Beija-flores veem cores que nós, humanos, nem sequer imaginamos

A capacidade dos pequeninos pássaros em ver cores fora do espectro do arco-íris é “uma das coisas mais emocionantes que já testemunhei”, diz cientista.

Por Virginia Morell
Publicado 26 de jun. de 2020, 11:01 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 01:56 BRT
Um beija-flor-de-cauda-larga macho voa no Colorado, EUA, como parte de um experimento sobre visão de cores.

Um beija-flor-de-cauda-larga macho voa no Colorado, EUA, como parte de um experimento sobre visão de cores.

Foto de Noah Whiteman, University of California, Berkeley

UM BEIJA-FLOR MACHO simplesmente pousando em um galho é capaz de nos hipnotizar com sua plumagem colorida e iridescente. Mas talvez estejamos perdendo todo o efeito colorido — porque, segundo um novo estudo, os beija-flores veem cores que os humanos não conseguem detectar.

Não é novidade para os cientistas que as aves provavelmente enxergam melhor as cores que os humanos. Assim como a maioria dos primatas, os humanos são tricromáticos — ou seja, nossos olhos têm três tipos de receptores ou cones sensíveis à cor: azul, verde e vermelho. Mas os pássaros têm quatro cones de cores, o que significa que são tetracromáticos.

Com nossos três cones de cores, conseguimos ver as cores do arco-íris — vermelho, laranja, amarelo, verde, azul, índigo e violeta — as chamadas matizes espectrais. Também conseguimos ver uma única cor não espectral pura (ou seja, fora do espectro do arco-íris), a cor roxa, porque ela estimula nossos cones vermelho e azul simultaneamente.

Teoricamente, os quatro cones de cores dos pássaros permitem discernir uma gama mais ampla de cores, incluindo o espectro ultravioleta, que inclui cores como o verde ultravioleta e o vermelho ultravioleta. Porém até o momento, os pesquisadores haviam feito poucas investigações sobre o que os pássaros conseguem realmente ver.

Portanto, Mary Stoddard, bióloga evolutiva da Universidade de Princeton, e seus colegas realizaram uma série de experimentos de campo com beija-flores-de-cauda-larga silvestres próximo do Laboratório Biológico de Rocky Mountain, no Colorado. Os resultados surpreendentes revelaram que as aves conseguiam discernir entre alimentadores que possuem cores espectrais e alimentadores que possuem cores não espectrais.

“Vê-los fazendo isso diante dos meus olhos é uma das coisas mais emocionantes que já testemunhei”, diz Stoddard, cujo trabalho foi publicado recentemente na revista científica Proceedings of National Academy of Sciences.

O estudo é um “grande avanço”, pois oferece o maior número de detalhes até o momento sobre como os pássaros distinguem as cores, diz Trevor Price, biólogo evolutivo da Universidade de Chicago que não participou da pesquisa.

“Na verdade, estamos apenas começando a dar os primeiros passos em relação ao nosso entendimento da visão de cores nos animais”, diz ele.

‘Abordagem incrivelmente ousada’

Para o estudo, Stoddard e sua equipe colocaram vários alimentadores de pássaros em forma de tubo, equipados com dispositivos LED perto do laboratório. Programaram os dispositivos LED próximos aos alimentadores para projetarem duas cores diferentes em uma superfície, conforme o conteúdo do alimentador: uma pequena quantidade de água açucarada ou água pura.

“É importante fazer os testes na natureza”, diz Stoddard, “para que possamos realmente entender a experiência sensorial que essas aves têm do mundo”.

Os beija-flores, que se alimentam do néctar das flores, rapidamente aprenderam a associar uma cor à recompensa de uma bebida doce, e a outra cor à água pura e sem graça.

Durante três temporadas de campo, de 2016 a 2018, os cientistas realizaram 19 experimentos e registraram cerca de 6 mil visitas de beija-flores. Com o acompanhamento das visitas dos pássaros aos alimentadores, os cientistas demonstraram que os beija-flores-de-cauda-larga escolhem de forma consistente o alimentador com o sabor doce, independentemente de terem tom não espectral ou espectral.

“Mesmo quando as cores pareciam iguais para nós — por exemplo, quando os pássaros tinham que escolher entre um alimentador de cor verde ultravioleta e um que era simplesmente verde — eles conseguiam ver a diferença”, conta Stoddard.

“Foi uma abordagem experimental incrivelmente ousada”, diz Karen Carleton, bióloga evolutiva da Universidade de Maryland, em College Park, por e-mail. O estudo mostra que “aos olhos de um beija-flor, o mundo pode ser totalmente diferente do que vemos”.

Em cores vivas

A visão em cores ajuda os animais a selecionarem seus alimentos e parceiros, e a evitarem predadores. As abelhas, por exemplo, conseguem ver padrões ultravioletas em flores amarelas que as direcionam para o néctar. Mas quando olhamos para a mesma flor, vemos apenas uma flor amarela.

Para determinar por que os beija-flores veem tanta variedade de cores, Stoddard e seus colegas cientistas analisaram dados existentes referentes à cor de diferentes plumagens de pássaros e cores de plantas. Descobriram que os beija-flores seriam capazes de ver 30% da plumagem das aves e 35% das cores das plantas em tons não espectrais — cores que “os humanos nem sequer conseguem imaginar”, diz Stoddard. Essa habilidade provavelmente ajuda as pequenas aves a localizarem uma grande variedade de plantas e seu néctar.

Stoddard e sua equipe acreditam que os resultados se aplicam a todas as aves com visão tetracromática que são ativas durante o dia, bem como a vários peixes, répteis e invertebrados. E esse nível adicional de discernimento também pode ter sido uma característica dos dinossauros que, segundo teoria, teriam ostentado penas coloridas.

Os mamíferos evoluíram como seres noturnos que não precisavam ver a riqueza dos tons à luz do dia, de modo que a maioria — como nossos cães e gatos de estimação — é dicromática e possui apenas cones azuis e verdes. As pessoas desenvolveram um terceiro cone (vermelho), possivelmente porque os primatas primitivos desenvolveram um apetite por frutos maduros.

“Se quisermos entender a diversidade de cores na natureza, certamente precisamos compreender como as espécies diferem em sua capacidade de perceber as cores”, acrescenta Price. “Esse estudo mostra o caminho.”

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