Como o advento das armas nucleares, há 75 anos, mudou o rumo da história

Muitos cientistas lamentaram seu papel na criação de uma arma capaz de aniquilar tudo e todos ao seu redor em segundos.

Por Erin Blakemore
Publicado 22 de jul. de 2020, 16:45 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 01:56 BRT
Nos 75 anos desde o primeiro teste bem-sucedido de uma bomba de plutônio, as armas nucleares ...

Nos 75 anos desde o primeiro teste bem-sucedido de uma bomba de plutônio, as armas nucleares mudaram a face da guerra. Nesta imagem, tropas da 11ª divisão aerotransportada assistem a uma explosão atômica a curta distância no deserto de Las Vegas, em 1 de novembro de 1951.

Foto de Bettmann, Getty

ÀS 5H30 DA MANHÃ, em 16 de julho de 1945, uma luz mais forte que o sol iluminou o Novo México. A bola de fogo aniquilou tudo ao seu redor, depois produziu uma nuvem em formato de cogumelo que subiu mais de 11 quilômetros de altura.

Após a explosão, os cientistas que produziram a bomba riram, apertaram as mãos e serviram bebidas em comemoração. Então, em profunda tristeza, se deram conta do potencial letal da arma que haviam criado. Eles haviam acabado de produzir a primeira explosão nuclear do mundo.

O teste, denominado “Trinity”, foi um sucesso e provou que os cientistas eram capazes de aproveitar o poder da fissão do plutônio. Lançou o mundo na era atômica, mudando a guerra e as relações geopolíticas para sempre. Menos de um mês depois, os Estados Unidos jogaram duas bombas nucleares nas cidades de Hiroshima e Nagasaki, no Japão — provando mais uma vez que agora era possível destruir grandes extensões de terra e exterminar um grande número de pessoas em segundos.

Em agosto de 1945, os Estados Unidos decidiram lançar suas armas nucleares recém-desenvolvidas nas cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, na tentativa de acabar com a Segunda Guerra Mundial. Nesta fotografia, um homem não identificado posa ao lado de uma lareira azulejada que antes pertencia a uma casa em Hiroshima, em 7 de setembro de 1945.

Foto de Stanley Troutman, Ap

Os cientistas estavam tentando produzir fissão nuclear — uma reação que acontece quando os núcleos atômicos são divididos, produzindo uma enorme quantidade de energia — desde a descoberta do fenômeno na década de 1930. A Alemanha nazista foi a primeira a tentar utilizar essa energia como arma, e a notícia vazou do país junto com dissidentes políticos e cientistas exilados, muitos deles judeus alemães.

Em 1941, depois que o físico emigrante Albert Einstein alertou o presidente Franklin Delano Roosevelt de que a Alemanha poderia estar tentando desenvolver uma bomba de fissão, os Estados Unidos se juntaram à primeira corrida para a produção de armas nucleares. Ele lançou um projeto secreto de pesquisa atômica, com o codinome Projeto Manhattan, que contava com físicos de destaque do país, além de cientistas exilados da Alemanha e de outros países ocupados pelos nazistas.

O projeto foi realizado em dezenas de locais, de Los Alamos, Novo México, a Oak Ridge, no estado do Tennessee. Embora o projeto tenha empregado cerca de 600 mil pessoas durante o período de desenvolvimento, seu objetivo era tão confidencial que muitas das pessoas que trabalharam nele não souberam como seus esforços contribuíam para o objetivo principal. Os pesquisadores adotaram duas abordagens nucleares: uma que se baseava em urânio e outra, mais complexa, que se baseava em plutônio.

Após anos de pesquisa, o Projeto Manhattan fez história em 1945 com o êxito do teste do “gadget”, ou artefato, uma das três bombas de plutônio produzidas antes do fim da guerra. Os Estados Unidos também desenvolveram uma bomba de urânio que não foi testada. Apesar do potencial evidente dessas armas de pôr fim ou alterar o curso da Segunda Guerra Mundial, muitos dos cientistas que ajudaram a desenvolver a tecnologia nuclear se opuseram ao seu uso na guerra. Leo Szilard, físico que descobriu a reação nuclear em cadeia, pediu à administração de Harry S. Truman (que sucedeu Roosevelt como presidente) que não a empregasse a tecnologia na guerra. Mas seus pedidos, acompanhados por assinaturas de dezenas de cientistas do Projeto Manhattan, não foram ouvidos.

Em 6 de agosto de 1945, um “superbomber” B-29 lançou uma bomba de urânio sobre Hiroshima na tentativa de forçar a rendição incondicional do Japão. Três dias depois, os Estados Unidos lançaram uma bomba de plutônio, idêntica à bomba do teste Trinity, sobre Nagasaki. Os ataques dizimaram as duas cidades e mataram ou feriram pelo menos 200 mil civis.

O Japão se rendeu em 15 de agosto. Alguns historiadores argumentam que as explosões nucleares tinham um propósito adicional: intimidar a União Soviética. Sem dúvida, as explosões deram início à Guerra Fria.

O líder soviético Joseph Stalin já havia aprovado um programa nuclear em 1943, e um ano e meio após os bombardeios no Japão, a União Soviética obteve sua primeira reação nuclear em cadeia. Em 1949, a URSS testou o “First Lightening”, seu primeiro dispositivo nuclear.

Ironicamente, o governo dos Estados Unidos acreditava que a construção de um arsenal nuclear robusto funcionaria como um obstáculo, ajudando a impedir uma terceira guerra mundial, mostrando que o país poderia derrotar a URSS caso ela invadisse a Europa Ocidental. Mas quando os Estados Unidos começaram a investir em armas termonucleares com um poder de fogo centenas de vezes maior que o das bombas utilizadas para acabar com a Segunda Guerra Mundial, os soviéticos fizeram o mesmo. Em 1961, a União Soviética testou a “Bomba Tsar“, uma arma poderosa com força equivalente a 50 megatons de TNT e que produz uma nuvem em formato de cogumelo tão alta quanto o Monte Everest.

“Não importa quantas bombas tivessem ou a intensidade das explosões, eles precisavam sempre de mais”, escreve o historiador Craig Nelson. “Eles nunca achavam quer era suficiente.”

À medida que outros países desenvolviam capacidade nuclear e a Guerra Fria atingiu seu pico no fim da década de 1950 e no início da década de 1960, um movimento antinuclear ganhou força em resposta a diversos acidentes nucleares e testes com armas que ocasionaram prejuízos ambientais e mortes.

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    Os cientistas e a população começaram a pressionar primeiro pela proibição de testes nucleares e depois pelo desarmamento. Einstein foi um deles — cujo alerta inicial a Roosevelt havia tido como objetivo impedir a guerra nuclear, em vez de colocá-la em curso. Em um manifesto de 1955, o físico e um grupo de intelectuais pediram que o mundo abandonasse suas armas nucleares. “Este é o problema que apresentamos a vocês: grave, terrível e inevitável”, escreveram. “A raça humana será dizimada; ou a humanidade renunciará à guerra?”

    A urgente questão não foi solucionada. Então, em 1962, relatos do aumento do número de armas soviéticas em Cuba levaram à Crise dos Mísseis em Cuba, um tenso impasse entre os Estados Unidos e a URSS que muitos temiam que terminasse em catástrofe nuclear.

    Em resposta às preocupações dos ativistas, os Estados Unidos e a URSS (e mais tarde a Rússia) assinaram em 1963 um tratado parcial sobre a proibição de testes, seguido por um tratado de não proliferação nuclear em 1968 e diversos acordos adicionais com o objetivo de limitar o número de armas nucleares.

    No entanto, no início de 2020, havia aproximadamente 13,4 mil armas nucleares no mundo — em comparação com cerca de 70,3 mil em 1986 — de acordo com a Federação de Cientistas Norte-Americanos (FAS). A FAS relata que 91% de todas as ogivas nucleares pertencem à Rússia e aos Estados Unidos. Outros países com potencial nuclear incluem a França, China, Reino Unido, Israel, Paquistão, Índia e Coréia do Norte. Suspeita-se que o Irã esteja tentando construir sua própria arma nuclear.

    Apesar dos perigos da proliferação nuclear, apenas duas armas nucleares — as lançadas em Hiroshima e Nagasaki — foram utilizadas em uma guerra. Ainda assim, escreve o Escritório das Nações Unidas para Assuntos de Desarmamento, “Os perigos de tais armas vêm à tona com a própria existência delas”.

    Setenta e cinco anos após o teste Trinity, a humanidade, até agora, sobreviveu à era nuclear. Mas em um mundo com milhares de armas nucleares, alianças políticas em constante mudança e conturbada geopolítica, ainda persistem as preocupações levantadas pelos cientistas que criaram a tecnologia para uma guerra nuclear.

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