Cientistas tentam superar o ‘vale da morte’ das vacinas no Brasil

Vacinas candidatas contra a covid-19, Butanvac, do Instituto Butantan, e Versamune, da Farmacore e da USP, devem avançar para os estudos clínicos neste semestre.

Por Kevin Damasio
Publicado 6 de mai. de 2021, 17:05 BRT
Cientistas da Fundação Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro, abrem ovos e retiram embriões para fabricação de ...

Cientistas da Fundação Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro, abrem ovos e retiram embriões para fabricação de vacinas em 1943, tecnologia semelhante à da Butanvac. Apesar do histórico na produção de imunizantes, vacinas brasileiras têm dificuldade de passar da fase pré-clínica, de desenvolvimento e testes em animais, para clínica, quando há testes em humanos.

Foto de Sílvio Cunha, Casa Oswaldo Cruz, Fundação Rockefeller

“Vamos para frente”, comemorou Célio Lopes Silva. Em janeiro, o bioquímico e uma equipe de pesquisadores acabavam de analisar os resultados dos estudos pré-clínicos da Versamune, uma vacina candidata contra a covid-19. Estavam confiantes de que superariam, finalmente, o que cientistas da área chamam de 'o vale da morte' das vacinas no Brasil: o avanço dos estudos em laboratório e em animais para os testes em humanos. O projeto é fruto de uma parceria entre a Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (FMRP-USP), a empresa brasileira Farmacore e a americana PDS Biotechnology.

Lopes é professor da FMRP-USP, onde coordena o Laboratório de Vacinas Gênicas, do Departamento de Bioquímica e Imunologia. Em 2005, Lopes e Helena Faccioli fundaram a Farmacore, que começou na incubadora Supera, no campus da universidade. Hoje ele é consultor científico da empresa. A startup de biotecnologia tem como foco o desenvolvimento e pesquisa de produtos imunobiológicos, tanto para saúde humana como veterinária. “Durante a fase de incubação, estabelecemos diversas plataformas tecnológicas baseadas em vacinas de DNA, proteínas recombinantes, vacinas vetorizadas por microorganismos inativados, entre outras”, conta o professor.

Desde então, a Farmacore realiza projetos em parceria com o laboratório de Lopes. Desenvolvem, por exemplo, uma vacina candidata contra a tuberculose em plataforma de DNA. Essa doença resulta todo ano em 1,5 milhão de mortes no mundo. O imunizante obteve sucesso nos estudos pré-clínicos, com financiamento do Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos, mas os testes em humanos ainda não começaram.

No início de 2020, os cientistas da Farmacore analisaram o cenário da pandemia, os primeiros resultados de imunopatologia de vacinas candidatas contra a covid-19 e a tecnologia que já dispunham na empresa. Decidiram, então, utilizar uma plataforma chamada Versamune, licenciada quatro anos antes da PDS Biotechnology.

Em seguida, a Farmacore, a FMRP e a PDS firmaram um contrato com a USP para realizar os ensaios de prova de conceito e os estudos pré-clínico e clínico. Em maio, solicitaram recurso ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCTI). Em 21 de agosto, receberam da pasta um aporte de R$ 3,8 milhões. Somado aos recursos empenhados pela Farmacore e pela PDS, foi suficiente para começar o projeto.

A vacina é composta pelo carreador Versamune e por um antígeno – a proteína S1 do Sars-CoV-2. O carreador é formado por uma única molécula lipídica chamada Dotap, uma gordura que envelopa o antígeno. “Esse carreador é um grande imunomodulador”, explica Lopes. “Ele, por si só, ativa o sistema imunológico, principalmente na produção de interferon do tipo 1. Em qualquer infecção viral, essa é uma das moléculas mais importantes para estimular no sistema imunológico. Isso faz com que outras células sejam ativadas, como as matadoras naturais, as natural killers.”

Em agosto, os cientistas foram para a bancada do laboratório verificar se havia interação entre o carreador e o antígeno do Sars-CoV-2. Testaram várias proteínas do vírus e elegeram a S1, por se mostrar a mais imunogênica, produzindo tanto anticorpos neutralizantes, quanto células T CD8 e CD4 polifuncionais. Na análise físico-química do composto, “os resultados foram excelentes, existe interação”, lembra Lopes. Assim, a equipe seguiu para o desenvolvimento da formulação vacinal, que se demonstrou “muito estável à temperatura de geladeira e de fácil produção”.

O coronavírus conecta-se à célula humana por meio da proteína spike, que divide-se em duas subunidades: S1 e S2. Na parte S1 está o domínio RBD, por meio do qual o vírus se liga ao receptor da célula hospedeira. "Não precisamos usar a spike inteira. O domínio S1 contém todos os elementos para desenvolver uma imunidade que possa bloquear a ligação do vírus com a célula hospedeira, além de estimular a imunidade celular”, observa Lopes.

Toda vacina possui um carreador, seja viral ou nanoparticulado. No caso dos imunizantes da AstraZeneca/Oxford, do Instituto Gamaleya e da Janssen, o carreador utilizado é um vetor viral. A Moderna, a NovaVax e a Pfizer/BioNTech adotam um carreador lipídico nanoparticulado – semelhante, porém mais complexo, que o sistema adotado pela Versamune. “O nosso é uma nanopartícula, só que colocamos a proteína recombinante direto dentro da célula. Então, tem uma etapa a menos”, compara Lopes. “Uma vez que entra na célula, ativa todo o sistema imunológico. Além da imunidade própria do adjuvante, vai estimular também a produção de anticorpos neutralizantes.”

Com o sucesso na etapa inicial, os pesquisadores partiram para os ensaios pré-clínicos em animais no final de setembro. O estudo de imunogenicidade foi realizado em camundongos, nos quais analisaram as imunidades humoral (produção de anticorpos neutralizantes) e celular (de linfócitos CD4+, CD8+ e ativação de células dendríticas). Segundo Lopes, os estudos pré-clínicos demonstraram que a Versamune é capaz de estimular essas duas respostas do sistema imunológico. “Estimula de uma forma fantástica os linfócitos T CD8 citotóxicos, que reconhecem as células infectadas e as destroem”, afirma Lopes. “Quando o Sars-CoV-2 entra na célula, tem os mecanismos de inativação do interferon tipo 1, que é uma arma que desativa o sistema imunológico. A nossa vacina o ativa e supera essa guerra entre a desativação e a ativação. É um fator importante e diferencial.” Depois, os cientistas realizaram uma avaliação de toxicidade, a fim de identificar se a vacina é segura.

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    “Estamos conseguindo vencer esse ‘vale da morte’ porque existiu essa cooperação. Quem sabe, no futuro, consigamos ter mais independência. ”

    por Viviane Boaventura
    Universidade Federal da Bahia e Sociedade Brasileira de Imunologia

    Com dados pré-clínicos de segurança e imunogenicidade positivos, os pesquisadores decidiram procurar a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O órgão é responsável por autorizar ou rejeitar ensaios que tenham finalidade regulatória, ou seja, que exigirão registro de vacina ou medicamento. Depois de três reuniões, os pesquisadores da Farmacore e da FMRP-USP entregaram o Dossiê de Desenvolvimento Clínico do Medicamento (DDCM), a fim de obter anuência da agência para a realização dos ensaios de fases 1 e 2 da Versamune. Eles ainda preparam o Dossiê do Estudo Clínico, no qual devem detalhar o protocolo dos testes, com previsão de entrega até o final de maio.

    Demandas regulatórias

    A Anvisa leva em conta quatro aspectos principais em sua análise. No caso de vacinas que serão administradas pela primeira vez em seres humanos, o primeiro ponto analisado consiste nos dados dos estudos não clínicos, realizados em modelos animais e em laboratório. “O que queremos ver é, basicamente, se esses estudos mostraram segurança, principalmente no que diz respeito à toxicologia e possíveis eventos adversos – hepatotoxicidade, ataque no fígado, no rim, qualquer coisa que possa trazer um alerta”, explica Gustavo Mendes, gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos da Anvisa.

    A agência reguladora requer ainda informações sobre o histórico do desenvolvimento da vacina. “A Versamune é uma tecnologia diferente de todas que aprovamos até o momento. A proposta dela é um peptídeo sintético, ou seja, a própria proteína do coronavírus, feita de maneira laboratorial, é aplicada na pessoa para gerar resposta imune”, exemplifica Mendes. “Entender essa biotecnologia é uma parte importante da nossa avaliação.”

    O requerente precisa também apresentar um protocolo do estudo clínico que deseja realizar. Devem constar informações como, por exemplo, quantos voluntários participarão do ensaio, quais são os centros de pesquisa e como será a abordagem estatística para chegar aos dados de segurança, imunogenicidade e eficácia.

    Além disso, é preciso demonstrar boas práticas clínicas. Esse aspecto está relacionado ao grau de confiabilidade e rastreabilidade dos dados que serão gerados. “Os laudos, a ficha clínica, os documentos que acompanham os participantes do estudo”, continua Mendes, “tudo isso tem que ser rastreável e seguir padrões internacionais de regulação para que, quando fizermos a avaliação para aprovação da vacina, tenhamos confiança de que aquele estudo aconteceu e realmente seguiu as regras.”

    O Instituto Butantan também já iniciou o pedido de anuência para estudos clínicos de sua própria vacina. A Butanvac é produzida em ovo embrionário e adota a tecnologia de vetor viral, com o vírus inativado da Doença de Newcastle, patologia que infecta aves. “Essa vacina será totalmente produzida aqui. Não dependeremos da importação de nenhum insumo. Uma tecnologia que já existe, a mesma usada para a produção da vacina da gripe”, disse Dimas Covas, diretor-presidente do Butantan, no anúncio da vacina candidata em 26 de março. O instituto planeja realizar o estudo em humanos 20 semanas depois autorização, que incluirá participantes acima de 18 anos. A Anvisa já recebeu os dois dossiês com o histórico e o protocolo do estudo clínico, mas pediu novos esclarecimentos para dar sequência à análise técnica, como dados e informações sobre o controle de qualidade da vacina e detalhes sobre o protocolo clínico.

    “Essas vacinas venceram uma etapa que tem sido muito crítica na produção no Brasil, que é a de sair do estudo pré-clínico para buscar autorização da Anvisa para o estudo clínico”, observa Viviane Boaventura, professora da Universidade Federal da Bahia e integrante do Departamento de Imunologia Clínica da Sociedade Brasileira de Imunologia (SBI). “Elas já avançaram essa fase e estão com o material pronto para fazer ensaio em humanos. Isso já é uma ótima notícia. Mas realmente precisamos, como estratégia de enfrentamento e desenvolvimento de tecnologia de vacina no país, otimizar esse funcionamento, para que tenhamos mais vacinas candidatas chegando a esse mesmo estágio.”

    “Estamos chegando atrasados? Pode ser que sim. Mas essa doença veio para ficar e, com essas novas variantes que estão surgindo, teremos um papel bastante importante.”

    por Célio Lopes
    Laboratório de Vacinas Gênicas/FMRP-USP

    Boaventura considera que parcerias internacionais são fundamentais nessa fase inicial de desenvolvimento no país. “Estamos conseguindo vencer esse ‘vale da morte’ porque existiu essa cooperação. Quem sabe, no futuro, consigamos ter mais independência. Mas parcerias vão sempre acontecer e serão sempre bem-vindas. A pesquisa no mundo hoje é internacional.”

    Além da Versamune e da Butanvac, há outros projetos brasileiros em estágio avançado na etapa pré-clínica. A Universidade Federal de Minas Gerais desenvolve a vacina Spintec, que adota a plataforma de proteínas quiméricas, e anunciou em 28 de abril que receberá R$ 30 milhões da prefeitura de Belo Horizonte (MG) para viabilizar o início dos estudos clínicos. Já no Instituto do Coração, da Faculdade de Medicina da USP, uma equipe coordenada pelo imunologista Jorge Kalil Filho está finalizando os testes pré-clínicos de uma vacina de spray nasal que contou com investimento de R$ 20 milhões do MCTI, R$ 5 milhões da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo e R$ 104 mil da USP Vida.

    Novos aspectos dos estudos

    De acordo com a plataforma Our World in Data, da Universidade de Oxford, 7,9% dos 7,79 bilhões da população mundial receberam ao menos uma dose das vacinas contra covid-19 até a última quarta-feira, 6 de maio. As primeiras vacinas contra a covid-19 aprovadas e administradas atualmente no Brasil foram submetidas a testes que seguem o padrão ouro considerado pela Anvisa. São os estudos duplo-cego e randomizados, em que metade dos participantes recebe a vacina candidata e outro grupo, uma substância controle – ou placebo, ou uma vacina para outra doença. No entanto, a segunda geração de vacinas contra a covid-19 precisará de métodos diferentes. “Com a ampliação da vacinação e o fato de já termos vacinas aprovadas, essa situação fica um pouco mais complicada, principalmente pelo aspecto ético”, considera Mendes. “O que muda para a Anvisa é a maneira como o estudo é delineado.”

    “O maior desafio é que, com o fato de termos vacinas seguras e eficazes disponíveis, o ensaio clínico não pode mais ser feito com placebo, como para as vacinas iniciais. Não seria ético”, analisa Denise Garrett, médica epidemiologista e vice-presidente do Instituto Sabin Vaccine. “Os novos ensaios clínicos agora têm que ser o que chamamos de estudos de não inferioridade, para mostrar que a nova vacina não é inferior. Esses ensaios requerem uma amostragem maior e são muito mais caros.” Para Garrett, as novas vacinas contra a covid-19 precisam ir além de serem tão ou mais eficazes que as atuais: devem ser “mais baratas, mais fáceis de armazenar e distribuir”, bem como “ampliar a resposta imune, incluindo proteção contra variantes emergentes”.

    Diante da calamidade nos serviços de saúde mundo afora, com hospitais superlotados, a prioridade dos estudos das primeiras vacinas contra a covid-19 foi clara: diminuir agravamento de doença, internações e óbitos. Para os novos imunizantes, Boaventura atribui uma “importância gigantesca” no foco em impedir a infecção, característica que ajudará a controlar a pandemia a longo prazo. Prevenir a infecção significa que o vírus não consegue se conectar à célula, então a pessoa não desenvolve os sinais e sintomas da doença. Proteção contra a doença acontece quando o vírus ainda se conecta à célula, mas logo é neutralizado pelo sistema imunológico. 

    “Quando se administra qualquer vacina, não só de covid, sabemos que tem um grupo de pessoas que responde muito bem e outro, não, por questão genética, de background ou por condições de saúde que deixam o sistema de defesa suprimido”, reflete a imunologista. “Precisamos que essas pessoas estejam indiretamente protegidas, reduzindo a circulação do vírus. E só vamos reduzir de forma muito eficaz a circulação do vírus se as pessoas vacinadas não tiverem mais capacidade de transmitir, nem de se infectar.”

    Essa estratégia torna o estudo clínico mais detalhado, caro e demorado, continua Boaventura. “A covid pode dar doença sintomática ou assintomática. Um estudo que visa prevenir a infecção tem que ficar, sistematicamente, colhendo swab dessas pessoas por um longo período, para avaliar, mesmo sem sintoma, se tem algum vírus nas vias respiratórias dessas pessoas.”

    Ensaios clínicos

    Célio Lopes detalhou à reportagem o planejamento para o ensaio clínico da Versamune. A exemplo das primeiras vacinas contra a covid-19 já aprovadas, as fases 1 e 2 ocorrerão simultaneamente. Serão necessários 360 participantes no estudo para atestar a imunogenicidade e a segurança do imunobiológico em humanos. Os testes devem acontecer em um único centro de pesquisa no estado de São Paulo, provavelmente na capital paulista, e serão aplicados em quatro coortes, ou grupos de voluntários. “Pretendemos aplicar duas doses – baixa e alta – em dois grupos experimentais, de faixas etárias de 18 a 55 anos e de 56 a 75”, diz. Lopes espera que, caso obtenham a anuência da Anvisa, o trabalho tenha início entre junho e julho. O estudo está previsto para durar pelo menos um ano, com a possibilidade de abrir os resultados após três meses, para análise preliminar de segurança e eficácia. “Nesse desenho que fizemos, essa faixa de 56 a 75 já está prejudicada, logicamente”, observa Lopes, ao levar em conta a campanha de imunização contra a covid-19. “Como unidade de pesquisa clínica, já estamos trabalhando para refazer essas fases.”

    Enquanto preparam os documentos pendentes de envio à Anvisa e aguardam a autorização, Lopes já planeja o passo seguinte: a fase 3. Ele estima que o estudo incluirá ao menos 20 mil participantes, o que exigiria um lote grande da vacina Versamune. Com isso, trabalham na implantação da tecnologia por uma empresa farmacêutica nacional, para não dependerem da importação do ingrediente farmacêutico ativo, o IFA. Isso também possibilitaria uma produção em larga escala para que em dezembro, quando terminasse a fase 3 e caso os resultados sejam satisfatórios, a imunização da população com a Versamune já possa iniciar em janeiro ou fevereiro de 2022.

    “Para a fase 3, não teremos o placebo, então temos que mudar o escopo. Vamos fazer um ensaio clínico comparativo com outra vacina que se aproxime mais com o perfil da nossa, que seria talvez a da Pfizer, ou mesmo da AstraZeneca. E aí veremos os estudos de eficácia”, detalha Lopes. "Faremos estudos de comparabilidade ou de não inferioridade, para ver se dá resultados mais ou menos similares, por exemplo, à da AstraZeneca, cerca de 70%, ou, se for da Pfizer, em torno de 90%. Então, nenhum indivíduo ficará sem vacinar.”

    O MCTI comprometeu-se com mais dois aportes para o desenvolvimento da vacina Versamune. Para as fases 1 e 2, o ministério destinará aproximadamente R$ 30 milhões. Para a fase 3, serão R$ 282 milhões. Contudo, no final de abril, o presidente Jair Bolsonaro bloqueou R$ 272 milhões do orçamento da pasta e vetou outros R$ 371 milhões. Da quantia vetada, R$ 200 milhões seriam destinados aos estudos da Versamune.

    A National Geographic perguntou ao MCTI se o veto inviabilizaria o apoio aos estudos clínicos e se a pasta já possui alguma alternativa para o financiamento, mas não houve resposta até a publicação desta reportagem.

    “Ainda estamos analisando o cenário de financiamento para os estudos clínicos. O que temos certeza é que de alguma fonte vamos ter esses recursos”, disse Lopes.

    Investimento e autonomia

    “Estamos chegando atrasados? Pode ser que sim. Mas essa doença veio para ficar e, com essas novas variantes que estão surgindo, teremos um papel bastante importante”, considera Lopes. Ele reflete que países do bloco Brics – China, Índia e Rússia - já desenvolveram suas próprias vacinas. Brasil e a África do Sul não, por um atraso tecnológico que impede o desenvolvimento em todas as etapas. “O que estamos fazendo é dar uma contribuição bastante significativa para a ciência e tecnologia nacional.”

    Além disso, Lopes acredita que a vacina será suficiente para proteger contra as variantes de preocupação, por estimular a imunidade celular, mas que também há possibilidade de alterar o antígeno para adaptá-la a outras que possam emergir. “É o que o Brasil precisa nesse momento. Outros coronavírus podem surgir, outras pandemias, logicamente, porque estamos mexendo muito na biodiversidade brasileira”, analisa. "Estaremos um pouco mais adaptados, tendo o nosso produto nacional, com uma empresa produtora aqui, com toda a tecnologia. E damos uma contribuição para o Brasil não depender exclusivamente de importação de produtos, de vacinas, do mercado, da competição.”

    Para Boaventura, da SBI, três aspectos são fundamentais para que a ciência brasileira avance do atual patamar, no qual pesquisadores não conseguem prosseguir para os estudos clínicos de seus imunizantes candidatos. Primeiro, criar plataformas de pesquisa e desenvolvimento disseminadas pelo Brasil, com o objetivo de facilitar a realização de estudos pré-clínicos em animais. Em segundo lugar, promover parcerias “para que os produtos saiam do laboratório e aqueles que realmente mostrarem segurança e proteção em modelo animal passem para o ensaio clínico”. Por fim, o apoio e financiamento de estudos que utilizam novas plataformas tecnológicas, como a tecnologia de RNA mensageiro adotada pelas vacinas da Pfizer/BioNTech e Moderna.

    “O Brasil não pode perder o bonde desse boom de inovação e descoberta na área da vacina. Precisa realmente investir, para que nossa comunidade científica esteja em um patamar de criatividade próximo do que acontece em outros países”, alerta a imunologista. “É um momento crucial para a ciência brasileira no desenvolvimento de vacina e dessas plataformas. Se não acompanharmos o andar da carruagem, podemos perder um timing importantíssimo para termos autonomia no futuro.”

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