A virada do ano afeta a nossa mente?

Você já ouviu falar na síndrome de fim de ano? Psicólogos explicam como a sensação de término de ciclo pode impactar a saúde mental.

Multidões engolem a Broadway na véspera de Ano Novo (1964).

Foto de George F. Mobley
Por Redação National Geographic Brasil
Publicado 26 de dez. de 2022, 16:00 BRT

A chegada das festas de fim de ano costuma suscitar sentimentos controversos. Há quem se emocione com a possibilidade de encontrar com gente que não conviveu muito; há os interessados nos festejos, brindes e trocas de presentes; e existe também quem se sinta pressionado pela ideia de fim de ciclo e tudo que ela significa. 

“Depois de um tempo de muita dor, sofrimento, restrição e medo causados pela Covid-19, esse fim de ano vai ser um momento em que a gente volta, um pouco, aos nossos antigos costumes das festas, das comemorações, de encontrar pessoas. O que é algo váliosíssimo”, comenta o psicólogo Yuri Busin, especialista em neurociência comportamental e professor na Universidade Presbiteriana Mackenzie, de São Paulo. 

Para Busin, mesmo para quem não vai comemorar a virada em algum festejo, 2023 pode significar esperança de tempos melhores, o que é um sentimento importante para a mente humana. “A passagem de um ano para o outro causa muitas reflexões que não ocorrem no dia a dia – e isso pode ser benéfico ou não”, adianta Busin, que reforça como essa “mudança” no calendário tem efeitos psicológicos sobre o cérebro.

A virada de 2022 para 2023, em especial, acontece em um contexto no qual a prevalência global de ansiedade e depressão aumentou 25% no primeiro ano da pandemia, de acordo com um resumo científico da Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgado em março de 2022. E os impactos na saúde mental desse simples avançar no calendário pode colaborar para a chamada síndrome do fim de ano. 

O que é a síndrome de fim de ano?

O que acontece, então, com a mente se esse “balanço” sobre o que passou acaba ficando mais negativo do que positivo? 

“A gente tem problemas e quando o ano acaba, e eles não são resolvidos, entramos em uma fase de autocobrança que pode até levar a melancolia”, diz Saulo Velasco, psicólogo e professor da The School of Life, e especialista em métodos de ensino de habilidades cognitivas complexas (como a resolução de problemas).

Velasco relata que esses sentimentos são conhecidos como a síndrome de fim de ano, ou “dezembrite” (outra forma pela qual é conhecida), em que sensações de tristeza e de insuficiência são potencializadas pela data e por uma pressão de se sentir feliz, realizado e com planos renovados. “Por conta disso, é comum episódios de ansiedade e depressão, com muitos medos e decepções potencializadas”, explica o especialista.

O que significa a virada de ano para a mente?

Há quem veja o fim do ano com preocupação e anseio por objetivos não alcançados – e o dia 31 de dezembro é a materialização dessa ansiedade em relação ao desempenho passado e ao que esperar do futuro.

Para Saulo Velasco, o jeito como entendemos o tempo está ligado ao porquê o fim do ano impacta tanto o lado psicológico.  “A gente pensa muito em ciclos. É uma forma de funcionamento do nosso cérebro que tem influência cultural. A virada do ano é encarada como o fim de um desses ciclos, o encerramento de um conjunto de oportunidades”, diz Velasco. 

“É interessante pensar que mesmo que nenhuma mudança biológica ou social de importância realmente aconteça, a troca de ano é um grande marco que causa reflexões sobre o que aconteceu, o que deixou de acontecer, promessas cumpridas ou não, perdas e ganhos”, afirma Velasco. “Nosso cérebro faz um grande balanço do que vivemos nos últimos 365 dias, o que pode nos trazer felicidade ou tristeza a depender do que aconteceu.”

Mulheres praticam ioga ao ar livre após um piquenique no Palácio Chihilsitoon no início do ano novo em Cabul, Afeganistão

Foto de Kiana Hayeri

Promessas de fim de ano ajudam ou atrapalham?

Os especialistas alertam que as promessas e objetivos traçados na virada do ano, muito comuns nessa época, podem potencializar os sentimentos ruins de fim do ciclo. “Isso porque as pessoas se sentem decepcionadas consigo mesmas por não terem alcançado os objetivos que se colocaram, insatisfeitas com o próprio desempenho”, afirma Velasco. 

Outro fator que contribui para essa autocobrança, segundo Velasco, é a configuração do trabalho contemporâneo em que há muita pressão pela produtividade. Para ele, a pessoa não consegue se desvincular da pressão das demandas “que não estão sob o controle dela”. “Por exemplo, não posso prever a quantidade e dificuldade das tarefas que meu chefe vai solicitar, mas eu já me preocupo com isso, mesmo não tendo como resolver nada no momento”, explica. 

A dica para diminuir a autocobrança, inclusive perto da virada de ano, é – para Velasco – entender que muitas coisas não dependem apenas do indivíduo. “Tivemos dois anos estagnados por conta da pandemia e muitos objetivos não foram alcançados por isso, e não por uma falha pessoal”, ressalta. 

Já Busin diz que expectativas irreais também são parte do problema para fomentar a síndrome do fim de ano. “Começar o ano pensando que conseguirá fazer tudo diferente – ou melhor – também não é a solução porque, muitas vezes, as pessoas colocam metas inatingíveis e se decepcionam quando não as cumprem.”

Por isso, os especialistas recomendam que para o fim do ano não cause essa decepção, é necessário fazer ajustes das expectativas à realidade e ter a clareza de que nem tudo está sob controle. 

(Você pode se interessar: A Covid-19 pode desencadear depressão?)

Veja algumas dicas para evitar a pressão do fim do ano

Para Busin, traçar objetivos menores a fim de alcançar objetivos maiores pode ajudar. “Tente delimitar metas que você realmente vai conseguir cumprir e acompanhe seu progresso. Por exemplo, não coloque que você quer perder 30 quilos no próximo ano, e sim que você quer ser mais ativo, quer diminuir o consumo de doces, ter mais hábitos saudáveis”, recomenda o psicólogo. 

Outras formas, segundo Busin, de cuidar da saúde mental durante as festas de fim de ano são: 

  • Evite comparar seus resultados com os de outras pessoas. “Muitas vezes esquecemos de considerar os processos de cada um e nos colocamos para baixo. Busque, ao invés disso, usar o exemplo como inspiração.”
  • Reflita sobre suas conquistas e exercite a gratidão. “Não foque no que você não conseguiu realizar e sim nos desafios que você superou”.
  • Tenha compreensão com seus limites e, se não está feliz com o agora, reflita sobre o que você pode mudar. “Temos que tomar cuidado com os pensamentos cruéis de nós mesmos. Tenha em mente que não é possível mudar o passado, mas o futuro sim. Uma pequena mudança de comportamento já pode significar melhoras para o próximo ano.”

Velasco complementa que, para evitar a melancolia do fim de ano, é recomendado investir no autocuidado em 2023. “Quanto mais fortalecemos e cuidamos da nossa saúde mental, menos ficamos suscetíveis à pressão dessa época”, diz.  

Em suma, já que nossa mente entende a virada como um novo ciclo, também é possível tomar novas atitudes que tragam bem-estar.

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