A receita do estado da Baja California para salvar comunidades pesqueiras

As populações de peixes despencam em outros lugares, mas, o estado mexicano, as comunidades limitam a pesca para manter estoques fartos e preservar um modo de vida.

Por Erik Vance
fotos de Thomas P Peschak
Publicado 8 de nov. de 2017, 20:36 BRST, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Um turista em um barco na Laguna San Ignacio tenta tocar em uma baleia-cinzenta, das muitas ...
Um turista em um barco na Laguna San Ignacio tenta tocar em uma baleia-cinzenta, das muitas que vão à baía para se acasalar e criar os filhotes. Outrora temidas pelos pescadores, as baleias 78 amistosas agora são uma parte vital da economia. Esta foto foi originalmente publicada em “Gestores do mar” em setembro de 2017.
Foto de Thomas P Peschak

Esta reportagem está na edição de setembro da revista National Geographic Brasil.

Falta meia hora para o sol nascer, e o mar é uma tinta preta lambendo a areia. Uns dez pescadores batem papo na sala do capitão do porto em Punta Abreojos, riem e comentam sobre a festa que haverá essa noite.

A animação é grande nessa localidade costeira do estado mexicano de Baja California, pois hoje é um dia do ano muito esperado: o início da temporada do abalone. Na verdade, a temporada começou faz quatro meses, mas Punta Abreojos segue uma singular proibição autoimposta. Em vez de começar a pescar em janeiro, conforme a permissão do governo, a comunidade aguarda até abril, quando esses moluscos já ganharam peso.

Entro no Pacífico com três pescadores cinquentões que atuam juntos desde a adolescência. “Cavalo” opera o motor, “Toupeira” iça os sacos de abalone e “Peixe”, naturalmente, mergulha. (Eles se chamam Porfirio Zúñiga, Eduardo Liera e Luis Arce, mas todo mundo os trata pelo apelido.)

Peixe é o mais esfuziante: acaba de voltar de Pebble Beach, Califórnia, onde surfou e jogou golfe. Os amigos zoam quando ele veste uma roupa de mergulho novinha. O sol está alto. Antes de o barco chegar ao seu local de pesca, Cavalo para perto de um recife abarrotado de abalones. “Estes são abalones ‘verdes’. Só vão estar prontos daqui a um mês, no mínimo”, explica.

Algumas milhas depois, Peixe pula na água. Em duas horas, ele atinge o limite de pesca e sobe, sorridente, com um saco lotado de abalones sadios. Na maioria das cidades pesqueiras do México – aliás, em boa parte do resto do mundo em desenvolvimento –, homens como ele obtêm um butim exíguo em águas exauridas, e mal conseguem se sustentar. O que explica o otimismo desses homens com a temporada que começa? Como eles podem se dar ao luxo de um novo traje de mergulho e férias em resorts de golfe?

A cooperativa de pesca local surgiu em 1948 e, durante anos, funcionou como as outras: extraindo do mar tudo o que pudesse. Nos anos 1970, porém, depois de temporadas decepcionantes, os pescadores decidiram tentar algo novo: um manejo de longo prazo das lagostas (e, mais tarde, dos abalones), em vez de buscar lucros imediatos.

Hoje, Abreojos e outras comunidades de Baja que seguem a mesma estratégia apanham mais de 90% dos abalones no México. As casas têm pintura nova. A cidade possui um time de beisebol e uma equipe de surfe. As lagostas e os abalones são enlatados em uma fábrica nova e vendidos diretamente à Ásia para maximizar os lucros. As águas são vigiadas por radar, barcos e aviões. Os pescadores aposentados recebem pensão.

Talvez o melhor representante desse sucesso seja Zacarías Zúñiga, de 67 anos. O seu pai ajudou a fundar a cooperativa, mas tinha dificuldade para preencher a sua cota diária de pescado. Zúñiga trabalha como especialista em controle de qualidade na fábrica de enlatados. Graças a uma bolsa de estudo para a universidade oferecida pela cooperativa, o seu filho é professor de ciência da computação. “Aqui, todo mundo trabalha e, ao mesmo tempo, é dono”, diz ele. Punta Abreojos não é a única história de sucesso nessa parte do México. Em todo o mundo, populações de peixes despencam, e espécies fundamentais como atum e garoupa revelam-se ainda mais escassas. Contudo, no noroeste do México, áreas de proteção marinha foram criadas pelas comunidades ou com o apoio delas – e isso, para muitos ambientalistas, é a chave para o êxito em conservação. A estratégia mexicana dá lições para as populações pesqueiras de outros países.

A história da pesca em baja é uma saga de altos e baixos. Quando o escritor John Steinbeck esteve na península em 1940, fascinou-se pela incrível biodiversidade: cardumes imensos de arraias-jamanta, leitos de ostras perlíferas e tantas tartarugas que os mais velhos da região dizem que era possível cruzar o oceano apenas andando sobre a carapaça delas. Mas, duas décadas mais tarde, o homem tinha dizimado os leitos de ostras selvagens e encontrado os limites. Depois disso, voltou-se para tartarugas, atuns, tubarões e garoupas e mais de uma dezena de outras espécies.

Para piorar as coisas, durante décadas o governo mexicano incentivou trabalhadores desempregados a se tornarem pescadores, em um programa intitulado Marcha para o Mar. No sul de Baja, que só se tornou estado mexicano em 1974, essa mentalidade gerou uma cultura da autossuficiência que ainda persiste. “As pessoas estão acostumadas a fazer as coisas por conta própria. Não ficam esperando ações do governo”, diz Octavio Aburto, biólogo marinho do Instituto Scripps de Oceanografia que há 20 anos estuda os peixes de Baja. Nascido na Cidade do México, Aburto veio para a região nos anos 1990 e se apaixonou pela sua simpática cultura de pescadores. 

Confira a reportagem completa: da revista National Geographic Brasil.
Publicada por ContentStuff.

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