Espinossauro tinha ossos como os de pinguins – sinal que caçava embaixo d'água

Além das aves, o predador – e seu primo Baryonyx – são os únicos dinossauros conhecidos com essa adaptação aquática.

Por Michael Greshko
Publicado 4 de abr. de 2022, 13:33 BRT
Na representação deste artista, o Espinossauro atravessa os rios do Marrocos há mais de 95 milhões ...

Na representação deste artista, o Espinossauro atravessa os rios do Marrocos há mais de 95 milhões de anos em busca de Onchopristis, um tipo de arraia conhecida como peixe-serra. Um novo estudo descobriu que o Espinossauro e pelo menos um de seus primos tinham ossos altamente densos, consistentes com um estilo de vida de alimentação debaixo d'água.

Foto de Davide Bonadonna

Há mais de 95 milhões de anos, um portentoso sistema de rios corria pelo que hoje é o Saara marroquino, fornecendo um lar para um dos dinossauros mais incomuns conhecidos pela ciência: o espinossauro, uma besta de 15 metros de comprimento e 7 toneladas com um focinho de crocodilo repleto de dentes afiados.

Paleontólogos concordam que o espinossauro e seus parentes tinham fortes laços com a água, mas há anos eles discutem se essa criatura de crista nadava pelas águas como um "monstro do rio devorador de peixes”, rondando as margens como uma espécie de mega-garça reptiliana. 

Agora, usando o maior conjunto de dados do tipo, pesquisadores compararam a densidade dos ossos do carnívoro pré-histórico a uma ampla gama de animais vivos e extintos. A análise descobriu que o espinossauro – e, surpreendentemente, também seu primo britânico barionix – tinha paredes ósseas altamente densas, como os pinguins, sugerindo que eles provavelmente passavam grande parte do tempo na água e caçavam presas aquáticas.

"O espinossauro também pode ter sido um animal que às vezes caminhhava, mas sua ecologia é caracterizada pela imersão total na água", diz o principal autor do estudo, Matteo Fabbri, pesquisador de pós-doutorado no Museu de História Natural de Chicago, Illinois, Estados Unidos.

Matteo Fabbri, autor principal do estudo, se debruça sobre detritos ricos em ossos de Espinossauro no sítio arqueológico marroquino. Fabbri e seus colegas mais tarde recuperaram parte do crânio de Espinossauro neste monte de fragmentos ósseos.

Foto de Diego Mattarelli

As novas descobertas publicadas na Nature reforçam o caso de que os espinossaurídeos, o grupo que contém o espinossauro e seus parentes, adaptaram-se a uma vida na água – os únicos dinossauros conhecidos que o fizeram, além das aves. Recentemente, por exemplo, o primeiro fóssil encontrado de uma cauda do espinossauro revelou uma estranha forma de remo que o dinossauro pode ter usado para nadar.

"Os ossos não mentem", diz o pesquisador e explorador da National Geographic Nizar Ibrahim, autor sênior do estudo e paleontólogo da Universidade de Portsmouth, no Reino Unido. O espinossauro "é ainda mais aquático do que esperávamos", diz ele.

Ainda assim, os detalhes sobre como o espinossauro nadava e perseguia sua presas aquáticas é uma questão em aberto. O predador pré-histórico, com seu corpo alongado e gigantesca nadadeira traseira, continua a confundir os cientistas – afinal, trata-se de um bicho muito incomum quando comparado com outras criaturas aquáticas.

"Eu não duvido que o espinossauro tenha ossos muito densos ... [mas] isso adiciona massa suficiente para ajudar os animais a afundar?", pergunta Don Henderson, paleontólogo do Museu Real de Paleontologia Tyrrell, no Canadá, cujo estudo de 2018 sobre o espinossauro sugeriu que o animal.

"Se você vê pinguins nadando, assim que param de bater as asas eles começam a se mover até a superfície", diz Henderson. "Eu só não consigo ver como o espinossauro pode ficar debaixo d'água sem um esforço extremo."

Lastro ósseo

Catapultado para a fama recente pelo filme Jurassic Park III, o espinossauro é um dos dinossauros mais misteriosos já encontrados. Pesquisadores descobriram os primeiros fósseis conhecidos do animal na década de 1910, no Egito, mas os ossos foram destruídos em um bombardeio da Segunda Guerra Mundial, o que dificultou a vida de paleontólogos que queriam estudá-lo.

Em 2014, pesquisadores liderados por Ibrahim anunciaram que um local no Marrocos preservava um esqueleto de espinossauro surpreendentemente completo. O fóssil apresentava membros posteriores atarracados, bem como ossos densos. Esses traços apontavam para um estilo de vida semiaquático no qual o espinossauro vivia ativamente na água pelo menos parte do tempo. O anúncio em 2020 da cauda de remo do mesmo fóssil só aumentou a intriga.

Para investigar ainda mais o quão apto à natação era o espinossauro, a equipe de Fabbri e Ibrahim começou a trabalhar no novo estudo em 2015, e o projeto acabou levando seis anos para ser concluído. A maior parte do tempo foi dedicada à busca de Fabbri para coletar o máximo de dados possível sobre uma grande variedade de animais. Ele entrou em contato com museu após museu, persuadindo uma lista crescente de curadores para ajudá-lo a coletar espécimes para seu estudo.

Em outros grupos de animais terrestres que fizeram a transição evolutiva para a água, como as baleias, o aumento da densidade óssea foi um dos primeiros traços a aparecer, com os ossos agindo como lastro para economizar energia. Assim, para testar se os espinossaurídeos estavam adaptados à água, os pesquisadores compilaram cortes transversais digitalizadas das costelas e fêmures de mais de 200 tipos diferentes de amniotas, o amplo grupo de animais que inclui répteis, aves e mamíferos modernos, bem como uma mistura de criaturas antigas e extintas, incluindo dinossauros. 

A equipe então comparou a densidade óssea com as habilidades conhecidas dos animais para se alimentar debaixo d'água ou voar. A análise mostrou que ossos altamente densos estavam fortemente correlacionados com um animal que frequentemente mergulha debaixo d'água. O espinossauro e o barionix foram os únicos dois dos dinossauros não-aviários no estudo com ossos tão densos.

Nem todo animal com ossos densos vive um estilo de vida aquático ou mesmo parcialmente aquático. Elefantes e dinossauros saurópodes extintos, por exemplo, têm ossos densos para suportar seus grandes pesos.

No entanto, essas estruturas ósseas "graviportais", que suportam peso, diferem visivelmente das "osteoescleróticas", que pinguins e outras criaturas mergulhadoras possuem. Ossos altamente densos podem dar aos animais uma vantagem única para permanecer na água por longos períodos, sem eliminar a capacidade de se locomover em terrenos secos.

"Embora um pinguim ou um crocodilo sejam capazes de nadar e mergulhar debaixo d'água, eles também são capazes de andar em terra", diz Fabbri.

Fabbri (esquerda) e seus colegas Simone Maganuco (meio) e Davide Bonadonna (direita) catalogam os achados do dia no sítio arqueológico do Espinossauro em Marrocos durante uma missão prospectiva liderada pelo Explorador da National Geographic Nizar Ibrahim.

Foto de Nanni Fontana

Mesmo que o espinossauro e o barionix tivessem tido mais facilidade em ficar na água do que outros dinossauros, eles também deviam subir à terra de vez em quando. O primeiro fóssil conhecido de barionix foi encontrado junto com escamas de peixe, bem como os ossos de um jovem dinossauro comedor de plantas – talvez um sinal de que ele predava tanto em terra quanto na água.

O especialista em espinossaurídeos Tom Holtz, paleontólogo da Universidade de Maryland, Estados Unidos, que não participou do estudo, diz que os novos dados podem ter implicações muito além de espinossauro e barionix. Alguns paleontólogos sugeriram que alguns tipos de dicinodontes – criaturas extintas de duas presas com parentesco distante dos primeiros mamíferos – poderiam ter levado estilos de vida semelhantes a hipopótamos. Novas análises de densidade óssea podem ajudar a testar essas ideias e outras como essas, especialmente para fósseis fragmentários dos quais pouco se sabe.

"Pelo que sei, ninguém tentou essa [análise] nessa escala antes", diz Holtz. "Eles inspirarão trabalhos [e] informarão pesquisas sobre criaturas que talvez sejam menos carismáticas para o público, mas, em termos científicos, igualmente interessantes."

Reforçando as tendências da evolução

Além do barinonix e do espinossauro, o estudo também deu uma olhada em outros candidatos a dinossauros semiaquáticos. Entre eles, o halszkaraptor, que era semelhante a um pato moderno. A equipe descobriu que nenhum dos dinossauros analisados tinham ossos densos, parecidos com os de pinguins. No entanto, isso não exclui que esses animais tenham tido uma vida ligada à água. Muitos dinossauros modernos que vivem ao redor da água, como patos, gansos e outras aves aquáticas, não têm densidades ósseas semelhantes a pinguins.

Uma das maiores surpresas do estudo vem de outra espécie de espinossaurídeo: ao contrário do espinossauro e do baryonyx, um espinossaurídeo encontrado no Níger, país na África Ocidental, chamado suchomimo não tem ossos densos, apesar da semelhança animal com o Baryonyx.

"Seria de se esperar, em um grupo que não está necessariamente 100% comprometido com a vida aquática, a possibilidade de a evolução alternar características", diz Holtz.

As descobertas gerais ressaltam o quão estranhos os espinhossauros eram no grande esquema da história evolutiva. Na maioria dos outros casos em que animais terrestres se adaptaram à vida na água, as espécies pioneiras tendiam a ter corpos pequenos. De acordo com Holtz, os primeiros mosassauros – um grupo de répteis marinhos antigos, não dinossauros – não tinham mais do que 4 a 5 metros de comprimento, do tamanho dos modernos lagartos-do-nilo. Mas os ascendentes dos barionix e dos espinossauros provavelmente eram gigantes.

O paleontólogo Kiersten Formoso, doutorando na Universidade do Sul da Califórnia, Estados Unidos, diz que, embora o espinossauro tenha ossos densos como outros animais terrestres que evoluíram para retornar à água, ele também "acumula alguns dos caminhos comuns", evolutivamente falando.

Por exemplo, a maioria dos amniotas aquáticos têm corpos bastante planos e redondos, mas o corpo do espinossauro era alto e magro. Em geral, os dinossauros terópodes – bípedes e carnívoros –, incluindo o espinossauro, tinham corpos mais rígidos que os de alguns outros animais semiaquáticos, o que teria afetado potenciais movimentos de natação. As vértebras dos terópodes também eram atravessadas por sacos de ar, o que teria tornado muito mais difícil para os espinossauros afundarem, embora, segundo a pesquisadora, a densidade óssea extra das criaturas pode ter neutralizado esse efeito.

Depois, há um dos traços marcantes do espinossauro: sua cauda dorsal incrivelmente hidrodinâmica, de 1,80 metro de altura.

"Acho que esse animal estava perfeitamente feliz, relaxando e se alimentando em águas rasas, com os pés no fundo na maioria dos casos", diz Formoso, embora, em sua opinião, o espinossauro "teria tido dificuldade em perseguir presas aquáticas".

Ainda assim, é possível que o habitat único do espinossauro tenha dado ao dinossauro uma vantagem na caça aquática. As camadas rochosas que preservaram o espinossauro marroquino também continham fósseis de peixes pré-históricos grandes e lentos. "Esses são os tipos de coisas que o espinossauro teria ido atrás – obviamente não estamos falando em ir atrás saltando como golfinhos", diz Ibrahim.

Estudos futuros prometem revelar mais detalhes sobre este estranho predador. Formoso e Henderson estão trabalhando juntos em um próximo estudo que irá comparar o espinossauro com mamíferos aquáticos e répteis, e a equipe de Ibrahim está trabalhando em estudos de acompanhamento das pernas e pés do espinossauro, que mostram sinais de terem sido amplamente arqueadas, possivelmente para apoiar membranas. 

Para Holtz, os tempos mais emocionantes para a pesquisa sobre o espinossauro e seus parentes estão por vir.

"As evidências apontam claramente para [o espinossauro] ser algum tipo de animal aquático, e essa nova descoberta suporta a ideia de estar debaixo d'água, ou pelo menos em grande parte da vida debaixo d'água. Ok, mas como?!", ele se pergunta. "Descobrir o que eles estavam fazendo vai ser a parte divertida."

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