Minerais “extraterrestres” são identificados em meteorito

Os minerais nunca encontrados na Terra foram descobertos em um meteorito de mais de 15 mil quilos. Eles oferecem um vislumbre emocionante das colisões que abalaram o início de nosso Sistema Solar.

Por Maya Wei-Haas
Publicado 19 de dez. de 2022, 10:46 BRT

O padrão entrelaçado dos cristais observados nessas lâminas do meteorito El Ali é comum em meteoritos ferrosos. Mas este meteorito guardava uma surpresa: três novos minerais nunca identificados na natureza na Terra.

Foto de Abdulkadir Abiikar Hussein Almaas University

Um pedregulho vermelho esburacado permaneceu por muitos anos na periferia da cidade de El Ali, na Somália, perto de um poço popular onde pastores e seus rebanhos se reúnem para saciar a sede

O conhecimento sobre a rocha, com mais de 15 mil quilos, foi repassado por gerações de pastores de camelos, que utilizavam sua superfície metálica como bigorna para afiar lâminas. Mas a história da rocha remonta a uma época mais antiga: aos primórdios de nosso Sistema Solar.

Conhecido como o meteorito El Ali, o pedaço de metal atravessou a atmosfera da Terra em alguma data desconhecida no passado. Trouxe consigo ao menos três minerais não encontrados naturalmente na Terra, conforme anúncio recente de cientistas. Ocultos na composição química e na estrutura cristalina de cada mineral estão indícios de fenômenos ocorridos a milhões de quilômetros de distância e bilhões de anos no passado.

Embora os minerais possam não alterar drasticamente nossa compreensão sobre nossa vizinhança celestial, pesquisadores esperam que esses segredos cósmicos descobertos diante de todos possam ajudar a fornecer mais informações sobre as colisões caóticas do início de nosso Sistema Solar.

“Todo mineral novo – cada um deles – tem uma mensagem e uma história para contar”, afirma Chi Ma, mineralogista de meteoritos do Instituto de Tecnologia da Califórnia, nos Estados Unidos, que identificou um dos novos minerais e ajudou a confirmar os outros dois.

A descoberta de três novos minerais é a última reviravolta na disputa de muitos anos sobre o destino do meteorito El Ali. Garimpeiros de uma pequena mineradora encontraram a rocha em 2019 ao procurar opalas. No ano seguinte, depois que o governo da Somália não se dispôs a pagar o preço multimilionário, a mineradora exportou o meteorito para a China, afirma Abdulkadir Abikar Hussein, geólogo da Universidade de Almaas, em Mogadíscio, na Somália, que inspecionou o meteorito a pedido do governo.

Agora a rocha espacial ainda não tem comprador e Hussein teme que seja cortada em pedaços menores para venda, destruindo para sempre uma peça inestimável do patrimônio nacional. Ele espera que as novas descobertas incentivem “o governo a tomar uma atitude, comprar a rocha e devolvê-la à Somália”.

Uma pequena mineradora, na esperança de vender o meteorito de mais de 15 mil quilos, removeu-o de sua localização original e o exportou para a China.

Foto de Abdulkadir Abiikar Hussein Almaas University

Surpresas no meteorito

Embora gerações de pastores de camelos soubessem do meteorito, o nono maior já encontrado no mundo, ele foi documentado cientificamente apenas há alguns anos. A rocha extraordinariamente lisa chamou a atenção de garimpeiros e, quando a golpearam com um martelo, um tom metálico ressoou. Suspeitaram que fosse um meteorito ferroso – um objeto do espaço feito predominantemente de ferro e níquel, muitos dos quais se acredita terem origem em núcleos de asteroides ou planetesimais esmagados, assim como o centro metálico de nosso próprio planeta.

Os garimpeiros enviaram pequenas amostras do meteorito a cientistas para confirmação e análise posterior, e uma peça chegou às mãos de Chris Herd, curador da coleção de meteoritos da Universidade de Alberta, no Canadá.

Ao estudar a lâmina de rocha, notou diversos cristais com composições incomuns. Análises posteriores, incluindo uma comparação com minerais desenvolvidos sinteticamente, confirmaram sua suspeita: a composição e a estrutura dos minerais eram inéditas na natureza. 

Herd batizou um mineral de elaliita, em homenagem ao próprio meteorito, e o segundo de elkinstantonita, em homenagem a Lindy Elkins-Tanton, cientista planetária da Universidade Estadual do Arizona, nos Estados Unidos, e pesquisadora principal da próxima missão Psyche (Psiquê, em tradução livre) da Nasa, que explorará um asteroide metálico.

Elkins-Tanton tomou conhecimento do nome planejado por Herd para o mineral logo depois que a missão Psyche perdeu sua data de lançamento devido a problemas durante testes de software, e seu moral estava baixo. “Despertou meu ânimo...” conta ela, fazendo uma pausa. “Fiquei tão emocionada.”

O Instituto de Tecnologia da Califórnia, que já havia descoberto dezenas de novos minerais, identificou o terceiro mineral, batizando-o de olsenita em homenagem ao falecido Edward Olsen, ex-curador do Museu Field de História Natural em Chicago, nos Estados Unidos, que havia teorizado a existência do mineral que hoje leva seu nome.

Memórias minerais

Nosso planeta possui cerca de 5,8 mil minerais, ao passo que apenas cerca de 480 foram encontrados em meteoritos. Muitos desses minerais meteoríticos são de fato extraterrestres: cerca de 30% não se formam naturalmente na Terra.

Os minerais recém-descobertos foram encontrados em inclusões, semelhantes a bolinhas microscópicas dispersas pelas lâminas das amostras do meteorito. A equipe ainda estuda as condições exatas de sua formação, afirma Herd, mas a presença dos novos minerais dentro das bolinhas oferece indícios sobre o período de sua origem.

À medida que o metal derretido de um meteorito resfria lentamente e se solidifica, diferentes minerais cristalizam em momentos diferentes, o que resulta em alguns elementos “incompatíveis” concentrados no acúmulo líquido cada vez menor. Os novos minerais se formaram quando quase todo o metal já havia resfriado e restavam apenas pequenas bolhas derretidas, que acabaram se cristalizando e formando as inclusões.

A composição química geral da rocha revela que esse processo de resfriamento provavelmente não ocorreu no núcleo de um asteroide, como se acredita que ocorra com a maioria dos demais meteoritos ferrosos. Em vez disso, o metal provavelmente cristalizou perto da superfície de um corpo planetário depois que uma colisão em alta velocidade derreteu superfícies sólidas.

Esses corpos em colisão podem ter sido núcleos de asteroides destruídos, ou talvez fossem rochas espaciais primitivas conhecidas como condritos, que possuem uma quantidade significativa de metal mesclado com rocha. De qualquer maneira, provavelmente colidiram a velocidades impressionantes – essas colisões estão em curso atualmente no cinturão de asteroides, em que objetos aceleram a cerca de 18 mil quilômetros por hora.

Estudar a mineralogia de meteoritos é “uma exploração do Sistema Solar ‘no escuro’, em muitos aspectos”, observa Herd. “Procuramos restringir a variedade de condições existentes em diferentes corpos planetários.”

Por ora, na Terra, o debate sobre o futuro do meteorito persiste. Se o meteorito for vendido a terceiros, parte do dinheiro será repassado ao governo local, segundo Hussein. Mas ele acrescenta que muitos somalis consideram a solução insatisfatória e acreditam que a rocha nem deveria ter sido transferida originalmente para fora da Somália. “Deveria estar em nosso país.”

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