Imagens sensíveis capturam um mundo em pausa devido ao novo coronavírus
Isolados em casa, de Nova York a Nairóbi, os fotógrafos da National Geographic concentram-se nas famílias, nas ruas vazias e em passeios pela natureza.
Publicado 29 de mar. de 2020, 09:00 BRT

MILÃO, ITÁLIA
“Na Itália, a situação é triste e descontrolada, e eu estou no epicentro da tempestade, a Lombardia”, diz o fotógrafo Luca Locatelli. “Os mais vulneráveis são os idosos, como minha mãe, uma avó italiana teimosa, difícil e adorável de 82 anos. Ela não consegue entender esse tsunami invisível que não deixa ninguém entrarem contato com ela. É triste para mim não deixá-la ver seus sobrinhos, não abraçá-la e tentar convencê-la a usar uma máscara. Trago a comida dela e minha câmera. Após 10 dias, tornou-se nosso ritual e nossa realidade.”
Foto de Luca LocatelliBAHIA, BRASIL
“Aqui no sul da Bahia não há estrutura para essa crise. As pessoas continuam vivendo suas vidas normalmente, indo à praia, respeitando a distância às vezes”, diz a fotógrafa Luisa Dörr. ”[Os baianos] são muito resilientes, foram criados na floresta, trabalharam a vida inteira em condições adversas. Eles dizem que não é o vírus que irá matá-los. Eles também são muito religiosos e a maioria deles acredita fielmente que Deus os protegerá.”
Foto de Luisa DörrKUALA LUMPUR, MALÁSIA
“Adoro essa vista da minha janela”, diz o fotógrafo britânico-malaio Ian Teh. “Mas o barulho trai essa imagem tão pacífica: o zumbido do tráfego de uma rodovia próxima ainda pode ser ouvido. [Mas durante] o isolamento, os pássaros cantam do lado de fora ou há apenas silêncio. Ambos são um lembrete da grave situação. Só saímos para comprar alimentos ou medicamentos. Trabalhos e projetos desapareceram ou foram adiados. Sinto-me feliz por poder compartilhar esse tempo com minha parceira em casa. Tentei ver a situação como uma oportunidade de fazer coisas para as quais eu nunca tinha tempo, desde conversar com amigos e familiares distantes por vídeo até cozinhar e meditar.”
Foto de Ian TehNOVA YORK, ESTADOS UNIDOS
“Ontem, minha vizinha de 82 anos, Barbara, me pediu para ajudar a configurar uma chamada no Zoom em seu iPad para a aula de pilates”, diz o fotógrafo Ismail Ferdous. “Ela frequenta essas aulas com a mesma instrutora há mais de três décadas, e foi a primeira vez que Barbara teve que participar remotamente, de seu apartamento em Manhattan. Quando precisou de pesos, ela improvisou e usou [latas de] feijão. ”
Foto de Ismail FerdousMILÃO, ITÁLIA
“Minha resposta instintiva à situação é encontrar beleza no que me cerca, redescobrindo minha casa e sua poesia através da fotografia e do vídeo”, diz a fotógrafa milanesa Camilla Ferrari, que não sai de casa desde 9 de março. “Acredito que esse processo forçado de desaceleração revelará em breve como nosso comportamento afetou a Terra e os outros humanos. Estou tentando me manter o mais otimista possível lendo, pesquisando, meditando e tirando fotos.”
Foto de Camilla FerrariPORTLAND, ESTADOS UNIDOS
“Acabei de chegar de fora do estado e é difícil não me preocupar com a possibilidade eu de estar carregando um vírus adormecido”, diz o fotógrafo Corey Arnold. “Espero transformar minha nova incapacidade de viajar em algo positivo, com mais tempo com a minha família. Minha parceira, Aly Nicklas, e eu moramos em Portland com nosso filho de seis semanas, Wolfgang. Normalmente, viajo para fora do estado pelo menos duas vezes por mês para trabalhar, mas agora, em quarentena em casa, me vejo documentando uma crise econômica e de saúde que se aproxima em um futuro não tão distante.”
Foto de Corey ArnoldGOTEMBURGO, SUÉCIA
“Na primeira manhã de isolamento voluntário, uma inesperada luz surgiu na parede do apartamento do meu parceiro perto de Gotemburgo, na Suécia”, diz a fotógrafa Acacia Johnson. “Desde que iniciamos o nosso isolamento voluntário, me vi fotografando da maneira que fotografava quando peguei uma câmera pela primeira vez na adolescência — procurando por uma mágica silenciosa no cotidiano. Neste momento de incerteza, é reconfortante reconhecer a beleza nos pequenos detalhes ao nosso redor.”
Foto de Acacia JohnsonCALIFÓRNIA, ESTADOS UNIDOS
“É ótimo desacelerar e passar tanto tempo juntos em família, mas isso também pode nos deixar loucos”, diz Ivan Kashinsky, que, com sua esposa fotógrafa, Karla Gachet, passa diversas horas com suas filhas pequenas. “A nossa salvação tem sido a natureza. Fazemos uma longa caminhada noturna todos os dias e as trilhas parecem esvaziar nossas mentes. A fotografia é outra forma de terapia. Eu tenho documentado nossas vidas com meu celular enquanto seguimos em direção ao desconhecido.”
Foto de Ivan Kashinsky And Karla GachetMIAMI, ESTADOS UNIDOS
“Na verdade, vejo um outro lado nessa crise, o fato de o mundo inteiro ter parado”, diz a fotógrafa Maggie Steber. “Estou aproveitando o tempo para trabalhar em um projeto em andamento: coletando itens do meu jardim e observando as atividades de lagartos, abelhas e esquilos. Hoje eu vi um confronto entre lagartos que terminou em briga! Por mais preocupada que eu esteja com o mundo, o trabalho e a vida em geral, esse hiato também me deu calma.”
Foto de Maggie SteberTEERÃ, IRÃ
“Os fotógrafos tradicionais já são desafiados pela maneira como capturam o mundo virtual e tudo o que acontece nele. Com o coronavírus, eu também me sinto fisicamente desafiada”, diz a fotógrafa de Teerã Newsha Tavakolian, que furou a própria quarentena para fotografar imagens assustadoras em sua cidade natal. “Meu compromisso é contar histórias, mas muitas vezes são histórias de outras pessoas. Desta vez, o que está acontecendo também diz respeito a mim.”
Foto de Newsha TavakolianISTAMBUL, TURQUIA
“Preocupo-me com o futuro do meu trabalho como fotógrafa freelancer que depende de viagens e trabalhos no exterior”, diz Rena Effendi, de Istambul. “Viajei para cerca de 20 países no ano passado a trabalho e estou gostando de ficar um tempo parada em casa com a minha filha. O bairro em que moro, Gihangir, não é um lugar tão ruim para cumprir quarentena. Há diversos pequenos mercados e tudo o que precisamos está a uma curta distância.”
Foto de Rena EffendiNAIRÓBI, QUÊNIA
“Com a incerteza, surge uma conscientização mais profunda, não apenas das curvas parabólicas inconstantes dessa pandemia, mas pelas minúcias da vida cotidiana”, diz a fotógrafa Nichole Sobecki. “Os gaviões que voam pelo bairro, o calor do solo sob nós, momentos tranquilos juntos. Passei boa parte da década passada apenas como espectadora, conforme hotéis, aeroportos e refeições apressadas se misturavam em uma linha de movimento contínuo. Agora, com todas as viagens adiadas, o tempo se estende. Preocupo-me com a situação no Quênia, o país que escolhi para viver, quando a tempestade atingir com força. O país é um lugar vibrante, mas sofre com a enorme desigualdade.”
Foto de Nichole SobeckiTÓQUIO, JAPÃO
Para a fotógrafa sueca Loulou D’Aki, que mora na Grécia, passar um tempo no Japão durante o surto de coronavírus envolveu várias coisas. “Estar longe das minhas duas casas, a que eu escolhi e a minha terra natal, foi bastante cansativo do ponto de vista emocional”, diz ela. “Eu acompanhava as notícias e conversava com amigos e familiares, mas em tempos de crise como esse, parecia errado estar sozinha do outro lado do mundo. O Japão teve uma maneira muito diferente de lidar com uma situação como essa. Quando cheguei, eles já haviam descoberto como manter a pandemia afastada. Por um lado, isso me ajudou a me sentir calma, mas bastante solitária também.” D'Aki fotografou esta imagem de mulheres com máscaras no bairro de Jimbocho, em Tóquio, antes de retornar à Suécia no fim de março.
Foto de Loulou d'AkiBARCELONA, ESPANHA
“Um fotógrafo é fotógrafo 24 horas por dia durante o ano todo, não apenas durante um trabalho”, diz Paolo Verzone, que fotografou a academia improvisada que montou no andar de cima de sua casa em Barcelona. Sinto-me perfeitamente confortável documentando a vida em quarentena da minha cozinha ou de uma sala de 20 metros quadrados. É a mesma coisa como se eu estivesse no meio de um deserto com uma vista mágica.”
Foto de Paolo Verzone