Onda de calor extremo atinge América do Sul. O que acontece com o clima?

Argentina, Uruguai e Brasil emitiram alertas – temperaturas podem ultrapassar 42 graus Celsius. La Ninã, estiagem e mudanças do clima contribuem para a formação de massa de ar quente e seco no Cone Sul.
Previsão de mudanças de temperatura na superfície de hora em hora entre 14/01 e 23/01. GFS/NOAA via Windy.com
Por Miguel Vilela
Publicado 14 de jan. de 2022, 13:08 BRT

Uma onda de calor extremo atinge região sul e central da América do Sul, e pode levar temperaturas recordes ao norte da Argentina, Uruguai e partes do Rio Grande do Sul, no Brasil.

O Serviço Metereológico Nacional da Argentina (SMN), país que deve ser o mais afetado, informou que as temperaturas já começaram a subir nas províncias Rio Negro, Neuquén, Mendoza, La Pampa, oeste de Buenos Aires, San Luis, San Juan, La Rioja, Catamarca, Tucumán, leste de Salta e Jujuy, Santiago del Estero, Chaco e Formosa. Nos próximos dias, até começo da semana que vem, a onda deve atingir as províncias de Buenos Aires, Córdoba, Santa Fe, Entre Ríos, Chaco, Corrientes e Misiones.

A temperatura máxima deve ficar entre 35 e 42ºC – algumas localidades devem ultrapassar essa marca –, e o calor deve afastar as possibilidades de chuva, acentuando a seca que persiste em algumas regiões e aumentando o risco de incêndios. Na última quarta-feira (13/01), a capital Buenos Aires registrou 41,1°C o segundo dia mais quente da série histórica, iniciada em 1906, e a tendência é esquentar ainda mais. 

O Instituto Uruguai de Metereologia também emitiu aviso de onda de calor para municípios do oeste do país, que devem ter temperaturas de até 42ºC entre 11 e 16 de janeiro.

No Brasil, o Instituto Nacional de Meteorologia emitiu alerta de perigo, com risco à saúde, para 216 municípios do Rio Grande do Sul, que deverão, segundo o órgão, sofrer com temperaturas 5ºC acima da média por três a cinco dias a partir da última terça-feira (11/01).

O que é e como se forma uma onda de calor

As ondas de calor se configuram se atinge uma “sequência de três, quatro ou mais dias com temperaturas muito elevadas, com o detalhe para as madrugadas, também quentes, com temperaturas acima de 23ºC”, explica o climatologista Fracisco Aquino, professor do departamento de geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em entrevista à reportagem.

Ondas de calor são eventos importantes, que levam riscos à saúde da população. “Elas tornam o ambiente difícil, especialmente para idosos e crianças”, diz Aquino, “e podem disparar problemas respiratórios, como bronquite e asma, circulatórios e cardíacos e causar embaralhamento da visão e tonturas.” Atividades ao ar livre são muito perigosas.

Entre as precauções sugeridas pelo SMN para evitar hipertermia – caracterizada por fortes dores de cabeça, perda de consciência, aumento abrupto da temperatura corporal, tontura e ressecamento da pele –, está não se expor ao sol direto – especialmente no meio do dia –, evitar bebidas alcóolicas ou muito açucaradas, reduzir atividades físicas, preferir frutas e verduras à abundância de comida, usar roupas leves e de cor clara, permanecer em lugares ventilados ou resfriados e, o mais importante, ingerir muito líquido. “Água, água e sombra”, reforça Aquino.

Região propensa a ondas de calor

O Cone Sul do continente é um lugar propício para a formação de fenômenos de calor extremo. “Quando combinamos a geografia física da América do Sul – o seu formato, a continentalidade da região central da Argentina, os Andes a oeste – com dias de mais de 14 horas de sol, temos as condições propícias para a formação de uma massa de ar quente e seca que vai dar o tom da onda de calor”, explica Aquino.

Também contribuem para o fenômeno os ventos que veem do oeste e se aquecem ao descerem a Cordilheira dos Andes, aumentando a sensação de calor; uma estiagem histórica que atinge principalmente a Argentina e partes do Rio Grande do Sul desde janeiro de 2020; e os efeitos do La Niña – um fenômeno oceânico-atmosférico caracterizado pelo resfriamento anormal nas águas superficiais do Oceano Pacífico Tropical.

Por trás disso tudo, há as mudanças climáticas globais. Dados do Sistema de Mudanças Climáticas Copernicus, gerenciado pela Comissão Europeia, mostram que os últimos sete anos foram os mais quentes já registrados na Terra – 2021 foi o quinto com temperatura média mais elevada. Isso tem aumentado em intensidade e frequência os eventos climáticos extremos em todo o mundo – incluindo chuvas desproporcionalmente fortes e extremos de calor.

De acordo com o Sexto Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, publicado em setembro de 2021, “é virtualmente certo que extremos de calor (incluindo ondas de calor) tornaram-se mais intensas e mais frequentes em todas as regiões terrestres desde os anos 1950”. O documento também afirma que “alguns extremos de calor observados na última década seriam extremamente improváveis de ocorrer sem a influência humana no sistema climático”.

“No Rio Grande do Sul, por exemplo, nos anos 1930 a 1950, as ondas de calor começavam em dezembro e iam até fevereiro. Hoje, elas iniciam em dezembro e continuam até março, às vezes até abril”, diz Aquino. “E o número de dias, que antes era de três a cinco, às vezes passa de 14.” Para piorar, a maioria da população vive hoje em cidades, geralmente cobertas por concreto, onde a sensação térmica é muito superior à da zona rural.

Como evitar o pior

Além das medidas básicas para preservar a saúde durante uma onda de calor, a solução a longo prazo passa justamente por evitar que o clima na Terra aumente ainda mais. Um estudo publicado no ano passado concluiu que 37% das mortes causadas por ondas de calor entre 1991 e 2018 podem ser atribuídas exclusivamente às mudanças climáticas. “O que vem sendo observado – esse percentual de 37% – deve aumentar exponencialmente”, disse Ana Vicedo Cabrera, autora principal da pesquisa em entrevista à National Geographic concedida em julho de 2021.

“Na atual crise climática, zerar o desmatamento, preservar os leitos dos rios, as matas ciliares, as florestas, têm um benefício enorme para o sistema climático do planeta Terra”, defende o professor Francisco Aquino. “E mais: traz um aporte de ar húmido, de água, que é o que mais falta.”

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