Os 4 principais mitos sobre os lobos – desfeitos por especialistas
O maior canino do mundo atrai tanto a reverência quanto a ira. Aqui estão alguns dos mal-entendidos mais comuns, de acordo com os cientistas.

Um jovem lobo macho, apelidado de Gray Mane, caminha à frente de sua matilha em busca de presas no Ártico canadense em 2018. Essa caçada durou quase dois dias e percorreu mais de 100 quilômetros.
As histórias sobre os lobos – algumas delas verdadeiras, outras que são mitos – animam os contos populares há milhares de anos, seja no caso do Lobo Mau de Chapeuzinho Vermelho, por exemplo, ou em lendas de lobisomens caçando sob a Lua cheia.
Embora as variações mudem com o tempo – poucos livros infantis modernos alertam sobre lobos comendo avós – as histórias inevitavelmente pintam o lobo, considerado o maior canino do mundo, com um pincel polarizado.
A forma como as pessoas vêem os lobos, em especial os lobos cinzentos (Canis lupus) ainda gera muito debate, principalmente quando esses animais são mortos.
Em um caso que chocou os Estados Unidos em fevereiro de 2024, um homem chamado Cody Roberts atropelou um lobo macho jovem com seu snowmobile, fechou sua boca com fita adesiva e o exibiu em um bar local, no oeste do estado do Wyoming, antes de atirar o animal ao relento, de acordo com os relatos de autoridades estaduais e municipais.
Embora Wyoming, que abriga mais de 350 lobos como parte do ecossistema da Grande Yellowstone, onde fica o famoso parque de mesmo nome, não seja conhecido como um estado que adora os lobos, esse ato foi tão horrível que até mesmo a comunidade de caçadores do estado se uniu em oposição. As fotos do incidente, que se tornaram virais, causaram um clamor internacional relacionado ao tema.
“Esta pessoa fez algo que, para quase todo mundo, é inconcebível”, diz Brian Nesvik, diretor do Departamento de Caça e Pesca de Wyoming. “Ouvi centenas de pessoas e ainda não conversei com uma única pessoa que tenha dito que isso é aceitável”, afirmou.
Em muitos casos, a mitologia profundamente enraizada dos lobos como vilões pode levar a mal-entendidos mais amplos. Por isso mesmo, National Geographic pediu a Nesvik e a outros pesquisadores desses animais que dissipassem alguns dos mitos mais comuns sobre os lobos.
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Um lobo afugenta os corvos de sua comida no Parque Nacional de Yellowstone. O parque abriga pelo menos 120 lobos.
Mito 1: Os lobos matam por diversão
Embora nenhum pesquisador de lobos afirme compreender os sentimentos de um animal selvagem individual, a ideia de que os lobos matam por diversão – muitas vezes chamada de matança excedente – não se baseia na realidade.
Os lobos vivem à margem da deficiência nutricional, não passam fome, mas também não acumulam gordura, explica Ken Mills, biólogo de lobos do Departamento de Caça e Pesca de Wyoming.
“Eles são maratonistas magros. Eles precisam percorrer muito terreno para encontrar uma presa vulnerável e, em seguida, pegá-la com a boca, puxá-la para baixo e… Matá-la. Isso não é fácil”, diz Mills.
Além disso, caçar presas grandes como alces, por exemplo, é perigoso. Em Yellowstone, onde os humanos não podem caçar lobos, os ferimentos sofridos durante a caça de animais de grande porte são a segunda principal causa de morte dos carnívoros, diz Kira Cassidy, pesquisadora do Yellowstone Wolf Project (Projeto Lobo de Yellowstone), um dos estudos mais longos e detalhados sobre lobos no mundo.
“As matilhas de lobos só são bem-sucedidas em uma pequena porcentagem, geralmente de 10 a 20%, de suas tentativas de caça”, diz Cassidy. E como encontrar comida não é garantia de sucesso, se houver uma presa acessível na frente deles, eles a matarão, diz ela.
A menos que os lobos sejam expulsos por pessoas ou por outra matilha, eles continuarão voltando várias vezes para comer uma carcaça até que ela desapareça.
Nos 23 anos em que Mills trabalha com lobos em Wyoming, Michigan, Ontário e Novo México – todos lugares na América do Norte – ele investigou apenas alguns incidentes de lobos que mataram mais animais do que podiam comer, incluindo o incidente bem divulgado de uma matilha de lobos que matou 19 alces em Wyoming.
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Lobos comem os restos de uma carcaça. Para obter essa imagem, o fotógrafo Ronan Donovan colocou uma armadilha fotográfica dentro do corpo da presa abatida. A matilha retornou para se alimentar de vez em quando pelo período de um mês.
Mito 2: Os lobos são “salvadores” de ecossistemas
O conceito de cascata trófica (um fenômeno ecológico desencadeado pela adição ou remoção de predadores de topo – o que geralmente resulta em mudanças drásticas na estrutura do ecossistema, explica a Encyclopedia Britannica) persiste desde que os cientistas reintroduziram os lobos no Parque Nacional de Yellowstone, nos Estados Unidos, na década de 1990. A ideia básica é que, quando os lobos não habitam mais uma paisagem, os ungulados, como veados e alces, tornam-se abundantes e danificam prados, encostas de montanhas e áreas úmidas.
Ecossistemas como o de Yellowstone mudaram tão fundamentalmente após a remoção dos lobos (e ursos pardos) que, pelo menos em alguns lugares, eles não poderiam retornar ao seu estado anterior apenas trazendo esses predadores de volta, de acordo com pesquisa publicada no início deste ano na revista científica “Ecological Monographs”.
O trabalho, baseado em 20 anos de pesquisa em Yellowstone, constatou que a paisagem está em “um estado estável alternativo” e não retornou ao estado anterior.
“Os lobos são um componente importante de um ecossistema saudável”, diz Cassidy, ‘mas sua presença não é o único fator crítico para a saúde, estabilidade ou resiliência de uma área’.
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Mito 3: Os lobos atacam as pessoas
Filmes infantis como “Frozen” e “A Bela e a Fera” sugerem que os lobos são um perigo para as pessoas. Na verdade, o ataque de um lobo a uma pessoa é extremamente raro – apenas duas pessoas morreram em encontros com lobos na América do Norte no século passado. Já os raios, por exemplo, matam incontavelmente mais pessoas por ano – só nos Estados Unidos foram 28 vítimas anualmente.
Os lobos cinzentos vivem em toda a parte norte do globo, desde Estados Unidos e Canadá até Europa e Ásia: em todos esses lugares, os encontros com pessoas são igualmente raros nesses ambientes.
“Minha experiência é que eles têm muito medo de pessoas”, diz Cassidy. “Ou são muito cautelosos a ponto de a maioria das pessoas não ver um.”

Apelidados de “lobos do mar”, esses caninos vivem na costa acidentada da Colúmbia Britânica, na parte oeste do Canadá, alimentando-se de peixes e outras formas de vida marinha.
O mesmo se aplica aos lobos cinzentos, pois suas duas espécies competem em uma corrida armamentista evolutiva que proporciona a uma criatura uma pequena vantagem antes que a outra a alcance.
Em áreas onde as espécies de presas diminuem – geralmente devido a doenças e ao desenvolvimento humano – os lobos criam menos filhotes, perdem mais filhotes ou se afastam e procuram novas fontes de alimento.
Não importa o que as pessoas pensem dos lobos, eles são simplesmente outra espécie na paisagem, diz Nesvik – uma espécie que tenta encher a barriga como todos nós.
