Microplástico encontrado espalhado pelas profundezas do oceano

A descoberta é mais uma prova de que o plástico permeia nossos oceanos.

Por Laura Parker
Publicado 6 de jun. de 2019, 18:18 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Esta reportagem foi produzida em parceria com a National Geographic Society.

Há anos cientistas tentam contabilizar a quantidade de resíduos plásticos nos oceanos da Terra com base em estimativas que medem a quantidade que atinge os mares anualmente. Até o momento, a contabilização aponta grandes concentrações na superfície e em águas costeiras. Mas boa parte do montante total continua "desaparecida".

E cientistas não conseguem avaliar os danos que os plásticos causam ao meio ambiente até saberem onde eles estão. Agora, uma nova pesquisa realizada próximo à costa da Califórnia sugere um reservatório ainda maior de plásticos: nas águas da zona pelágica, o maior habitat da Terra.

Cientistas do Instituto de Pesquisas do Aquário da Baía de Monterey encontraram altas concentrações de microplásticos na Baía de Monterey – um ecossistema marinho em um cânion profundo banhado pela corrente da Califórnia, que flui desde a costa da Columbia Britânica, no Canadá, até o litoral do estado mexicano da Baja Califórnia.

A conclusão do estudo publicado quinta-feira na revista científica Scientific Reports, é a de que esse depósito profundo de pequenos resíduos plásticos "se estende muito além, ocupando uma área mais extensa nas águas, nos sedimentos e nas comunidades de animais em alto mar". Esse trabalho é mais um entre os diversos realizados por cientistas em busca do plástico "desaparecido" nos oceanos.

"Encontramos microplásticos em todos os lugares que procuramos, em todas as amostras e espécimes que analisamos", diz Anela Choy, professora de oceanografia do Scripps Institution of Oceanography em San Diego, e principal autora do artigo.

A palavra pelágico é derivada do grego antigo e significa 'aberto'. A zona pelágica é o "mar aberto", que se estende ao longo de mais de 137 milhões de quilômetros cúbicos. Embora microplástico tenha sido encontrado em todos os oceanos, da superfície à mais profunda fenda no leito oceânico, atividades para avaliar a densidade dos microplásticos na zona pelágica são difíceis e requerem altos investimentos.

Este larvacea é um outro tipo de animal que vive nas profundezas e que, involuntariamente, transporta microplásticos ao fundo do mar.
Foto de Monterey Bay Aquarium Research Institute

Animais transportam o plástico

Choy e sua equipe também encontraram evidências que confirmam que pequenos animais que se alimentam filtrando a água, como caranguejos-vermelhos e organismos em formato de girino conhecidos como larvaceas gigantes, transportam microplásticos ao longo da coluna d'água, introduzindo partículas de plástico em alimentos marinhos, de águas mais rasas ao leito do oceano nas profundezas.

Os caranguejos e larvaceas estão entre os cerca de 700 organismos marinhos que consomem microplásticos. Além disso, ambos podem espalhar minúsculos pedaços de plástico pela coluna d'água, de acordo com Kakani Katija, bioengenheira do Aquário e uma das autoras do estudo. Os caranguejos, encontrados em grande quantidade próximo à superfície, servem de alimento a peixes maiores, como o atum.

Os larvaceas produzem filtros na mucosa conhecidos como "casa" ou "bolha", que expandem o animal, que fica mais ou menos do tamanho de um bolinho, e coletam material orgânico, incluindo plástico. Quando os filtros ficam sobrecarregados, eles são liberados pelos larvaceas. E eles são consumidos por outros animais marinhos conforme afundam até o leito oceânico. Os larvaceas também transportam partículas de plástico em águas profundas, expelindo-as em grânulos fecais que rapidamente afundam, carregando pedaços de plástico.

As novas descobertas sobre organismos marinhos complementam uma pesquisa que ambas as cientistas publicaram em 2017 sobre a capacidade dos larvaceas de transportarem microplásticos até o fundo do mar. Naquele estudo, elas injetaram pequenos grânulos de plástico na água ao redor dos larvaceas e observaram os grânulos serem ingeridos por eles. No novo estudo, a equipe não alimentou caranguejos ou larvaceas.

"O que aprendemos com os animais que coletamos é que eles já estavam ingerindo plástico no meio ambiente", afirma Katija, que também é Exploradora da National Geographic.

Para surpresa da equipe, as cientistas descobriram uma forte ligação entre as partículas na coluna d'água e as partículas encontradas nos caranguejos-vermelhos e nos filtros descartados pelos larvaceas.

"As partículas eram de tipos similares e tinham tamanhos parecidos", afirma Choy.

101 | Plástico
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Amostras coletadas por ROVs

A equipe de Choy utilizou veículos submarinos operados remotamente para coletar amostras de dois locais nas profundezas, que variaram de cinco a mil metros abaixo da superfície. As amostras foram coletadas próximo da costa, mas a maioria foi obtida a uma distância de um pouco mais de 80 quilômetros da costa, nas águas profundas do Cânion de Monterey.

As cientistas encontraram concentrações maiores do que as concentrações de microplásticos que se acumulam na Grande Faixa de Lixo do Pacífico, uma ilha de lixo que flutua na superfície do oceano. A maior parte dos microplásticos encontrada no novo estudo tem como origem o politereftalato de etileno (PET), comumente utilizado na fabricação de plásticos descartáveis.

Marcus Eriksen é um dos fundadores do 5 Gyres Institute, um instituto sem fins lucrativos batizado em homenagem aos cinco principais giros oceânicos, e afirmou que a descoberta não é uma surpresa. Ele é um dos autores de um estudo de 2015 que estimou que o número de microplásticos no oceano varia de 15 a 51 trilhões de unidades, que pesam entre 93 mil e 236 mil toneladas. Ele não participou do estudo em Monterey.

"Faz sentido o fato de terem sido encontradas concentrações de microplásticos no fundo do oceano", afirma ele. "O que não se sabe é quanto tempo os microplásticos podem ficar na coluna d'água já que eles são levados por correntes mais profundas a todos os cantos do mundo".

Os cientistas sabem que alguns plásticos possuem densidade menor e outros maior do que a água, o que significa que alguns afundam mais rapidamente enquanto outros boiam.

"Acredito que a maior parte dos plásticos esteja próximo da superfície e que os plásticos mais pesados afundam logo após serem despejados no mar", afirma Eriksen.

"Modelos iniciais da distribuição vertical sugerem que metade dos plásticos nos oceanos se localiza em até um metro da superfície, sendo que o restante desce lentamente na vertical e se move horizontalmente por centenas de quilômetros. Certamente, no fim [do século], a maioria dos resíduos plásticos do mundo estará no fundo do mar, constituindo um material definidor para o Antropoceno."

Os microplásticos de Monterey estavam "altamente desgastados", sugerindo que haviam sido despejados no oceano há meses ou anos, concluiu a equipe de Choy. A equipe encontrou muito pouco dos tipos de plástico utilizados na fabricação de materiais de pesca, sugerindo ainda que os microplásticos na coluna d'água profunda foram transportados até lá por correntes oceânicas.

A equipe concluiu que, como é previsto um aumento nos resíduos plásticos ao longo do restante do século, os esforços de mitigação devem considerar "a enorme escala espacial (horizontal e vertical) e ecológica do problema, revelado por essas novas descobertas".

Choy alertou que trabalhos no leito oceânico precisam ser realizados em todo o mundo para determinar a extensão da saturação de microplásticos em águas profundas. "É uma questão em aberto. Trata-se de um estudo e muito trabalho. Mas as descobertas precisam ser replicadas por outros em outras partes do oceano para verificar se elas se sustentam", afirma ela. "É provável que haja muita variabilidade devido a alterações nos ecossistemas. Quanto mais dados tivermos, maior capacidade teremos de entender o motivo."

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