O óleo de palma está destruindo as florestas. Mas tente passar um dia sem ele.

Após anos escrevendo sobre esse ingrediente controverso, uma jornalista confronta o consumo do óleo em sua família.

Por Hillary Rosner
Publicado 7 de jan. de 2019, 07:40 BRST, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Um trabalhador em uma plantação na Malásia exibe os frutos da palma—fonte do óleo comestível mais ...
Um trabalhador em uma plantação na Malásia exibe os frutos da palma—fonte do óleo comestível mais conhecido do mundo.
Foto de Pascal Maitre

NEVAVA EM UMA MANHÃ DE DEZEMBRO quando saí da cama no escuro. No banheiro, lavei as mãos, escovei os dentes e passei um pouco de hidratante no rosto. Antes de o sol tingir as montanhas de rosa através da minha janela, antes mesmo de eu chegar até a cozinha, eu já tinha óleo de palma nas minhas mãos, no meu rosto e na minha língua.

Convenci meu filho a sair da cama e ir tomar um banho quente. E lá estava o ingrediente de novo, no sabonete, no xampu, no condicionador e na loção que passei nele depois: mais óleo de palma. O meu filho de 5 anos mal havia acordado, e ele já estava todo coberto pela substância.

Para ver quanto o óleo de palma estava presente em nossas vidas, decidi rastrear todos os meus encontros com ele ao longo do dia.

No banheiro

O óleo de palma é o óleo comestível mais conhecido do mundo, representando um terço de todos os óleos vegetais consumidos no planeta. As palmeiras de dendê consistem em uma cultura altamente eficiente, mas as plantações têm ocupado o lugar de grandes pedaços de florestas e o aumento do seu cultivo tem gerado abuso de direitos humanos, declínio de algumas espécies e perigosas emissões de dióxido de carbono.

Você pode estar pensando: 'espera um pouco. Eu nunca vi "óleo de palma" na lista de ingredientes de nenhum cosmético'. Você provavelmente tem razão, mas ele está lá de qualquer jeito. O óleo de palma é um ingrediente encontrado dentro de outros ingredientes.

Veja o decil glicosídeo, por exemplo, listado entre os demais ingredientes de fácil pronúncia do sabonete líquido com essência de morango que minha família gosta. Decil glicosídeo é um agente de limpeza utilizado em diversos xampus infantis e produtos para pele sensível. Ele é feito, em parte, de decanol—uma molécula de álcool graxo normalmente derivada de óleo de palma.

Lauril glicosídeo também é um surfactante feito de óleo de coco ou palma, e consiste em outro componente do mesmo sabonete líquido. Surfactantes ajudam a combinar ingredientes que, de outra forma, seriam impossíveis de misturar, como óleo e água. Esse surfactante também está na minha pasta de dentes, junto com lauril sulfato de sódio, outro ingrediente à base de óleo de palma usado para fazer a espuma da pasta.

Até mesmo o nosso condicionador contém óleo de palma na forma de glicerina, bem como álcool cetearílico—um ingrediente comum utilizado para espessar muitos condicionadores.

Obviamente, somente porque um produto contém óleo de palma não significa que ele esteja contribuindo com a destruição ecológica. Veja a Alaffia, uma empresa socialmente responsável que fabrica o nosso sabonete líquido e condicionador. A página da Alaffia no Facebook declara abertamente que a empresa utiliza óleo de palma: "O nosso óleo de palma natural do Oeste da África é cultivado e colhido por pequenos produtores na região Maritime de Togo, da cidade de Tsevie a Kpalime. O óleo é extraído pela nossa cooperativa de Comércio Justo em Sokodé com métodos tradicionais". De acordo com Tom's of Maine, que fabrica a minha pasta de dentes sabor hortelã, todos os seus ingredientes são feitos utilizando apenas óleo de palma com certificado de sustentabilidade da Aliança Florestal ou da Mesa Redonda sobre Óleo de Palma Sustentável (RSPO).

Já é difícil saber se produtos contêm óleo de palma—ainda mais se são produzidos de forma sustentável. Passei horas mais tarde naquele dia lendo as minúsculas listas de ingredientes em todos os produtos utilizados pela minha família, tentando saber quais componentes químicos eram feitos à base de óleo de palma. No fim, descobri que meu hidratante facial da Trader Joe's representava o sonho de qualquer produtor de óleo de palma: Palmitato de ascorbila, palmitato de retinila, etilhexilglicerina, estearato de glicerila e assim por adiante, todos feitos, de alguma forma, com palma. (O descritivo dos produtos da Trader Joe's contém informações sobre os óleos de coco e oliva utilizados, mas nada sobre o óleo de palma; a empresa não é membro da RSPO).

Na cozinha

Algo engraçado aconteceu enquanto eu continuava a rastrear meu consumo de óleo de palma. Quando cheguei à cozinha, mal consegui achar o ingrediente. Sim, havia um pote de creme de avelã da marca Justin's que continha óleo de palma para que o produto fosse fácil de espalhar. (Justin's usa óleo de palma com certificado de sustentabilidade). Uma caixa de barras Kind com cobertura de chocolate. Assim como em muitas outras barras energéticas, o óleo de palma é utilizado para dar ao chocolate uma textura cremosa para aplicações em coberturas. (Kind LLC é membro da RSPO). E uma caixa de bolachas salgadas da Nabisco, comprada quando meu marido estava doente algumas semanas antes, onde novamente, o óleo de palma confere uma característica vagamente cremosa. (A Nabisco é subsidiária da Mondelēz, que recebeu uma pontuação 9 do total de 10 no Placar de Compradores de Óleo de Palma WWF2016).

E isso foi tudo o que encontrei. Para o café da manhã, meu filho comeu um pote de iogurte natural com maçãs frescas e frutas vermelhas congeladas e um ovo frito em azeite de oliva. Eu comi torrada (feita de pão natural, que contém menos ingredientes e ingredientes mais simples do que o pão de forma industrializado) com avocado e extrato de levedura Marmite. Meu marido comeu o arroz que havia sobrado com ovo frito e espinafre. Nada de óleo de palma.

Isso porque a maioria dos alimentos que consumimos naquela manhã eram alimentos integrais—maçãs, frutas vermelhas, avocados, ovos—ou alimentos com poucos ingredientes. E a maioria dos produtos comestíveis que contêm óleo de palma não são alimentos integrais e sim processados.

Alimentos "processados" geralmente são alimentos industrializados com longas listas de ingredientes, encontrados em abundância nas prateleiras dos supermercados e em cardápios de restaurantes fast-food. Produtos "longe da fonte", conforme explicado por Melanie Warner, escritora gastronômica, o que significa que muitas etapas foram removidas de seu ponto inicial natural.

Na maioria dos alimentos processados, "os ingredientes saudáveis e naturais são removidos e muitas substâncias são adicionadas, que em grandes quantidades, não fazem bem para nós—sal, açúcar, gordura, aditivos artificiais", explica Warner, autora de Pandora’s Lunchbox: How Processed Food Took Over the American Meal (A Lancheira de Pandora: como os alimentos processados dominaram as refeições norte-americanas, em tradução livre).

Muitos alimentos ultraprocessados são prejudiciais e a maioria não fornece nada de benéfico. E são nesses alimentos que encontramos boa parte do óleo de palma utilizado. Podemos citar Oreos, doces do Dia das Bruxas, pizza congelada. Se você deseja consumir menos óleo de palma, faça uma coisa simples: Coma menos alimentos processados. Você ficará mais saudável.

Fontes responsáveis

Também há cosméticos que não contêm óleo de palma, como sabonetes feitos de óleo de oliva com poucos ingredientes. Mas não é necessário eliminar o óleo de palma completamente da sua vida. Na verdade, boicotá-lo pode trazer consequências ainda mais graves para o meio ambiente. Produzir a mesma quantidade de outro óleo vegetal—digamos, óleo de soja—necessitaria de ainda mais terra.

E retirar o apoio às empresas que tentam tornar a produção de óleo de palma menos prejudicial do ponto de vista ecológico daria uma vantagem competitiva àqueles que se importam apenas com os lucros e nada mais. Apoiar as empresas que estão se distanciando de práticas destrutivas ajudará a tornar a indústria toda mais sustentável.

Desde sua formação em 2004, muitos críticos dizem que a RSPO—uma parceria entre a indústria e ONGs—não estabelece padrões altos o suficiente. O CEO da RSPO na Malásia, Darrel Webber, alega que é crucial criar um grupo grande o suficiente para permitir a entrada de mais empresas—e, no processo, ensinar mais sobre a importância de proteger ecossistemas e tratar os trabalhadores de forma justa.

"Adoraria dirigir uma Ferrari", diz ele, utilizando uma analogia conhecida, "acelerar e impressionar os meus amigos. Mas a experiência envolveria apenas eu e uma outra pessoa, pois o carro possui dois assentos. A realidade é que preciso dirigir um ônibus se quiser provocar alguma mudança. Temos que encontrar um jeito de envolver todo o grupo".

Diversas ONGs, incluindo a WWF, a União dos Cientistas Preocupados e o Zoológico Cheyenne Mountain, criaram apostilas para ajudar os consumidores a tomarem decisões inteligentes sobre o óleo de palma. Tudo o que precisamos é de um pouco de tempo e pesquisa—e isso faz sentido quando pensamos nos produtos que consumimos, que usamos no banho e que passamos na pele dos nossos filhos.

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