Duas novas espécies de rã-de-vidro são descritas no Equador

Os anfíbios, que vivem separados a apenas 20 km de distância, são praticamente iguais, mas geneticamente diversos — uma surpresa para os cientistas.

Por Angela Posada-Swafford
fotos de Jaime Culebras
Publicado 4 de abr. de 2022, 09:57 BRT
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Hyalinobatrachium mashpi, uma das espécies recém-descobertas, é conhecida por seu apito agudo e pelos pontos pretos que cobrem seu corpo que poderiam atuar como camuflagem em seu habitat de floresta tropical.

Foto de Jaime Culebras

A apenas 16 km de Quito, capital do Equador, as encostas dos Andes abrigam um dos pontos mais biologicamente diversos e ameaçados nos trópicos.

Nessa região, aos pés dos Andes, há um vale. O rio que passa por ele, o Guayllabamba, fica no centro de uma notável história de duas espécies recém-identificadas de rã-de-vidro.

Uma delas, a Hyalinobatrachium mashpi, vive no lado sul do rio, nas reservas Mashpi e Tayra, dois oásis particulares e adjacentes que juntos abrangem 2,5 mil hectares. A outra espécie de sapo, Hyalinobatrachium nouns, habita o flanco norte do vale, na Cordilheira Toisana, um complexo íngreme de montanhas isoladas do cinturão principal dos Andes, uma ilha de terra flutuando sobre um mar verde.

Ambas as criaturas existem aproximadamente na mesma altitude, em condições semelhantes de umidade e temperatura. Ambas medem entre 1,9 e 2,1 centímetros do focinho à cloaca (medida padrão de comprimento dos anfíbios). Seus corpos são quase idênticos a olho nu, com costas verde-limão salpicadas por pontos pretos dispostos em torno de manchas amarelas.

Por baixo, ambas mostram o cartão de visita da rã-de-vidro: uma barriga completamente transparente revelando um coração vermelho, fígado e sistema digestivo brancos texturizados e, nas fêmeas, uma bolsa de ovos esverdeados.

Os órgãos e os ovos de uma fêmea H. mashpi são vistos claramente através de sua ...

Os órgãos e os ovos de uma fêmea H. mashpi são vistos claramente através de sua pele translúcida.

Foto de Jaime Culebras

"No início, quando começamos a recolhê-los, pensamos que eram da mesma espécie", diz Juan Manuel Guayasamin, biólogo evolucionário da Universidade São Francisco de Quito, e principal autor do artigo que descreve a nova espécie, publicado na revista PeerJ.

Mas quando ele e seus colegas analisaram o DNA dos sapos mais de perto, ficaram "surpresos ao saber que eles realmente possuem grandes diferenças genéticas".

Descobrindo novos sapos

Existem 156 espécies conhecidas de sapos de vidro vivendo em todos os neotrópicos, principalmente no norte dos Andes e na América Central.

Na última década, Guayasamin, um explorador da National Geographic, e seus colegas vêm coletando amostras de DNA de rãs-de-vidro, tanto vagando pela floresta tropical quanto coletando espécimes de museus e coleções particulares em vários países.

Até agora, os pesquisadores sequenciaram genes para cerca de 90% das 150 espécies de rãs-de-vidro conhecidas, diz ele. Foi assim que descobriram que os sapos H. mashpi e H. nouns divergem geneticamente em quase 5%, uma grande lacuna para anfíbios semelhantes.

Também surpreendente, diz Guayasamin, é que ambos os grupos vivem geograficamente muito próximos, cerca de 20 km de distância um do outro.

Como o vale do rio Guayllabamba é mais seco e ecologicamente único das encostas adjacentes, "o que estamos pensando é que o vale impediu esses sapos de se misturarem uns com os outros", diz Guayasamin. "Quando você tem populações separadas por uma barreira geográfica, começa a ter um acúmulo de mutações em cada grupo, e com o tempo, elas se tornam geneticamente diferentes."

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    Uma rã H. mashpi guarda seus ovos. Cuidados parentais são comuns entre sapos de vidro.

    Uma rã H. mashpi guarda seus ovos. Cuidados parentais são comuns entre sapos de vidro.

    Foto de Jaime Culebras

    Isso é o que os cientistas chamam de diversidade enigmática – em outras palavras, as características que diferenciam uma espécie não são visíveis a olho nu, diz o co-autor do estudo Jaime Culebras, pesquisador da Fundação Andina Condor, uma organização sem fins lucrativos com sede em Quito que trabalha para conservar a vida selvagem no Equador. E diversidade enigmática é muito comum em anfíbios.

    Além da genética, os pesquisadores usaram bioacústica — reproduzindo e transmitindo sons de animais – para determinar diferenças entre as espécies de sapos na natureza. No entanto, eles só foram capazes de gravar as chamadas da rã H. mashpi macho e comparar o som com o de outras espécies do gênero Hyalinobatrachium.

    "Soa apenas como um grilo", diz Culebras, que também é fotógrafo da vida selvagem. "Mas, novamente, alguns grilos soam como aquela rã!"

    A riqueza de diversidade da fauna andina

    A identificação das novas rãs-de-vidro mostra quantas espécies ainda estão para serem descobertas, particularmente nos Andes tropicais, diz Andrea Teran, herpetóloga do Centro de Pesquisa Jambatu, em Quito, que não participou do estudo.

    "A topografia aqui é bastante complexa, com muitos nichos inexplorados e áreas de difícil acesso, então o endemismo é muito alto", diz Teran. "Na verdade, quando você fala de anfíbios no Equador, o local mais diversificado são os Andes, não a Amazônia."

    De fato, os Andes tropicais – uma região que inclui partes da Venezuela, Colômbia, Equador, Peru e Bolívia – abriga mais de mil espécies anfíbias, duas vezes mais do que na Amazônia.

    Alguns dos anfíbios equatorianos, como o novo H. mashpi, vivem até perto de pessoas, dentro da maior área metropolitana de Quito, diz Culebras.

    "As pessoas não percebem que a cidade se estende bem para as montanhas, abrigando uma enorme diversidade de seres vivos", diz ele.

    No entanto, as pessoas e suas atividades também são uma ameaça para essas criaturas: metade das espécies anfíbias nos Andes estão seriamente ameaçadas pela mineração de cobre e ouro, diz ele. 

    A União Internacional para a Conservação da Natureza lista 10 espécies de rãs-de-vidro como criticamente ameaçadas, 28 como ameaçadas e 21 vulneráveis à extinção. É muito cedo para dizer se H. mashpi e H. noums estão entre essas criaturas ameaçadas, mas Guayasamin suspeita que sim.

    "Mais uma vez", diz ele, "a natureza sofre com nosso extrativismo míope e descontrolado."

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