Muitos outros ícones históricos enfrentam os mesmos riscos que Notre Dame

Centenas de Patrimônios Culturais da Humanidade admirados no mundo todo não estão preparados para incêndios e perigos semelhantes, alertam especialistas.

Por Erin Blakemore
Publicado 17 de abr. de 2019, 16:09 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Os bombeiros apagam as chamas da Catedral de Notre Dame em chamas em Paris, na França, ...
Os bombeiros apagam as chamas da Catedral de Notre Dame em chamas em Paris, na França, em 15 de abril de 2019.
Foto de Benoit Tessier, Reuters

Enquanto a mais famosa catedral da França queimava, pessoas do mundo todo paralisaram em choque com as imagens do incêndio catastrófico. Agora estão dando um suspiro de alívio com a notícia de que os bombeiros conseguiram salvar das chamas boa parte da Notre Dame de Paris.

Entretanto, o incêndio despertou um debate antigo sobre como proteger melhor Patrimônios Mundiais Culturais da Humanidade (locais que — com demasiada frequência — carecem de proteções adequadas contra uma série de desastres).

“Muitos Patrimônios Mundiais da Humanidade não possuem nenhuma política, plano ou processo estabelecido para redução dos riscos associados a desastres”, escreve a UNESCO. “Consequentemente, centenas de locais estão extremamente expostos a eventuais riscos.”

Um grande incêndio assola o Museu Nacional no Rio de Janeiro, no Brasil, em 2 de setembro de 2018.
Foto de Carl de Souza, AFP, Getty

Esses riscos, que variam de incêndios, enchentes, mudanças climáticas e até conflitos, devastaram muitos dos tesouros culturais mundiais nos últimos anos.

No ano passado, o Museu Nacional no Brasil foi dizimado em um incêndio, deixando em cinzas importantes artefatos, como a coleção de Egiptologia do museu e gravações de áudio de línguas indígenas agora perdidas.

Em 2016, militantes do Estado Islâmico destruíram os Portões Mashki e Adad na antiga cidade de Nínive, no Iraque. E o terremoto no Nepal em 2015 despejou escombros em cima de templos culturalmente importantes, entre outros locais.

Contudo, os curadores de patrimônios culturais não estão sempre dispostos a fazer o planejamento para desastres, afirma Jonathan Bell, diretor da Iniciativa Being Human (Ser Humano, em tradução livre) da National Geographic Society. “É uma tarefa bastante onerosa”, prossegue ele, e os oficiais locais podem se sentir pressionados a maximizar os dólares gerados pelo turismo e a evitar fechamentos de locais ao público.

É crucial a colaboração entre pesquisadores, especialistas em conservação e líderes locais, afirma Valéry Freland, Diretor da ALIPH, fundação de patrimônios culturais que intervém em locais ameaçados por conflitos. “Devemos prestar atenção à situação local, bem como às necessidades reais da região e trabalhar em conjunto com agentes locais.”

A restauração é um negócio arriscado

Ironicamente, o incêndio de Notre Dame ocorreu durante uma tentativa que chegou muito atrasada para impedir a catedral de esfacelar. Contudo isso não surpreende curadores experientes. De acordo com o Instituto de Conservação Getty, a maioria dos incêndios em instituições culturais ocorre durante reformas ou construções.

“O trabalho de conservação e restauração é muito delicado”, conta Bell, curador de arquitetura que oferece consultoria a profissionais locais em patrimônios mundiais. Por exemplo, o trabalho de restauração pode expor materiais antigos à fiação elétrica e a outros riscos.

Bell lembra-se de uma visita a um patrimônio histórico em que ele notou que uma lâmpada estava chamuscando a superfície onde estava apoiada — a centímetros de uma cúpula de madeira inestimável. “Observei esse tipo de descuido em inúmeros lugares”, conta ele.

Algo parecido pode ter causado a fagulha inicial do incêndio em Notre Dame. Apesar de sua monumental alvenaria em pedra, a armação interna da catedral foi feita de árvores cortadas no século 12. Ao que parece, “a Floresta”, como era apelidada a estrutura do teto de 1,3 mil anos, foi totalmente perdida.

O reitor de Notre Dame contou a uma estação de rádio local que monitores de incêndio verificavam o teto de madeira três vezes ao dia, de acordo com matéria publicada no The New York Times. Ele confirmou que existe um bombeiro no local, porém não está claro se essa pessoa esteve presente quando o incêndio irrompeu ou se fica um bombeiro de plantão o tempo todo.

A vista aérea do Castelo de Windsor, no Reino Unido, mostra os danos no teto causados por um incêndio ocorrido em 20 de novembro de 1992.
Foto de DAVID GILES, AFP, Getty

As lições do incêndio de Notre Dame serão aprendidas em outros patrimônios históricos? No Palácio de Westminster, a sede do governo britânico, os arquitetos de uma grande reforma terão o incêndio gravado em sua memória enquanto modificam os sistemas de combate a incêndio da estrutura.

“Estamos prontos para aprender as lições do incêndio de Notre Dame para garantir que façamos todo o possível para proteger nossa população e nossas construções na Propriedade do Parlamento”, contou um porta-voz do Parlamento à National Geographic.

Um raio causou um incêndio catastrófico na Catedral de York em 1984.
Foto de PA Images, Alamy

Oficiais do Castelo de Windsor, construído aproximadamente na mesma época que Notre Dame e que passou por seu próprio incêndio catastrófico em 1992, informou a National Geographic que a estrutura é monitorada continuamente para prevenção de incêndios.

Enquanto outros patrimônios mundiais culturais reveem seus planos de proteção contra incêndios, os oficiais agora devem decidir como serão os reparos em Notre Dame. Eles estão recebendo apoio (e uma grande dose de esperança) dos artesãos que ajudaram outro marco histórico inglês a retornar das cinzas há quase quatro décadas.

Em 1984, um raio causou um incêndio catastrófico na Catedral gótica de York, também construída na mesma época que Notre Dame. A igreja foi restaurada com a ajuda de artesãos que utilizaram materiais tradicionais para reparar o teto danificado, o vitral e outros elementos da catedral. John David, mestre de obras da Catedral de York, contou à BBC que restaurar Notre Dame com técnicas tradicionais é “algo bem possível de concretizar”.

Bell, que cresceu na França, espera que esses planos de restauração incluam uma robusta preparação para desastres. “Quando se trabalha com um patrimônio histórico, o valor desse local é muito maior que o de uma construção comum”, afirma ele. E, se o pior realmente acontecer, “é como perder um velho amigo.”

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