Vulcão das Ilhas Canárias despertou pela primeira vez em 50 anos

A explosão do último fim de semana é a mais recente de uma série de erupções que acontecem há séculos na ilha espanhola de La Palma. Especialistas dizem que a atividade pode durar semanas.

Por Robin George Andrews
Publicado 21 de set. de 2021, 15:13 BRT, Atualizado 22 de set. de 2021, 18:34 BRT
A lava jorra após a erupção do Cumbre Vieja em La Palma, nas Ilhas Canárias espanholas. ...

A lava jorra após a erupção do Cumbre Vieja em La Palma, nas Ilhas Canárias espanholas. O evento marca a primeira vez que este vulcão entrou em erupção desde 1971.

Foto de Arturo Rodríguez

O vulcão Cumbre Vieja, na ilha espanhola de La Palma, já havia se contorcido, convulsionado e resmungado, mas a última vez que jorrou lava foi em 1971. Isso mudou nesse fim de semana. Às 15h12, hora local, em 19 de setembro, o magma ascendente abriu várias fissuras em seus flancos ocidentais, e uma enorme erupção começou.

De longe, parecia espetacular. Lava a quase 1.000ºC era lançada ao céu vertiginosamente, atingindo alturas de até 1,5 mil metros – quase o dobro do Burj Khalifa, o arranha-céu mais alto do mundo. Abaixo, rios de rocha derretida jorravam das fissuras como sangue de feridas abertas.

A ilha de La Palma faz parte das Ilhas Canárias espanholas e é uma das zonas com maior atividade vulcânica do arquipélago. Cerca de 85 mil pessoas habitam o local.

Foto de Arturo Rodríguez

Situada 480 metros a oeste do litoral do Marrocos, no Oceano Atlântico, La Palma só existe porque um local de alta atividade vulcânica construiu massa de terra sobre o mar há muito tempo, formando o arquipélago conhecido como Ilhas Canárias. Um maçarico de fogo superaquecido embaixo do manto terrestre criou oito ilhas principais, que têm ecossistemas maravilhosamente variados, de florestas subtropicais a desertos. Em La Palma, as altas montanhas fornecem condições ideais para se observar as estrelas sem nuvens, e é por isso que a ilha abriga um grande observatório europeu.

Mas, como esta nova erupção demonstra, "o preço e o privilégio de viver em uma linda ilha é, neste caso, sua história geológica", comenta Helen Robinson, geocientista da Universidade de Glasgow que trabalhou como parte da equipe de monitoramento de Cumbre Vieja em 2015.

Cumbre Vieja é um monte vulcânico altamente ativo, e, nos últimos 7 mil anos, uma infinidade de erupções ocorreram em uma cordilheira orientada de norte a sul – um eixo pontilhado por fissuras, cones, crateras e aberturas. Desde o século 15, inúmeros rios de lava danificaram construções e correram para o mar. Eles frequentemente entram em erupção a partir de fissuras, um estilo comum para muitos vulcões ao redor do mundo, desde o Kīlauea, no Havaí, até a erupção contínua na península de Reykjanes, na Islândia.

Até a tarde de 20 de setembro, a última erupção não mostrava sinais de desaceleração. De acordo com Pedro Hernández, vulcanólogo do Instituto Vulcanológico das Ilhas Canárias (Involcan), a lava continua a cair lentamente encosta abaixo e se aventurar para o oeste em direção ao mar. A maior parte da ilha não foi afetada, contudo 5 mil pessoas no caminho do fogo foram evacuadas. “Mais de 20 casas foram destruídas”, afirma Hernández. A Reuters informa que mais de 500 turistas tiveram que deixar seus hotéis, e cerca de 360 foram evacuados de um resort local para a ilha vizinha de Tenerife.

É difícil estimar por quanto tempo a lava seguirá como uma ameaça. As erupções em La Palma podem durar de algumas semanas a vários meses. “A única maneira de saber é conhecer o volume total de magma propenso à erupção sob o Cumbre Vieja”, revela Pablo J. González, vulcanólogo físico do Conselho Superior de Investigações Científicas em Tenerife. "Essa informação é desconhecida."

A mudança de forma do vulcão e a trilha sonora sísmica de seus terremotos podem revelar uma resposta a essa pergunta tão importante. Porém, mesmo sob intenso excrutínio científico, é improvável que o Cumbre Vieja entregue seus segredos facilmente.

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      A última erupção foi precedida por vários terremotos. Um monitoramento cuidadoso permitiu que os funcionários iniciassem algumas evacuações antes que a lava começasse a fluir.

      Foto de Arturo Rodríguez

      Ameaça crescente

      La Palma, a ilha das Canárias mais a noroeste, é um sonho vulcânico: uma mistura de vários montes vulcânicos grandes e pequenos. Ao sul, você pode encontrar o Cumbre Vieja, ou Pico Velho, que, apesar do nome, é um dos irmãos mais novos, com meros 125 mil anos de idade. A última erupção do vulcão foi de um pequeno monte chamado Teneguia, em 1971. Mas isso não significa que o Cumbre Vieja esteve quieto desde então.

      De acordo com Itahiza Domínguez Cerdeña, sismóloga do Instituto Geográfico Nacional, em Tenerife, nove enxames sísmicos – centenas de estrondos acontecendo na mesma área sucessivamente – ocorreram cerca de 29 quilômetros abaixo do vulcão desde outubro de 2017.

      Há apenas uma semana, esses terremotos estavam acontecendo a somente 11 quilômetros de profundidade, e, nos últimos dias, os tremores emanavam logo abaixo da superfície. De 10 a 19 de setembro, foram registrados surpreendentes 25 mil tremores, sendo a maioria imperceptível aos humanos. Essa cacofonia, cada vez mais alta, era o som da crosta sendo empurrada de lado e deformada. A causa? A "pressão do magma invadindo a crosta", diz Cerdeña.

      No último fim de semana, o solo havia inflado aproximadamente 15 centímetros, sugerindo que um volume razoável de magma havia se infiltrado recentemente na crosta rasa. A maioria das intrusões de magma não levam a erupções; por não conseguir perfurar a rocha sólida em cima, resfriam e, finalmente, param de subir. Mas é sempre possível que um maior volume de rocha derretida se reúna sob uma intrusão, e isso pode potencialmente alimentar uma erupção prolífica e prolongada.

      Vulcanólogos ficaram alarmados com a deformação da montanha e os barulhos sísmicos, e, em 13 de setembro, as autoridades aumentaram o nível de alerta, avisando a porção sul da ilha e seus 35 mil moradores que uma erupção poderia ocorrer.

      Em 18 de setembro, cientistas começaram a implantar sismógrafos adicionais na região para melhor identificar os tipos de tremores e rastrear sua migração com mais precisão, enquanto outros realizaram sobrevoos em helicópteros para avaliar se o solo estava aquecendo. Pouco antes do meio-dia de 19 de setembro, um potente terremoto de magnitude 4,2 sacudiu o vulcão.

      Por precaução, soldados espanhóis ajudaram a evacuar 40 pessoas e seus animais de fazendas de diversas aldeias ao redor do vulcão.

      Mais tarde, a lava explodiu das colinas arborizadas no flanco ocidental do vulcão. A lava incendiou árvores e fazendas, cruzou uma rodovia e destruiu oito casas isoladas. Naquela noite, o governo anunciou que 5 mil pessoas potencialmente em perigo haviam sido evacuadas.

      Embora a lava ainda não tenha penetrado as partes com mais edificações do município de El Paso, o mais próximo, ela "está se arrastando em direção a uma área densamente povoada", conta Robinson. A esperança é que o rio evite aquela área em sua jornada para o mar, mas, mesmo que isso não ocorra, a área foi evacuada, reduzindo significativamente as chances de fatalidades.

      Milhares foram evacuados e pelo menos 20 casas foram destruídas pela erupção contínua em 20 de setembro.

      Foto de Arturo Rodríguez

      Cinzas, astronomia e tsunamis

      Felizmente, não importa quanto tempo a erupção dure, não deve danificar a infinidade de telescópios astronômicos no Observatório Roque de los Muchachos, que fica na ilha. Juan Carlos Pérez Arencibia, administrador do observatório, diz que as instalações estão 17 quilômetros ao norte do local da erupção. Além disso, o observatório está localizado a 2,4 quilômetros acima do nível do mar, enquanto a lava está emergindo a 600 metros.

      "As cinzas podem significar que os telescópios permaneçam fechados por vários dias sem observação, mas o observatório em si não deve sofrer danos", diz David Jones, astrônomo do observatório.

      Apesar dos temores nas redes sociais desencadeados por um artigo altamente especulativo de 2001, quase não há chances de que a erupção do Cumbre Vieja possa criar um megatsunami que atingiria a costa leste da América, afirma Dave Petley, especialista em deslizamentos de terra na Universidade de Sheffield, na Inglaterra.

      Os colapsos do flanco de vulcões são uma preocupação genuína, e é verdade que vários colapsos do flanco no litoral de La Palma ocorreram há muitos milhares de anos. Mas um estudo de 2015 descobriu que, sob condições realistas de modelagem, o colapso mais grave poderia causar não mais do que um tsunami de 1,8 mil metros ao longo da costa oeste do Atlântico.

      Embora tal eventualidade seja indesejável, a Involcan observa que seria necessário um terremoto incrivelmente poderoso e uma erupção vulcânica surpreendentemente explosiva acontecendo simultaneamente para qualquer tipo de colapso do flanco ocorresse. O Cumbre Vieja é estruturalmente sólido no momento, e não há indicação de que tal confluência seja remotamente possível.

      Não se engane: os rios de lava são o verdadeiro perigo aqui. Felizmente, os moradores de La Palma estão sendo protegidos por uma vulcanólogos e sismólogos. Os esforços de longo prazo dos geocientistas na ilha garantiram que estava claro que algo perigoso estava se formando muito antes de os rios de lava saírem da encosta do Cumbre Vieja.

      "Se não fizessem um monitoramento tão intenso", conclui Robinson, "eles não entenderiam seus vulcões tão bem quanto entendem."

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