Marfim parece estar perdendo o encanto na China

Desde a implementação da proibição do produto no país asiático no fim de 2017, mais chineses dizem não querer comprar o material.

Por Rachael Bale
Publicado 10 de out. de 2018, 11:18 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
O número de elefantes africanos despencou em 30% de 2007 a 2014, em grande parte devido ...
O número de elefantes africanos despencou em 30% de 2007 a 2014, em grande parte devido à caça para o comércio do marfim.
Foto de Michael Nichols, National Geographic Creative

O comércio do marfim na China tornou-se ilegal há nove meses, e parece que menos pessoas estão interessadas em comprar marfim. Uma nova pesquisa com mais de 2 mil pessoas na China realizada pela GlobeScan, consultoria de pesquisa de opinião pública, e financiada pela World Wildlife Fund (WWF), constatou que 72% dos entrevistados não comprariam marfim, comparados aos 50% da pesquisa conduzida no ano passado, antes da proibição doméstica ter sido implementada.

Acredita-se que a China seja o maior mercado ilegal de marfim do mundo e, até 31 de dezembro de 2017, também era o maior mercado legal de marfim do mundo. Mas, com a pressão crescente como resultado da crise da caça ilegal, com aproximadamente 30 mil elefantes africanos mortos em razão do marfim a cada ano, o presidente Xi Jinping e o então presidente americano Barack Obama acordaram em 2015 que ambos os países implementariam planos para acabar com as vendas legais de marfim.

“Nós dizemos há anos que a proibição chinesa mudaria o jogo. E parece ser verdade. Já vemos efeitos positivos”, disse Jan Vertefeuille, da WWF, que lidera o trabalho da organização relacionado ao marfim.

Compradores admiram um ornamento de marfim em um estabelecimento de propriedade estatal em Guangzhou, China, em 2012. Este casal comprou 15 peças de marfim ao custo de mais de 16 mil dólares.
Foto de Brent Stirton, Getty, National Geographic

Além de uma maior quantidade de pessoas na China rejeitando em absoluto o marfim, menos chineses compraram o produto desde janeiro de 2018. Em uma pesquisa realizada antes da proibição, mais de um quarto dos entrevistados afirmaram ter comprado marfim nos últimos seis meses. Na nova pesquisa, apenas 12% responderam o mesmo.

Mas nem tudo são boas notícias. Desde a proibição, um grupo de pessoas se tornou mais propenso a comprar marfim: as pessoas que viajam para o exterior regularmente. “Isso é algo sobre o qual pretendemos conduzir mais pesquisas”, disse Vertefeuille. Mas não está claro no momento por que os viajantes especificamente têm uma maior intenção de compra.

Para os viajantes chineses, a Tailândia é um dos destinos estrangeiros mais populares onde ainda se compra marfim. Para combater isso, a WWF lançará um programa piloto na próxima semana. Do dia 1º ao dia 8 de outubro, ocorre a Golden Week [ou semana dourada] na China, um período de feriados que inclui o Ano Novo chinês, sendo a época de maior movimento turístico do ano. Através da geolocalização e das mídias sociais, como o WeChat e Weibo, a WWF enviará mensagens para turistas chineses que chegam à Tailândia para lembrá-los da proibição e para que “viajem sem marfim”.

Causa e efeito

A grande questão para os conservacionistas e para aqueles lutando contra o comércio de vida selvagem é o quanto desta mudança comportamental pode ser atribuída à proibição. A pesquisa sugere que apenas 8% dos chineses tenham conhecimento da nova legislação. Embora seja o dobro da quantidade do ano passado antes da implementação da proibição, ainda é muito baixo, diz Vertefeuille.

“Não podemos dizer [que os resultados] sejam definitivamente devido à proibição, uma vez que a conscientização sobre ela é ainda baixa”, disse ela. “Parte desse resultado é devido à conscientização dos consumidores. Mas eles estão entendendo o recado de alguma forma, o que é animador”.

Vanda Felbab-Brown, especialista em comércio ilegal de vida selvagem e crime organizado na Brookings Institution, diz que um próximo passo importante será investigar o grupo de pessoas que passaram de possíveis compradores de marfim em 2017 para reprovadores em 2018. “Queremos saber quem são as pessoas que mudaram de opinião e perguntar: Foi devido à proibição? Foi devido à campanha [de conscientização]? Foi porque ‘minha avó disse para salvar o inocente bebê elefante?’”, ela diz.

Felbab-Brown também estudou o tráfico de drogas e examinou os efeitos de proibições em determinadas atividades. “As proibições causam efeitos”, ela diz. “A questão da dimensão dos efeitos depende dos indivíduos, das sociedades e das culturas. As pessoas propensas a comprar marfim são suscetíveis ao elemento moral e legal de cumprir as leis?”.

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    Antes da proibição do marfim, a China contava com muitas fábricas de entalhe e distribuidores de marfim. Esta fábrica em Pequim esculpia mais de 725 quilos de marfim por ano e empregava mais de 20 artesãos em 2011.
    Foto de Brent Stirton, Getty, National Geographic

    Para que uma proibição realmente funcione, ela diz, fazer cumprir a lei é essencial: “Eu diria que um grande impeditivo seria a realização de grandes ações policiais por agentes chineses. Não apenas uma vez, mas uma série de investidas contra os comerciantes”, além de punição para os compradores.

    Marfim à venda

    As lojas que vendiam marfim de forma regulamentada parecem ter entendido o recado. A organização de monitoramento do comércio de vida selvagem TRAFFIC, uma ramificação da WWF, conduziu visitas em 2018 a 71 lojas que haviam sido licenciadas para vender marfim antes da entrada em vigor da proibição. Eles constataram que 17 delas foram fechadas e confirmaram que as demais 54, que vendiam marfim além de outros itens, não ofereciam mais o material proibido em suas prateleiras.

    “É muito animador saber que lojas legalmente credenciadas não ofereçam o marfim”, disse Vertefeuille, mas é importante ficar de olho em vendas por debaixo dos panos. A pesquisa de mercado da TRAFFIC também encontrou muito marfim à venda ilegalmente em outras lojas, embora isso também tenha diminuído ligeiramente.

    Um novo trabalho de campo mostra que novos centros de compra e venda de marfim estão surgindo na China, e que há potencialmente novos grupos de compradores, observa Felbab-Brown. Isto é, embora as pessoas que anteriormente mostravam interesse em comprar marfim possam ter mudado de ideia, é provável que haja novas pessoas deslocando-se para a cidade e para a classe média que não tenham visto nenhuma das campanhas de conscientização ou que não tenham conhecimento da proibição, ela diz.

    O governo chinês ainda mantém uma reserva de marfim, a qual vinha liberando em quantidades definidas para fábricas de entalhe e distribuidores antes da proibição. E, até o momento, não foram instituídas campanhas de recompra que visem retirar o marfim remanescente dos depósitos das lojas antes licenciadas.

    Já em relação à diminuição da caça ilegal, Felbab-Brown diz ainda ser muito cedo para saber se a proibição ajudou a salvar elefantes na África. Em seus estudos sobre políticas de drogas, ela aprendeu que é normal haver um intervalo de aproximadamente dois anos entre os esforços de redução da demanda e quaisquer mudanças significativas nas ruas.

    Por enquanto, promover a conscientização sobre a proibição e fazer cumprir a lei são as prioridades. Vertefeuille acredita que mais jovens adultos estejam entrando na categoria de “rejeitadores do marfim”. Para haver progresso, ela disse, defensores precisam incentivar os jovens a espalhar a mensagem aos seus colegas. Ademais, o governo chinês também precisa trabalhar de forma mais direta com as campanhas das ONGs, e o setor privado, principalmente a indústria do turismo, precisa se envolver para ajudar a combater o comércio internacional entre os viajantes chineses.

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