Paris: as 6 maneiras de vivenciar atualmente os incríveis anos 1920
Na Paris dos anos 1920, o clima era exuberante em lugares como o Zelli's Royal Box, em Montmartre (mostrado na foto em 1929), que atraía um público cosmopolita para dançar até tarde da noite e beber champanhe em garrafa.
Há um século, em 1924, quando Paris sediou os Jogos Olímpicos pela última vez, a cidade foi uma festa gigantesca, seduzindo visitantes de todo o mundo. Mais de 600 mil espectadores lotaram as arquibancadas, incluindo norte-americanos que desembarcaram de transatlânticos em Le Havre, na Normandia, e viajavam até Paris.
Entre os eventos esportivos, eles aproveitaram as vistas que fizeram de Paris um dos destinos mais turísticos da Europa na época (e ainda hoje segue como a cidade mais visitada do mundo), incluindo a Torre Eiffel, que exibiu uma nova pintura para seu 35º aniversário, naquele momento. Acima de tudo, os visitantes absorveram o ambiente exuberante da cidade.
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Os loucos anos 1920 foram uma época de quebra de regras e criatividade artística. Após os horrores indescritíveis da Primeira Guerra Mundial, o clima na capital francesa abraçava a liberdade e a diversão. Era uma cena cosmopolita: Kiki de Montparnasse dançava nos balcões dos bares, o escritor Ernest Hemingway rabiscava em cafés e o pintor Pablo Picasso pintava prodigiosamente.
“Paris era vista como a capital do mundo na época”, disse o historiador Pascal Blanchard, um dos curadores da exposição ”Olympism: A History of the World” no Palais de la Porte Dorée (Museu de História da Imigração). As Olimpíadas de 1924 aconteceram em meio a esse fervor urbano.
Veja como hoje em dia você pode vivenciar um pouco desse espírito parisiense dessa época glamurosa.
Nadar em uma piscina olímpica
Os atletas jogam pólo aquático na centenária e recém-reformada piscina Georges Vallerey, a primeira do mundo a ser construída especificamente para eventos olímpicos.
As Olimpíadas de 2024 estão sendo realizadas em meio aos desafios da mudança climática. Os organizadores de Paris 2024 pretenderam reduzir a pegada de carbono pela metade, priorizando a energia renovável, fornecendo alimentos ecologicamente sustentáveis e restringindo a construção de novas instalações esportivas.
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Um exemplo dessa estratégia de sustentabilidade é a piscina de 50 metros, onde Johnny Weissmuller fez história nos Jogos de 1924, quando nadou 100 m em menos de 1 minuto (com três medalhas de ouro, o nadador mais tarde estrelaria como o personagem Tarzan no cinema). Recentemente renomeado em homenagem a Georges Vallerey, campeão de natação e herói da Segunda Guerra Mundial, o centenário centro aquático com teto retrátil foi completamente reformado com materiais recuperados.
Agora, tanto os moradores locais quanto os visitantes podem mergulhar na piscina que foi a primeira do mundo a ser construída especificamente para eventos olímpicos. (O preço de entrada para as piscinas de Paris é de 3,5 euros).
Veja arte em Montparnasse
Cerca de 200 obras da renomada escultora Chana Orloff estão expostas no Ateliers-Musée Chana Orloff, no bairro de Montparnasse, em Paris.
Nenhum outro lugar encapsulou melhor o espírito de Les Années Folles (os “anos loucos”) – como a época foi conhecida em Paris – do que o bairro de Montparnasse. Os artistas famosos da École de Paris – como Marc Chagall, Amedeo Modigliani e Kees Van Dongen – se reuniram aqui para experimentar o que hoje é chamado de “arte moderna”.
Em um imóvel barato que antes era uma favela, Montparnasse recebeu ateliês construídos com materiais reaproveitados dos pavilhões da Feira Mundial. Atualmente, muitos estúdios de artistas são de propriedade privada, mas é possível identificar sua antiga função pelas grandes janelas de vidro (procure a Cité Fleurie no Boulevard Arago ou a Villa Vassilieff na Avenue du Maine). Outros ateliês foram transformados em museus, como os dos escultores Ossip Zadkine e Chana Orloff.
Tome um café em locais clássicos de Paris
Os viajantes se reúnem no La Rotonde, um dos locais favoritos das estrelas do mundo das artes dos anos 1920 em Paris, como Kiki de Montparnasse e Pablo Picasso.
Os cafés e restaurantes eram fundamentais para a cena de Montparnasse. “Eles representam o último vestígio da época”, afirma Edith de Belleville, advogada, autora e guia turística parisiense. “Pelo preço de uma xícara de café, você pode viajar para a década de 1920.” Particularmente notórias eram as quatro brasseries que ficavam uma em frente à outra no Carrefour Vavin: Le Select, Le Dôme, La Coupole e La Rotonde.
Os norte-americanos festeiros e fugitivos da Lei Seca nos Estados Unidos iam em massa ao Le Select, o primeiro do bairro a ficar aberto a noite toda. Cenas do famoso livro “O Sol Também se Levanta”, de Ernest Hemingway, foram imaginadas nesse lugar.
Até hoje, as mesas ainda lotam os terraços da calçada em frente a esse quarteto de brasseries – tipo de café e restaurante em locais maiores. Garçons de avental branco se movimentam pelos pisos de mosaico do La Coupole – seu menu de almoço com preço fixo o torna o mais acessível do grupo. O Le Dôme serve pratos de frutos do mar com vibrações Art Déco, enquanto as banquetas de veludo vermelho do La Rotonde receberam a primeira festa da vitória do presidente francês Emmanuel Macron.
Era no banheiro do La Rotonde que Kiki de Montparnasse, musa dos artistas e ícone da época, lavava os pés antes de posar para o pintor japonês Foujita. Man Ray caiu em seu feitiço, publicando uma foto inovadora em 1924 na revista surrealista Littérature. Uma cópia do retrato – mostrando as costas voluptuosas de Kiki na forma de um violino – foi vendida por um valor recorde de 12,4 milhões de dólares em um leilão da Christie's de 2022, em Nova York.
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Tome drinques como o sidecar ou um absinto
Logo na esquina do La Rotonde, fica o Dingo's Bar, onde o escritor Hemingway conheceu seu compatriota F. Scott Fitzgerald, foi preservado dentro de um restaurante italiano chamado Auberge de Venise. E próximo ao Port Royal, o La Closerie des Lilas – onde Fitzgerald pediu a Hemingway que lesse seu livro “O Grande Gatsby” - é “um dos raros lugares em Paris onde se pode beber um absinto de verdade”, comenta de Belleville.
Do outro lado da cidade, na Place Vendôme, o hotel de luxo Ritz Paris abriu seu primeiro bar em 1921, que Hemingway afirmou ter “liberado” no final da Segunda Guerra Mundial. Atualmente, há dois bares chiques no hotel: o Bar Hemingway, que não exige reservas, atrai uma fila noturna de entusiastas de coquetéis interessados em saborear um sidecar cercado de recordações vintage, enquanto o Bar Ritz é uma ode contemporânea à astrologia e à mixologia de alto nível.
As bebidas também fluem livremente no Maxim's. Nascido na belle époque e uma lenda na década de 1920, o Maxim's hoje canaliza a folia da época com entretenimento ao vivo e fantasiado. Uma recente reforma feita pelo grupo de hospitalidade Paris Society restaurou o esplendor art nouveau dos célebres artistas Alphonse Mucha e Hector Guimard. “Paris só será arruinada no dia em que o Maxim's desaparecer”, comentou certa vez o escritor e cineasta Jean Cocteau.
Veja um filme em um cinema histórico
Além das festas badaladas, Paris foi uma pioneira cultural na década de 1920. O cinema Le Louxor foi inaugurado em 1921 no 10º arrondissement como um dos primeiros cinemas da capital. Foi uma criação do empresário Henri Silberberg, que havia assistido às primeiras exibições pagas de filmes dos irmãos Lumière em 1895.
Decorado com hieróglifos, o local com 1140 lugares inspirou-se no estilo art déco e no Egito antigo (a descoberta da tumba do Rei Tut, em 1922, apenas alimentou ainda mais essa tendência decorativa em Paris). Atualmente, o “palácio do cinema”, que já foi uma boate na década de 1980, exibe uma grande variedade de filmes.
Assista a um espetáculo
Construído sem colunas que bloqueiam a visão do público, o Théâtre des Champs-Elysées foi o lar da renomada trupe modernista Ballets Suédois na década de 1920.
O Bal Blomet foi inaugurado em 1924 como um cabaré a oeste de Montparnasse. Apelidado de “Bal Nègre”, o local multicultural atraía as pessoas para a música beguine da Martinica. Hoje, o local restaurado é considerado o clube de jazz mais antigo da Europa ainda em funcionamento.
Um novo e sensacional gênero de entretenimento impressionou o público no Folies Bergère, originalmente inaugurado como uma casa de prazeres do século 19 para a nobreza. Seguindo o modelo do Alhambra de Londres, foi o primeiro music hall de Paris, e as “revistas”, como eram chamados os espetáculos, combinavam comédia, dança, fantasias malucas e nudez.
Os espectadores circulavam livremente enquanto bebiam, fumavam e assistiam a espetáculos exagerados. O diretor Paul Derval, que governou o local por 50 anos, recrutou grandes nomes para o palco, como Josephine Baker, que dançou em sua infame saia banana (1926). Atualmente, as apresentações vão desde o Fashion Freak Show 2019 do estilista Jean-Paul Gaultier até shows de grandes nomes.
Durante a década de 1920, o Théâtre des Champs-Elysées exibiu o Ballets Suédois. As produções da trupe eram uma síntese da arte e da música modernistas concebidas por grandes talentos, como Fernand Léger, Jean Cocteau e Cole Porter. A arquitetura em si era inovadora: construída em concreto armado, em um estilo art déco pioneiro. Em seu interior, o teatro permitia perfeita visibilidade do palco, sem colunas bloqueando a visão.
“Os primeiros espectadores ficaram apavorados com a possibilidade de as sacadas desabarem”, afirma a guia Ophélie Lachaux. O teatro também era audacioso em sua programação, começando com a escandalosa apresentação de 1913 de “A Sagração da Primavera”, de Igor Stravinsky. Mais tarde, Josephine Baker fez sua estreia em Paris com a “danse sauvage” durante La Revue Nègre (1925), um show repleto do “exotismo” que enfeitiçava o público parisiense na época.
Considerado um monumento histórico, o teatro continua a apresentar produções originais todos os anos, não se contentando em apresentar apenas os clássicos. Lachaux diz: “Há um desejo de criação, uma necessidade de criação” – um zeitgeist dos loucos anos 1920 que ainda está em voga em Paris hoje.