Amazônia: semanas depois de “dia do fogo”, floresta ainda queima no Pará

Sobrevoo mostra que queimadas ainda consomem regiões próximas ao evento organizado por fazendeiros em 10 de agosto na Floresta Amazônica. Cidade de Novo Progresso ainda não tem efetivo para combater os incêndios.

Por Juliana Arini
Publicado 28 de ago. de 2019, 17:53 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT

Novo Progresso - Pará | As curvas dos rios Jamanxim cortam a floresta com cachoeiras e praias de areia branca. Ipês amarelos pontuam a paisagem coberta por um intenso verde. Ao norte, acima da serra do Cachimbo, no Pará, uma fina névoa começa a transformar lentamente o cenário.

Do avião é possível sentir o cheiro de madeira queimando. Aos poucos, a visão abaixo torna-se desoladora. Árvores tombadas, chamas, cinzas e fumaça consomem a Amazônia.

A Floresta Nacional do Jamanxi, no município de Novo Progresso (PA), é uma das mais afetadas pelas queimadas que bateram recordes em 2019 em todos os biomas do país. Em um sobrevoo pela região, na segunda-feira (26/08), a fumaça ainda é tão intensa que o piloto perdeu a visão e precisou voar apenas com apoio de instrumentos.

“Este ano realmente tem muito mais fogo, faz tempo que não via essa situação”, diz o comandante Jairo Gomes. A vista revela uma verdade inconveniente: muitos dos mais de oito mil focos de calor do estado do Pará seguem sem qualquer controle, mesmo depois de algumas poucas chuvas.

Em sobrevoo realizado na segunda-feira (26/08), na região do sudoeste do Pará, ainda é possível ver fumaça. Enquanto isso, fazendeiros e agência ambiental trocam acusações sobre os culpados pelos incêndios.
Foto de Juliana Arini

Na sede do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) de Novo Progresso, a notícia é de que não há equipes da Força Nacional na região. Tampouco há qualquer previsão de que o escritório local receba algum tipo de reforço. Proibidos de conceder entrevistas sem autorização de Brasília, o grupo de menos de três pessoas responde laconicamente que segue com as suas atividades cotidianas. A pouco menos de 300 km, três unidades de conservação ardem em chamas sem qualquer batalhão de combate atuando.

Apesar de ser possível avistar vários focos de incêndio próximos a novas pastagens, muitos negam que os incêndios no município tenham sido criminosos. “Foi uma bituca de cigarro jogada na estrada”, diz o atendente do hotel. “São as faíscas dos pneus dos caminhões”, explica a dona da lanchonete. E terminam com a mesma frase: “É um grande escândalo das ONGs e dos europeus, incêndio sempre existiu na Amazônia”.

No entanto, o Ministério Público Federal do Pará (MPF) investiga a situação que parece comover o mundo, menos essa pequena parte do país. Em 7 de agosto, uma denúncia à procuradora do MPF revelou que poderia acontecer um “dia do fogo” em Novo Progresso. No dia 12, o mesmo escritório local do Ibama respondeu ao MPF que, apesar de ter enviado ofícios ao Ministério da Justiça, não havia recebido resposta da pasta.

A denúncia, propagada por um jornal local da cidade, dizia que seriam contratados motoqueiros para atearam fogo às margens da BR-163 e em algumas unidades de conservação da região. Por Whatsapp, cerca de 80 pessoas se mobilizaram para patrocinar a ação.

O presidente do sindicato dos produtores rurais da cidade, Agamenon da Silva Menezes, rebate com outra acusação. “Estão nos acusando para encobrir outra verdade. Existe um boletim de ocorrência de uma senhora que viu agentes colocando fogo próximo à sua propriedade”, disse em entrevista na sede do sindicato. “Eles estavam em uma camionete, e com uma moto preta. No carro estava escrito ICMBio.”

Essa senhora, suposta testemunha do crime ambiental em Novo Progresso, seria uma pecuarista da região de Cachoeira da Serra (PA). Ela reapareceu em reportagem da rádio local reafirmando a acusação.

Na sede do Ibama, funcionários confirmaram a existência da suspeita, mas disseram que ninguém levou nenhuma prova.  

Os únicos indícios materiais de um crime ambiental na região de Novo Progresso são os incêndios florestais. Nesta semana, o site OEco trouxe outro elemento – uma multa lavrada há 10 dias por, supostamente, “destruir 70,93 hectares de floresta do bioma amazônico mediante uso do fogo” dentro da Reserva Biológica da Serra do Cachimbo, umas das unidades de conservação mais desmatadas do Pará. Além da multa avaliada em R$ 1 milhão por desmatamento e queimada ilegal a propriedade da mesma pecuarista que acusa o órgão ambiental de crime na região foi embargada.

Enquanto se debate os responsáveis pelo fogo, a floresta continua queimando no Pará.

As imagens do fotógrafo Marcio Pimenta presentes na galeria de fotos no alto desta reportagem foram feitas com o apoio do Rainforest Journalist Fund em parceria com o Pulitzer Center.

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