Terremotos podem atrapalhar baleias a encontrarem alimento

Em 2016, um terremoto de grandes proporções acabou com comunidades inteiras de animais, e teve impactos que reverberaram por toda a cadeia alimentar.

Por Joshua Rapp Learn
Publicado 8 de fev. de 2020, 08:30 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
As baleias cachalotes são conhecidas por mergulharem até mil metros de profundidade em busca de lulas, ...
As baleias cachalotes são conhecidas por mergulharem até mil metros de profundidade em busca de lulas, chegando a prender a respiração por 90 minutos.
Foto de Flip Nicklin, Minden Pictures/Nat Geo Image Collection

Terremotos podem perturbar, por até um ano, a capacidade das baleias cachalotes de caçarem, de acordo com o primeiro estudo a analisar os efeitos dos tremores nos mamíferos marinhos.

Em 14 de novembro de 2016, o terremoto de magnitude 7,8 em Kaikoura abalou a Ilha Sul da Nova Zelândia, causando um tsunami destrutivo, bem como duas mortes e dezenas de feridos. Sob a superfície, o evento sísmico gerou fortes correntes que devastaram e, sobretudo, aniquilaram diversos ecossistemas de invertebrados que viviam no cânion submarino de Kaikoura. O imenso deslizamento de terra não só deixou a água turva, como também levou os animais a centenas de quilômetros de distância e é provável que tenha causado a reorganização de todo o ecossistema.

Como consequência, os cachalotes tiveram que mergulhar mais fundo e por mais tempo para encontrar comida — uma “importante mudança” de comportamento, diz a coautora Liz Slooten, bióloga marinha da Universidade de Otago, na Nova Zelândia.

Slooten estava estudando as baleias cachalotes na área de  Kaikoura com a doutoranda e autora principal do estudo Marta Guerra quando o terremoto ocorreu. As cientistas viram isso como uma rara oportunidade de pesquisar como um desastre natural em grande escala pode afetar os cachalotes, que são considerados vulneráveis à extinção pela União Internacional para a Conservação da Natureza.

Os cachalotes (na foto, na Nova Zelândia) podem ser identificados por pequenas diferenças no tamanho, formato ou cor da cauda.
Foto de Flip Nicklin, Minden Pictures/Nat Geo Image Collection

“Estávamos no lugar certo na hora certa” acrescenta o coautor do estudo Will Rayment, professor sênior de ciências marinhas da Universidade de Otago. “Não dá para planejar uma coisa dessas.”

O impacto dos terremotos nos animais terrestres foi bem documentado, mas os cientistas sabem relativamente pouco sobre o que acontece debaixo da água. Uma pesquisa recente sobre tubarões do Caribe, por exemplo, revelou que os peixes submergem a grandes profundidades para fugir das águas turbulentas da superfície durante os terremotos.

Essa pesquisa é importante para as agências governamentais, que podem precisar levar os recentes terremotos em consideração ao determinar cotas de pesca, observa Rochelle Constantine, ecologista de mamíferos marinhos da Universidade de Auckland que não participou do estudo.

Mais a fundo

O cânion submarino de Kaikoura, parte de uma região costeira montanhosa, chega a atingir 800 metros de profundidade, não muito longe da costa. “Há somente mais dois locais no mundo onde é possível ver baleias cachalotes tão perto da costa,” conta Slooten, cujo estudo foi publicado recentemente no periódico Deep Sea Research Part I: Oceanographic Research Papers.

Os trechos superiores do cânion são repletos de animais invertebrados, fornecendo alimento para lulas e peixes que vivem no fundo do mar, os quais compõem a dieta dos cachalotes.

Dessa forma, quando o fenômeno arrebatador exterminou essas formas de vida menores, “causou graves consequências na comunidade à sua volta,” conta Rayment. “Esse efeito percorreu toda a cadeia alimentar.”

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    Como parte de seu estudo em andamento, os cientistas estavam monitorando 42 baleias individuais, que foram identificadas por suas barbatanas caudais singulares. Após o terremoto, a equipe utilizou hidrofones direcionais para sintonizar os sons dos cetáceos e, em seguida, se dirigiu de barco à origem do som.

    Quando estavam perto das baleias, os cientistas cronometravam quando os animais vinham à tona para respirar e descansar entre os mergulhos. Ao todo, registraram dados de 40 baleias, mostrando que a abundância de baleias na área geral não mudou depois do terremoto. No entanto as baleias modificaram a forma como usavam seu habitat.

    Os resultados revelaram que os cachalotes passavam cerca de 25% mais tempo na superfície entre os mergulhos em busca de alimentos do que antes do terremoto. Slooten diz que isso sugere que as baleias estavam armazenando mais oxigênio e recarregando seus músculos para dar mergulhos mais longos ou mais profundos — provavelmente porque havia menos presa disponível.

    Sustentando essa teoria, está o fato de que, antes do terremoto, as baleias frequentemente concentravam sua caça na parte superior do cânion. Mas posteriormente, as baleias abandonaram quase completamente essa área e foram se aventurar nas partes mais profundas do cânion.

    “Agora elas têm um alcance muito maior e claramente estão se movendo de forma bem diferente para encontrar presas”, diz Constantine, acrescentando que essa área é uma importante zona de alimentação para cachalotes machos adolescentes.

    Recuperação

    Um ano após o terremoto, os pesquisadores observaram que as baleias estavam voltando aos antigos intervalos de respiração na superfície — talvez porque os sedimentos haviam se assentado e a comunidade de invertebrados começou a se recuperar.

    “Isso nos dá uma ideia de como essas comunidades do fundo do mar são resilientes”, diz Rayment.

    Mas ele e seus colegas continuarão o monitoramento de longo prazo para ver se há efeitos que ainda não foram identificados. A atividade dos cachalotes na área já havia diminuído, embora não se saiba a causa, que pode incluir alterações naturais na quantidade de presas, turismo de observação de baleias, pesca ou aumento das temperaturas do oceano.

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