Onda de terremotos sacode Islândia e pode indicar intensa atividade vulcânica em breve

Milhares de terremotos no sudoeste da Islândia podem sinalizar o início de um novo período de atividades geológicas intensas que pode durar 100 anos.

Por Robin George Andrews
Publicado 9 de mar. de 2021, 16:00 BRT
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Área geotérmica de Seltún na Península de Reykjanes, na Islândia, com borbulhas de fontes termais e gases sulfurosos. Onda recente de terremotos na Península de Reykjanes leva geólogos a se perguntar se erupções vulcânicas poderiam estar na iminência de ocorrer.

Foto de Arterra Picture Library, Alamy Stock Photo

Nos últimos 800 anos, a pitoresca Península de Reykjanes, no sudoeste da Islândia, esteve relativamente tranquila. Mas há 15 meses, houve um despertar. O que começou como uma série de leves tremores de terra cedeu lugar a um aumento drástico que culminou com mais de 17 mil terremotos apenas na semana passada.

Cientistas agora testemunharam uma mudança no formato de parte do solo da região e detectaram o deslocamento de vibrações sísmicas de magma em direção à superfície. A pergunta feita por todos é: haverá uma erupção?

Há alguns dias, a resposta parecia ser um enfático sim. O cenário mais plausível implicava fontes de lava espetaculares e rios de rocha derretida que não colocariam em risco nenhum centro populacional. Tal erupção também não ameaçaria aviões sobrevoando a região, como ocorreu durante a erupção do vulcão Eyjafjallajökull em 2010, em outra região do país.

Mas diante do atual comportamento inusitado do sistema vulcânico em Reykjanes, é impossível saber se é provável ocorrer uma erupção nos próximos dias ou semanas. “Todos começaram a se perguntar o que estava acontecendo”, conta Dave McGarvie, vulcanólogo da Universidade de Lancaster, na Inglaterra.

Ciclos anteriores de atividade vulcânica na região sugerem que essa turbulência tectônica pode marcar o início de uma sucessão de erupções que podem se perpetuar por um século. Se esse cenário se confirmar, a Península de Reykjanes pode passar a ser banhada pelo brilho de milhares de focos vulcânicos que se acendem, apagam e reaparecem intermitentemente por um longo período da existência da humanidade.

Para quem não mora na Islândia, essa incerteza pode parecer angustiante, mas essa hiperatividade geológica é normal para os islandeses. “As pessoas se acostumam com esses fenômenos intensos ao viver em um país assim”, afirma Thorbjörg Ágústsdóttir, sismólogo do Iceland GeoSurvey, instituto governamental geológico da Islândia.

Deslocamento subterrâneo de rocha derretida

A Península de Reykjanes do país, situada cerca de 27 quilômetros a sudoeste da capital Reykjavik, possui atividades vulcânicas como qualquer outro ponto da ilha e é monitorada rigorosamente. Em 3 de março, sismógrafos detectaram sinais acústicos ligados à movimentação de magma através da crosta perto de Fagradalsfjall, uma montanha de cume plano da península, e do sistema vulcânico Krýsuvík-Trölladyngja, abrindo uma série de rachaduras no solo. O solo na região também sofreu deformação, confirmando o deslocamento da rocha derretida.

Vulcanólogos e autoridades civis começaram a suspeitar que uma erupção era iminente. “Parece a turbulência característica anterior a uma erupção”, declarou Kristín Jónsdóttir do Departamento Meteorológico da Islândia à imprensa local no dia do ocorrido. O fluxo de magma abaixo da superfície sugere que uma erupção pode ocorrer em questão de horas.

Em vulcões situados em outros pontos do país, esses tipos de sinais seriam um prenúncio de que o vulcão irá expelir lava, conta McGarvie. Mas nada aconteceu.

“É algo inédito. Não era esperado”, afirma McGarvie. “Sempre há surpresas. Não é possível prever tudo.”

Até o momento da publicação desta matéria, os tremores que indicavam a movimentação de magma haviam acalmado. Podem reaparecer, mas também podem não retornar mais. “É preciso aguardar para saber”, afirma Bergrún Arna Óladóttir, vulcanóloga do Departamento Meteorológico da Islândia. “É preciso se preparar para o pior e esperar o melhor.”

Quando ocorre uma penetração de magma, como neste caso, ele pode ficar preso, resfriar, solidificar e simplesmente permanecer no subsolo, explica Ágústsdóttir.

“Acredito que o cenário mais provável seja um declínio gradual até que a penetração cesse”, afirma Sigurjón Jónsson, geofísico da Universidade de Ciência e Tecnologia Rei Abdullah, na Arábia Saudita.

O problema é que todos os vulcões possuem características próprias. Diversos vulcões podem compartilhar os mesmos sinais precursores de erupções, que nem sempre ocorrem. A última grande erupção na Península de Reykjanes aconteceu há oito séculos: não muito tempo após a colonização da Islândia. Naquela época, a ciência da vulcanologia basicamente inexistia e, por isso, não foram registrados dados sísmicos específicos da região, sendo assim, não se sabe exatamente o comportamento dos vulcões dessa região da Islândia logo antes de uma erupção.

Mas uma análise mais profunda dos conhecimentos atuais sobre a história geológica da região pode revelar indícios sobre a onda recente de tremores e o que o futuro pode reservar.

Afastamento gradual da península

Após uma série de grandes erupções entre os séculos 10 e 13, a Península de Reykjanes andava bastante calma. Isso mudou no fim de 2019, quando a península começou a tremer com mais frequência e violência. Em fevereiro deste ano, um terremoto de magnitude 5.7 sacudiu a região e, nesta semana, ocorreram abalos rápidos e em massa.

“É a sequência de terremotos mais intensa na região em quase 100 anos”, revela Jónsson.

O motivo de tamanho caos tectônico é que a Islândia está localizada ao norte da Dorsal Mesoatlântica, uma fenda no fundo do mar que se estende por todo o mundo. Na Islândia, a lava aflora e resfria, formando uma nova crosta oceânica em cada lado da fenda. As placas tectônicas da América do Norte e da Eurásia ficam a oeste e a leste do país, respectivamente, e são afastadas uma da outra em média à mesma velocidade do crescimento das unhas humanas.

A maior parte da Dorsal Mesoatlântica está submersa, mas a Península de Reykjanes está localizada ao norte da dorsal e, por isso, está gradualmente sendo dividida sem parar. Por razões desconhecidas, uma vez a cada 800 anos ou mais, a fenda aumenta subitamente, desencadeando um grande aumento nos abalos tectônicos, como está ocorrendo atualmente. Fluxos de lavas antigos estudados por geólogos e relatos históricos dos primeiros assentamentos da Islândia indicam que, quando há um pico elevado de terremotos no país, o magma aflora em seguida.

“Não se conhecem os motivos da existência desses períodos turbulentos de numerosos terremotos seguidos pela movimentação de magma à crosta. Mas é evidente que ambos os fenômenos estão interligados”, afirma McGarvie.

É possível que, à medida que a península é dividida, ela crie novos caminhos para o magma aflorar à superfície, mas os cientistas não sabem ao certo. Mas está claro que três episódios anteriores apresentaram esse padrão de terremotos seguidos por erupções, “e esse parece ser o mais recente episódio”, afirma McGarvie.

O começo de algo espetacular

Se a tempestade sísmica na península provocar uma erupção, será bem diferente de alguns dos fenômenos mais explosivos e expansivos que abalaram outras regiões do país insular.

Por exemplo, a infame erupção do Eyjafjallajökull em 2010 criou uma coluna elevada e gigantesca de cinzas quentes. O medo de que materiais vulcânicos vítreos atingissem e danificassem motores a jato causou o maior fechamento do espaço aéreo europeu desde a Segunda Guerra Mundial. Mas a rocha derretida abaixo da Península de Reykjanes é uma mistura um pouco diferente, mais viscosa e não muito gasosa, semelhante ao material expelido pelo vulcão Kīlauea do Havaí atualmente.

Esse magma não consegue criar pressão suficiente ao subir à superfície a ponto de causar grandes explosões de cinzas. A relativa falta de cobertura de gelo no país também retira do magma um combustível perigoso: a água, a qual, em pequenas quantidades, é vaporizada com tanta violência pela rocha derretida que desencadeia rajadas de cinzas.

Também não há sinais de que uma erupção em Reykjanes implicaria o mesmo volume de magma dos prolíficos derramamentos de lavas da erupção de Laki, ocorrida entre 1783 e 1784. Esse fenômeno produziu lava suficiente para enterrar uma cidade do tamanho de Boston em 60 metros de rocha derretida.

Em vez disso, um cenário mais plausível é o afloramento de lava através de uma ou mais fissuras na região, afirma McGarvie. A erupção pode durar algumas semanas ou mais, produzindo fontes de lava espetaculares disparadas em direção ao céu conforme pequenos cones se formam ao redor e fluxos de lava seguem rumo a áreas mais baixas. Esses fluxos não atingiriam nenhum centro populacional, mas poderiam invadir uma estrada ou derrubar algumas linhas de transmissão de energia.

O magma poderia aflorar em um aquífero — ou até mesmo na atração turística Lagoa Azul, deflagrando explosões. Mas “esse é considerado um cenário bastante improvável”, observa McGarvie, e seja o que for que aconteça, os sinais sísmicos permitiriam aos cientistas monitorar antecipadamente a movimentação do magma e avisar a todos para ficarem longe do local.

Também existe a preocupação de que Grindavík, cidade na costa sul da península que foi abalada por uma enxurrada de terremotos, possa estar em perigo se a lava aflorar por perto, destaca Jónsson. Mas se houver uma erupção, é muito provável que “seja bem recebida pelas pessoas, que observarão o fluxo de lava com as luzes do norte como cenário de fundo”, afirma McGarvie.

E pode ser apenas o começo de algo muito maior. Estudos anteriores na península revelaram que o início de um novo ciclo de vulcanismo geralmente não implica uma única erupção, mas inúmeras erupções. Os sinais sísmicos e os dados de deformação do solo do ano passado mostram o acúmulo de magma não somente em um, mas em três pontos diferentes abaixo de dois sistemas vulcânicos da península, explica McGarvie.

É cedo demais para saber, mas os fenômenos desta semana podem ser um sinal do início de mais 100 anos de atividades vulcânicas intermitentes ao longo da península no sudoeste da Islândia. Segundo McGarvie, “as pessoas estão começando a perceber que pode ser algo duradouro”.

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