Religião que funde espiritualismo com antigas civilizações atrai seguidores no Planalto Central

Com 800 mil fiéis, o complexo do Vale do Amanhecer, perto de Brasília, possui uma pirâmide, um templo em forma de espaçonave, um centro de oração de seis pontas e várias esculturas em forma de elipse.

Por Ye Charlotte Ming
fotos de Gui Christ
Publicado 14 de set. de 2018, 12:00 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Uma seguidora do Vale do Amanhecer louva em frente a uma estátua de um dos líderes ...
Uma seguidora do Vale do Amanhecer louva em frente a uma estátua de um dos líderes da prática espiritual, Pai Seta Branca.
Foto de Gui Christ

A uma hora da capital futurística do Brasil, Brasília, está localizada uma das capitais espirituais do país: o Vale do Amanhecer.

À primeira vista, o Vale do Amanhecer parece um parque temático em miniatura – onde os visitantes podem ver cópias das maravilhas do mudo sem ter que viajar para os locais reais. Construído em Planaltina, cidade satélite de Brasília, o complexo do templo à beira do lago possui uma pirâmide, um templo em forma de espaçonave, um centro de oração de seis pontas e várias esculturas em forma de elipse.

Embora a configuração física do vale possa parecer desorientadora, não é acidental. Meticulosamente projetado, ele reflete as intrincadas doutrinas e crenças abrangentes da religião – tirada de uma diversidade de religiões e civilizações, incluindo Cristianismo, Hinduísmo, Judaísmo, religião Inca e o antigo Egito.

Segundo os seguidores do Vale do Amanhecer, seres extraterrestres pousaram na Terra há 32 mil anos para desenvolver as civilizações humanas. Esses seres depois voltaram à Terra através de sucessivas encarnações passando por várias culturas e épocas. Os membros do Vale, conhecidos como médiuns, acreditam que eles próprios são as mais recentes encarnações: os Jaguares.

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    Um seguidor do Vale do Amanhecer, vestido com uma roupa de mestre, faz compras em uma loja local.
    Foto de Gui Christ

    O Vale do Amanhecer foi fundado por Neiva Chaves Zelaya, conhecida como tia Neiva, em 1959. Viúva e com quatro filhos, ela trabalhava como motorista de caminhão em Brasília, que na época ainda estava em construção para substituir o Rio de Janeiro como capital do Brasil. Ali, ela conta que começou a vivenciar episódios psíquicos, os quais ela acredita terem sido visitas de espíritos do mundo extraterrestre.

    Neiva conta que, primeiramente, foi guiada por Pai Seta Branca, um espírito emissário que hoje é retratado em estátuas e desenhos como um nativo líder Sul Americano.

    O fotógrafo brasileiro Gui Christ foi atraído para o Vale do Amanhecer por causa de sua fantástica história de origem e dos trajes coloridos e extravagantes dos médiuns. Ele documentou uma série de rituais, alguns deles envolvendo longas horas de canto ao redor do lago.

    Os médiuns normalmente trabalham em pares durante os rituais. Um apara, ou médium de recepção, tem o trabalho de incorporar fisicamente um espírito, sendo ele bom ou problemático, e um médium doutrinador assume a tarefa de ensinar o espírito e ajudá-lo a voltar ao mundo espiritual. Os seguidores acreditam que os rituais também ajudam os médiuns as expiar as dívidas cármicas de suas vidas passadas.

    Francisca Antonia dos Santos faz uma pausa na sala de oração chamada Castelo do Silêncio.
    Foto de Gui Christ

    Seguidor da umbanda, religião espiritual afro-brasileira, Christ sentiu uma energia indescritível ao fotografar os rituais. “Eu já vi muitas religiões na África, Ásia e no Brasil, mas essa é a primeira vez que me senti conectado a alguma coisa,” ele diz. “Eu precisei sair do templo porque estava me sentindo tonto”.

    O Vale do Amanhecer é um dos movimentos religiosos que crescem mais rapidamente no Brasil, com 800 mil seguidores e 600 templos afiliados globalmente, de acordo com Kelly Hayes, professor associado de estudos religiosos na Universidade de Indiana, Indianápolis.

    Ainda assim, a sociedade dominante e as comunidades religiosas no Brasil normalmente rejeitam o Vale do Amanhecer, classificando-o e outros grupos espiritualistas como seitas. A tensão é principalmente dominante entre os seguidores do Vale e evangélicos que construíram igrejas perto da comunidade, visando membros para conversão. “[Os evangélicos] acreditam que os membros do Vale estão sob a influência de demônios,” diz Hayes.

    Em vez de rejeitar o Vale como um culto inócuo, as pessoas deveriam considerá-lo no contexto de sua fundação, diz Hayes. Estabelecida na década de 1950, a religião era popular entre agricultores pobres e migrantes que vieram para ajudar a construir Brasília. “Brasília, naquela época, significava o Brasil saltando para o mundo moderno e tornando-se uma nação moderna,” conta Hayes.  Mas a cidade de concreto hiperorganizada revelou-se uma distopia inóspita, atormentada pela superlotação e pelo crime.

    A cura espiritual que o Vale oferece é terapêutica para algumas das almas descontentes de Brasília. “Muito disso é sobre narrar sua vida de novo,” explica Hayes. “Essas narrativas dão para muitas pessoas uma sensação de que elas têm algum controle sobre suas vidas… que justiça e igualdade são possíveis através do seu trabalho.”

    Alexandre Alves se deita para um tratamento espiritual dentro do templo pirâmide da comunidade.
    Foto de Gui Christ

    Conheça o trabalho de Gui Christ no site e no Instagram.

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