Tempestades solares podem ser piores se você morar perto de certas rochas

Dados do Serviço Geológico dos Estados Unidos mostram como aumentam ou reduzem os riscos de blecautes das cidades durante fortes tempestades solares em função da geologia regional.

Por Robin George Andrews
Publicado 5 de jun. de 2019, 07:30 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Uma imagem ultravioleta do Sol, obtida pelo Observatório de Dinâmica Solar da NASA, mostra uma explosão ...
Uma imagem ultravioleta do Sol, obtida pelo Observatório de Dinâmica Solar da NASA, mostra uma explosão em formato de “X” de uma forte rajada solar no canto inferior direito do disco solar em setembro de 2017.
Foto de NASA, Gsfc, Sdo

Nosso Sol é um astro incansável. Quando está particularmente ativo, pode expelir ondas efervescentes de energia magnética e partículas carregadas conhecidas como rajadas solares. Com a liberação de uma pequena rajada em direção à Terra, o material solar pode produzir espetáculos de auroras magníficos, porém inofensivos, ao se chocarem com nossa atmosfera.

No entanto, explosões solares mais fortes podem gerar tempestades geomagnéticas que trazem caos à bolha magnética da Terra, com a possibilidade de causar graves danos à infraestrutura elétrica do planeta.

Ao que tudo indica, a capacidade de sua cidade de resistir a uma forte tempestade geomagnética pode depender dos tipos de rochas localizadas abaixo de seus pés.

Uma poderosa explosão solar registrada pelo Observatório de Dinâmica Solar da NASA em setembro de 2017.
Foto de NASA, Gsfc, Sdo

Pesquisas recentes do Serviço Geológico dos Estados Unidos analisaram como diferentes características de rochas interagem com tempestades geomagnéticas no nordeste dos Estados Unidos. O estudo demonstra que o potencial de dano às redes elétricas poderá ser ampliado ou reduzido significativamente a depender dos tipos regionais de rochas. Quem vive na região montanhosa da Nova Inglaterra, por exemplo, possui risco maior de sofrer grandes danos durante uma tempestade geomagnética, mostra o estudo, ao passo que os moradores da Planície Costeira do Meio-Atlântico possuem um risco bem inferior.

Cientistas já sabem há algum tempo que a geologia exerce um papel importante nos danos causados por tempestades solares. No entanto, o estudo de Love, publicado em dezembro no periódico Space Weather, dá um passo além ao quantificar com exatidão como diferenças geológicas afetam o potencial de dano em localidades específicas do nordeste dos Estados Unidos. Embora esse estudo tenha enfoque apenas em uma região de um país, ele possui repercussões globais.

No momento, existe escassez de dados detalhados sobre riscos geomagnéticos regionais, a frequência e a intensidade de tempestades solares e respostas tecnológicas a eles, o que significa que avaliações de riscos meteorológicos espaciais estão atrasadas várias décadas em relação a análises de ameaças causadas por ciclones e terremotos, o que torna o planejamento de atenuações “extremamente desafiador”, afirma Edward Oughton, associado sênior de pesquisa do Instituto de Mudanças Ambientais da Universidade de Oxford. O mapeamento regional mais detalhado de riscos geoelétricos ajudará a eliminar defasagens e já estão em andamento iniciativas australianas e chinesas com esse intuito.

“Em um contexto mais geral, esses levantamentos e coletas de dados geomagnéticos não são tão onerosos”, afirma Jeffrey Love, líder do estudo, geofísico do Programa de Geomagnetismo do Serviço Geológico dos Estados Unidos. “Mas é preciso iniciativa para isso”

Bagunça elétrica interplanetária

Tempestades solares fortes não devem ser menosprezadas. Quando o Sol lança uma poderosa rajada em direção à Terra, a energia eletromagnética atinge o planeta à velocidade da luz, o que estimula as partículas da atmosfera superior, causando interrupções nos sinais de rádio. Se a rajada for forte o bastante, a comunicação por rádio utilizada por empresas aéreas e redes de navegação de satélite apresentará mau funcionamento ou sua operação será interrompida por completo.

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    Duas explosões solares brilham no sol em setembro de 2017 nesta imagem do Observatório de Dinâmica Solar da NASA.
    Foto de NASA, Gsfc, Sdo

    Cerca de 30 minutos depois, chegará uma inundação enorme de elétrons e prótons se aproximando à velocidade da luz. Esse violento ataque danifica circuitos eletrônicos de satélites e quaisquer astronautas que estiverem fora do escudo magnético da Terra poderiam receber uma dose de radiação potencialmente letal.

    Em seguida, de 18 horas a vários dias após o início do fenômeno, uma nuvem de plasma colossal conhecida como ejeção de massa coronal poderá colidir contra a bolha magnética da Terra a mais de 3 mil quilômetros por segundo. Esses processos são capazes de criar grandes perturbações no campo magnético de nosso planeta, que são conhecidas como tempestades geomagnéticas.

    Quando poderosas o suficiente, essas tempestades podem induzir fortes correntes elétricas em estruturas condutoras muito longas da rede elétrica, causando-lhes danos graves e, por vezes, permanentes, o que pode desencadear blecautes generalizados; uma tempestade geomagnética em 1989 fez apagarem as luzes em toda cidade de Quebec. Durante a Guerra do Vietnã, o clima espacial extremo, ao que tudo indica, fez com que  explodissem minas marítimas na costa do Vietnã.

    Uma das maiores e mais fortes tempestades geomagnéticas já registradas, a  Tempestade Solar de Carrington de 1859, interrompeu sistemas de telégrafos e seus operadores tomaram choques elétricos. A tempestade produziu auroras tão ao sul quanto o Havaí e foi possível ler jornais ao ar livre mesmo à noite. Se um fenômeno análogo acontecesse hoje, é muito provável que causasse uma devastação ampla e extremamente custosa de nossa infraestrutura cada vez mais eletrificada.

    A sobrecarga de uma tempestade solar

    Em uma escala regional, a composição geológica subjacente pode ter uma influência extremamente significativa no potencial de dano de uma tempestade. Rochas sedimentares tendem a possuir espaços poderosos que contêm água, tornando-os condutores elétricos, afirma Ciaran Beggan, geofísico do Serviço Geológico Britânico. Rochas metamórficas e magmáticas são mais densas e menos porosas e, portanto, são mais resistivas em termos elétricos.

    Contudo, durante uma tempestade geomagnética, a atividade magnética errante induz correntes elétricas na superfície do planeta, o que pode trazer problemas a uma cidade construída sobre rochas metamórficas ou magmáticas. Por mais que a corrente não consiga passar facilmente por essas rochas, “se você provocar um curto circuito na parte isolada da região com a rede elétrica, ele passa direto por ela” causando danos, afirma Love.

    Isso significa que, quando vier a próxima grande tempestade geomagnética, “uma rede elétrica em uma região da Europa pode permanecer completamente intacta, porém outra, a poucas centenas de quilômetros de distância, pode ser gravemente afetada pelo mesmo fenômeno” explica Juha-Pekka Luntama, chefe da meteorologia espacial do Programa de Conscientização Situacional Espacial da Agência Espacial Europeia.

    Esse efeito se aplica a regiões de todo o mundo. O norte da Escócia, por exemplo, possui muitas rochas resistivas, o que significa que suas redes elétricas têm risco de passar por campos geoelétricos perigosamente fortes, afirma Beggan. Por outro lado, o sul da Inglaterra está geralmente repleto de rochas sedimentares de baixo risco.

    Regiões costeiras são mais complexas. Os litorais possuem tanto a areia resistiva quanto a água do mar condutora, o que pode criar um “efeito de canalização, com o qual a corrente aumenta ao longo da costa”, conta Beggan. Isso é ruim para qualquer rede elétrica que opere ao longo do litoral.

    Em seu último estudo, a equipe de Love obteve registros de tempestades magnéticas detectadas em observatórios e, em seguida, integrou-os com os novos levantamentos que mediram o campo magnético local e seu campo elétrico relacionado. Ao fazer isso, foi possível calcular os picos elétricos que seguiram as tempestades geomagnéticas, que podem ser utilizados para desenvolver modelos para fenômenos futuros de magnitude semelhante.

    A equipe verificou que o risco varia consideravelmente de região para região, algumas rochas resistivas em termos elétricos multiplicaram por cem o risco geoelétrico regional. As enormes quantidades de rochas metamórficas ou magmáticas dos Montes Apalaches implicam que as redes elétricas em cima deles sofrerão intensamente na próxima vez que o Sol se enfurecer.

    A orientação da rede elétrica também exerce um papel, explica Love. Os fios elétricos perpendiculares aos Apalaches aumentam o potencial de dano em relação a uma rede elétrica paralela a eles.

    Olhando para o Sol

    Também precisamos saber a frequência em que ocorrem tempestades geomagnéticas fortes. Infelizmente, a instrumentação moderna passou a documentá-las apenas nos últimos 70 anos aproximadamente, o que significa que nossos registros são no mínimo incompletos (Descubra como cientistas que monitoravam a atividade solar provavelmente evitaram hostilidades da Guerra Fria em 1967).

    É por isso que alguns cientistas estão tentando obter dados mais antigos. Em um estudo da PNAS publicado anteriormente neste mês, uma equipe liderada por Raimund Muscheler, da Universidade de Lund, examinou marcas químicas deixadas em anéis de árvores e núcleos de gelo e encontrou evidências de que uma tempestade solar atingiu a Terra por volta de 660 a.C. Essa tormenta foi 10 vezes mais forte que uma conhecida tempestade solar forte ocorrida em 1956.

    Os dados, entretanto, são muito discordantes, então é uma tarefa difícil encontrar tempestades solares reais ocultas, afirma Muscheler: “Acho que atualmente perdemos todos os fenômenos muito grandes (como o de 660 a.C.) e fenômenos da dimensão do de 1956”, prossegue.

    Ao mesmo tempo, a Agência Espacial Europeia está entre os diversos grupos que procuram formas para encontrar tempestades futuras em formação a tempo para atenuar seus efeitos.

    Se for garantido financiamento no fim de novembro, a missão Lagrange da Agência Espacial Europeia será estabelecida perto do Sol, ficando de olho e avisando a Terra de quaisquer ataques repentinos. Assim, pouco antes da Terra e do Sol renovarem sua perigosa aliança, as empresas de energia poderão estabelecer o máximo possível de circuitos para distribuir a eletricidade excedente pela rede.

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