Exclusivo: por dentro da expedição em busca do avião de Amelia Earhart

Muitas tentativas foram feitas para descobrir o destino da famosa aviadora, mas nunca com a tecnologia que agora está à disposição de Robert Ballard, o homem que encontrou o Titanic.

Por Rachel Hartigan
Publicado 13 de ago. de 2019, 17:35 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Amelia Earhart caminha em frente ao Lockheed Electra, avião no qual ela desapareceu em julho de 1937 enquanto tentava se tornar a primeira mulher a voar ao redor do mundo.
Foto de Alamy Stock Photo

NIKUMARORO, KIRIBATI O clima tropical está agradável ao sul do equador no Oceano Pacífico, mas dentro da escura sala de controle do E/V Nautilus faz frio e tudo está silencioso. Os monitores são a única fonte de luz. Movimentar-se é perigoso — fios pendurados nas paredes e pouco espaço entre as estações de trabalho. Apesar do calor no lado de fora, os tripulantes usam lã para se proteger do ar gelado. Suas vozes são quase inaudíveis quando se comunicam pelo microfone.

As telas instaladas em paredes pintadas de preto fornecem uma visão de outro mundo. Uma delas exibe um veículo operado remotamente (ROV), que flutua em uma imensidão de cor azul-escura e tem aparência acanhada em comparação ao que parece ser a face de um enorme penhasco. Outra tela fornece uma visão mais de perto — leito de rocha e detritos de coral, ocasionalmente ocultos por um manto de neve marinha.

Dentro da sala de controle, os tripulantes pilotam veículos operados remotamente (ROVs) e observam as telas permanentemente, revezando-se em turnos de quatro horas.
Foto de Spencer Smith, National Geographic

"Estamos procurando por cores que não fazem parte do plano de fundo", diz Robert Ballard, conforme analisa atentamente as telas sentado na fileira de trás. O homem que encontrou o Titanic está em uma missão para descobrir o que aconteceu com Amelia Earhart, que desapareceu tentando ser a primeira mulher a dar a volta ao mundo a bordo de um avião.

Earhart provavelmente teria ficado surpresa com o visor do navio, digno da era espacial. A aviadora sempre esteve de olho no futuro, independentemente se envolvia recordes a serem quebrados nos céus ou novos caminhos a serem trilhados pelas mulheres. Ela até mesmo se aventurou debaixo d'água em uma das versões iniciais de um traje de mergulho.

No entanto, ela teria ficado surpresa com as maravilhas tecnológicas empregadas para descobrir seu destino.

O Explorador da National Geographic Robert Ballard é conhecido principalmente por sua descoberta do Titanic, em 1985.

Ballard direcionou o seu moderno navio, o E/V Nautilus, para as águas ao longo da costa de Nikumaroro, um anel isolado de corais e areia ao redor de uma lagoa azul-turquesa. Com apenas 7,2 quilômetros de comprimento e 2,4 quilômetros de largura, a ilha aparece na maioria dos mapas como um mero ponto no vasto Oceano Pacífico.

"Existem diversas teorias sobre onde o avião de Amelia pousou, e algumas delas são um pouco inusitadas", diz Ballard, Explorador da National Geographic. Algumas pessoas acreditam que Earhart e o navegador Fred Noonan acabaram nas Ilhas Marshall, uns dizem Saipan ou até mesmo Nova Jersey, outros especulam que o avião caiu e afundou. “Estamos considerando a hipótese de que ela realmente tenha pousado”.

Em 2 de julho de 1937, Earhart e Noonan tinham como objetivo chegar à Ilha Howland, que é ainda menor do que Nikumaroro. Após decolar de Lae, em Nova Guiné, no terceiro até o último percurso da tentativa de Earhart de circundar o globo, eles não conseguiram localizar Howland e desapareceram sem deixar vestígios.

Equipado com uma série de sensores subaquáticos, o E/V Nautilus opera em um padrão de busca em grade, que Ballard compara a "cortar a grama".
Foto de Ernie Kovacs, National Geographic

O Grupo Internacional de Recuperação Histórica de Aeronaves (TIGHAR) passou as últimas décadas investigando a hipótese de que Earhart e Noonan pousaram seu Lockheed Electra 10E em Nikumaroro quando não conseguiram encontrar Howland.

Os pesquisadores baseiam suas hipóteses nas últimas transmissões de rádio feitas por Earhart. Às 8h43 do dia 2 de julho, Earhart passou uma mensagem de rádio para Itasca, a embarcação da Guarda Costeira dos EUA que aguardava Earhart em Howland: "KHAQQ [prefixo do Electra] para Itasca. Estamos na linha 157 337”. A Itasca recebeu a transmissão, mas não conseguiu obter nenhuma localização a partir do sinal.

A "linha 157 337" indica que o avião estava voando em uma linha de navegação noroeste a sudeste que cortava a Ilha Howland. Se Earhart e Noonan perdessem Howland, eles voariam para noroeste ou sudeste na linha para localizá-la. A noroeste de Howland está o mar aberto, que se estende por milhares de quilômetros; a sudeste está Nikumaroro.

Earhart e o navegador Fred Noonan consultam um mapa do Pacífico que mostra a rota traçada de sua viagem ao redor do mundo.
Foto de Photograph from Bettmann Archive/Getty images

A mensagem de rádio sobre a linha de posição foi a última transmissão confirmada de Earhart, mas os operadores de rádio receberam 57 mensagens que poderiam ter sido do Electra. Estações sem fio obtiverem ângulos de direção em sete delas. Cinco mostraram resultados próximo de Nikumaroro, na época denominada Ilha Gardner.

No momento do desaparecimento de Earhart, a maré em Nikumaroro estava especialmente baixa, revelando uma superfície de recife ao longo da costa, que era longa e plana o suficiente para o pouso de um avião. Se Earhart enviou qualquer uma dessas 57 transmissões de rádio, o avião deve ter pousado relativamente intacto.

Os pesquisadores do TIGHAR acreditam que Earhart e Noonan fizeram as transmissões de rádio à noite para evitar o intenso calor que fazia durante o dia dentro do avião de alumínio. Por fim, a maré levantou o Electra do recife e ele afundou ou foi danificado na arrebentação. A última transmissão confiável foi ouvida em 7 de julho de 1937.

Os membros do TIGHAR viajaram para a ilha 13 vezes, mas nunca com a tecnologia que Ballard tem à sua disposição. O Nautilus é equipado com um sonar de feixes múltiplos no casco, dois ROVs com câmeras de alta definição, um veículo autônomo de superfície (ASV) e vários drones — além dos anos de experiência de Ballard em encontrar tesouros no fundo do mar.

Centro de pesquisa de Ballard Ilha Nikumaroro, um atol desabitado que faz parte da nação da Micronésia de Kiribati. Alguns pesquisadores acreditam que Earhart e o navegador Fred Noonan chegaram aqui e morreram como náufragos.
Foto de Rob Barrel, NAI'A Fiji

Nessa expedição, ele tem como objetivo descobrir o destino do avião de Earhart após ter sido levado do recife.

É um trabalho meticuloso. O Nautilus não se aproximou diretamente da ilha, mas fez uma ampla varredura que permitiu ao sonar mapear o terreno submerso. Mas o navio não conseguiu chegar muito perto; o recife é extremamente perigoso, conforme demonstram os destroços do navio a vapor Norwich City, que ainda domina a costa nordeste da ilha.

Quando o Nautilus chegou à ilha, eles rapidamente passaram a seguir uma rotina: enviar o ASV (basicamente um barco-robô) para mapear o terreno perto da arrebentação. Quando ele volta, é realizada uma análise dos dados para verificar o que “o caldo rendeu”, como diz Ballard. Ballard e seus colegas estão procurando por alvos — anomalias — embora a ausência deles não signifique que nada de interessante esteja abaixo das ondas.

O veículo autônomo de superfície (ASV) Argus é usado para vasculhar águas que são rasas demais para o Nautilus.
Foto de Jesse Goldberg, National Geographic

Ballard acredita que irá atingir seu objetivo. "Tudo o que eu já encontrei foi localizado visualmente", diz ele.

É aí que entram os ROVs. Normalmente lançados à noite, eles podem atingir até 4 mil metros de profundidade. O Hercules, uma caixa amarela brilhante com uma base de metal, oferece visão em primeira pessoa, enquanto o Argus, que é menor, mantém uma câmera apontada para o Hercules.

Os pilotos do ROV operam em turnos de quatro horas, 24 horas por dia e, na maioria das vezes, eles não veem muita coisa. Contudo, na primeira noite, eles encontraram destroços — itens que pareciam ser uma hélice, uma caldeira, um eixo de manivelas e muito mais — todos do Norwich City.

Não era o naufrágio que Ballard estava procurando, mas respondeu uma pergunta importante: que profundidade o avião poderia atingir? Os destroços do Norwich City se concentram a uma profundidade de 100 a 300 metros. "Qualquer coisa com massa semelhante — parte de um avião ou parte de um navio — desceria direto para uma zona nessa profundidade", explica o líder da expedição Allison Fundis. “As explorações com o ROV se concentram nessa profundidade".

Quando os pilotos detectam algo, suas reações tendem a perder intensidade (a menos que seja uma criatura carismática, como um polvo-dumbo). Durante uma recente observação, um objeto metálico em forma de tubo foi avistado. O piloto do Hercules murmurou, “Parece antropogênico. Devo pegá-lo?”

A resposta foi sim. Após um momento de hesitação, Hercules esticou o braço e, muito lentamente, fechou suas pinças ao redor do tubo e o colocou delicadamente em um recipiente branco na lateral.

O que seria? A resposta teria que esperar até que os ROVs fossem recuperados e a caixa pudesse ser aberta, o que não aconteceria até o dia seguinte.

Alerta de spoiler: o objeto não fazia parte do avião de Earhart. Em vez disso, o item pareceu ser uma peça de equipamento oceanográfico — um sinal de que outros exploradores estiveram aqui antes de Ballard.

Ballard não se importa com alarmes falsos, especialmente logo no início das buscas. "Fizemos isso durante nove dias na busca pelo Titanic", conta ele.

Amelia Earhart planejava usar seu Electra para testar o que havia de mais moderno em equipamentos de aviação — até mesmo apelidando-o de "Laboratório Voador". Até o final da expedição que visa encontrar a pilota e seu avião, os equipamentos do Nautilus serão testados ao extremo e a pequena ilha de Nikumaroro será completamente mapeada. Talvez Earhart ficasse satisfeita com o resultado, independentemente de o seu paradeiro ser descoberto ou não.

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