Por que as dores de cabeça causadas pela Covid-19 são diferentes?

Especialistas dizem que três tipos de dores de cabeça podem ocorrer com a infecção por coronavírus. Descobrir qual alguém tem é a chave para encontrar o tratamento certo.

Por Tara Haelle
Publicado 27 de set. de 2022, 13:56 BRT
Um angiograma feito no Centro Médico da Universidade da Virgínia revela a vasculatura cerebral de um ...

Um angiograma feito no Centro Médico da Universidade da Virgínia revela a vasculatura cerebral de um paciente. Dores de cabeça relacionadas à infecção por Sars-CoV-2 podem resultar de lesão microvascular envolvendo o nervo trigêmeo.

Foto de Joe Mcnally Getty Images

Como sobrevivente de uma lesão cerebral traumática que aconteceu há pouco mais de uma década, Heather Schroeder está familiarizada a dores de cabeça. Ela controlou suas enxaquecas intermitentes com medicamentos e injeções de Botox desde um acidente de equitação. Mas quando ela pegou a Covid-19 em julho de 2021, as dores de cabeça que ela sofreu foram “um inferno”, diz ela.

“Ao contrário de uma enxaqueca relacionada à minha lesão cerebral, desta vez foi como um cobertor sendo jogado sobre minha cabeça. Não era um processo de ficar com dor de cabeça. De repente, tive uma dor de cabeça e foi torturante”, lembra Schroeder, 52 anos, de Knoxville, Tennessee, EUA. “Uma enxaqueca normal para mim pode ter uma intensidade de oito ou nove em 10, com vômitos, sensibilidade à luz e mal-estar pós-enxaqueca. Essa dor de cabeça foi de 20 em 10.”

Nem Tylenol nem medicamentos específicos para enxaqueca reduziram a dor, ela conta. A dor de cabeça persistiu por duas semanas e a privou de sono – permitindo-lhe apenas 15 a 45 minutos de descanso por vez. “Muitas pessoas que conheço passaram a quarentena assistindo televisão ou lendo”, cita Schroeder. “Passei com uma compressa fria na cabeça tentando aguentar a dor de cabeça.”

O caso de Schroeder não é algo isolado. Em uma pesquisa recente, aproximadamente metade de todas as pessoas com infecção aguda por Covid desenvolveu dor de cabeça, e foi o primeiro sintoma em cerca de um quarto das pessoas. Apesar da classificação da Covid como uma doença respiratória, cerca de um em cada cinco pacientes com Covid moderada a grave relatam que foram os sintomas neurológicos – incluindo dor de cabeça, confusão mental e perda de paladar e olfato – que os incomodaram mais.

Essas porcentagens provavelmente são subestimadas. “O relato de dor de cabeça varia, dependendo se é avaliado em pacientes internados ou ambulatoriais”, esclarece Mia Tova Minen, chefe de pesquisa de dor de cabeça e neurologista da Universidade Langone Health, de Nova York. “Provavelmente é subnotificado por pacientes hospitalizados, em parte porque há muitos outros sintomas que podem ser o foco desses pacientes”.

Tipos de dores de cabeça da Covid-19 

Uma dor de cabeça é geralmente um sintoma inicial da Covid e tipicamente bilateral – ocorrendo em ambos os lados da cabeça, ou “na cabeça inteira”, como alguns descreveram. A dor varia de moderada a grave, mas várias pessoas disseram à National Geographic que a dor era muito pior do que nas dores de cabeça anteriores.

Outros classificaram a dor como semelhante a enxaquecas anteriores. Mas entre 47 e 80% das pessoas com histórico de dores de cabeça descreveram sua dor de cabeça por Covid como diferente das anteriores – com dor súbita e intensa.

Schroeder, por exemplo, diz que suas enxaquecas costumavam começar lentamente, dando-lhe tempo para reduzir a exposição à luz e tomar remédios. Mas sua dor de cabeça da Covid surgiu rapidamente, e suas enxaquecas, desde a infecção, não são as mesmas. “Minhas enxaquecas estão muito menos controláveis, ​​e no outono e no início da primavera eram muito mais frequentes do que nunca”, lembra.

Seu marido, Jesse Trucks, também sofreu uma lesão cerebral traumática devido a contusões esportivas. Como sua esposa, foi vacinado quatro meses antes de contrair a Covid-19. Ele também desenvolveu uma dor de cabeça que descreveu como distinta daquelas resultantes de sua lesão cerebral. “A dor de cabeça da Covid era como quando a broca do dentista atinge um nervo”, compara. 

Enquanto suas dores de cabeça normalmente parecem formar uma faixa ao redor da frente de sua cabeça, sua dor de cabeça causada pela Covid estacionou-se na base do pescoço e na parte de trás da cabeça, com duração de 10 dias.

As dores de cabeça relatadas por pessoas com Covid aguda se enquadram em três categorias principais, de acordo com Jennifer Frontera, neurologista da Escola de Medicina Grossman da Universidade de Nova York: dores de cabeça tipo enxaqueca, tipo tensão e dores de cabeça diárias persistentes. Cada uma delas corresponde a tipos de diagnósticos de cefaleia já existentes.

Algumas pessoas com Covid descrevem uma dor de cabeça semelhante à enxaqueca, com latejamento em um lado da cabeça, muitas vezes acompanhada de náusea, vômito e sensibilidade à luz e ao som. Vários estudos, no entanto, identificaram as características mais comuns das dores de cabeça da Covid como sintomas semelhantes aos das dores de cabeça do tipo tensional, que ocorrem em ambos os lados e têm uma “restrição mais parecida com um elástico na cabeça”, explica Frontera. 

Entre 70 e 80 por cento das pessoas dizem que ocorrem em ambos os lados e na frente da cabeça, e as descrevem como uma sensação de “pressão” ou “aperto”. Sensibilidade à luz ou ao som e náusea ou vômito, por outro lado, ocorrem em menos da metade das pessoas com dor de cabeça por Covid.

Mas algumas dessas dores de cabeça do tipo tensional desencadeadas pela Covid têm outra qualidade que justifica a terceira categoria: duram dias, semanas ou até meses. Elas se assemelham a “novas dores de cabeça diárias persistentes”, um diagnóstico para uma dor de cabeça que simplesmente não desaparece e geralmente é desencadeada por uma infecção viral, um procedimento médico, um evento estressante da vida ou até mesmo uma viagem de avião, diz Minen. 

Embora apenas formalmente diagnosticada como uma nova dor de cabeça diária persistente após 90 dias, Minen diz que os médicos geralmente reconhecem essas dores de cabeça e podem começar a tratar mais cedo.

Novas dores de cabeça persistentes diárias podem ser menos responsivas aos tratamentos de dor de cabeça padrão para enxaqueca ou dores de cabeça tradicionais do tipo tensional, o que levou muitos especialistas em dor de cabeça a vinculá-las às dores de cabeça contínuas que as pessoas descrevem durante um surto de Covid, explica Minen.

Em um estudo com mais de 900 pacientes com Covid, a dor de cabeça durou em média 14 dias, mas um em cada cinco pacientes ainda a teve três meses depois; e um em cada seis pacientes teve nove meses depois. Quanto pior a dor de cabeça durante a infecção aguda, maior a probabilidade de as pessoas terem a Covid aguda.

Causas da dor de cabeça da Covid-19

Os pesquisadores ainda estão aprendendo sobre os mecanismos específicos de uma dor de cabeça da Covid-19, mas algumas possibilidades incluem lesão direta do vírus, uma resposta à inflamação à medida que o corpo combate a infecção, menos oxigênio no sangue, desidratação, problemas de coagulação do sangue ou problemas com as células endoteliais que formam a camada interna dos vasos sanguíneos. Nenhum deles, no entanto, explica todas as dores de cabeça da Covid.

“Provavelmente, há mecanismos ligeiramente diferentes em jogo”, acredita Frontera. "Os dados patológicos mais convincentes dizem respeito à lesão microvascular", complementa. Os efeitos negativos da Covid-19 nos vasos sanguíneos são bem reconhecidos e podem afetar o nervo trigêmeo, o maior nervo craniano e responsável pelas sensações faciais e atividades motoras, como mastigar e deglutir. Localizado perto da têmpora na frente das orelhas em ambos os lados da cabeça, cada gânglio trigêmeo – um grupo de nervos – tem três ramos ao longo das partes superior, média e inferior da face.

“Existe uma associação entre dor de cabeça e perda de olfato e paladar, então, um mecanismo potencial pode ser algum tipo de dano nessa via olfativa”, diz Minen. “Pode ser que a Covid esteja entrando pelo nariz e haja inflamação na cavidade nasal. Isso ativa os ramos do nervo trigêmeo, o que pode causar dores de cabeça.”

Laura Johansen, pesquisadora clínica de saúde pública em Charlotte, Carolina do Norte, notou que a dor de cabeça que desenvolveu quando sofreu de Covid-19 em outubro de 2020 “alinhava-se quase perfeitamente com a perda do paladar e do olfato, e piorava em conjunto”, uma associação comum na pesquisa. Como a maioria das dores de cabeça da Covid, a dela estava concentrada no topo e na frente da cabeça.

“Parecia que uma dor de cabeça sinusal encontrou uma enxaqueca”, recorda Johansen. “Durou cerca de quatro dias e, uma vez instalado, estava solidamente estacionado – sem fluxos e refluxos, apenas dor contínua.” Embora ela tenha tomado paracetamol, ela disse que o medicamento não fez muito efeito.

O acetaminofeno é um dos tratamentos mais comuns oferecidos pelos médicos, assim como medicamentos anti-inflamatórios não esteroides, metamizol, triptanos ou uma combinação destes, mas apenas um quarto das pessoas relata alívio completo; e metade relatou obter algum alívio com esses medicamentos. 

Minen diz que os especialistas geralmente tratam dores de cabeça do tipo tensional ou dores de cabeça diárias persistentes com gabapentina, um medicamento que também é usado para tratar convulsões e dores nos nervos.

“Certamente, se você não está respondendo aos analgésicos básicos de venda livre, provavelmente é razoável marcar uma consulta com um especialista em dor de cabeça”, aconselha Frontera. “Primeiro, para ter certeza de que não há mais nada acontecendo e, em seguida, definir que tipo de dor de cabeça você está tendo.” Os tratamentos são diferentes para dores de cabeça do tipo enxaqueca versus dores de cabeça do tipo tensional ou diárias persistentes, ela explica.

Dores de cabeça longas da Covid

Embora as dores de cabeça relacionadas à Covid diminuam com outros sintomas na maioria das pessoas, até 45% das pessoas continuam sofrendo com a dor de cabeça depois que outros sintomas diminuem.

Travis Littlechilds, analista de sistemas que mora em Londres, teve dor de cabeça da Covid na maioria dos dias nos últimos quatro meses. Sua dor de cabeça durante a infecção ativa foi semelhante a uma enxaqueca, “mas extra sensível à pressão”, lembra. Curvar-se ou tossir era particularmente doloroso. Embora suas dores de cabeça tenham se tornado menos intensas, uma característica se repetiu: forte pressão diretamente na parte de trás da cabeça que piora com o movimento.

Outras pessoas com Covid longa relataram que a dor de cabeça que desenvolveram durante a infecção nunca desapareceu. Em uma meta-análise de 36 estudos envolvendo mais de 28 000 pessoas, a dor de cabeça durou até dois meses para uma em cada seis pessoas, e até três meses para uma em cada 10. Para 8% dos pacientes, a dor de cabeça durou pelo menos seis meses. A maioria das pesquisas sobre dores de cabeça por Covid não aborda se os sintomas diferem para pessoas vacinadas ou não vacinadas, mas pelo menos um estudo recente descobriu que, para aqueles que foram vacinados ou reforçados, as dores de cabeça estavam entre os sintomas menos graves.

Aqueles com maior probabilidade de desenvolver uma dor de cabeça longa por Covid são pessoas com histórico deste tipo de dor, que a tiveram como primeiro sintoma, cuja a dor de cabeça por Covid durou mais do que o restante dos sintomas de Covid ou cuja dor de cabeça não respondeu a analgésicos. Aqueles com dores de cabeça pós-Covid tendem a responder bem aos medicamentos amitriptilina e nortriptilina, ambos para enxaqueca, diz Frontera.

Schroeder, que teve como sintomas da Covid dor de cabeça e fadiga, sem aperto no peito ou espirros, teve a sorte de não desenvolver uma longa dor de cabeça por Covid. Ela e o marido continuam tomando precauções para evitar outra infecção.

“Nunca mais quero ter uma dor de cabeça assim”, diz ela. “Olho para trás e me pergunto como sobrevivi à experiência. Estranhamente, não me lembro bem dos dias… mas consigo me lembrar da dor perfeitamente.”

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