Animal pré-histórico andava erguido, para a surpresa dos cientistas

A estranha criatura, do tamanho de um pequeno cão, seria um parente próximo do último ancestral comum entre répteis, dinossauros, aves e mamíferos.

Por Jason Bittel
Publicado 25 de jan. de 2019, 08:40 BRST, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Este fóssil incrivelmente completo de Orobates pabsti foi encontrado na Alemanha.
Este fóssil incrivelmente completo de Orobates pabsti foi encontrado na Alemanha.
Foto de Phil Degginger / Alamy Stock Photo

Há 300 milhões de anos, a Terra era o lar de uma estranha criatura do tamanho de um cãozinho, chamada Orobates pabsti. A maioria das pessoas não o conhece, porém os cientistas consideram o animal um primo próximo do último ancestral comum entre répteis, dinossauros, aves e até mamíferos.

Agora, os cientistas não só sabem que o O. pabsti andou em nosso planeta, como também sabem como ele teria andado.

É que o O. pabsti é especial—é a mais antiga criatura conhecida cujos esqueletos bem preservados e pegadas fossilizadas foram encontrados. Nenhum indício é definitivo por si só, mas, juntos, eles oferecem uma perspectiva que permitiu aos cientistas recriar o modo de andar do animal antigo, primeiro em uma simulação de computador, depois usando um robô físico.

O trabalho está ajudando biólogos a entender melhor quando e por que a locomoção evoluiu da forma que evoluiu e pode ser uma primeira etapa para desvendar como nossos ancestrais fizeram a transição do mar para a terra.

Por exemplo, os cientistas acreditam que o O. pabsti seria muito semelhante a um jacaré do gênero Caiman quando ele vivia na região que é a atual Alemanha, o que é surpreendente, afirma John Nyakatura, biólogo evolucionário da Universidade Humboldt em Berlim e autor principal do estudo publicado na revista científica Nature. Os cientistas acreditavam anteriormente que os animais dessa época andavam de forma semelhante a salamandras, com as pernas afastadas e o corpo próximo ao chão.

O jacaré Caiman, por outro lado, lança o tronco para o ar quando se desloca, uma forma avançada de locomoção que muitos cientistas acreditavam ter surgido apenas milhões de anos mais tarde, quando criaturas ovíparas chamadas amniotas entraram em cena.

“Se o último ancestral comum do grupo ao qual o Orobates e os amniotas pertencem poderia já ter evoluído a essa locomoção avançada, então, ao que tudo indica, não há relação com a evolução do ovo”, afirma Nyakatura.

Seguindo os passos do Orobates

Para entender melhor o andar do O. pabst, os cientistas criaram primeiro um modelo digital tridimensional do esqueleto do animal. A seguir, fizeram simulações de computador de como seria o andar do O. pabsti com essas pegadas fossilizadas utilizando diferentes modos de caminhada.

Diversos tipos de animais poderiam deixar essas pegadas, mas cada um andaria utilizando características de locomoção levemente distintas, afirma Kamilo Melo, coautor do estudo e biorroboticista da Escola Politécnica Federal de Lausanne, na Suíça. Por exemplo, camaleões mantêm todos os quatro membros abaixados no chão, ao passo que iguanas elevam a parte anterior do corpo quando andam.

Após 512 simulações, ficou evidente que alguns modos de andar seriam anatomicamente impossíveis, explica Nyakatura, porque teriam feito os ossos do O. pabsti se chocarem ou as articulações do pulso teriam rompido.

O andar do robô

No entanto certos fatores, como a gravidade, o atrito e o equilíbrio, não podem ser representados com precisão em uma simulação de computador, conta Melo. Então a equipe foi estudá-los no mundo real. Para tanto, os cientistas recorreram ao OroBOT, um robô biomimético.

O OroBOT pôde descartar ainda mais tipos de andares com o ajuste de alguns parâmetros, como o grau de curvatura da coluna vertebral do animal antigo durante a movimentação, a largura das pernas quando esticadas e a amplitude de movimento das articulações do ombro. Alguns modos de andar fizeram o OroBOT tropeçar e cair de costas, afirma Melo. Mas esse não foi o pior cenário.

“Acabamos quebrando uma das costelas”, prossegue.

No fim, a equipe se decidiu por um andar semelhante ao do jacaré Caiman como a correspondência mais provável. Contudo, apenas para garantir que a metodologia empregada era coerente, a equipe voltou e repetiu o experimento com espécies vivas do jacaré Caiman e da salamandra para verificar se a equipe era capaz de prever, com apenas pegadas e modelos de esqueletos digitais, como esses animais se movimentariam. Quando esses testes chegaram a modos de andar semelhantes aos observados na natureza, eles souberam que tinham se deparado com uma importante descoberta.

Está lançado o desafio

Nyakatura destaca que todas essas técnicas já tinham sido experimentadas, mas, até agora, ninguém as tinha reunido em um estudo completo. “Acho que podemos nos orgulhar bastante de nossa ideia”, afirma.

Julia Molnar, anatomista comparativa do Instituto de Tecnologia de Nova York, parece concordar com a avaliação, alegando que o estudo cria um novo patamar no ramo.

“Foi lançado o desafio no estudo da locomoção de animais extintos”, conta Molnar. Em uma perspectiva mais abrangente, Molnar afirma que criaturas menos conhecidas como o O. pabsti são muito interessantes porque podem nos ajudar a entender melhor como nossos ancestrais remotos passaram a viver em terra.

“Acredito que este seja o começo do primeiro capítulo de uma história bem fascinante”, afirma Molnar.

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