Julgamento do marco temporal pelo STF pode desterrar povos indígenas – entenda

Reportagem acompanhou a mobilização dos mais de 6 mil indígenas que acamparam em Brasília para protestar contra a tese do marco temporal e o cerceamento dos direitos dos povos originários pelos poderes Executivo e Legislativo.

Por Carolina Cunha
Publicado 5 de set. de 2021, 07:00 BRT, Atualizado 5 de set. de 2021, 20:36 BRT
povo-xukuru

Povo xukuru protesta em frente ao Congresso Nacional em agosto de 2021. Alguns juristas tem chamado a apreciação do marco temporal pelo STF de o "julgamento do século" – pela primeira vez tribunal aplica a repercussão geral a uma matéria indígena.

Foto de Andressa Zumpano

Era domingo, 22 de agosto, quando o acampamento Luta pela Vida brotou. Mais de 6 mil indígenas se reuniram a dois quilômetros do Congresso Nacional, na região central de Brasília. Muitos chegaram de longe – alguns enfrentaram até sete dias de viagem de ônibus.

As delegações representavam 170 etnias de todas as cinco regiões e foram convocadas pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). Segundo os organizadores, o número representa a maior mobilização na história dos povos originários por seus direitos.

No acampamento, participantes circulavam com máscaras de proteção facial. Quem chegava de viagem, testava para covid-19. Na tenda central, lideranças de diferentes povos debatiam temas da causa indígena. O vaivém de parentes, como os indígenas se identificam, revelava a diversidade dos povos originários brasileiros, reunidos em uma grande casa comum temporária.

A reportagem acompanhou a mobilização por cinco dias, conversando com líderes de diferentes etnias. Os relatos mostram como uma única decisão ameaça a vida de indígenas do norte ao sul do Brasil.

Sônia Guajajara, coordenadora executiva da Apib, destaca a urgência do momento, em meio à pandemia. É preocupante, mas não tem outro jeito. Essa chegada em Brasília, com essa quantidade de indígena, demonstra o quanto nós estamos tendo os direitos violados”, disse em entrevista na Esplanada dos Ministérios. “Não podemos nos calar diante desse cenário violento. Não é apenas o vírus da covid-19 que está matando nossos povos.”

O objetivo central é acompanhar a semana do julgamento do Recurso Extraordinário 1.017.365 no Supremo Tribunal Federal (STF). O caso envolve diretamente a terra disputada pelo governo de Santa Catarina com a comunidade indígena xokleng e tem repercussão geral. O estado reivindica uma área da Terra Indígena (TI) Ibirama-Laklanõ, onde também vivem povos guarani e kaingang, e alega que ela foi invadida e pertence originalmente à Reserva Biológica do Sassafrás.

Os xokleng defendem que a área em disputa é parte do território indígena que foi subtraído ao longo do século 20 e acabou ficando de fora da demarcação oficial da TI. Mas a revisão dos limites da terra, cobrada há anos pelos indígenas, já teve o estudo antropológico concluído pela Fundação Nacional do Índio (Funai) e a portaria declarada pelo Ministério da Justiça – ambos em favor dos indígenas.

Brasílio Priprá, liderança xokleng, conta que seus antepassados foram expulsos do território original devido a perseguições. “Foram muitos massacres. Eu vou te contar apenas um. Foi em 1904. Num dia só, mataram 244 indígenas xokleng, mãe, pai, filho”, disse à reportagem em Brasília. “Aquela terra tem sangue.”

Registros antropológicos relatam que, até meados de 1930, o governo catarinense incentivava a imigração alemã e considerava os indígenas um entrave para a colonização. Jagunços conhecidos como 'bugreiros' eram contratados a mando de autoridades locais para exterminar os ‘bugros’, termo racista usado para se referir aos indígenas. O pagamento era feito por par de orelhas. “Tem depoimentos de bugreiros na história recente, que diziam que cortar índio a facão era como cortar bananeira”, diz Brasílio.

Além dos povos que habitam a TI Ibirama-Laklanõ, o julgamento pode definir o futuro de povos de todo o Brasil. Em 2019, o STF definiu que o julgamento do povo xokleng terá efeito vinculante, com repercussão geral sobre a temática das terras indígenas. Ou seja, a decisão aplicada valerá para outros casos semelhantes.

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    Durante a mobilização de agosto, indígenas também protestaram contra o projeto de lei 490/2007, aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados em junho deste ano. O PL também determina um marco temporal e permite a exploração de terras indígenas.

    Foto de Andressa Zumpano

    “Nós estamos considerando como o julgamento do século, o mais importante da história brasileira. Nunca o Judiciário aplicou a repercussão geral em um caso que envolva matéria indígena”, afirmou à reportagem Rafael Modesto, advogado do povo Xokleng. “A decisão agora vai vincular a todas as questões territoriais indígenas do Brasil. A gente espera que o Supremo possa dizer que o marco temporal é inconstitucional e que os povos possam ter acesso a seus territórios de onde foram expulsos sob o jugo da violência.”

    O que está em jogo na Suprema Corte são duas teses jurídicas. A tese que os indígenas defendem é a do direito originário, consagrado no artigo 231 da Constituição Federal e que leva em conta as terras tradicionalmente habitadas pelos povos ancestrais do Brasil. Hoje a Funai é responsável pelo início do processo de demarcação, que inclui estudos antropológico e delimita as fronteiras da comunidade indígena. Finalizado o fluxo burocrático, o presidente pode sancionar ou não a criação.

    A outra tese é a do marco temporal, que estabelece uma linha de corte de tempo para as demarcações, na qual os indígenas só poderiam reivindicar terras se comprovado que as ocupavam antes de 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Essa tese é defendida pelo presidente Jair Bolsonaro e por grupos ruralistas, que alegam insegurança jurídica. Eles temem que se a tese do marco temporal for invalidada, o governo federal possa iniciar ou retomar os processos de demarcação de áreas que foram travados com base nesse princípio. Entidades ligadas ao agronegócio afirmam ainda que a expansão de áreas indígenas vai levar a grandes perdas na produção.

    O marco temporal ganhou força após ser utilizado pelo STF no julgamento da reserva indígena Raposa-Serra do Sol, em 2009. A partir daí, grupos utilizam o argumento para inviabilizar novas demarcações, embora o caso não tenha sido considerado de repercussão geral pela Corte. Em 2017, durante o governo do presidente Michel Temer, a Advocacia Geral da União emitiu o parecer 001/2017, que estabelecia que o marco temporal poderia ser aplicado a toda administração pública e proibia a expansão de áreas demarcadas. Mas, por ordem do ministro Edson Fachin, esse parecer está suspenso até que o recurso catarinense seja julgado. Desde a gestão Temer, o governo federal não demarcou nenhuma terra indígena.

    O Brasil possui atualmente 421 terras indígenas homologadas, onde vivem cerca de 466 mil pessoas. Há, porém, 303 terras indígenas não homologadas em fase de processo de demarcação. Estas terras somam 11 milhões de hectares, onde vivem cerca de 197 mil indígenas. Estima-se que existam ainda 100 grupos de povos isolados sem contato na Amazônia.

    Para o advogado dos xokleng, muitas comunidades indígenas não estavam na posse das terras reivindicadas na data da promulgação da Constituição por um simples motivo. “Foram expulsos e não podiam voltar. E quando retornavam para o território, eram massacrados”, diz Modesto. Para ele, a perspectiva de aplicação do marco temporal seria devastadora. “Vamos ter um retrocesso sem tamanho. Porque as demarcações em curso serão anuladas. As sem providência, que são muitas, nem início teriam. Muitos casos com a demarcação finalizada ou homologada registrada em cartório seriam anulados. Portanto, os povos seriam desterrados. Eles seriam expulsos mais uma vez dessas áreas para que elas sejam entregues à iniciativa privada e ao agronegócio.”

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        Tupinambá protestam em Brasília em agosto de 2021. Indígenas representando mais de 170 etnias de todo o Brasil estiveram presentes na capital federal – a maior manifestação do tipo desde pelo menos a Constituinte, em 1988.

        Foto de Andressa Zumpano

        Elizeu Pereira Lopes, liderança dos guarani kayowá, acompanha o julgamento com preocupação. “Quem vai ser mais afetado se for aprovado esse marco temporal é o povo guarani kayowá”, diz Elizeu. “A maioria retornou para sua terra tradicional depois de 1988. O que pode acontecer caso essa interpretação seja considerada correta? Pode acontecer muito despejo e derramamento de sangue.”

        Os guarani kaiowá representam a segunda maior população indígena do Brasil, com mais de 50 mil pessoas que lutam há décadas pela regularização fundiária de seus antigos tekoha, os territórios de ocupação tradicional. Os conflitos remontam ao século 19, com a chegada de colonos gaúchos ao Mato Grosso do Sul, fato que provocou a dispersão dos povos indígenas.

        Hoje existem oito reservas guarani kayowá demarcadas antes de 1988. Mas a área é considerada insuficiente. “Ali já não cabe mais ninguém. É aproximadamente 2 mil hectares, 3 mil hectares para abrigar uma população de 9 mil, 12 mil e 15 mil. Por isso que nós retornamos para a terra tradicional”, relata Elizeu. “Mas hoje somos chamados de invasores.” O crescimento populacional indígena, a morosidade das demarcações e a expansão do agronegócio acirraram o cenário de conflito.

        Parte dos guarani kayowá ocupam terras que precisam ser regularizadas e estão em disputa com fazendeiros. Na região, há 36 processos de retomadas de terras. Outras já foram homologadas, mas falta a posse indígena. Há ainda comunidades que vivem na beira das estradas, em condições semelhantes a refugiados. “Foram despejados de suas terras tradicionais pela Justiça e estão esperando a demarcação”, diz Elizeu. A falta de espaço para a subsistência, o racismo, o confinamento e a precariedade das condições de vida também elevam o número de casos de suicídios na etnia.

        Elizeu mora em uma reserva de área de retomada, encravada no Mato Grosso do Sul, na fronteira com o Paraguai. Segundo a liderança, o conflito de terras no estado é um barril de pólvora. Os guarani kaiowá já foram alvo de ataques de pistoleiros, e o próprio Elizeu é jurado de morte. Se o marco temporal for aceito, ele acredita que haverá forte resistência local. “Vamos resistir até o fim. Pode haver muita ação judicial para que os guarani sejam despejados. Eles não vão se entregar, porque a nossa maior luta é pelo espaço. Para nós, a terra é sagrada. Para onde a gente vai se formos expulsos? A beira da estrada? A gente não quer ir. Pretendemos morrer em cima das nossas terras, em cima dos nossos territórios, ser enterrado ali. Por isso o marco temporal é um genocídio.”

        Outro povo que teria as terras impactadas com o entendimento do marco temporal é o pataxó da Bahia, que vive no litoral sul. “Temos oito aldeias demarcadas. Se esse entendimento passar, 14 aldeias que estão em processo de demarcação podem deixar de existir”, disse à reportagem Erilza Uruba Pataxó, vice-cacica da aldeia Barra Mãe Velha. “Claro que alguém vai ocupar esse espaço, e para onde vai nosso povo?”

        A homologação da TI Barra Velha teve um longo processo, que começou na década de 1940 e contou com episódios dramáticos, como um massacre em 1951, que dispersou a comunidade. Em 1961, foi criado o Parque Nacional e Histórico de Monte Pascoal, conhecido por ser o local da chegada dos portugueses ao Brasil, em 1500. Com a criação do parque, os pataxó foram impedidos de utilizar os recursos econômicos do território, que ficavam dentro da reserva.

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          Indígenas fazem vigília em frente ao prédio do Supremo Tribunal Federal, em Brasília, em 24 de agosto de 2021. Do alto, podia-se ler: 'Brasil terra indígena'.

          Foto de Gabi Cerqueira

          Os limites do parque foram feitos sem considerar a ocupação histórica da comunidade. “A sobrevivência estava na natureza. Mas meu povo era impedido de caçar, plantar, de ocupar o mangue, pegar os mariscos, e até ir para o mar”, lembra Erilza. Os anciões contam que, na 1970, dois líderes foram a Brasília pedir ajuda ao governo. Eles partiram a pé de Barra Velha, rumo à capital federal. Após três meses de caminhada, foram atendidos pelo presidente da Funai. Em 1988, o entorno de Barra Velha foi reconhecido como ‘de posse imemorial indígena’.

          A TI foi homologada em 1991, mas seus limites não correspondem à totalidade do território tradicionalmente ocupado. Grande parte foi absorvida pelo parque, outras áreas estão sob a pressão da grilagem. É desejo dos pataxó que, com a demarcação de novas áreas, eles próprios possam garantir a conservação das reservas biológicas e culturais.

          Para a vice-cacica, o governo não quer demarcar nenhum centímetro de terra indígena. “Eles enxergam que nossas terras têm que ser exploradas. Mas eles são os invasores; quando chegaram aqui nos encontraram”, diz Erilza. “Nós, indígenas, a gente nunca desiste. Somos os primeiros indígenas a ter contato com a civilização. Fomos a muralha para defender os outros povos que estão no interior, os primeiros a ter contato, e ainda estamos vivos. Vamos sobreviver aqui.”

          Rumo ao julgamento

          No dia 24, primeiro dia de marcha, a multidão ocupou a praça em frente ao prédio do STF, sob o olhar de policiais e da estátua que representa a Justiça – uma mulher, sentada e com olhos vendados, que segura uma espada. Ao anoitecer, começou uma vigília. Após defumação com ervas e rezas, o público acendeu velas e ficou em silêncio. Lâmpadas de led foram acesas – vistas de cima, formavam a frase ‘Brasil Terra Indígena’. A imagem viralizou nas redes sociais e na imprensa. “Essa vigília foi para levar a mensagem ao mundo que o Brasil inteiro é terra indígena”, diz Sônia Guajajara, coordenadora da Apib.

          No dia seguinte, data marcada para o julgamento, os participantes marcharam pela Esplanada dos Ministérios até a Praça dos Três Poderes, onde ficam o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o prédio do STF. Ao som de maracás e cantos, cada etnia forma uma linha de frente. Muitos carregam faixas e cartazes com frases como ‘Nossa história não começa em 1988’, ‘Terra protegida’ e ‘Não ao marco temporal’. Brasílio Priprá, do povo xokleng, caminhava ao meu lado, com um sorriso. Pergunto como ele se sente às vésperas da sentença. “Eu acredito na sociedade brasileira. Eu acredito na justiça brasileira. Hoje estou em alegria. Nada é mais importante que a luta pela vida.”

          Mas o julgamento foi adiado duas vezes, por falta de tempo e deve ser retomado em 8 de setembro, com o voto do ministro relator Edson Fachin. A frustração entre os que assistiam a sessão do lado de fora, por um telão, era evidente.

          Os xakriabá voltaram a pé para o acampamento, cantando ao longo de todo o percurso. À noite, foi realizada uma grande roda com o pajé. A liderança Célia Xakriabá destaca a forte presença da espiritualidade no acampamento. “A espera é um desgaste muito grande. Mas aqui não são somente 6 mil indígenas, é a força ancestral, cantando e gritando. Homens, mulheres, anciãs, crianças, trazendo a força dos encantados. E tem sido essa a principal arma dos povos indígenas”, disse ela em entrevista à reportagem. “Nós projetamos a nossa voz não somente com o microfone. Projetamos com o maracá, o nosso microfone para o mundo. É muito importante pensar que nós não podemos ser somados somente pela quantidade, mas pela força da espiritualidade. Enquanto houver um indígena sempre vai ter resistência.”

          Localizada no sertão de Minas Gerais, a TI Xakriabá foi homologada em 1988, depois de um triste episódio que seria reconhecido pela Justiça como o primeiro crime de genocídio indígena no Brasil. A palavra que nomeia seu povo significa ‘bons de remo’. Hoje a comunidade ocupa apenas um terço do território tradicional e busca retomar áreas para que possam voltar a ter acesso às águas do rio São Francisco.

          A morosidade no processo favorece os conflitos. Em junho deste ano, uma aldeia da TI sofreu um incêndio criminoso que destruiu a casa de medicina tradicional, escola e biblioteca. Para Célia, os brancos precisam entender a importância da vida dos povos indígenas. “O que está em jogo nesse julgamento [...] é a vida de toda a humanidade. A gente protege o ar, a terra, a floresta. É urgente reativar o princípio da humanidade. O problema dela é a destemperança. Enquanto o planeta está cada dia mais aquecido, a humanidade está com o coração mais frio.”

          Depois de uma intensa agenda de reuniões com líderes políticos, Davi Kopenawa, xamã e líder yanomami, observava o movimento indígena na Praça dos Três Poderes. Ele foi a Brasília denunciar a atuação ilegal e os conflitos com garimpeiros na terra yanomami. Levantamento da Hutukara Associação Yanomami aponta que atividade ilegal degradou 200 hectares de floresta no primeiro trimestre de 2021 e que existam hoje mais de 20 mil garimpeiros ilegais trabalhando em seu território.

          Para Kopenawa, a retomada da terra vai muito além de espaço físico. Trata-se da vida em coletivo. “Estamos pedindo para o presidente respeitar o nosso direito. A nossa lei que as autoridades escreveram. Estar aqui é a nossa dança e revolta. Nós estamos junto com a Mãe Terra. O marco temporal também amarra o pescoço e mata”, disse o líder. “Não precisa tentar entrar na terra yanomami. Lá é minha casa, aqui é a casa deles. Eu não mexo. Eu só olho e respeito. O hoje já é o futuro. Todos estes povos juntos, somos o futuro. Futuro é terra, terra é a vida.”

          Após o adiamento do julgamento para 1º de setembro, o acampamento Luta pela Vida começou a ser desmontado e as delegações voltaram para suas casas. Mas um grupo pequeno continuará em Brasília pressionando o STF até a decisão final. É possível, no entanto, que novos pedidos de vista posterguem uma decisão.

          Disputas no Congresso Nacional

          Ninawa Ninawa Inu Huni Kuin é um homem da floresta. Na língua pano, seu nome significa ‘floresta'. No final do século 19 até o início do século 20, o povo huni kuin, que vive no Acre, teve as terras invadidas por milhares de seringueiros em busca da borracha na Amazônia. Os huni kuin foram escravizados por muitos anos. Os que resistiram, fugiram para os altos rios.

          Para Ninawa, o momento é de alerta máximo e os olhos indígenas devem estar voltados para o Congresso Nacional. “Aqui no Brasil, eu acredito que teremos anos de muitas lutas intensas no Legislativo, que eu estou chamando de massacre civilizado. Antes eles atiravam em nossos parentes, hoje é na caneta. Na prática, é uma tentativa de legalizar o extermínio dos povos indígenas”, disse Ninawa.

          Enquanto se julga o marco temporal no Judiciário, avança no Congresso o Projeto de Lei (PL) 490/2007, que, entre outros pontos, também estabelece o ano de 1988 como marco temporal para a demarcação de terras indígenas. Além disso, o projeto abre as terras indígenas para a exploração do agronegócio, mineração e infraestrutura e é defendido pela Frente Parlamentar Agropecuária, que representa uma das maiores bancadas do Parlamento.

          Oriunda de Roraima, a deputada federal Joênia Wapichana (Rede/RR) é a única parlamentar indígena do Congresso Nacional. Ela também foi a única voz dos povos originários em junho, quando o PL 490 foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça. Na época, representantes dos povos indígenas também viajaram a Brasília para protestar. Joênia e a oposição defendem que o PL é inconstitucional e criticaram o fato de a comissão não abrir espaço para indígenas discutirem o texto. Aprovado em comissão, o PL espera para ser votado em plenário.

          “Eu sou a única ali. Mas não vão me calar, porque não estou sozinha. Estou com os povos indígenas. Por mais que tentem me impedir de falar, eu creio que a minha mensagem sempre vai ser deixada”, diz Joênia. “Fui eleita num processo democrático e estou aí para exercer minha missão, que é ser representante parlamentar do meu povo.”

          Formada em Direito, a deputada enxerga um cenário cada vez mais complexo para os indígenas. A única saída, acredita, é a defesa da Constituição. "Infelizmente é um cenário muito negativo. Mas eu diria que não está perdido. Eu, como parlamentar, tenho utilizado tudo que é mecanismo de direito e ações judiciárias. Tem o Executivo que está com posição anti-indígenas, o Legislativo, que a maioria ainda insiste em invisibilizar e não aceitar os direitos da Constituição. Agora o Judiciário tem o poder de dar um basta, pelo menos no marco temporal.”

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