Novas Tecnologias (Pregnancy Research Ethics for Vaccines, Epidemics, and New Technologies - PREVENT, em inglês). Embora às vezes possa fazer sentido não incluir gestantes nos testes iniciais, ela reitera: “buscamos proteger as gestantes o máximo possível”.

Mas os cientistas coletaram evidências incontestáveis de que determinadas vacinas são seguras, eficazes e, em alguns casos, extremamente necessárias. Hoje, o CDC incentiva veementemente as gestantes a serem vacinadas contra influenza, doença que é conhecida por causar complicações graves nessa população. Especialistas da área médica também aconselham a vacinação contra a coqueluche (ou tosse convulsa), que pode ser fatal para os recém-nascidos. As gestantes também podem ser imunizadas contra várias outras doenças, incluindo hepatite e meningite.

O aprendizado obtido com essas vacinas demonstra que não há razão para se preocupar com os tipos de vacinas que utilizam vírus inativados para provocar uma resposta imune, uma vez que não conseguem infectar a gestante nem seu bebê, esclarece Geeta Swamy, professora associada de obstetrícia e ginecologia da Faculdade de Medicina da Universidade Duke, na Carolina do Norte, e pesquisadora renomada de imunização materna.

Por outro lado, as vacinas que utilizam uma pequena quantidade de vírus vivos — como a do sarampo, caxumba e rubéola, e a da catapora — podem causar infecções de baixo grau, que são motivo de preocupação para alguns cientistas, pela possibilidade de prejudicarem o feto. Mas, acrescenta Swamy, “mesmo essas considerações se baseiam em questões teóricas de risco”, não em evidências de que realmente ocorram.

O que há de diferente nas vacinas contra a covid-19

As vacinas da Moderna e Pfizer-BioNTech contra a covid-19 representam um novo desafio. Até agora, a plataforma de RNA mensageiro que utilizam não havia sido licenciada para uso em humanos. Dessa forma, os únicos dados disponíveis relacionados à gestação são de estudos pré-clínicos com animais de laboratório e participantes de ensaios clínicos que posteriormente descobriram que estavam grávidas.

Mas já se sabe bastante sobre como a tecnologia de mRNA funciona. Em vez de utilizar vírus inativados ou mortos, essas vacinas contêm fragmentos de código genético dentro de lipídios, ou glóbulos de gordura, que protegem o código da degradação. Uma vez injetado, o mRNA ensina as células a produzirem a proteína de espícula do SARS-CoV-2, que desencadeia a resposta imunológica do corpo.

Em teoria, tudo isso é promissor porque, como as vacinas anteriores, não envolve vírus ativos. “Tudo o que é considerado ser o caso das vacinas de mRNA do ponto de vista biológico é incrivelmente tranquilizador”, acrescenta Faden. “As vacinas não devem ter qualquer impacto na gestação ou em seu desfecho.”

Anthony Fauci, consultor médico chefe da Casa Branca, também declarou que os dados existentes “não apresentam nenhum perigo” para as gestantes até o momento.

Ainda assim, cientistas levantaram questões sobre como as vacinas de mRNA funcionarão na realidade. A maior preocupação é saber se o mRNA conseguiria atravessar a placenta e gerar a proteína de espícula no feto. Não seria necessariamente prejudicial se o fizesse — e não causaria doenças congênitas — mas a preocupação é que o feto possa apresentar efeitos colaterais, incluindo dor, inchaço e febre. Swamy afirma que os estudos em animais não mostraram sinais de efeitos colaterais físicos, mas ainda não foram realizados testes em humanos.

Os efeitos colaterais na mãe também podem ser um problema. Christina Chambers, epidemiologista perinatal da Universidade da Califórnia, San Diego, está realizando um estudo com gestantes vacinadas contra a covid-19. Ela observa que pode ser prejudicial para o bebê quando sua mãe tem febre alta. “Se for um efeito colateral, deve ser monitorado e discutido com seu médico para que um medicamento para reduzir a febre seja prescrito”, esclarece ela.

Existem ensaios clínicos em fase de desenvolvimento para investigar os efeitos das vacinas em gestantes. Faden gostaria que esses estudos tivessem começado assim que as vacinas receberam a aprovação da Agência de Administração de Alimentos e Medicamentos dos Estados Unidos (Food and Drug Administration, FDA), mas ela ressalta que o processo está evoluindo mais rapidamente do que no passado.

“Antes sentíamos que nadávamos contra a corrente em um vasto oceano nesse sentido”, relata ela. “Agora temos uma embarcação completa que demanda mais dados e a inclusão de gestantes nos lançamentos das vacinas. Isso é muito bom.”

Os riscos de infecção

Por outro lado, já se sabe muito sobre os riscos que a covid-19 apresenta para quem está esperando um bebê. “Não há dúvida de que as gestantes são mais afetadas do que não-gestantes”, relembra Swamy.

Estudos mostram que gestantes com covid-19 apresentam riscos maiores de serem internadas, admitidas na UTI e precisarem de ventilação mecânica. Em janeiro, um estudo publicado no periódico JAMA Internal Medicine constatou que a covid-19 estava associada a maiores probabilidades de desenvolver problemas de pressão arterial e parto prematuro, embora não houvesse maiores probabilidades de fetos natimortos. Um outro estudo de outubro constatou que uma em cada quatro gestantes podem ter sintomas persistentes de covid-19, que chegam a durar semanas ou até meses.

Mas o risco de apresentar a forma grave da covid-19 é menor para gestantes do que para outros grupos de alto risco, como idosos ou pessoas com doenças cardíacas. Portanto, é fundamental observar os fatores individuais que aumentam os riscos de cada pessoa — incluindo o número de contato físico diário, acesso a testes e EPI de alta qualidade, além de comorbidades como asma ou obesidade — e se há algo que pode ser feito para reduzi-los.

O momento oportuno também deve ser levado em consideração. Swamy alega que não há evidências de que uma vacina possa causar problemas de desenvolvimento ou aborto espontâneo no primeiro trimestre de gestação. Mas as mulheres com menor risco de infecção podem optar por não se vacinar durante esse período, que é vital para o desenvolvimento dos órgãos fetais e costuma ser quando abortos espontâneos ocorrem. (A vacina contra influenza é segura em qualquer momento durante a gestação.)

Para gestantes com alto risco de exposição à covid-19 sem a opção de reduzi-lo, tomar a vacina assim que forem admissíveis é algo a ser considerado. Mas para termos certeza, Chambers acrescenta, “o mais urgente é obter dados sobre as pessoas que estão sendo vacinadas”.

O que ainda estamos tentando descobrir

Há motivos para acreditar que, em breve, os cientistas terão um melhor entendimento dos efeitos das vacinas contra a covid-19 durante a gravidez. No curto prazo, os cientistas aguardam os dados de profissionais da saúde que estão grávidas e começaram a ser vacinadas em dezembro. Faden ressalta que os dados devem ser confiáveis, visto que  mais de 15 mil gestações entre as pessoas vacinadas foram relatadas ao CDC até 20 de janeiro.

Além das vacinas de mRNA, existem algumas novas opções no horizonte. A Johnson & Johnson apresentou sua vacina para aprovação da FDA em 4 de fevereiro, ao passo que a AstraZeneca e a Novavax divulgaram recentemente dados essenciais dos estudos de fase três. Todas as três vacinas contam com tecnologias que foram estudadas em gestantes no passado, algo que Swamy acredita que possa fornecer mais garantias.

Estudos recentes também sugeriram que pode haver benefícios adicionais na vacinação durante a gravidez. Um estudo publicado na revista científica JAMA Pediatrics demonstrou que mulheres que foram infectadas com covid-19 transferem anticorpos protetores para seus bebês de forma eficiente — especialmente se forem infectadas no início da gestação. O estudo não sugere que essa transferência aconteça após a vacinação, observa a coautora Karen Puopolo, neonatologista residente no Hospital da Pensilvânia. Mas Swamy afirma ser uma boa notícia que os anticorpos atravessem regularmente a placenta em infecções naturais e que ela espera que a vacinação produza uma resposta semelhante.

“Isso nos mostra que vacinar mulheres poderia ser uma espécie de dois pelo preço de um”, conclui ela, “pois ao vacinar as mulheres também estamos proporcionando algum benefício às crianças durante a primeira infância”.

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