“A investigação filosófica é um elemento central na história intelectual de muitas civilizações”, diz a Encyclopaedia ...

Existe um antídoto filosófico para a solidão e os algoritmos? O que a filosofia diz sobre 5 temas polêmicos

O pensador britânico John Armstrong disseca com seu olhar analítico para NatGeo alguns dos temas mais relevantes da atualidade por ocasião do Dia Mundial da Filosofia.

“A investigação filosófica é um elemento central na história intelectual de muitas civilizações”, diz a Encyclopaedia Britannica.

Foto de Domínio público
Por Redação National Geographic Brasil
Publicado 19 de nov. de 2025, 12:09 BRT

A investigação filosófica é um elemento central na história intelectual de muitas civilizações”. Com essa definição da Encyclopaedia Britannica (plataforma de conhecimentos gerais do Reino Unido) já é possível entender a importância da filosofia na existência humana, estando ela presente em sociedades antiquíssimas como a grega ou no Império Romano

Coube à Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) instituir a efeméride do Dia Mundial da Filosofiacelebrado anualmente em toda terceira quinta-feira de novembro, de forma a incrementar o pensamento crítico filosóficoreforçar a importância dos ensinamentos de nomes essenciais da área.

Entre eles podem ser citados a filósofa moderna e cientista política Hannah Arendto conhecido pensador alemão Friedrich Nietzsche (1844 – 1900); ou os nomes clássicos como Epíteto (50 – 130 d. C.) e Aristóteles (384 a.C a 322 a.C).

Para debater um pouco mais sobre a importância da filosofia – inclusive na atualidade, diante de tantas transformações sociais como os impactos causados pela mudança climática ou a popularização da inteligência artificialNational Geographic entrevistou o pensador, professor e filósofo britânico John Armstrong, cofundador da The School of Life, autor de livros como “O Poder Secreto da Beleza” e “Arte Como Terapia”.

Ele expõe suas opiniões sobre temas-chave como o antropoceno, a tecnologia, a solidãoa relação entre o bem e a beleza: confira, a seguir, os melhores momentos da conversa com John Armstrong.

Hoje em dia, o espaço para o debate migrou para as mídias sociais. Segundo John Armstrong, ...

Hoje em dia, o espaço para o debate migrou para as mídias sociais. Segundo John Armstrong, esse lugar não promove uma boa troca de ideias e opiniões: "o debate é uma habilidade significativa e cuidadosa, na qual é preciso compreender o que o outro está dizendo, filtrar o que pode ser importante, levantar objeções bem direcionadas", diz ele.

Foto de Domínio público

FILOSOFIA X ANTROPOCENO

NatGeo: Vivemos na era do Antropoceno, em que a ação humana é a força dominante que molda o planeta. Qual é a principal responsabilidade ética que surge dessa condição sem precedentes? É uma ética de preservação, reparação ou uma maneira completamente nova de interagir com a natureza?

John Armstrong: É muito tentador pensar em deveres éticos para com o planeta, mas há um perigo: isso faz com que as pessoas que não assumem muita responsabilidade prática sejam consideradas imorais. Mas, muitas vezes, são essas pessoas que seria útil alcançar. 

O valor que mais gostaria de incentivar é a elegância: a beleza alcançada com meios mínimos. Não devemos fazer com que viver uma vida menos consumista pareça um dever doloroso, mas sim o subproduto de uma visão mais refinada da felicidade

FILOSOFIA X ALGORITMOS

NatGeo: Você argumenta que o caráter é a arquitetura de nossas vidas mentais. Em um mundo de algoritmos que moldam nossos desejos e opiniões, quem é o principal arquiteto do nosso caráter hoje? Ainda somos nós, ou terceirizamos essa construção para plataformas digitais?

John Armstrong: Vamos nos aprofundar um pouco no que é um algoritmo. Em última análise, é apenas uma recomendação sobre o que prestar atenção a seguir. 

programa de filosofia da Universidade de Oxford, por exemplo, é um algoritmo, já que diz: depois de examinar este argumento, faça este teste, então outro livro ou ideia é recomendado com base no seu desempenho. Nesse sentido, um comerciante de vinhos tem um algoritmo – se você gostou desse vinho, que tal experimentar este?

O problema com os algoritmos digitais é sua total falta de preocupação com o bem-estar ou desenvolvimento a longo prazo. Não há amor ou visão orientada para um bom desenvolvimento por trás deles; eles apenas dizem que você parece fazer “muito X”, então “aqui está mais X, um X mais intenso”. Geralmente, é o oposto da educação

Com isso, em vez de nossos caracteres se expandirem, se aprofundarem e se tornarem mais maduros com a experiência, ficamos mais limitados e frágeis

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    O filósofo britânico John Armstrong.

    O filósofo britânico John Armstrong.

    Foto de Divulgação/Juliana Lubini

    FILOSOFIA X BELEZA

    NatGeo: você defende uma correlação entre o Bem e o Belo, sugerindo que a beleza e a estética servem como um caminho para uma vida mais significativafeliz e ética. Você poderia explicar melhor como a Ética e a Estética estão relacionadas em seu pensamento?

    John Armstrong: Na maioria das vezes, a ética (o que é bom) e a estética (o que é beloparecem muito distantes uma da outra. Isso ocorre porque o materialismo puro vê a beleza como um luxo. A imagem de “fazer o bem” geralmente se concentra em ajudar as pessoas materialmente. Mas a beleza, se permitirmos, toca a alma e é fundamental para o anseio humano

    Uma sociedade saudável não poderia ser fundada apenas na prosperidade material. A beleza é graciosidade, ternura, harmonia e generosidade (todos ideais éticos); ela deve nos encorajar a internalizar essas qualidades em nossos próprios pensamentos e ações. 

    FILOSOFIA X SOLIDÃO

    NatGeo: vários estudos mostram que solidão se tornou uma epidemia em muitos países ao redor do mundo e agora está afetando populações mais jovensespecialmente os homens. Como a filosofia pode ajudar a reverter esse cenário?

    John Armstrong: posso tentar uma ideia estranha aqui neste tópico. Ela tem a ver com um episódio do antigo programa de carrosTop Gear. O programa era voltado diretamente para homens jovens. Nesse episódio, os apresentadores dirigem carros esportivos em alta velocidade por uma colina e, em determinado momento, uma música clássica incrivelmente bela começa a tocar: é uma peça majestosa e celestial. 

    Tenho certeza de que muitos jovens que nunca teriam ouvido essa música ficaram profundamente comovidos. Eles começaram a perceber que há mais coisas na vida do que manter a boa forma ou jogar videogame. Seria ótimo pensar em amizades formadas em torno de dizer (timidamente) “Eu adorei isso, você não?”. 

    “No passado, os guardiões da cultura podiam ter suas falhas, mas geralmente eram pessoas instruídas e sérias, preocupadas em não cometer erros. ”

    por John Armstrong
    filósofo

    FILOSOFIA X REDES SOCIAIS

    NatGeo: Na era digital, nossa “ágora” — ou seja, o nosso espaço para o debate ético — migrou para as mídias sociais. Como essa mudança de uma arquitetura física para um espaço virtual distorceu ou transformou nossa capacidade de dialogar sobre o bem e o mal?

    John Armstrong: No passado, os guardiões da cultura podiam ter suas falhas, mas geralmente eram pessoas instruídas e sériaspreocupadas em não cometer erros e que se esforçavam bastante para apresentar fatos corretos e argumentos lógicos. 

    Havia uma visão generalizada de que, obviamente, muitos temas importantes precisavam ser debatidos de forma inteligente, mas a verdade sobre eles era complexa. Pessoas com visões simplistas eram vistas como sem instrução, sem direito inerente de ter suas ideias de baixo nível amplamente divulgadas

    Ainda que tenhamos direito às nossas próprias ideias, por mais tolas que sejam; não há direito sensato de espalhar as ideias de alguém pelos quatro cantos do mundo. O espaço digital não promove o debate — dado que o debate é uma habilidade significativa e cuidadosa, na qual é preciso compreender o que o outro está dizendofiltrar o que pode ser importante, levantar objeções bem direcionadas e esperar o mesmo tratamento em troca. Basicamente, não há muito dinheiro a ser ganho com esse tipo de troca.

     

    *A entrevista foi feita por Luciana Borges, Editora Sênior de National Geographic Brasil e LATAM.

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