Imenso pterossauro antártico encontrado entre escombros do Museu Nacional

Um osso escurecido pelas chamas é um dos primeiros fósseis a serem descritos depois que o trágico incêndio de 2018 dizimou as coleções do museu.

Por John Pickrell
Publicado 16 de out. de 2019, 12:57 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Um pterossauro azhdarchid sobrevôa a atual Romênia em uma ilustração. Fósseis encontrados entre os escombros do Museu Nacional revelam que os répteis voadores deste mesmo grupo também reinavam sobre a Antártida durante o Cretáceo Superior.
Foto de Ilustração de Mark Witton

Quando o incêndio devastou o antigo edifício imperial do Museu Nacional no Rio de Janeiro, em 2018, milhões de artefatos valiosos foram danificados, incluindo muitos fósseis importantes trazidos do mundo inteiro. Mas agora, um osso de 70 milhões de anos encontrado nos escombros do museu oferece um fio de esperança aos cientistas.

Junto com um segundo osso que estava guardado em outro prédio, longe do fogo, o fóssil representa a primeira evidência de que pteurossauros reinavam sobre a Antártida durante o fim da era dos dinossauros.

“É ótimo saber que ao menos parte da coleção de pterossauros não somente foi recuperada, mas também está em condições boas o bastante e com registros suficientes para continuar a produzir informações científicas”, afirma Mark Witton, especialista em pterossauros da Universidade de Portsmouth, no Reino Unido, que não estava envolvido na pesquisa.

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Coletado na ilha Veja, na Península Antártica, o fóssil recuperado pertencia a um pteurossauro azhdarchid ou pteranodontian, dois tipos comuns durante o período Cretáceo Superior. Apesar da Antártida ter sido mais quente do que hoje e recoberta por florestas de coníferas – habitat aparentemente ideal para pteurossauros –, as evidências desse réptil voador no continente gelado têm sido difícil de rastrear. Ossos de pteurossauro têm revestimentos muito finos e são repletos de bolsões de ar que facilitam seu reconhecimento, mas também são delicados e raramente restam conservados por muitos anos.

Com os ossos em mãos, paleontólogos conseguiram, pelo menos, defender que pteurossauros enormes um dia vagaram pelos céus da região: acredita-se que o osso que sobreviveu ao incêndio pertenceu a uma criatura com envergadura de 4,8 m.

“Foram recuperados do palácio muitos fósseis importantes e outras peças, mas o osso escurecido é o primeiro do tipo a ser estudado após o incêndio”, disse o paleontólogo e diretor do Museu Nacional Alexandre Kellner, que apresentou a descoberta no fim da semana passada em um encontro da Sociedade de Paleontologia de Vertebrados em Brisbane, Austrália.

“Qualquer história sobre fósseis ou espécimes que sobreviveram é incrível”, comenta Liz Martin-Silverstone, que trabalha com pteurossauros na Universidade de Bristol, no Reino Unido. “Não supera a imensa tristeza e devastação de tudo que foi perdido, mas pelo menos sabemos que algumas coisas sobreviveram.”

Entre o gelo e o fogo

Até hoje, a única evidência conhecida desses répteis voadores na Antártida era o minúsculo osso do braço superior de um pterossauro do tamanho de um corvo encontrado no início da década de 1990. O osso mostrou que os pterossauros já estavam presentes nas Montanhas Transantáricas há cerca 190 milhões de anos, no início do Jurássico.

As novas descobertas estão entre centenas de fósseis recuperados por uma equipe brasileira que visitou a Península Antártica em quatro expedições, entre 2006 e 2019. Essa região do continente, que se projeta em direção à América do Sul, é a única parte da Antártida para onde a Marinha do Brasil pode oferecer transporte em segurança, afirma Kellner. Mesmo assim, cada viagem envolve semanas de saídas infrutíferas em busca de fósseis sob condições meteorológicas desafiadoras.

“A Antártida é um local onde o clima muda abruptamente”, afirma Kellner. “O dia pode estar lindo e, em menos de uma hora, tudo pode se transformar em um terrível pesadelo em que você ficará preso em uma barraca durante uma ou mais semanas.”

A equipe descobriu os primeiros restos de pterossauro na ilha James Ross, em 2016, ao desenterrar dois segmentos de um osso da asa de um pterossauro com envergadura entre 3 e 4 metros. Depois, encontraram o fóssil da ilha Vega, de um pteurossauro ainda maior, em 2017. Os dois conjuntos de fósseis datam de 70 a 80 milhões de anos atrás, durante o Cretáceo Superior.

Com o fim das expedições, os fósseis foram levados para as coleções do Museu Nacional, no Rio de Janeiro. Por sorte, pelo menos o espécime descoberto na ilha James Ross ficou em um laboratório separado e não foi atingido pelo incêndio. Mas a localização da outra metade ainda é desconhecida.

“As descobertas são especialmente importantes em razão da grande escassez de materiais descritos da Antártida, sobretudo pelo fato do continente ser predominantemente recoberto por gelo e neve”, explica Adele Pentland, paleontóloga da Universidade de Swinburne em Melbourne, que descreveu recentemente um pterossauro australiano do Cretáceo Superior.

Fio de esperança

A Austrália ainda estava ligada à Antártida naquela época, tendo sido a última parte restante do supercontinente sul de Gondwana. Os fósseis recém-descritos jogam luz em um registro precário de pteurossauros de ambas as regiões, ajudando-nos a compreender quando e por que os pteurossauros foram extintos, diz Witton.

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    “Não supera a imensa tristeza e devastação de tudo que foi perdido, mas pelo menos sabemos que algumas coisas sobreviveram”

    por LIZ MARTIN-SILVERSTONE
    Universidade de Bristol

    Não se sabe ao certo se os pterossauros já estavam em declínio no fim do Cretáceo e simplesmente foram exterminados com o impacto do asteroide Chicxulub há 66 milhões de anos ou se ainda “compunham um grupo saudável e relativamente bem-sucedido perto do fim”, diz Witton. “Estamos encontrando muitos indícios de que os pterossauros estavam em uma condição melhor perto da extinção, no fim do Mesozoico, do que acreditávamos anteriormente.”

    Com as últimas descobertas, os pesquisadores esperam conseguir financiamento para próximas expedições à Antártida a fim de encontrar mais fósseis de pterossauros que poderiam completar o último capítulo da história.

    “Agora que sabemos de sua existência na região”, diz Kellner, “é só uma questão de tempo até que mais espécimes sejam encontrados”.

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