Perereca-pixinguinha: pesquisadores unem ciência e arte ao batizar anfíbio

Espécie ocorre somente no Espírito Santo e foi batizada em homenagem ao músico que "transformava notas de choro, o ritmo, em lágrimas de alegria”. 

Feita sob um aumento de mais de 400% do desmatamento da Mata Atlântica no Espírito Santo, a descoberta da perereca-pixinguinha (Scinax pixinguinha) no estado foi um alento aos pesquisadores da biodiversidade. Em meio às mazelas da sociedade brasileira, Pixinguinha também trazia esperança. "Como mágico, transformava notas de choro, o ritmo, em lágrimas de alegria” diz João Victor Lacerda, líder do estudo que descreveu a espécie.

Foto de João Victor Lacerda
Por Gabriel de Sá
Publicado 29 de jun. de 2021, 12:00 BRT

ELA NÃO TOCA FLAUTA nem saxofone, tampouco compôs clássicos atemporais do cancioneiro brasileiro. Mesmo assim, ganhou um nome cheio de personalidade: Pixinguinha. Recém-identificada e encontrada apenas no município de Santa Teresa, na região serrana do Espírito Santo, a perereca-pixinguinha (Scinax pixinguinha) foi observada no começo de 2020 e, para a surpresa dos pesquisadores, tratava-se de um bicho completamente novo para a ciência.

A descrição da nova espécie foi publicada hoje no periódico científico internacional Ichthyology & Herpetology, em estudo de autoria de João Victor Lacerda, pesquisador do Projeto Bromeligenous/Instituto Marcos Daniel e do Instituto Nacional da Mata Atlântica, em parceria com Rodrigo Barbosa Ferreira, Katyuscia Araujo-Vieira, Cássio Zocca e Ana Carolina Lourenço.

Santa Teresa é um dos municípios com maior diversidade de anfíbios do planeta – mais de 100 espécies já foram catalogadas na região. Quando encontraram a perereca-pixinguinha, os pesquisadores notaram características bem peculiares: uma mancha escura entre os olhos e manchas pretas nas coxas. Os machos, que têm entre 2,4 e 2,8 cm, possuem braços fortes e coloração amarelada, além de um canto que chama a atenção. Já as fêmeas podem chegar a 3,8 cm. “Poucos indivíduos foram encontrados até o momento, e apenas em Santa Teresa”, observa Rodrigo Barbosa Ferreira. “Com a descrição, é possível que novas áreas reportem a ocorrência da espécie.”

O autor do estudo, João Victor Lacerda, conta que é estarrecedor constatar que a Mata Atlântica foi praticamente toda devastada e que muitas espécies desapareceram antes mesmo de serem descobertas. Por isso, encontrar indivíduos até então desconhecidos pela ciência teve um poder transformador para o pesquisador. “Essa mistura de sentimentos nos lembrou bastante dos feitos do saudoso e talentoso Pixinguinha, que, feito mágico, transformava notas de choro, o ritmo, em lágrimas de alegria”, compara Lacerda.

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    À esquerda: No alto:

    As pererecas-pixinguinhas machos (na foto) têm entre 2,4 e 2,8 cm, possuem braços fortes e coloração amarelada, além de um canto que chama a atenção. 

    Foto de João Victor Lacerda
    À direita: Acima:

    Nascido Alfredo da Rocha Viana Filho, no Rio de Janeiro, em 1897, e morto em 1973, Pixinguinha é considerado um dos maiores compositores da música popular brasileira.

    Foto de Arquivo Nacional

    Nascido Alfredo da Rocha Viana Filho, no Rio de Janeiro, em 1897, Pixinguinha é considerado um dos maiores compositores da música popular brasileira, além de ter contribuído para que o choro ganhasse o status de gênero musical. Tanto é que o Dia Nacional do Choro, em 23 de abril, é uma homenagem à data antes atribuída a seu nascimento (que depois constatou-se ser em 4 de maio). Pixinguinha é autor de obras como Carinhoso, Rosa, Lamentos, Naquele Tempo e Um a Zero. O músico morreu em 1973, aos 75 anos.

    Para João Victor Lacerda, qualquer homenagem ainda será pouca em se tratando de Pixinguinha. “Tivemos a pretensa ideia de nos aproveitar da cultura brasileira para falar de ciência e conservação, assim como usar ciência e conservação para também falar de cultura brasileira”, diz ele. “Sem dúvida, um dueto fadado ao sucesso.” Ainda se sabe pouco sobre a perereca-pixinguinha, mas ela corre riscos por conta da degradação das nascentes e poluição dos córregos por esgotos e agrotóxicos.

    E, para quem se interessa pelo tema, um ponto importante: qual a diferença morfológica entre os tipos de anfíbio? Quem explica é o pesquisador Rodrigo Barbosa Ferreira. “Sapos têm a pele granulosa, dedos sem ventosas e pernas curtas. Já as pererecas têm a pele lisa e úmida, possuem ventosas entre os dedos e são boas escaladoras”, detalha. “A rã tem a pele lisa e úmida, poucas possuem ventosas entre os dedos e as pernas são longas para grandes saltos.”

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