Conheça a cidade mágica que 'inspirou' o filme A Viagem de Chihiro

Um fotógrafo nos conta sobre o retorno à cidade encantada de Jiufen, localizada em uma montanha à beira-mar.

JIUFEN, TAIWAN: Os becos de Juifen, aldeia nas montanhas à beira-mar a 90 minutos de Taipei, a capital de Taiwan, ganham vida sob o brilho das luzes de lanternas. Cenas urbanas encantadoras, em casas de chá à beira de penhascos e nas ruas movimentadas com vendedores de alimentos, parecem idênticas às do filme A Viagem de Chihiro.

Foto de Mike Chen
Por MIKE KAI CHEN em depoimento a Allie Young
Publicado 22 de jul. de 2022, 13:06 BRT

Sempre fui atraído por lugares de encanto. Como fotojornalista apaixonado por capturar experiências e perspectivas únicas, perseguir cenários que parecem existir entre mundos reais e fantásticos tornou-se parte do meu trabalho.

Com suas casas de chá à beira do penhasco, ruas íngremes lotadas de vendedores de comida quente e o brilho de lanternas vermelhas, Jiufen, Taiwan, é um desses lugares fascinantes. Conheço bem essa aldeia serrana à beira-mar, pois tenho visitado ela desde a infância. Fica a 90 minutos de ônibus de onde nasci, na capital, Taipei.

Presa entre um passado tradicional e um presente agitado, Jiufen é uma cidade essencialmente taiwanesa. No entanto, algumas de suas características mais marcantes são de seus colonizadores anteriores – a saber, os holandeses (no século 17) e o Japão (no início do século 20). 

Trata-se de uma pequena vila com iguarias caseiras como bolas de taro doces, mas que também carrega uma mística mundana. De dia é um posto avançado na ladeira da montanha e um paraíso tropical banhado pela luz do sol. À noite, traz uma sensação diferente – a vila se torna mais sombria, como se você pudesse encontrar espíritos rondando em busca de um lanche na madrugada.

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      No século 17, durante a dinastia Qing, só viviam aqui nove famílias. Quando a vila solicitava remessas, eles pediam “nove porções” ou “jiu fen”, em chinês.

      Foto de Mike Chen

      Com o desenvolvimento da mineração de ouro no final do século 19, a relativamente tranquila Jiufen tornou-se uma vila movimentada durante a ocupação japonesa, que durou até 1945. Lembranças desse período podem ser encontradas em pousadas de estilo tradicional e outros edifícios em toda a cidade. Entre a folhagem exuberante pendurada nas estruturas empilhadas na montanha, observe as kawara, que são as telhas tradicionais japonesas que formam os icônicos telhados curvos e alongados.

      O cineasta japonês Hayao Miyakazi nega que Jiufen tenha sido uma inspiração, mas muitos estabeleceram uma conexão pela aparência semelhante que há entre a cidade e os cenários do filme A viagem de Chihiro, de 2001.

      Esse filme de animação vencedor do Oscar conta a história de Chihiro, uma garota de 10 anos, que fica presa no mundo espiritual e precisa descobrir como salvar seus pais de uma terrível maldição. Ao longo do caminho, ela faz amizade com espíritos animais, empregadas da casa de banhos, o homem da caldeira e seus duendes de fuligem, o enigmático Sem Rosto, dentre outros, que a ajudam em sua missão através de uma paisagem de sonhos hipnotizante.

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        Os visitantes exploram túneis subterrâneos, vestígios da corrida do ouro da era japonesa em Jiufen.

        Foto de Mike Chen

        A casa de chá Shu-ku da Jiufen oferece lanches como biscoitos, ameixas, ovos de chá, nozes e, claro, uma ampla variedade de chás categorizados por período de fermentação.

        Foto de Mike Chen

        Chihiro faz um acordo para trabalhar na imponente casa de banhos para resgatar seus pais, mas acaba quase esquecendo seu nome depois de ganhar um apelido falso e abreviado. Um destino semelhante acomete seu amigo Haku. 

        O espírito mascarado Sem Rosto não consegue falar, a menos que assuma as características dos espíritos que ele consome. Esses são apenas alguns dos momentos em que assuntos como identidade e pertencimento ocupam a temática central do filme.

        Embora essas questões sejam vivenciadas universalmente, faz sentido que o filme tenha repercutido tão fortemente no Ocidente, especialmente nos Estados Unidos, um país de imigrantes. A Viagem de Chihiro e todo o trabalho de Miyazaki ocupam um lugar especial no meu coração.

        Eu tinha três anos quando nossa família se mudou de Taiwan para Toronto, e depois para a Califórnia. Hoje, eu digo que sou taiwanês-americano – como muitos outros, muitas vezes me sinto americano demais para me chamar de taiwanês e taiwanês demais para me chamar de americano.

        Sempre que podíamos, voltávamos a Taiwan para visitar meus avós, a raiz de nossa família que ficava em Taipei, e nos reuníamos com tias, tios e primos. Jiufen era uma parada favorita, que se tornou um dos pilares de uma coleção de momentos especiais em Taiwan: ler quadrinhos com o vovô na biblioteca, acompanhá-lo em seus passeios pelo parque às cinco da manhã, e a vovó aparentemente sempre limpando a cozinha.

        Minha irmã e eu sentíamos que a divisão cultural se aprofundava à medida que envelhecíamos, mas a comida uniu nossa família e criou memórias duradouras. O clássico chá de leite de pérola que comprávamos nos carrinhos de rua e barzinhos era um de nossos favoritos. 

        Fazíamos viagens para tomar sorvete com o vovô. Eu pedia constantemente a meus pais para comer niu rou mien, sopa de macarrão com carne, um alimento básico nacional. Nossa família se reunia ao redor do leite de soja e fan tuan, um rolo de arroz glutinoso coberto de you tiao, uma massa frita, legumes em conserva e carne de porco desfiada.

        Muitos desses pratos podem ser encontrados ao longo da Rua Velha de Jiufen, um dos mercados noturnos mais emblemáticos do país. Embora lanches deliciosos atraiam multidões o dia inteiro, a rua ganha vida no pôr do sol, igual à cena de abertura de A Viagem de Chihiro, quando Chihiro e seus pais se deparam com filas de barracas de comida repletas de macarrão fresco e carne assada. No filme, como na vida real, o vapor quente se mistura com as lanternas brilhantes que iluminam cada barraca.

        Ao longo da sinuosa Rua Velha, há uma ampla e extravagante oferta de produtos. Os visitantes podem encontrar peixe frito, batata-doce artesanal e bolas de taro em calda, salsichas taiwanesas em espetos, rolinhos de sorvete de amendoim, bolinhos de carne de porco cozidos no vapor cobertos com arroz doce e uma infinita variedade de sopas de macarrão.

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          Os visitantes caminham por becos enevoados pela icônica Casa de Chá Amei de Jiufen, um grande edifício que lembra a casa de banhos do filme A Viagem de Chihiro.

          Foto de Mike Chen

          A Casa de Chá Amei, que originalmente era uma ferraria, apresenta a arquitetura de influência japonesa da cidade.

          Foto de Mike Chen

          No ponto mais alto da cidade, uma luz dourada sai da grandiosa casa de chá Amei, quase como uma coroa de Jiufen. A instituição centenária ocupa uma ferraria reaproveitada, e talvez seja o elo mais forte da cidade com A Viagem de Chihiro. A ornamentada arquitetura japonesa do edifício tem uma forte semelhança com a casa de banhos, o cenário principal do filme, onde os espíritos relaxam e onde Chihiro encontra trabalho.

          A casa de chá Amei oferece uma experiência tradicional de chá com pequenos doces como bolos de feijão mungo, uma deliciosa combinação que fica ainda melhor acompanhada das vistas deslumbrantes do Mar da China Oriental. Há muitas casas de chá tradicionais menores no penhasco, que também oferecem vistas semelhantes e uma ampla seleção de chás locais.

          Para muitos, os filmes de Miyazaki parecem um abraço afetuoso, e meu retorno a Jiufen parece o mesmo. Muita coisa mudou desde a última vez que estive aqui – como uma pandemia catastrófica, a morte da minha avó, minha nova carreira na fotografia e uma nova interrogação sobre o que significa ser asiática-americana. 

          Apesar de tudo o que mudou, esta aldeia de montanha manteve todos os seus encantos e me lembrou da comida, dos momentos e das pessoas que me enraízam. 

          Mike Kai Chen é fotógrafo documental taiwanês-americano baseado em São Francisco. Você pode encontrá-lo no Instagram.

          Allie Yang é editora de viagens da National Geographic. Você pode encontrá-la no Twitter.

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