O belo gato-nebuloso é uma descoberta para a ciência, mas já está sob ameaça
Quando Joel Sartore fotografou Tabu, um gato selvagem no Toucan Rescue Ranch da Costa Rica, em 2021, ele foi considerado um oncilla costarriquenho (Leopardus tigrinus oncilla). Agora, um novo estudo confirma que Tabu pertence a uma nova espécie, o gato-nebuloso, Leopardus pardinoides.
A maioria das pessoas conhece bem os leões, tigres e outros grandes felinos do mundo. Mas e os gatos-tigre, que têm o tamanho aproximado de um gato doméstico e são encontrados da Costa Rica à Argentina?
Verdade seja dita, até mesmo os especialistas confundem esses felinos da América Latina. Até agora, apenas duas espécies de gatos-tigre tinham sido formalmente reconhecidas: o gato-tigre do norte ou oncilla (Leopardus tigrinus) e o gato-tigre do sul ou tigrina do sul (Leopardus gutullus), que também tem três subespécies.
Mas há cerca de 14 anos, Tadeu de Oliveira recebeu um e-mail que o fez repensar tudo o que sabia sobre esses pequenos predadores. "Posso até precisar a data", diz de Oliveira, conservacionista da vida selvagem da Universidade Estadual do Maranhão, no Brasil. "Foi em 22 de junho de 2010."
A mensagem veio da pesquisadora Rebecca Zug, que estava trabalhando com ursos de óculos no Equador e havia capturado algumas fotos de um gatinho de aparência curiosa, com cauda longa e muitas manchas – um gato-tigre diferente de qualquer outro que Oliveira já havia visto. "Fiquei hipnotizado com o que vi", lembra ele.
Avançando para 2024, Oliveira se uniu a mais de 40 pesquisadores de pequenos felinos para propor formalmente uma nova espécie conhecida como gato-nebuloso (L. pardinoides), o que elevaria o número total de espécies de gatos-tigre para três.
A equipe examinou 1400 registros de museus e armadilhas fotográficas, o que lhes permitiu comparar tamanhos, formas e padrões de cores entre os gatos-tigre, bem como determinar os habitats onde cada espécie vive. Eles também analisaram a genética do gato-bebuloso para defender seu status de espécie.
Apesar da feliz notícia de uma nova espécie, publicada recentemente na revista científica Scientific Reports, os cientistas também descobriram uma realidade sombria: cada espécie de gato-tigre existe em muito menos lugares do que se acreditava.
"Eles perderam mais de 50% de sua área original", explica de Oliveira. "O alerta vermelho de extinção foi ligado".
Monitorando os gatos-tigre
Com a adição do gato-nebuloso, agora há nove espécies no gênero Leopardus."É um pouco confuso para o público em geral, porque [o gênero] não está realmente relacionado ao leopardo", explica o coautor do estudo, Eduardo Eizirik, geneticista de conservação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, no Brasil.
Em vez disso, o gênero Leopardus inclui espécies do Hemisfério Ocidental, como a jaguatirica, o gato-maracajá, o gato-andino e o gato-dos-pampas, além dos gatos-tigre.
E, embora muitos dos felinos sejam parecidos, os cientistas continuam descobrindo maneiras pelas quais cada espécie traçou seu próprio caminho evolutivo.
Por exemplo, seu trabalho genético revelou que os gatos-nebulosos se separaram das outras duas espécies de gatos-tigre há mais de dois milhões de anos. E, ao manusear gatos-nebulosos vivos, a equipe revelou uma diferença física "bastante inesperada" e inexplicável: os gatos-nebulosos têm apenas um conjunto de mamilos, enquanto as outras espécies têm dois, diz Oliveira.
Eles também descobriram que cada gato-tigre, que pesa em média cerca de dois quilos, tem seu próprio habitat. Os gatos-nebulosos vivem exclusivamente nas cadeias montanhosas da América Central e da Cordilheira dos Andes, enquanto o Leopardus tigrinus se limita às savanas do Escudo das Guianas e do Brasil central e nordeste.
O L. guttulus vive nas florestas de planície da costa atlântica do Brasil. É também por isso que os autores propõem o restabelecimento dos nomes comuns dessas espécies como gato-tigre do cerrado e gato-tigre da Mata Atlântica, respectivamente.
"Portanto, independentemente da semelhança visual, essas espécies evoluíram separadamente", afirma Eizirik.
"Eles acumularam suas próprias adaptações, suas próprias ecologias, suas próprias funções nos ecossistemas", diz ele. "E é importante conservá-los porque desempenham um papel muito importante", por exemplo, como caçadores de pequenas presas florestais, "e porque representam linhagens únicas no mundo".
Ameaças aos gatos-tigre
Embora ainda leve algum tempo para que a nova espécie de gato se torne oficial, o estudo recebeu notas altas. "Eles usaram uma metodologia de ponta", diz Mel Sunquist, coautor do livro “The Wild Cat Book: Everything You Ever Wanted to Know about Cats” e professor emérito da Universidade da Flórida, em um e-mail.
"E o que mais chama a atenção na pesquisa é que, se você observar a lista de autores, todos são especialistas dos países onde os gatos vivem", comenta Sunquist, que não participou da pesquisa. "Esse é um esforço cooperativo único." De Oliveira diz que a inclusão foi intencional e necessária para o futuro desses felinos fascinantes.
Os gatos-tigre de todo o mundo estão sob ameaça iminente de perder seus habitats para a agricultura e o desenvolvimento, diz ele. E os agentes patogênicos, como o vírus da cinomose canina, têm a capacidade de se espalhar pelos animais domésticos. Também é lamentável o fato de que a maioria das populações de gatos-tigre esteja fora de áreas protegidas, semelhante à situação dos guepardos na África, diz ele.
Atualmente, a União Internacional para a Conservação da Natureza lista o L. tigrinus e o L. guttulus como vulneráveis à extinção. Mas agora que se descobriu que suas áreas de distribuição são menos da metade do que eram antes, de Oliveira diz que um status mais terrível quase certamente estará a caminho para ambos – e o gato-nebuloso provavelmente se juntará a eles.
"Toda vez que começo a falar sobre isso, fico emocionado", afirma Oliveira, que fundou a Tiger Cats Conservation Initiative, que ajuda a população local a vacinar seus animais domésticos contra a cinomose e outras doenças, além de reabilitar e libertar gatos-tigre confiscados do comércio de animais de estimação, entre várias outras iniciativas.
"As pessoas precisam entender que publicar artigos é uma coisa. Tomar medidas de conservação é outra", explica ele. "E você não pode fazer uma coisa sem a outra. Caso contrário, você não estará fazendo o seu trabalho."