Poça borbulhante de lama está se movendo, e ninguém sabe por quê
Movendo-se a aproximadamente seis metros por ano, o mistério lamacento não tem um condutor óbvio e, até agora, não pode ser impedido.
Quando o assunto é geologia e pedaços de terra que se movem na Califórnia, Estados Unidos, a falha de San Andreas é, normalmente, a estrela do show. Mas, desta vez, a região ao redor da infame falha chamou a atenção das pessoas devido a uma poça misteriosa de lama borbulhante.
Recusando-se a permanecer no lugar, uma massa turbulenta de dióxido de carbono e solo com aspecto de lodo vem migrando pelo estado em uma velocidade de seis metros por ano. Até agora, ela já esculpiu uma bacia de mais de 2,2 mil metros quadrados no solo, e parece que continuará sua cruzada até que o que quer que a conduza extinga-se. Cientistas ainda não têm ideia concreta do motivo do movimento ou se ele pode ser impedido.
Então, o que nós realmente sabemos sobre ela?
A curiosidade lamacenta surgiu em Salton Trough, uma região da Califórnia que vem sendo esticada por uma batalha tectônica entre as forças da falha de San Andreas e do East Pacific Rise, um cume no meio do oceano. Este ambiente único é onde o Rio Colorado despeja muitos de seus sedimentos, que se compactam de maneira que as camadas inferiores submersas a centenas de metros sejam aquecidas e levemente prensadas. (Descubra como um poderoso terremoto partiu uma placa tectônica em duas.)
Esta ação metamórfica de baixo grau transforma os sedimentos em novos tipos de rocha e, no processo, emite CO2. Escapando através da superfície fluida por fissuras e fendas pré-existentes, o gás abastece algo conhecido como mudpots (ou poças de lama escaldante), ou, se estiverem saindo do solo, vulcões de lama.
Nascente
Poças escaldantes e vulcões de lama são objetos comuns, mas normalmente inertes. É por esse motivo que cientistas se atentaram e repararam quando esta poça de lama começou a se mover em algum momento entre 2015 e 2016.
Atualmente localizada ao norte de Niland, a poça de lama move-se na direção da ferrovia Union Pacific, dando aos seus engenheiros uma bela dor de cabeça. Um poço foi escavado para despressurizar a fonte do gás, mas sem resultados. Paredes de aço enterradas a 24 metros no solo também foram facilmente contornadas. A poça de lama simplesmente mergulhou por debaixo delas e continuou seu caminho de destruição estranhamente linear.
“Ninguém nunca viu uma poça de lama errante antes”, disse David Lynch, físico que há muito estuda as características geotermais da região. Poças de lama escaldantes e vulcões de lama também não costumam exalar muita água, mas esta é extremamente vigorosa, produzindo mais de 150 mil litros de água por dia. Lynch e outros especialistas passaram a chamá-la de “nascente de lama”.
Então, por que ela se move? “Esta é a principal questão, e eu não sei a resposta”, disse Lynch. Mas ela não está acelerando, como foi noticiado em alguns jornais, e ela certamente não percorreu 18 metros em um único dia. Ao contrário do que dizem diversas reportagens, não há ligação entre as mudanças sísmicas da região e a jornada da poça de lama.
“A movimentação desta nascente de lama não tem relação com qualquer variação em sismicidade”, disse Ken Hudnut, pesquisador geofísico que trabalha para o Serviço Geológico dos Estados Unidos. “Os dois fenômenos são independentes”. A falha de San Andreas é uma das regiões sísmicas mais monitoradas do planeta, ele acrescenta. Assim, as pessoas podem ficar tranquilas de que o monstro de lama não é o prenúncio de um grande terremoto.
Vulcões fantasmas
Do mesmo modo, a poça de lama errante também não está relacionada à atividade vulcânica, apesar da implicação inadvertida que ocorreu quando o Condado de Imperial a descreveu recentemente como um gêiser. Sistemas geotermais conduzidos por calor magmático contam com suas próprias poças e vulcões de lama, como demonstra elegantemente o Parque Nacional de Yellowstone.
Mas, neste caso, “faz milhares de anos que qualquer atividade vulcânica ocorrera lá embaixo”, diz Hudnut. Os Salton Buttes, um conjunto de cinco cúpulas formadas nos últimos 12 mil anos, demonstram o passado magmático da região, mas não exibem nenhum sinal de atividade eruptiva. Além disso, a própria nascente de lama não é quente ou está em ebulição, apesar de sua aparência. Na verdade, ela está em temperatura ambiente. (Estes são os vulcões mais perigosos dos Estados Unidos, de acordo com o USGS.)
A nascente também exala odor de ovos podres, um sinal claro da emissão de sulfeto de hidrogênio. Embora muitas vezes ligado a atividades vulcânicas, bactérias podem ser as culpadas desta vez. A região apresenta um lago salgado, o Lago Salton. Formado a partir da explosão de um canal de irrigação em 1905, ele mantém-se cheio hoje devido ao escoamento de água da atividade agrícola, e fertilizantes podem fazer com que as populações de algas disparem no lago. Quando as algas morrem, as bactérias alimentam-se de seus vestígios, expelindo muito sulfeto de hidrogênio.
É possível que a nascente de lama esteja sendo abastecida por um reservatório fedorento similar a esse. No entanto, é possível que o odor tenha uma origem meramente geológica, diz Lynch.
Além do fato de estar se movendo, a poça de lama aprofundou ainda mais o mistério sobre as protuberâncias geotermais da região, e se elas podem realmente estar ligadas à Falha de San Andreas. Pesquisas anteriores conduzidas por Lynch e Hudnut sugerem que elas podem estar relacionadas, mas a ligação ainda não foi estabelecida.
A nascente de lama encontra-se próxima, mas não sobre a Falha de Wister, uma extensão ao sudeste da Falha de San Andreas. No entanto, ela parece estar traçando um caminho perpendicular às grandes falhas da região. Ela pode estar seguindo uma outra falha que atravesse a área, mas não está claro por que a poça de lama não se transformou em uma fissura, para que o gás emitido pudesse tirar proveito de uma longa fenda no solo.
Parece que o mistério lamacento permanecerá por algum tempo. Nem o Serviço Geológico dos Estados Unidos nem a Agência Geológica da Califórnia estão estudando ativamente o fenômeno. Pesquisas são dispendiosas, e eles precisam escolher suas batalhas. Lynch diz estar trabalhando em um modelo para explicá-la, mas que “ainda não está pronto para ser exibido”.
Enquanto isso, o trajeto da poça de lama ameaça prejudicar trilhos de ferrovias, fazendo com que a Union Pacific utilize um desvio temporário de trilhos como plano de contingência. No momento, parece que o melhor a se fazer é sair de seu caminho.