Grande elevação vulcânica encontrada na Lua é diferente de tudo que já se viu

Cientistas que investigam a superfície lunar em busca de pistas sobre a frequência de impactos no passado descobriram algo que deixou os geólogos completamente confusos.

Por Robin George Andrews
Publicado 31 de dez. de 2019, 09:00 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Uma imagem da lua vista de um telescópio revela as várias crateras bem preservadas e planícies ...
Uma imagem da lua vista de um telescópio revela as várias crateras bem preservadas e planícies de lava escura em nossa companheira celestial próxima.
Foto de Babak Tafreshi, Nat Geo Image Collection
101 | Lua
O que compõe a Lua, e como ela foi formada? Conheça o passado violento do nosso satélite natural, o papel de suas fases na criação dos primeiros calendários e como os humanos primeiro pousaram em sua superfície há meio século.

Em algum momento depois que o Sistema Solar se formou, há 4,6 bilhões de anos, um projétil se chocou com nossa jovem Lua e formou uma bacia lunar de cerca de 998 quilômetros de extensão conhecida como Mare Crisium. Ninguém sabe exatamente quando esse impacto aconteceu, mas, há décadas, os cientistas tentam resolver o mistério como parte do debate sobre o fato de a Lua e, por tabela, a Terra terem passado por um período de intenso bombardeio de meteoros no início de suas vidas.

Agora, os cientistas que percorrem a região dizem ter avistado uma cratera dentro do mar lunar que parece conter rochas derretidas provenientes do impacto primitivo, um tipo de rocha vulcânica que pode atuar como um verdadeiro relógio geológico. Se futuros astronautas ou um robô conseguirem obter uma amostra e determinar sua idade, pode ser que ajude a revelar o que estava acontecendo na Terra em seus primórdios, quando a vida surgiu em nosso planeta.

De quebra, a descoberta ainda traz um mistério intrigante: o mar lunar também abriga uma “bolha” geológica do tamanho de Washington, D.C., que é diferente de tudo que já se viu no Sistema Solar. Como relatado pela equipe em um artigo que será publicado em breve no periódico Journal of Geophysical Research: Planets, essa elevação vulcânica parece ter sido formada por uma atividade magmática subterrânea peculiar que ainda não pode ser explicada pelos pesquisadores.

“Estou totalmente confuso com isso,” conta Clive Neal, especialista em geologia lunar da Universidade de Notre Dame, que não participou da nova pesquisa.

A data de um apocalipse

Nosso registro de impactos anteriores na Terra é inconsistente, em grande parte porque a erosão ambiental e a agitação constante das placas tectônicas apagam as evidências. Por outro lado, devido à ausência de ar e de atividade na Lua, estão preservados bilhões de anos de crateras sobre crateras. Dessa forma, a nossa companheira de órbita oferece um registro indireto dos eventos de colisão no passado de nosso planeta.

Entre outros enigmas, é importante saber o que acontecia na Terra há bilhões de anos para que os pesquisadores consigam entender as origens da vida. Embora os cientistas ainda discutam a idade dos fósseis mais antigos conhecidos, diversos exemplos propostos datam entre 3,5 bilhões e 4,28 bilhões de anos atrás. Em uma coincidência impressionante, evidências da Lua sugerem que esse foi o momento em que a Terra primitiva estava sendo atingida por fragmentos da formação do Sistema Solar.

As missões Apollo e diversas expedições com equipamentos robóticos realizadas pela União Soviética trouxeram amostras de rocha de mares lunares e de grandes crateras da face visível da Lua, utilizadas pelos pesquisadores para datar os diversos eventos de colisão. Muitas dessas rochas revelaram idades entre 3,8 e quatro bilhões de anos, sugerindo que houve um grande aumento no número de impactos na Lua, que já era alto. Esse período de 200 milhões de anos ficou conhecido como o Intenso Bombardeio Tardio.

No entanto, teorias recentes colocaram em dúvida as idades desses mares lunares. A origem de muitas dessas amostras lunares é incerta e, atualmente, acredita-se que muitas foram ejetadas de determinados mares e lançadas em outros, o que resultou na determinação de idades falsas pelos cientistas. Além disso, se houve um pico de atividade há 3,9 bilhões de anos, como sugerem as amostras da era Apollo, então fica difícil explicar por que houve um período de tranquilidade de quase 700 milhões de anos depois da formação do Sistema Solar.

“Como o Intenso Bombardeio Tardio agora parece ainda mais duvidoso, é essencial determinar se aquelas colisões lunares gigantes de fato se formaram por volta da mesma época”, conta Paul Byrne, cientista planetário da Universidade Estadual da Carolina do Norte, que não participou do estudo.

Em geral, existe consenso somente em relação à idade correta de um mar lunar, o Mare Imbrium ou Mar das Chuvas, com 3,9 bilhões de idade, conta Bill Bottke, cientista planetário e especialista em asteroides do Instituto de Pesquisa do Sudoeste, em Boulder, Colorado, que não participou do novo estudo. São necessárias idades mais precisas dos mares lunares, obtidas a partir do material fundido produzido pelo impacto, para afirmar se o antigo pico de atividade foi verdadeiro. E é aí que entra o Mare Crisium.

O mar das crises

Um ano antes de sua morte, o renomado cientista lunar Paul Spudis publicou um artigo que propunha que o Mare Crisium continha fragmentos de seu material fundido original. Então, Dan Moriarty, geólogo lunar do Centro de Voos Espaciais Goddard da Nasa, e seus colegas decidiram usar os dados de um orbitador de reconhecimento lunar para tentar descobrir esse fato. Ao determinar que as mais puras rochas derretidas provenientes do impacto eram ricas em magnésio, eles vasculharam o mar lunar em busca da assinatura espectral desse elemento, que é inconfundível.

O impacto original que formou o Mare Crisium foi tão poderoso que criou uma camada de material fundido de até 15 quilômetros de espessura. Mas havia um inconveniente, erupções intensas de lava começaram a inundar a bacia há cerca de 3,6 bilhões de anos, formando um grande mar vulcânico — também conhecido como Mar das Crises — que cobriu grande parte das rochas derretidas no impacto original.

Por sorte, o mapeamento anterior havia revelado que esse cenário permitiu que “ilhas” formadas por rochas sobrevivessem dentro das bacias repletas de lava, denominadas Kīpukas. Na Terra e em outras partes da Lua, Kīpukas são basicamente pedaços de terra elevada cercados por lava fria mais recente, e a equipe supôs que nesses locais ainda pode estar exposto o material fundido proveniente do impacto do Mare Crisium.

Enquanto a equipe analisava a região, uma Kīpuka se destacou — literalmente. A saliência lunar do tamanho de uma cidade estava estranhamente elevada e rachada como uma casca de ovo e não tinha ligação com nenhuma outra formação geográfica.

Olhando mais de perto, uma pequena cratera nessa Kīpuka revelou que grande parte de sua composição era rocha vulcânica congelada. A melhor explicação elaborada pela equipe sobre sua origem é que a elevação rachada foi empurrada para cima por uma espécie de atividade vulcânica na subsuperfície. Mas, por ora, essa formação permanece um mistério. Além do mais, embora contenha um pouco de material fundido proveniente do impacto, as rochas estão bem deterioradas, por isso a equipe precisou continuar procurando melhores visões da história do impacto da Lua.

Montanha de fogo congelado

Felizmente, foi encontrada uma assinatura de magnésio na Cratera Yerkes de 35 quilômetros de extensão, situada dentro do Mare Crisium. O impacto foi tão forte a ponto de formar o que chamamos de pico central, feito de detritos que fluíram em forma líquida e depois se solidificaram como um amontoado no meio da cratera. Suas digitais espectrais sugerem que essa torre manteve grande parte das rochas derretidas do impacto do Mare Crisium fora do alcance do mar de lava que, por fim, inundou o leito da bacia.

Há a possibilidade de que esse material derretido provenientes do impacto sejam derivados da própria formação da Yerkes e não da maior, que formou o Mare Crisium, conta Neal. Mas se a equipe estiver certa, uma missão a Yerkes pode revelar de uma vez por todas a idade de um segundo mar lunar. Se tiver 3,9 bilhões de idade, assim como o Mare Imbrium, a ideia de um antigo pico de atividade de impactos com meteoros se sustenta. Por outro lado, se for muito mais antiga, sugere que os enormes impactos foram mais intervalados.

No caso de uma tempestade de meteoros mais disseminada, somente partes da Terra teriam se tornado desertos biológicos. Mas um pico de atividade concentrado pode ter derretido por completo a crosta do planeta e deixado a atmosfera repleta de vapores de silicato, conta o coautor do estudo, Dan Moriarty. Se isso ocorreu quando a vida surgiu, conta ele, então é realmente admirável a existência de seres vivos na Terra.

Apesar de os resultados dessa pesquisa oferecerem alguma contribuição, até que seja realizada uma visita ao Mare Crisium e aos outros mares lunares, os primeiros dias do Sistema Solar continuarão sendo um mistério.

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