Sacolas biodegradáveis enterradas por três anos ainda servem para uso

Novo estudo lança dúvidas quanto à viabilidade dos plásticos biodegradáveis como resposta à poluição plástica.

Por Laura Parker
Publicado 6 de mai. de 2019, 17:26 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Sacola plástica enterrada no solo por três anos ainda pôde aguentar o peso das compras.
Sacola plástica enterrada no solo por três anos ainda pôde aguentar o peso das compras.
Foto de Lloyd Russell, University of Plymouth

Richard Thompson, biólogo marinho britânico que dedicou sua carreira ao estudo do lixo plástico, já há muito tempo se pergunta como é a degradação real das sacolas biodegradáveis.

Então, em 2015, ele e seus alunos de pós-graduação da Universidade de Plymouth enterraram no jardim da faculdade um conjunto de sacolas em que se lia "biodegradável".

Três anos depois, ao serem desenterradas, as sacolas não estavam apenas intactas, como ainda podiam carregar quase 2,5 kg de compras.

“Foi realmente uma surpresa que, depois de três anos, ainda fosse possível levar as compras para casa com as sacolas”, disse ele em entrevista à National Geographic. "Elas não apresentavam a mesma resistência que tinham logo após saírem da fábrica. Mas não tinham se decomposto em nenhum nível significativo".

As qualidades indestrutíveis das sacolas biodegradáveis são somente uma das descobertas de um estudo inédito publicado no periódico Environmental Science & Technology. A pesquisa documenta a deterioração de cinco tipos de sacolas de compras imersas na água, enterradas no solo ou expostas ao ar livre, como se fossem lixo. Thompson e sua equipe testaram sacolas comuns disponibilizadas em lojas de varejo da região de Plymouth e concluíram que nenhuma delas — inclusive as sacolas compostáveis — se decompuseram o suficiente ao longo dos três anos de modo que tivessem alguma vantagem ambiental sobre as sacolas convencionais.

O estudo destaca como o termo "biodegradável" pode confundir os consumidores, levando-os a pensar que a sacola simplesmente desaparece quando jogada fora. Os cientistas alertam que, se os consumidores forem levados a pensar que estão sendo mais responsáveis jogando sacolas biodegradáveis nas latas de reciclagem, tal pensamento pode destruir os esforços de coleta de sacolas plásticas convencionais para transformação em novas sacolas. Os aditivos químicos presentes nas sacolas biodegradáveis podem contaminar a mistura, o que as torna inutilizáveis.

“Se as sacolas têm uma função de autodestruição, o reciclador não terá interesse em misturá-las com as outras sacolas", diz Thompson. “Eles precisam de materiais conhecidos e consistentes. Então, o problema passa a ser o seguinte: como separar os biodegradáveis do plástico convencional? Como o consumidor saberá descartá-lo?”.

O fabricante de sacolas discorda

O estudo provavelmente reacenderá uma polêmica surgida no último verão após a BBC ter divulgado resultados preliminares que mostravam que uma das sacolas biodegradáveis não haviam se decomposto depois de dois anos.

A Symphony Environmental Technologies, fabricante da sacola que estava intacta após dois anos, criticou o estudo e pôs em questão as credenciais de Thompson, observando que "ele não é cientista de polímeros".

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Thompson, que recebeu a Ordem do Império Britânico da Rainha Elizabeth por sua pesquisa sobre o lixo plástico, afirmou defender a pesquisa realizada por seu grupo.

“Temos total confiança no trabalho, como sempre tivemos”, afirmou. “Além de ele ter passado por um processo completo de revisão por pares”.

Controvérsia "biodegradável"

As sacolas de compra descartáveis são um dos produtos plásticos mais utilizados do mundo. Costumam ser utilizadas apenas por alguns momentos, sendo que a União Europeia estima usar cerca de 100 bilhões de sacolas todos os anos, com o uso anual per capita ultrapassando 450 sacolas por ano em alguns países da UE. Na medida em que o mundo busca soluções para o aumento do acúmulo de lixo plástico na Terra, são cada vez mais divulgados os produtos vendidos como biodegradáveis, prometendo uma fácil resposta ao uso das sacolas descartáveis. Mas, em muitos casos, a biodegradação não passa disso — apenas uma promessa.

“Não existe material degradável mágico que se decomponha num período muito curto em todos os ambientes de exposição possíveis. Isso não existe”, afirma Ramani Narayan, engenheiro químico da Universidade Estadual de Michigan e especialista em biodegradáveis. Ele não participou do estudo de Plymouth.

Tanto a Organização das Nações Unidas quanto a União Europeia assumiram posições contrárias aos biodegradáveis. A ONU, num relatório publicado em 2016, declarou enfaticamente que os plásticos biodegradáveis não são resposta à poluição plástica marinha. E a UE, ano passado, com alguma controvérsia, recomendou o banimento dos oxibiodegradáveis, que contêm aditivos projetados para acelerar a decomposição das moléculas de polímeros, de acordo com a maior fabricante de sacolas oxibiodegradáveis da Grã-Bretanha, Symphony, às vezes “[a decomposição ocorre] da mesma maneira que a folha de uma árvore, sem sobrar nada”.

Esse processo faz com que a sacola se desintegre em pequenos microplásticos, levantando preocupações de que as sacolas estejam contribuindo para o crescente acervo de microplásticos presentes nos oceanos do mundo.

Teste em três locais abertos

Thompson e sua equipe testaram cinco tipos de sacolas, inclusive uma sacola compostável, uma sacola convencional de polietileno de alta densidade e três tipos de sacolas biodegradáveis. Duas das biodegradáveis eram oxibiodegradáveis. A outra sacola biodegradável fora fabricada com método que promoveria uma decomposição diferenciada.

As sacolas foram expostas às condições ambientais de três locais diferentes. Para o experimento, algumas das sacolas foram cortadas em tiras e colocadas em bolsas de malha, onde ficavam expostas aos elementos do ar livre em cada um dos três diferentes locais de teste. Também foram usadas sacolas inteiras em cada um dos locais.

Para o teste no solo do jardim da universidade, foram enterradas amostras a quase 25 centímetros de profundidade. No teste de exposição ao ar livre, as amostras foram colocadas num muro do jardim com exposição ao sol. No teste marinho, foram submergidas amostras a mais de um metro abaixo da superfície de Porto de Plymouth. Foi realizado um quarto teste laboratorial a título de controle.

As amostras foram colocadas em 10 de julho de 2015, sendo inspecionadas regularmente à procura de sinais de perda superficial, buracos ou desintegração. As amostras também passavam por medições de resistência à tração, que indica sob que tensão ocorre a ruptura.

Sacola compostável desaparece

No local do porto, todas as sacolas e tiras de teste haviam adquirido um biofilme microbiano na superfície após um mês. A sacola compostável desapareceu depois de três meses.

No local ao ar livre no jardim, todas as sacolas e tiras de teste ficaram frágeis demais para futuros testes ou se desintegraram em microplásticos depois de nove meses. Depois disso, não puderam mais ser testadas.

No local de teste de solo no jardim, as sacolas continuaram intactas. Embora a sacola compostável tivesse sobrevivido na forma original por 27 meses, ela já não conseguia sustentar pesos sem rasgar.

Narayan, o químico, diz que o estudo proporciona dados da vida real para revalidar as limitações dos biodegradáveis. Mas questionou a inclusão de uma sacola compostável em testes que as sacolas compostáveis não são projetadas para suportar. As sacolas compostáveis, afirma ele, são projetadas para descarte em composteiras industriais, e a regulamentação dos Estados Unidos e da maior parte das outras nações exige que conste uma descrição clara no rótulo de instruções.

“Aí é que está a confusão”, diz ele. “A sacola compostável só é biodegradável no ambiente de compostagem industrial, sendo feita para ser descartada naquele ambiente”.

Vegware, a fabricante das sacolas compostáveis usadas no estudo, em declaração ao jornal The Guardian, afirmou ter atualizado a descrição dos rótulos de suas sacolas para: “compostável comercialmente nos locais aceitos”.

Imogen Napper, Exploradora da National Geographic que liderou o estudo em seu doutorado, disse ter observado "pouquíssima alteração" nas amostras enterradas no solo ao longo dos três anos. Mesmo assim, não acreditava muito que pudessem aguentar o peso das compras. Mas encheu uma sacola com uma caixa de cereal, latas de Coca-Cola, bananas e laranjas, bolachas salgadas e massas. “As sacolas estavam descoloridas e nojentas, mas ainda utilizáveis”, disse.

Thompson disse que o estudo não deve ser lido como argumento contra o desenvolvimento de produtos biodegradáveis ou compostáveis. Em vez disso, ele afirma, o estudo defende que repensemos quais produtos funcionam melhor como biodegradáveis. “Temos que vincular esses produtos aos usos corretos”, ele diz.

Os ambientes contidos, como estádios de futebol, podem ser mais adequados para o uso de produtos biodegradáveis ou compostáveis que as lojas de varejo. As sacolas de compras podem acabar em qualquer lugar ao fim da vida útil. Mas, num estádio, os recipientes e embalagens descartáveis de alimentos, mesmo os que contenham alimentos não consumidos, podem ser reunidos num só lugar, sendo todo o lixo processado num composteira industrial. “Faz sentido a ideia de que tudo isso faça parte do mesmo fluxo de resíduos”, diz Thompson.

Talvez, o melhor futuro para as sacolas plásticas, ele sugere, seja reverter o processo e manter a propriedade que as tornou tão populares no começo: a durabilidade. Essa é a conclusão final do estudo: “Uma sacola que possa e seja reutilizada muitas vezes representa uma alternativa melhor que a degradação”.

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