Contra a crise climática, cientistas defendem metas mais ambiciosas do Brasil

Governo quer reduzir as emissões em 50% até 2030 e zerar o desmatamento até 2028, mas especialistas consideram as medidas insuficientes e propõem novas estratégias na COP26.

Por Kevin Damasio
Publicado 11 de nov. de 2021, 18:14 BRT
Manifestantes protestam por ações contra as mudanças climáticas em Glasgow, na Escócia, durante a COP26.

Manifestantes protestam por ações contra as mudanças climáticas em Glasgow, na Escócia, durante a COP26. 

Foto de Felipe Werneck, Observatório do Clima

Um relatório lançado na primeira semana da COP26 demonstrou que, no Brasil, a erradicação do desmatamento, a descarbonização da economia e a redução de desigualdades podem, e devem, andar juntos para chegar a um futuro de neutralidade das emissões de gases de efeito estufa em 2050. Enquanto o ministro do Meio Ambiente anunciou a meta de reduzir as emissões em 50% até 2030, a Iniciativa Clima e Desenvolvimento, que reuniu mais de 300 especialistas e lideranças, demonstrou que a capacidade do país é bem maior: de 66% a 82%.

O estudo propõe dois cenários para a próxima década, que colocariam o Brasil no rumo da neutralidade de carbono em 2050, aliados ao desenvolvimento socioeconômico. “O maior patamar de ambição que propomos, de -82% em relação a 2005, colocaria o Brasil na vanguarda do mundo. Deixaríamos de ser um dos sete países que emitem mais de 1 gigatonelada (bilhões) de CO2 equivalente (GtCO2e) por ano e teríamos capacidade de exportar nossos bens e serviços livres de desmatamento”, analisa Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa e co-diretora da iniciativa.

O relatório foi desenvolvido pelo Centro Clima, da COPPE-UFRJ, responsável pelo Comitê Técnico-Setorial, e pelo Instituto Talanoa, encarregado do Comitê de Líderes sobre Política Climática. Contou com o apoio de organizações, redes e coalizões, como o Instituto Clima e Sociedade.

“A estratégia combina três elementos principais: precificação de carbono, cobrindo setores da economia que podem se tornar mais eficientes em termos energéticos; radical redução das taxas anuais de desmatamento, por meio de fiscalização eficiente e de ponta, entre outros; restauração de 4 milhões de hectares adicionais de florestas”, pontua Unterstell. “Tudo isso pode ser feito a baixo custo e sem contar com tecnologias disruptivas.”

“Nos pacotes, também consideramos medidas setoriais, para que a universalização do saneamento, por exemplo, possa ser feita de forma descarbonizada”, continua Unterstell. “Enxergamos, assim, uma transição em diversos setores importantes para o desenvolvimento do país. Além do ganho em termos de redução de emissões, essa estratégia tem o potencial de qualificar nosso desenvolvimento: aumentar o PIB e a renda e combater desigualdades.”

A iniciativa classifica o contexto atual como “Retomada Econômica” e resultaria em 1,7 GtCO2e em 2030, acima do compromisso do Brasil no Acordo de Paris (1,6 GtCO2e). Neste cenário, projeta-se um aumento do desmatamento anual até 2023, pequena queda até 2025 e estabilidade em 2030, além da manutenção do ritmo atual de programas de mitigação, como o Plano de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (Plano ABC) e o Renovabio. Não haveria medidas adicionais de mitigação, como novas políticas climáticas e a “precificação explícita” do carbono.

O primeiro cenário de mitigação adicional (CMA1), proposto pelos pesquisadores, foi denominado “Retomada e Transição Justa”. O Brasil emitiria 0,96 GtCO2eq em 2030 e seria capaz de zerar as emissões líquidas em 2050. Segundo o estudo, essa trajetória resultaria na diminuição de 66% das emissões em 2030 em relação à 2005, com crescimento econômico, de emprego e renda.

Dois terços dessa redução se dariam nas emissões de mudança do uso do solo e da silvicultura, que diminuiriam em 40%, quase integralmente relacionadas ao desmatamento. Com isso, os pesquisadores calculam uma alta de 30% nas remoções de carbono, com a criação terras indígenas (TI) e unidades de conservação (UC). O outro terço se daria através da precificação do carbono, custando US$ 9,5/tCO2eq em 2025 e US$ 19/tCO2eq em 2030. Os valores arrecadados nessa taxação seriam utilizados “na redução de encargos trabalhistas e compensação de perda do poder de compra das famílias mais pobres”. As ações demandariam investimentos adicionais de R$ 92,2 bilhões até 2030.

O CMA2, por sua vez, é chamado de “Retomada, com transição justa e taxa anual de desmatamento zero na Amazônia e na Mata Atlântica”. No caminho do carbono neutro até a metade do século, o Brasil chegaria em 2030 com 0,50 GtCO2e emitido. O cenário prevê 82% de redução de emissões até o fim desta década. As emissões de uso do solo cairiam 84%, com ganho de 30% de remoções pelo incremento de áreas protegidas. Além de zerar o desmatamento na Amazônia e na Mata Atlântica, os demais biomas teriam uma redução de 20% e estariam na trajetória para zerá-lo. O cenário adota a mesma estratégia de precificação de carbono do CMA1, a fim de assegurar a redução das desigualdades.

Os cenários foram desenvolvidos pela equipe da COPPE-UFRJ, coordenado pelo cientista Emílio la Rovere, e calibrados em consultas técnicas com 150 especialistas. Depois, para avaliar a viabilidade e a ambição, foram apresentados em rodadas com lideranças de diversos setores – governos subnacionais, parlamento, organizações da sociedade civil, comunidades, empresas, fundos de investimento, coalizões e associações privadas. Em todo o processo, a iniciativa envolveu mais de 300 pessoas.

“Esses atores também propuseram políticas, medidas e ações concretas. Foi muito interessante porque, a certa altura, muitos desses líderes nos disseram que -66% não eram ambiciosos, e sim o mínimo necessário”, observa Unterstell. “A razão principal era que esse caminho ainda permitia um desmatamento na casa dos 6 mil km2 na Amazônia em 2030. As lideranças – e aqui entram governadores, parlamentares, CEOs de empresas gigantes, investidores, líderes indígenas, líderes negros – queriam ir além. Foi assim que se desenvolveu um cenário adicional, com o fim do desmatamento em dois biomas, que nos dá -82% nesta década. Dá para fazer. Custa pouco. Rende muito.”

De um lado, temos um governo federal que, até a primeira semana da COP26, não adotou metas mais ambiciosas e vem de um contexto de destruição ambiental, com taxas recordes de desmatamento e queimadas. Do outro, a iniciativa Clima e Desenvolvimento mostrou que há vontade em todos os setores da sociedade em combater a crise climática. Se muitas ações propostas no documento não dependem do governo federal, alcançar os cenários de mitigação adicionais exigirão empenho tanto do Poder Legislativo como do Executivo.

“Ouço um coro de vozes propondo caminhos de prosperidade econômica aliada a sucesso na transição para baixo carbono no Brasil. São atores muito diferentes entre si, que provavelmente discordam em muitos assuntos, mas que veem oportunidades para o Brasil qualificar seu desenvolvimento nesta década através da descarbonização”, acredita Unterstell. Para a mestre em Administração Pública na Universidade de Harvard, o documento lançado estabelece “parâmetros claros em relação a como cada ator pode se alinhar ao Acordo de Paris”, com cenários de ambição que servirão de “referência para setor privado, público e sociedade”.

“Não tenho ilusões de que o governo federal da ocasião se mova. Já se passaram três anos. Sabemos quais são os valores e as teses que o sustentam. A essa altura, e com tanto estrago já feito, é preciso aglutinar forças para mover outros atores e os próximos governos”, conclui Unterstell. “Teremos uma gigantesca tarefa de reconstrução do Estado pela frente, principalmente na seara ambiental.”

A nova meta brasileira

Em 1º de novembro, o ministro Joaquim Leite participava em Brasília do primeiro painel do governo brasileiro sobre a COP26, que começava em Glasgow, na Escócia, e vai até o dia 12 de novembro. No final de sua fala, o ministro anunciou que a meta de redução de emissões do Brasil para 2030 passará de 43% para 50%, em relação ao valor de 2005, e que seria formalizada e detalhada no decorrer da Cúpula do Clima. Entretanto, até hoje não está clara a base de comparação selecionada, entre as duas métricas que constam no 4º Inventário Nacional de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa.

O presidente da COP26, Alok Sharma, e o secretário especial para o clima dos EUA, John Kerry, cumprimentaram a redução em 50% anunciada pelo Brasil. Contudo, Unterstell entende que seja “uma estratégia de minimizar danos, particularmente no contexto das negociações da COP26”.

“Para alcançar consenso em torno de um ‘Pacote de Glasgow’, o mundo precisa do Brasil”, pondera. “O Brasil começa esta COP com baixíssima credibilidade. O governo não honrou os compromissos assumidos junto ao Acordo de Paris em 2015, também não cumpriu a meta que tinha em lei para reduzir o desmatamento no ano de 2020 e anunciou uma atualização da NDC que não aumenta ambição. Estamos desalinhados com Paris.”

O Instituto Talanoa apontou, em nota técnica, que é improvável que a medida proposta aumente a ambição climática em relação aos compromissos inicialmente assumidos em 2015. No Acordo de Paris, o Brasil comprometeu-se a limitar as emissões em 1,2 GtCO2e em 2030, 43% a menos das 2,1 GtCO2e de 2005. Já em dezembro de 2020, a atualização da NDC submetida pelo Brasil para a ONU baseou-se em um nível de 2,8 GtCO2e em 2005. Essa mudança permitia ao país emitir, em 2030, 400 milhões de toneladas a mais do que previamente estabelecido.

Ao utilizar como base o 4º Inventário Nacional, o governo pode adotar duas métricas possíveis, conforme a análise do Instituto Talanoa: 2,4 ou 2,6 GtCO2e emitidos em 2005. Isso significaria que em 2030 o Brasil poderia limitar as emissões, respectivamente, em 1,22 GtCO2e ou 1,28 GtCO2e. Ou seja, o anúncio não torna a meta brasileira mais ambiciosa, mas sim retorna para o compromisso assumido no Acordo de Paris. Para mimetizar a NDC de seis anos atrás, o valor deveria ser, respectivamente, 51% e 54%.

“A meta não muda o ponto de chegada”, observa Tasso Azevedo, coordenador técnico do Observatório do Clima. “Como não mudou a linha de base adotada, basicamente estamos no mesmo lugar de reduzir as emissões para que não ultrapassem 1,2 gigatonelada até 2030. Então, foi isso. Botou o bode na sala no ano passado e o tirou agora.”

Para Luciana Gatti, coordenadora do Laboratório de Gases de Efeito Estufa do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o inventário nacional segue as normas internacionais para o cálculo das emissões, mas os números estão subestimados. “Não entra degradação, que é uma emissão tão grande quanto o desmatamento. Não entra queima de biomassa, que é considerada zero, como se no ano seguinte tudo que foi queimado se recuperasse”, pontua a cientista.

Já as absorções de carbono são superestimadas, continua Gatti. “Bastou estar no papel que a área é protegida para estar absorvendo. Aí entra o seguinte problema: usa-se uma média de 30 anos de comportamento da floresta para toda a Panamazônia, enquanto no Brasil já tem um comportamento anômalo”, explica a cientista. “A Amazônia brasileira já absorve menos carbono do que em alguns países mais ao Oeste e ao Norte. Dentro do Brasil, na parte leste da Amazônia, especialmente no Pará, e no norte de Mato Grosso, a floresta já virou uma fonte. Mas, quando olha no inventário, existe mais remoção de carbono pela floresta do que emissão. Então, a base que estamos usando não corresponde à realidade observada nos estudos.”

António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas, ecoou em um de seus primeiros discursos na COP26 a conclusão de uma pesquisa realizada por Gatti e publicada este ano na revista Nature: a Amazônia já emite mais carbono do que absorve. O estudo tornou-se referência para o debate sobre o estado da Floresta Amazônica e a crise climática. A cientista calculou diretamente a quantidade de CO2 na atmosfera, em sobrevoos por pontos espalhados por todos os cantos da Amazônia, de 2010 a 2018. No período, a porção brasileira da Amazônia, com 4,2 milhões de km2, emitiu para a atmosfera 0,87 GtCO2e por ano.

O Brasil na COP26

“O Brasil sempre participa das conversas, das negociações, ajuda, mais pela característica profissional de seus diplomatas. Mas, em relação aos debates, o Brasil, pelo menos até o momento, não tem apresentado protagonismo, especialmente porque tem uma desconexão entre o discurso feito nos primeiros dias e as ações que estão acontecendo no Brasil”, analisa Tasso Azevedo. “Basta olhar a pauta no Congresso Nacional, com um monte de ações que podem acelerar o desmatamento, com apoio do governo, enquanto aqui está se assinando que acabaria o desmatamento, ou a perda de cobertura florestal, até 2030.”

O Brasil teve a maior delegação estrangeira, com 479 membros, nas negociações desta última semana da COP26, mas sem a presença do presidente da República. Já nos primeiros sete dias, o destaque foi um grupo de quase 500 pessoas, com representantes da ciência, da sociedade civil, da iniciativa privada e de governos estaduais e municipais – principalmente em debates plurais no pavilhão Brazil Climate Action Hub.

“Ao redor disso, uma série de acordos estão sendo costurados, com apoio da sociedade civil. O próprio Acordo de Florestas tem participação e recursos do setor privado também. Tem dois acordos sendo costurados: na eletrificação dos transportes e no fim do financiamento e construção de novas termelétricas, em que também participa, por exemplo, o setor financeiro”, observa Azevedo. “Embora a sociedade civil e as empresas não participem diretamente das negociações, elas participam de uma série de iniciativas no entorno, voltadas a ampliar a ambição de todos os países, e do Brasil em particular, em relação à questão climática.”

Azevedo já participou de uma série de painéis durante a COP26 para apresentar os resultados mais recentes do Sistema de Estimativa de Emissões e Reduções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), como as levantamentos do MapBiomas, com diagnósticos da realidade das mudanças de uso da terra, do desmatamento e das queimadas no país, por exemplo. O engenheiro florestal é coordenador-geral de ambas iniciativas.

O Brasil chegou para esta COP26 na contramão do mundo. Quinto maior emissor, o país registrou alta de 9,5% em 2020 em relação a 2019, conforme o SEEG, do Observatório do Clima. No ano passado, no contexto da pandemia, as emissões globais caíram cerca de 7%. Mudanças no uso da terra (46%), sobretudo pelo desmatamento, e a agropecuária (27%) correspondem às principais fontes de emissão do Brasil. Os setores apresentaram altas de 23,7% e 2,5%, respectivamente, nos lançamentos de GEE. Energia (18%), processos industriais (5%) e resíduos (4%) compõem o restante das emissões. A emissão per capita do Brasil é de 10,2 tCO2e/ano, maior que a média global (7,2), da China (9) e da Índia (4)

Na primeira semana da COP26, o Brasil aderiu a dois acordos internacionais. Na “Declaração de Florestas e Uso da Terra”, 133 países, que compreendem 90% da cobertura vegetal do planeta, comprometeram-se a zerar o desmatamento até 2030. Em 2 de novembro, 103 países concordaram na redução de 30% das emissões de metano (CH4) – um gás com potencial de aquecimento 80 vezes maior do que o dióxido de carbono (CO2). O Brasil é um dos 15 maiores emissores de metano, grande parte proveniente da pecuária bovina.

Nos dois primeiros anos do governo Bolsonaro, o desmatamento na Amazônia ultrapassou 20 mil km2 (10,1 mil km2 em 2019 e 10,8 mil km2 em 2020), segundo o Inpe. Os dados oficiais para 2021 ainda não foram divulgados, mas os alertas do sistema de monitoramento em tempo real, o Deter, indicam que a supressão da cobertura vegetal pode ultrapassar os 10 mil km2. Antes da gestão do atual presidente, a última vez que o desmatamento superou a casa dos cinco dígitos foi em 2008 (12,9 mil km2).

Entre as NDCs brasileiras assumidas no Acordo de Paris, o Brasil havia se comprometido em zerar o desmatamento ilegal na Amazônia em 2030, além de restaurar e reflorestar 12 milhões de hectares até o final da década. Nos primeiros dias da COP26, o governo detalhou as metas atuais: redução de 15% ao ano até 2024, 40% anuais em 2025 e 2026, de 50% em 2027, até zerar o desmatamento ilegal em 2028.

“Se o Brasil zerar o desmatamento como estava previsto, ou pelo menos como foi compromissado agora, as emissões do Brasil facilmente ficariam abaixo do limite proposto”, aponta Azevedo. “Poderia ter um compromisso de redução das emissões de até 78%, em relação a 2005, que seria cumprido mesmo que as emissões dos outros setores continuassem onde estão hoje. Isso porque o desmatamento conta com uma parcela muito grande nas nossas emissões e, se for eliminado, contaríamos com novas remoções que compensariam as emissões de outros setores.”

No setor da agropecuária, Azevedo defende o foco nas práticas de agricultura de baixo carbono, algumas já em andamento. “O que é essencial é evitar a degradação do solo, que emite carbono, e ampliar a regeneração e recuperação de áreas agrícolas e de pastagem, que passam a capturar carbono”, explica. “No setor de energia, tem o processo de ampliar o uso de biocombustíveis e fazer a transição para veículos elétricos, o que terá um impacto grande, por ser a principal fonte de emissões do setor.

Áreas protegidas sob risco

Enquanto as emissões brutas no Brasil foram de 2,161 GtCO2e, as áreas protegidas foram responsáveis por 61% dos 636 milhões de toneladas de carbono removidos da atmosfera. Com isso, houve 1,525 GtCO2e de emissões líquidas em 2020 – nesse aspecto, a alta foi de 14,9% em relação à 2019. Contudo, nos últimos três anos, houve avanço expressivo da grilagem, do garimpo e da agropecuária em terras indígenas e unidades de conservação. O resultado, diz Azevedo, é a maior incidência de desmatamento e queimadas nessas áreas protegidas, gerando dois efeitos: contabilizam mais emissões de carbono e reduzem as remoções.

Outro fator de preocupação é a invasão de terras públicas não destinadas, onde ocorreu 44% do desmatamento na Amazônia em 2019 e 2020, conforme uma análise recente do Instituto de Pesquisas da Amazônia (IPAM). O IPAM identificou ainda que pastagens ocupam 75% da área desmatada em terras públicas no bioma, grande parte resultante da grilagem. Entre 1997 e 2020, 21 milhões de hectares de florestas em terras públicas foram devastados na Amazônia Legal – 8% dos 276,5 mi de hectares. A dimensão é maior do que a área do estado do Paraná. A emissão de GEE associada é de 10,2 GtCO2, o equivalente a cinco anos de emissões brasileiras.

As remoções de florestas em terras públicas sem destinação não são contabilizadas no SEEG, pois são consideradas áreas não manejadas. “Quando há a criação de terras indígenas ou UCs, aí passamos a contabilizar as remoções dessas áreas”, observa Azevedo. “A destinação para áreas de conservação e terras indígenas deve acontecer, porque essas são as áreas mais protegidas que temos não só na Amazônia, mas nos demais biomas do Brasil. É uma boa estratégia de conservação.”

Luciana Gatti, do Inpe, defende uma ação drástica: a moratória do desmatamento na Floresta Amazônica, para interromper o quanto antes o ciclo de destruição do bioma e as transformações que a região tem sofrido pela ação humana. “A Amazônia está sendo destruída numa velocidade tão rápida. Nós levamos 50 anos para desmatar 17%. Em três, já desmatamos quase 5%. Na Amazônia, com certeza já ultrapassamos o máximo do que podemos desmatar. E aí nossas metas falam em combater o desmatamento ilegal até 2030. É desesperador”, observa a cientista. “Hoje, a floresta no sudeste da Amazônia está mais morrendo do que crescendo. Não dá para esperar até lá [2030]. Nós precisamos, urgentemente, de uma moratória do desmatamento e das atividades que provocam o desmatamento na Amazônia.”

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