Fotos revelam as vidas isoladas dos reclusos sociais do Japão
Uma fotógrafa explora o mundo escondido dos hikikomori – e os laços pessoais que os trazem de volta.
No Japão, observa a fotógrafa Maika Elan, “há sempre dois lados opostos. É moderno e tradicional, vibrante e muito solitário. Restaurantes e bares estão sempre cheios, mas se você prestar atenção, a maioria está repleto de clientes comendo sozinhos. E nas ruas, não importa a hora, você verá funcionários exaustos saindo dos escritórios.”
É possível dizer que o oposto das pessoas que vivem vidas solitárias em público são aquelas que escolhem se isolar do mundo. Conhecidos como hikikomori, essas pessoas, na maioria homens, não participaram da sociedade ou mostraram qualquer desejo de fazerem isso, por pelo menos um ano. Eles dependem de seus pais para cuidarem deles. Em 2016, o censo japonês estimou o número em 540 mil pessoas entre 15 e 39 anos. Mas pode facilmente ser o dobro desse montante. Como muitos preferem manter-se totalmente escondidos, eles permanecem não contabilizados.
Elan, que é vietnamita, ouviu falar sobre os hikikomori pela primeira vez durante sua estadia em Tóquio de seis meses para uma residência artística. Ela entrou em contato com uma mulher japonesa chamada Oguri Ayako, que trabalhava com a Novo Começo, uma organização sem fins lucrativos com o foco em tirar os hikikomori da reclusão.
A pedido dos pais – e com um custo aproximado de 26 mil reais por ano – mulheres como a Ayako entram em contato regularmente com os reclusos, começando por cartas. O processo leva meses – eles abrem as cartas, depois as respondem, em seguida conversam pelo telefone, através da porta fechada, até que, finalmente, permitem que elas entrem. Muitos outros passos são necessários até que eles se aventurem a sair com elas. O objetivo é levá-los para morar no dormitório da Novo Começo e participar de um programa de formação profissional.
Ayako, cujo trabalho de ‘irmã de aluguel’ pode ser melhor descrito como o de uma assistente social, diz que já ajudou entre quarenta e cinquenta a saírem do isolamento durante a sua carreira de uma década.
Elan acompanhou Ayako durante visitas para onze diferentes hikikomori e, após cinco ou seis visitas, eles permitiram que ela tirasse fotos. “No início, achei que eram preguiçosos e egoístas”, ela admite, mas com o tempo, após conhecê-los, ela aprendeu como eles podem ser atenciosos e perspicazes. “Há tantas pessoas por aí trabalhando até o esgotamento. Os hikikomori, de certa forma, trazem o Japão a um equilíbrio.”
A situação não é única no Japão, embora seja mais extrema aqui. Elan cita diversas razões para isso: um número crescente de famílias tem apenas um filho em quem eles depositam todos os seus sonhos e esperanças, poucos têm um modelo masculino já que seus pais trabalham dia e noite, tradicionais papéis sociais de gênero continuam atribuindo muita, se não toda, a responsabilidade financeira da casa ao patriarca, entre outras razões.
Mas outra explicação poderia ser encontrada na mudança cultural do país, que está saindo de uma sociedade com mentalidade coletiva para uma mais individualista, especialmente entre as gerações mais jovens que buscam maneiras de se expressar. “No Japão, onde ainda se preza pela uniformidade e onde reputações e aparências são primordiais, a rebelião chega de forma muda, como os hikikomori”, ela disse.
“Quanto mais tempo os hikikomori permanecem de fora da sociedade, mais eles se tornam cientes de seu fracasso social,” explica Elan. “Eles perdem qualquer autoestima e confiança que poderiam ter e a perspectiva de saírem de casa torna-se cada vez mais assustadora. Trancar-se no quarto faz com que eles se sintam ‘seguros’.”
Elan pretende continuar este projeto com um maior foco nas irmãs de aluguel. Estas mulheres, estranhas para os hikikomori, podem ser a solução de seus problemas. Para comprovar sua teoria, Elan acabou de descobrir que um dos hikikomori que fotografou, Ikuo Nakamura, casou-se com sua irmã de aluguel, Oguri Ayako. Ele agora deseja se tornar um irmão de aluguel, ajudando outros como ele.
Veja mais do trabalhos de Maika Elan em seu site.