Encontrado magma efervescente em vulcão considerado extinto

Novas análises oferecem um impressionante vislumbre do funcionamento interior — e dos potenciais riscos — de vulcões considerados adormecidos há muito tempo.

Por Maya Wei-Haas
Publicado 24 de jul. de 2019, 17:16 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
O lago Sfânta Ana está situado em uma cratera do vulcão Ciomadul, na Romênia, que explodiu ...
O lago Sfânta Ana está situado em uma cratera do vulcão Ciomadul, na Romênia, que explodiu pela última vez há cerca de 30 mil anos. Agora, os cientistas estão tentando desvendar o que está ocorrendo há quilômetros abaixo da superfície.
Foto de Kósa István

Exuberantes colinas contornam as águas paradas do Lago Sfânta Ana, na Romênia, que fica sobre uma antiga cratera resultante da erupção do vulcão Ciomadul. Esse pico explodiu do cume do vulcão há cerca de 30 mil anos e sua longa inatividade levou muitos a deduzirem que ele provavelmente nunca mais entraria em erupção.

As rochas situadas a quilômetros abaixo dessa tranquila paisagem podem estar cozinhando lentamente devido a um calor surpreendente. Um estudo  recém-publicado na revista científica Earth and Planetary Science Letters sugere que o sistema deve abrigar aproximadamente de 20 a 60 quilômetros cúbicos de magma, um volume máximo maior que o de 20 mil grandes pirâmides de Gizé.

Para ficar claro, isso não quer dizer que necessariamente o vulcão entrará em erupção no futuro. Entretanto, o estudo chama atenção aos eventuais riscos de vulcões muitas vezes negligenciados que se mantêm silenciosamente em ebulição por dezenas de milhares de anos.

“Geralmente prestamos atenção em vulcões ativos — obviamente por demonstrarem indícios de um verdadeiro risco”, afirma Mickael Laumonier, autor do estudo, da Universidade Clermont Auvérnia, na França. “Mas não devemos nos esquecer de outros vulcões jovens relativamente recentes, pois eles podem representar um risco que vale a pena avaliar”.

O estudo associa análises geofísicas e geoquímicas a simulações numéricas e oferece aos pesquisadores um vislumbre impressionante sobre o que pode estar fervilhando abaixo do Ciomandul: o que pode ser promissor para ajudar os cientistas a compreenderem melhor a evolução de sistemas vulcânicos semelhantes ao longo do tempo. 

“É um ótimo estudo”, afirma Janine Krippner, vulcanóloga do Programa de Vulcanismo Global do Instituto Smithsoniano, que não participou do estudo. No entanto, ela adverte que desvendar as condições exatas quilômetros abaixo da superfície é uma tarefa incrivelmente difícil.

“Não estamos afirmando que algo vá acontecer. Estamos afirmando apenas que temos muitos dados que demonstram que existe essa possibilidade”, explica ela.

Chamas vulcânicas eternas

A todo instante, ao menos 20 vulcões estão em erupção no mundo todo. Mas muitos outros podem entrar em erupção: o problema é saber quais.

Vulcões como o Ciomadul, que não apresentou nenhuma erupção nos últimos 10 mil anos, são geralmente chamados de inativos. No entanto, a linha que os separa é de certo modo arbitrária, afirma Krippner.

Em termos de vulcões, “‘extinto’ é uma palavra capciosa”, conta ela. Alguns vulcões, como o infame supervulcão de Yellowstone, podem permanecer adormecidos por centenas de milhares de anos entre suas erupções.

Um sinal de que um vulcão aparentemente adormecido pode ter erupções futuras é a presença de volumes de rocha derretida escoando lentamente abaixo dele, e estudos anteriores conduzidos no Ciomadul sugeriram que é o que ocorre no caso em questão. Ao estudar a forma pela qual ondas sísmicas ricocheteiam o solo, os pesquisadores dos estudos anteriores encontraram alguns indícios de um reservatório de magma. Levantamentos da condutividade elétrica de subsuperfície (uma propriedade influenciada por fatores como temperatura e teor hídrico nas rochas) também indicaram que profundidades aproximadas entre 5 e 27 quilômetros podem ter conteúdos mais pastosos do que sólidos.

Contudo não ficou claro ainda se a rocha estava realmente derretida e, nessa hipótese, a quantidade de magma que poderia existir.

Consultando arquivistas de cristais

Para responder a essas questões, Laumonier e seus colegas primeiro recorreram a rochas obtidas a partir de erupções anteriores do vulcão. Conforme a lava escorre para baixo de um vulcão, ela resfria lentamente e forma cristais, alguns dos quais atuam como pequenos arquivistas mineralógicos, identificando as condições em que se formaram.

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    Por exemplo, uma classe de minerais conhecida como anfibólios altera sua composição química em função da temperatura e pressão durante a cristalização. Procurar esses cristais em rochas de erupções anteriores ajuda os pesquisadores a identificar as condições desse antigo sistema magmático.

    A equipe combinou esses dados geoquímicos com as dimensões conhecidas do sistema e fez simulações numéricas para determinar a proporção de resfriamento ao longo do tempo e avaliar a estrutura das câmaras vulcânicas nos dias atuais. O resultado: as rochas na crosta superior abaixo do vulcão estavam, em média, 15% derretidas, sendo que, em algumas partes, o derretimento chegou a até 45%.

    A equipe confirmou esse resultado criando um modelo baseado nas medidas de condutividade elétrica obtidas a partir de rochas de erupções anteriores sob diferentes temperaturas, pressões e teor hídrico, o que os ajudou a interpretar o que foi observado anteriormente nas medições de condutividade elétrica no Ciomadul.

    Essa segunda abordagem chegou a um resultado semelhante, o que sugere que o índice de derretimento da região abaixo do vulcão está entre 20 e 58%. Embora esse seja um grande intervalo para a quantidade de magma que poderia estar escoando lentamente em fissuras de subsuperfície do Ciomadul, todas as condições de subsuperfície possíveis produzem uma quantidade significativa de derretimento no Ciomadul.

    “Não temos nenhuma outra explicação para a anomalia geofísica”, afirma Laumonier.

    Pesquisadores acreditam ser possível uma erupção em vulcões com mais de 45% de rocha derretida. Abaixo dessa porcentagem, o “sistema fica totalmente bloqueado por cristais e não consegue irromper”, explica Michael Ackerson, curador de rochas e minérios do Museu Nacional de História Natural do Instituto Smithsoniano em Washington, D.C.

    Assim, essa última análise sugere que é possível uma erupção no Ciomadul — mas isso não significa que seja inevitável.

    Escoamento pastoso

    Acima de tudo, esse estudo investiga como são realmente esses sistemas nas profundezas da Terra.

    “O conceito tradicional de câmara magmática é uma borbulha enorme, gigante, ameaçadora, vermelha e quente de magma estagnada na crosta e prestes a entrar em erupção e matar a todos nós”, afirma Ackerson.

    Mas, cada vez mais, pesquisas indicam que não é o que ocorre. Em vez disso, os reservatórios magmáticos passam a maior parte de suas existências cozinhando lenta e silenciosamente na crosta. Normalmente, são cristalizados ao menos em parte e formam um caldo rochoso pastoso com diferentes proporções de cristais que derretem ao longo do sistema. Os índices nas estruturas das câmaras magmáticas podem variar drasticamente de um vulcão para outro.

    No Ciomadul, os pesquisadores acreditam que a rocha derretida se acumula em duas zonas de mistura: uma região superior com profundidades aproximadas entre 5 e 18 quilômetros e um reservatório mais quente inferior a partir de 30 quilômetros de profundidade, em média. Cada uma dessas zonas provavelmente é formada por bolsões sobrepostos de material derretido com temperaturas e composições discretamente distintas. Por ora, não está claro como exatamente as duas zonas se interligam, mas o novo mapeamento magmático ainda assim fornece valiosas informações sobre o funcionamento interior desse vulcão.

    “Esse é um novo marco na história dos magmas do mundo”, afirma Ackerson. “Este é um vulcão específico em um momento específico que vai nos ajudar a obter uma perspectiva muito maior e mais completa da formação e evolução do magma.”

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