Foto do telescópio Hubble mostra estrela mais distante e antiga já vista

Descoberta pelo telescópio espacial da Nasa em uma galáxia surgida a cerca de apenas 900 milhões de anos após o Big Bang, a estrela Eärendel poderá oferecer um raro vislumbre do Universo primitivo.

Por Nadia Drake
Publicado 31 de mar. de 2022, 12:19 BRT
HST

Usando como uma lupa a gravidade de um grande aglomerado de galáxias, o Telescópio Espacial Hubble detectou a estrela mais antiga e distante conhecida até agora.

Foto de NASA

Através do telescópio espacial Hubble, astrônomos observaram o que suspeitam ser uma estrela em uma galáxia muito, muito distante – a estrela mais distante e antiga já observada.

“É de longe a estrela individual mais distante já avistada”, afirma Jane Rigby, da Nasa, coautora do artigo que descreve a descoberta, publicado em 30 de março na revista científica Nature. “Será a melhor oportunidade de estudar como seria uma estrela massiva no início do universo.”

A estrela foi apelidada de Earendel (que significa “estrela da manhã” ou “luz nascente”, em inglês antigo). Sua origem remonta a 900 milhões de anos após o Big Bang; a recordista anterior, apelidada de Ícaro, surgiu aproximadamente 4,3 bilhões de anos após esse fenômeno explosivo, o que significa que Earendel surgiu logo depois que o universo recém-originado emergiu de um período de escuridão, durante o crescimento e evolução de algumas das primeiras galáxias.

O telescópio espacial Hubble observou uma estrela que existiu somente 900 milhões de anos após o Big Bang. Ela é visível graças a que a sua luz foi amplificada por um clúster de galáxias que fez um efeito de lupa.

A galáxia do Arco do Amanhecer aparece curvada por causa da sua luz ser distorcida pela lente gravitacional. A luz da nova estrela, chamada Earendel, é perto de uma das partes mais amplificadas da galáxia, o que permitiu detectá-la.

Jason Treat, NG Staff. Fonte: Brian Welch e outros, Nature, Março 2022

Foto de Nasa/ESA, B. Welch, D. Coe

Os cientistas estimam que a massa de Earendel seja ao menos 50 vezes maior do que a do Sol, embora possa ser um sistema binário de estrelas em vez de uma estrela solitária. Observações posteriores com o telescópio espacial James Webb (JWST) da Nasa devem ajudar a confirmar se o objeto é uma estrela – ou algo completamente distinto.

“Essa é uma interpretação bastante impressionante, gostaria que fosse confirmada”, afirma Katherine Whitaker, astrônoma da Universidade de Massachusetts Amherst, que não integrou a equipe da descoberta. “São esses os tipos de informações que espero que sejam descobertos, estou ansiosa para saber o que será revelado em observações posteriores.”

Hubble: uma lente de aumento cósmica

Estudar o universo distante é como olhar para o passado. Devido ao tempo que a luz leva para atravessar o cosmo, estrelas e galáxias extremamente distantes são observadas agora como eram há milhões ou bilhões de anos, quando esses objetos emitiram a luz captada pelos telescópios atuais. Além de implantar telescópios mais avançados, os cientistas desenvolveram métodos cada vez mais inteligentes de explorar os confins do espaço e do tempo.

Para a observação atual, os astrônomos utilizaram o Hubble para explorar o universo primitivo, apontando-o a um aglomerado de galáxias extremamente massivo denominado WHL0137-08. Aglomerados como esse possuem tanta massa que sua gravidade distorce e deforma a luz circundante, algumas vezes ampliando por acaso objetos ao fundo em um fenômeno conhecido como lente gravitacional.

Ao longo da última década, o projeto Levantamento de Aglomerados de Reionização por Lente, fez uso de 41 dessas lentes cósmicas em busca de objetos ampliados surgidos quando as primeiras luzes do universo cintilaram. Por meio dessa técnica, cientistas detectaram estrelas distantes, galáxias, supernovas e objetos extremamente brilhantes denominados quasares.

Quando as galáxias são observadas dessa maneira, a luz se deforma e assume um formato côncavo característico. Uma dessas galáxias ampliadas, apelidada de Arco do Nascer do Sol, é o lar da estrela Earendel.

“A galáxia onde a estrela está localizada é deformada gravitacionalmente pela lente e assume o formato de um arco longo e fino”, afirma Brian Welch, autor principal do estudo da Universidade Johns Hopkins, em Maryland, EUA. “Esse arco ampliado pelo efeito da lente foi o mais longo já observado a uma distância tão grande – nos primeiros bilhões de anos do universo.”

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    Earendel: uma estrela no arco

    Embora os astrônomos soubessem que o Arco do Nascer do Sol seria uma galáxia interessante para estudar, não faziam ideia do que exatamente seria encontrado. Welch, doutorando, foi incumbido de verificar o que poderia estar oculto ali. Ao analisar as observações, ele e seus colegas perceberam que uma seção do arco estava extremamente ampliada e que talvez contivesse uma imagem difusa de uma estrela individual.

    Welch e sua equipe calcularam que o objeto havia sido ampliado milhares de vezes, o que significa que era muito menor do que os menores aglomerados de estrelas conhecidos. Ainda assim, cálculos adicionais revelaram que o objeto – Earendel – tinha ao menos 50 vezes a massa do Sol e, por isso, em termos de magnitude de estrelas, era imenso.

    “Seu brilho possui intensidade entre um milhão e dez milhões maior do que a do Sol, então deve ser descomunal, mas qual é sua dimensão?”, indaga Rigby. “Não se sabe que tipo de estrela é essa.”

    Earendel existiu em um universo muito diferente do atual – um cosmo que ainda se desvencilhava da turbulência de sua origem radiante. Em seu início, o Universo era predominantemente escuro. Não havia estrelas nem galáxias, apenas uma imensidão em expansão de gás hidrogênio em um resfriamento lento. Após aproximadamente meio bilhão de anos, as luzes cintilaram. As primeiras estrelas surgiram desse gás e se aglomeraram para formar galáxias, enquanto buracos negros se formavam em meio a essa atividade. O período das trevas cósmicas havia chegado ao fim.

    Mas a luz das estrelas não conseguia atravessar facilmente a extensa neblina neutra no início e, por isso, era refletida e se dispersava, na maior parte. Posteriormente, esse manto se desfez: um período conhecido como época da reionização, quando a radiação ultravioleta emitida pela morte violenta de estrelas efêmeras dissipou a neblina escura, segundo Rigby, permitindo que a luz das estrelas percorresse livremente o cosmo.

    Cientistas suspeitam que uma geração anterior de estrelas massivas – talvez semelhantes a Earendel – sejam responsáveis por essa transformação.

    Observações futuras pelo mais recente observatório espacial da Nasa, o telescópio espacial James Webb, permitirão que a equipe mensure melhor a temperatura e o brilho de Earendel. Os astrônomos também poderão fazer um censo dos elementos químicos presentes na estrela e na galáxia. Se Earendel for algo diferente de uma estrela – talvez um pequeno buraco negro cercado por um disco giratório de poeira e gás brilhantes – o JWST poderá ajudar a identificar isso.

    Mas Welch e seus colegas esperam que a conclusão inicial se confirme. De acordo com Rigby, o gigante ampliado no Arco do Nascer do Sol representa a melhor oportunidade de estudar uma estrela de um período tão remoto na história cósmica.

    “Não estávamos à procura da estrela mais distante, foi uma descoberta casual”, revela Welch. “Antes de Earendel, podem ter existido apenas poucas gerações de estrelas”, acrescenta ele. “Seu aspecto pode ser muito diferente das estrelas atuais em nosso Universo, então a oportunidade de estudar uma em detalhes é incrível.”

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