Fotos revelam as vidas isoladas dos reclusos sociais do Japão

Uma fotógrafa explora o mundo escondido dos hikikomori – e os laços pessoais que os trazem de volta.

Por Laurence Butet-Roch
fotos de Maika Elan
Publicado 5 de mar. de 2018, 13:33 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
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Fuminori Akoa, 29, está em seu quarto há um ano. “De acordo com ele, é um grande homem e poderia fazer coisas extraordinárias, mas nem sempre tenta o seu máximo”, explica a fotógrafa Maika Elan, que o visitou com uma assistente social. “Ele muda seus hobbies e objetivos frequentemente e diz que, aos poucos, se perdeu.”
Foto de Maika Elan

No Japão, observa a fotógrafa Maika Elan, “há sempre dois lados opostos. É moderno e tradicional, vibrante e muito solitário. Restaurantes e bares estão sempre cheios, mas se você prestar atenção, a maioria está repleto de clientes comendo sozinhos. E nas ruas, não importa a hora, você verá funcionários exaustos saindo dos escritórios.”

É possível dizer que o oposto das pessoas que vivem vidas solitárias em público são aquelas que escolhem se isolar do mundo. Conhecidos como hikikomori, essas pessoas, na maioria homens, não participaram da sociedade ou mostraram qualquer desejo de fazerem isso, por pelo menos um ano. Eles dependem de seus pais para cuidarem deles. Em 2016, o censo japonês estimou o número em 540 mil pessoas entre 15 e 39 anos. Mas pode facilmente ser o dobro desse montante. Como muitos preferem manter-se totalmente escondidos, eles permanecem não contabilizados.

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Riki Cook, 30, tem pai americano e mãe japonesa. Sua família mora no Havaí enquanto ele mora sozinho no Japão. “Riki sempre tenta ser excepcional”, diz Elan, “mas tem medo de cometer erros.”
Foto de Maika Elan
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Quarto de Shoku Uibori, 43, que se tornou um hikikomori há sete anos. “Ele era empresário e tinha sua própria empresa, mas faliu. Ele se tranca no quarto o dia todo para ler e, às vezes, sai à noite para comprar comida e outros itens básicos em lojas de conveniência”, escreve Elan.
Foto de Maika Elan
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Quando Elan fotografou Ikuo Nakamura, de 34 anos, ele estava em seu quarto havia sete anos.
Foto de Maika Elan

Elan, que é vietnamita, ouviu falar sobre os hikikomori pela primeira vez durante sua estadia em Tóquio de seis meses para uma residência artística. Ela entrou em contato com uma mulher japonesa chamada Oguri Ayako, que trabalhava com a Novo Começo, uma organização sem fins lucrativos com o foco em tirar os hikikomori da reclusão.

A pedido dos pais – e com um custo aproximado de 26 mil reais por ano – mulheres como a Ayako entram em contato regularmente com os reclusos, começando por cartas. O processo leva meses – eles abrem as cartas, depois as respondem, em seguida conversam pelo telefone, através da porta fechada, até que, finalmente, permitem que elas entrem. Muitos outros passos são necessários até que eles se aventurem a sair com elas. O objetivo é levá-los para morar no dormitório da Novo Começo e participar de um programa de formação profissional.

Ayako, cujo trabalho de ‘irmã de aluguel’ pode ser melhor descrito como o de uma assistente social, diz que já ajudou entre quarenta e cinquenta a saírem do isolamento durante a sua carreira de uma década.

Elan acompanhou Ayako durante visitas para onze diferentes hikikomori e, após cinco ou seis visitas, eles permitiram que ela tirasse fotos. “No início, achei que eram preguiçosos e egoístas”, ela admite, mas com o tempo, após conhecê-los, ela aprendeu como eles podem ser atenciosos e perspicazes. “Há tantas pessoas por aí trabalhando até o esgotamento. Os hikikomori, de certa forma, trazem o Japão a um equilíbrio.”

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    A ‘irmã de aluguel’ Ayako Oguri escreve para Masahiro Koyama, 40, que estava em seu quarto há 10 anos. Esta é a terceira visita de Ayako à sua casa. Já que ele se recusa a conversar, ela escreve cartas e as deixa em frente ao seu quarto.
    Foto de Maika Elan
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    Todo sábado, a organização sem fins lucrativos Novo Começo oferece uma refeição onde os hikikomori podem socializar com os funcionários e seus filhos, e entre eles. Muitos que já foram hikikomori encontram uma maneira de ajudar as pessoas.
    Foto de Maika Elan
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    A 'irmã de aluguel' Ayako Oguri conversa com Ikuo Nakamura, 34, em agosto de 2016. Na época, Nakamura estava em seu quarto havia sete anos e Oguri já o visitava há vários meses. Em uma reviravolta recente, Elan descobriu que os dois se apaixonaram e se casaram. Nakamura agora quer se tornar um ‘irmão de aluguel’, ajudando outros hikikomori a saírem de sua reclusão.
    Foto de Maika Elan

    A situação não é única no Japão, embora seja mais extrema aqui. Elan cita diversas razões para isso: um número crescente de famílias tem apenas um filho em quem eles depositam todos os seus sonhos e esperanças, poucos têm um modelo masculino já que seus pais trabalham dia e noite, tradicionais papéis sociais de gênero continuam atribuindo muita, se não toda, a responsabilidade financeira da casa ao patriarca, entre outras razões.

    Mas outra explicação poderia ser encontrada na mudança cultural do país, que está saindo de uma sociedade com mentalidade coletiva para uma mais individualista, especialmente entre as gerações mais jovens que buscam maneiras de se expressar. “No Japão, onde ainda se preza pela uniformidade e onde reputações e aparências são primordiais, a rebelião chega de forma muda, como os hikikomori”, ela disse.

    “Quanto mais tempo os hikikomori permanecem de fora da sociedade, mais eles se tornam cientes de seu fracasso social,” explica Elan. “Eles perdem qualquer autoestima e confiança que poderiam ter e a perspectiva de saírem de casa torna-se cada vez mais assustadora. Trancar-se no quarto faz com que eles se sintam ‘seguros’.”

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    Chujo, 24, tornou-se um hikikomori há dois anos. Ele tem sonhos de se tornar um cantor de ópera, mas como é o filho mais velho, sua família quer que ele entre para o negócio da família. Trabalhou em um escritório por um ano, mas o estresse era tanto que ele sofria de dores estomacais. Ele também comparava a sua situação com a de seu irmão mais novo, que podia fazer o que quisesse. Descontente, ele se comportava mal, gerando uma maior repreensão de sua família, o que intensificava o seu sentimento de vergonha. Ele se trancou em seu quarto por um ano até que seus pais o forçaram a participar de um programa de apoio.
    Foto de Maika Elan

    Elan pretende continuar este projeto com um maior foco nas irmãs de aluguel. Estas mulheres, estranhas para os hikikomori, podem ser a solução de seus problemas. Para comprovar sua teoria, Elan acabou de descobrir que um dos hikikomori que fotografou, Ikuo Nakamura, casou-se com sua irmã de aluguel, Oguri Ayako. Ele agora deseja se tornar um irmão de aluguel, ajudando outros como ele.

    Veja mais do trabalhos de Maika Elan em seu site.

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