Rochas da Terra são capazes de absorver quantidade impressionante de carbono

As profundezas do planeta oferecem uma possível solução às mudanças climáticas, solução esta que é sólida como uma rocha.

Por Stephen Leahy
Publicado 1 de nov. de 2019, 07:00 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Vulcão Tungurahua em erupção durante o crepúsculo. As erupções vulcânicas representam uma forma pela qual a ...
Vulcão Tungurahua em erupção durante o crepúsculo. As erupções vulcânicas representam uma forma pela qual a Terra devolve seu carbono interno à superfície.
Foto de Mike Theiss, Nat Geo Image Collection

JÁ ACUMULEI cerca de 12,2 quilos de carbono durante a minha vida adulta. Você também está transportando carbono: cerca de 18% do seu corpo é constituído por átomos de carbono. Todos esses átomos já estiveram presentes nos alimentos que consumimos e, antes disso, no ar, nos oceanos, nas rochas e em outras formas de vida. O carbono, elemento proveniente de estrelas que explodiram, é essencial para todas as formas de vida e, portanto, o fato de mais de 90% do carbono do planeta ser subterrâneo é algo surpreendente.

Ainda mais impressionante é a descoberta de que a vida, na forma de micróbios e bactérias, prospera em tamanha abundância quilômetros abaixo de nossos pés que sua massa total de carbono é até 400 vezes maior que todos os 7,7 bilhões de humanos na superfície. O fato de um dos maiores ecossistemas da Terra estar nas profundezas do planeta é apenas uma das diversas descobertas do projeto Observatório de Carbono Profundo (DCO na sigla em inglês), que durou uma década e reuniu 1,2 mil pesquisadores de 55 países para explorar o funcionamento interno do nosso planeta.

O congresso do DCO aconteceu em Washington, D.C., de 24 a 26 de outubro, com centenas de cientistas de todo o mundo unidos para compartilhar e comemorar os resultados.

“Agora sabemos que a biosfera da Terra e sua geosfera são um sistema integrado e complexo, e o carbono é a chave”, afirma o Diretor Executivo do DCO, Robert Hazen, do Instituto Carnegie de Ciência. “Esta é uma forma totalmente nova de olhar para o nosso planeta”, diz Hazen em uma entrevista.

Na última década, o DCO lançou 268 projetos e produziu 1,4 mil estudos revisados por pares. Veja alguns destaques das dezenas, ou talvez centenas, de novas descobertas surpreendentes sobre o interior da Terra, incluindo seu papel no início à vida.

Um dos 31 novos minerais contendo carbono descobertos durante o Desafio Mineral de Carbono do DCO, o triazolito, foi encontrado no Chile. Acredita-se que tenha sido originado, em parte, do excremento do biguá.
Foto de Joy Desor, Mineralanalytik Analytical Services

Entrada e saída de carbono

O carbono das plantas e dos animais se aprofunda no solo devido ao processo de subducção — quando as placas oceânicas afundam abaixo das placas continentais — que ocorre há centenas de milhões de anos. Esse carbono, que antes tinha vida, foi descoberto dentro de diamantes que se formaram 410 a 660 quilômetros abaixo da superfície. Se permitido tempo suficiente, o carbono na forma de diamantes, rochas ou dióxido de carbono proveniente de emissões de vulcões retorna à superfície, e recebe o brilho do Sol novamente.

Em outras palavras, assim como nós, o nosso planeta está constantemente ingerindo e expelindo carbono, geralmente na forma de dióxido de carbono (CO2). Esse ciclo de carbono que antes era estável foi interrompido, pois o homem passou a acelerar o retorno do carbono à superfície, escavando e queimando grandes quantidades de hidrocarbonetos: petróleo, gás e carvão. Ao mesmo tempo, derrubar florestas, construir cidades e estradas, e transformar a superfície prejudicaram a capacidade do planeta de ingerir carbono.

Essa interrupção do ciclo do carbono é o que chamamos de crise climática, explica Hazen.

“As mudanças climáticas representam uma ameaça existencial à humanidade, não em um futuro distante, mas na próxima geração ou duas”, afirma ele.

Nos próximos 20 a 40 anos, as emissões de CO2 provenientes de combustíveis fósseis precisarão ser eliminadas e grandes quantidades de CO2 já existentes na atmosfera precisam ser removidas para evitar que o aquecimento global atinja níveis extremamente perigosos.

No entanto novas informações sobre o ciclo do carbono profundo revelado pelo DCO deixam Hazen esperançoso. Há métodos naturais de sequestrar carbono que são “incrivelmente poderosos”, conta ele.

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    Observando o crescimento das rochas

    Um desses métodos de sequestro envolve uma grande placa de rocha levantada do manto superior da Terra há muito tempo, na região onde hoje é o Omã. Conhecida como Ofiolito Samail, a erosão e a vida microbiana dentro da rocha retiram o dióxido de carbono do ar e o transformam em minerais carbonatados.

    O processo é tão eficaz que “é possível observar o dióxido de carbono sendo sugado para fora da atmosfera e depositado na forma de rocha bem diante de nossos olhos”, diz Hazan.

    Experimentos que bombearam fluidos ricos em carbono na formação rochosa de ofiolito mostram que os minerais carbonatados se formam muito rapidamente. Isso poderia remover bilhões de toneladas de CO2 da atmosfera, embora fosse um projeto enorme e muito diferente para o Omã, que depende das receitas geradas pelo petróleo, ele afirma.

    Ofiolitos também são encontrados na América do Norte, África e em outros lugares. Outra forma natural de sequestro de carbono envolve rochas de formações de basalto, como as encontradas no Havaí, que podem absorver CO2 do ar quando trituradas. Na Islândia, outro projeto de sequestro natural do DCO, o CarbFix, envolve injetar fluidos contendo carbono no basalto e observá-los serem convertidos em material sólido.

    Essas novas descobertas sobre a capacidade da Terra de absorver carbono “me deixam bastante otimista”, diz Hazen.

    Um pouco sobre vidas alienígenas

    O DCO também deu uma injeção de ânimo no que diz respeito às possibilidades de vida em outros planetas. Diamantes puros não contêm nada além de carbono, mas a maioria apresenta pequenas impurezas. Eles podem resultar em joias de má qualidade, mas seu valor é inestimável no campo da pesquisa. Essas impurezas, chamadas inclusões, revelaram metano “abiótico” como fonte de energia para a vida nas profundezas da Terra.

    Quando a água entra em contato com a olivina, mineral bastante abundante, sob intensa pressão, a rocha se transforma em outro mineral, a serpentina, e ainda produz metano abiótico. Se os micróbios conseguem sobreviver utilizando energia química de rochas sob temperaturas e pressões extremas à tamanha profundidade, o mesmo pode ocorrer em outros corpos planetários.

    A descoberta também alimenta a hipótese de que a vida se originou primeiro e evoluiu nas profundezas do planeta, não nos oceanos, como se acredita amplamente.

    “O Observatório de Carbono Profundo produziu evidências importantes” para essa hipótese, diz Jesse Ausubel, da Universidade Rockefeller e consultor científico da Fundação Alfred P. Sloan.

    Os diamantes também forneceram aos pesquisadores do DCO evidências de que as profundezas da Terra abrigam mais água — em sua maioria aprisionada em cristais de minerais, como íons, e não em sua forma líquida — do que todos os oceanos do mundo. Assim como o carbono, acredita-se que a subducção das grandes placas continentais e oceânicas tenha levado água às profundezas do planeta.

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    Alarmes da Terra

    Os projetos do DCO que monitoram gases provenientes de vulcões resultaram na primeira detecção de uma alteração na proporção de CO2 para dióxido de enxofre (SO2) emitida antes da erupção de um vulcão na Costa Rica, oferecendo um possível sistema de alerta precoce.

    “A alteração na proporção de gases antes de uma erupção era apenas uma teoria, mas o DCO nos permitiu desvendar isso”, disse Sami Mikhail, da Universidade de St. Andrews. “Pode funcionar como uma campainha, que nos avisa quando tem alguém à porta.”

    Vários vulcões próximos a áreas povoadas, incluindo o Tungurahua, no Equador, o Etna, na Itália, e o Soufrière Hills, em Montserrat, estão sendo monitorados. Essas e outras estações de monitoramento de vulcões também forneceram evidências definitivas de que as emissões de CO2 dos vulcões correspondem a uma fração minúscula comparado às emissões provenientes da queima de combustíveis fósseis. Os que negam o impacto da ação do homem nas mudanças climáticas há muito culpam os vulcões pelo aumento da concentração de CO2 na atmosfera.

    Embora o DCO tenha sido encerrado, a comunidade global de cientistas de carbono profundo continuará a realizar novas pesquisas e a trabalhar em pesquisas já existentes, com o apoio de subsídios da Nasa, da Fundação Nacional de Ciências, da Fundação Alemã de Pesquisa, do Instituto Canadense de Pesquisa Avançada e de outras instituições.

    O Instituto de Física do Globo de Paris será utilizado para a nova sede.

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