Cientistas alertam: a temporada de alergias está prestes a piorar

Plantas produtoras de pólen terão cada vez o crescimento prolongado por conta do clima mais quente que as mudanças climáticas estão causando.

Na foto, vemos um amieiro italiano liberando pólen. A temporada de alergias já foi prolongada pela mudança climática, e os as pessoas podem esperar que ela seja duas vezes mais longa até o final do século, segundo os cientistas.

Foto de FLPA, Alamy Stock Photo
Por Connie Chang
Publicado 8 de jul. de 2024, 10:18 BRT

No dia 8 de julho é o Dia Mundial da Alergia, data criada para conscientizar as pessoas sobre esse problema de saúde. E justamente com a chegada do inverno no Hemisfério Sul traz consigo o aumento das crises de alergias para milhões de pessoas. 

Isso porque ao contrário de outras épocas, no outono e no inverno de países como o Brasil e em outros locais tropicais, as árvores não perdem suas folhas e seguem floridas, produzindo e liberando pólen que induzem à alergias – algo mais comum de acontecer na primavera no Hemisfério Norte. 

E, somado a isso, são estações mais secas – e não tão frias como em outros tempos. Graças às mudanças climáticas, as estações das alergias estão prestes a piorar: o aquecimento do planeta está estendendo a estação de crescimento de plantas e, consequentemente, a liberação de pólen e, junto com isso, os riscos à saúde humana causados pelas alergias respiratórias.

Até 2100, a quantidade de pólen produzida durante a estação de floração poderá aumentar em 40%, de acordo com uma pesquisa publicada em março de 2022 na revista científica Nature Communications – o que gera uma necessidade urgente de entender melhor os fatores que impulsionam esse aumento. 

Mesmo com seca e o calor danificando florestas e pastagens, algumas gramíneas, ervas daninhas e árvores que produzem pólens que induzem alergias prosperam com o aumento das temperaturas e das concentrações de dióxido de carbono, crescendo e produzindo mais folhas.

Trabalhos anteriores que examinaram as tendências históricas estimam que, em média, a estação do pólen na América do Norte chega 20 dias antes, dura oito dias a mais e libera 20% mais pólen no ar do que há 30 anos. Se esse quadro for estendido até o final do século, a estação do pólen poderá começar 40 dias antes e se estender por 19 dias a mais.

"O pólen tem um impacto enorme na saúde pública", afirma Allison Steiner, cientista atmosférica da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, e autora sênior do artigo. "Muitas pessoas são afetadas por alergias sazonais, mas os modelos de previsão de pólen não são muito bons.”.”

Um prado da Baviera, na Alemanha, em pleno modo de produção de pólen. Muitas plantas produtoras de pólen se desenvolverão com o clima mais quente trazido pelas mudanças climáticas.

Foto de Armin Weigel, picture alliance, Getty Images

Melhorando o panorama das alergias


Para preencher essa lacuna, a equipe de Steiner desenvolveu modelos, com base em dados históricos, que preveem as emissões de pólen em resposta a fatores como temperatura e precipitação para 15 dos táxons ou variedades de plantas mais comuns que causam alergia

Os modelos também levam em conta o aumento do dióxido de carbono atmosférico, causado pela mudança climática, bem como as mudanças na distribuição dos tipos de plantas ao longo do tempo. A expansão de gramíneas ou árvores, por exemplo, pode ocorrer às custas da ambrósia – um alérgeno importante que, segundo as projeções, diminuiria em até 80% no leste dos Estados Unidos nesse cenário.

"Nossa simulação analisa as emissões de pólen dia a dia", diz Steiner. "E você pode ver a progressão – ela começa no sudeste e, depois, à medida que as temperaturas esquentam, a linha de produção de pólen se desloca para o norte."

Embora se espere que muitas plantas produtoras de pólen floresçam, alguns tipos de árvores produtoras de pólen, como a bétula, não se sairão tão bem em um ambiente quente e rico em dióxido de carbono.

Usando esses modelos, Steiner e seus colegas compararam a quantidade de pólen liberada no território continental dos Estados Unidos durante um período histórico (1995-2014) e dois cenários climáticos prospectivos (2081-2100): um futuro de emissões de gases de efeito estufa (GEE) no meio do caminho e um mais extremo, impulsionado por combustíveis fósseis, representando um aumento de 2-3 °C e 4-6 °C, respectivamente. 

cenário mais terrível, no qual as concentrações de dióxido de carbono atingem mais de 2,5 vezes o nível atual, resulta em uma estação de pólen prolongada e mais intensa, dobrando as tendências históricas dos últimos 30 anos.

Talvez o mais importante, no entanto, seja o futuro previsto pelo cenário mais moderado, comenta William Anderegg, professor associado da Universidade de Utah que não participou da pesquisa. "Basicamente, os impactos do pólen diminuíram pela metade em comparação com o cenário de alta emissão, de modo que os pesquisadores realmente destacam o quanto o combate à mudança climática trará benefícios críticos para nossa saúde respiratória", observa Anderegg, que estuda os efeitos da mudança climática nos ecossistemas florestais.

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    A ambrósia, que causa alergias significativas em algumas pessoas, tornou-se uma praga em algumas partes de Brandemburgo, na Alemanha, e por isso está sendo arrancada à mão para reduzir sua propagação. 
     

    Foto de Patrick Pleul, picture alliance, Getty Images

    Impactos do pólen na saúde


    novo estudo está alinhado com o que o alergista John James observou em primeira mão. Quando James se mudou para o Colorado, nos Estados Unidos, há 25 anos, a temporada de alergias se limitava, em grande parte, a março e abril. Nos anos seguintes, esse padrão mudou. "Os pacientes começaram a chegar mais cedo e perguntar: 'Por que meus sintomas estão durando tanto tempo? Parece que não consigo ter um descanso'", diz James, que presta consultoria para a Asthma and Allergy Foundation of America.

    As temporadas de pólen cada vez mais rigorosas são uma ameaça à saúde pública global, segundo vários estudos.  Os alunos com alergias têm um desempenho pior do que seus colegas na escola; a produtividade dos adultos no trabalho é prejudicada quando a febre do feno ataca. Ao mesmo tempo, os dias em que as concentrações de pólen são mais altas foram associados a um aumento nas visitas ao pronto-socorro por causa da asma, com custos associados tanto para os indivíduos quanto para os sistemas de saúde.

    (Você pode se interessar: O que é a asma, segundo a medicina?)

    Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que, até 2050, cerca de metade da população do planeta será vítima de pelo menos um distúrbio alérgico. Atualmente, as alergias afetam de 10% a 30% dos adultos e até 40% das crianças. Esse aumento é impulsionado não apenas pelo aumento das concentrações de pólen, mas também pelas diversas maneiras pelas quais os produtos químicos dos poluentes interagem com o pólen.

    Os poluentes destroem as paredes celulares do pólen, "quebrando os grãos de pólen relativamente grandes em partículas submicrônicas que podem ir mais fundo nos pulmões e são mais perigosas para os pacientes", explica Isabella Annesi-Maesano, epidemiologista ambiental da Universidade de Montpellier, na França. E os poluentes podem tornar o próprio pólen mais capaz de provocar uma reação alérgica. Estudos realizados em laboratório demonstram que um aumento no dióxido de carbono atmosférico resulta em pólen que contém mais proteínas alergênicas, que provocam a produção de anticorpos responsáveis pelos sintomas físicos de uma reação alérgica.

    As possíveis próximas etapas


    Steiner diz que o estudo de 2022 "representa um primeiro passo para o desenvolvimento de melhores ferramentas para entender como o pólen pode mudar no futuro e ajudar as pessoas a se prepararem melhor para os impactos na saúde". 

    Mas ainda há desafios e trabalho adicionais. Por exemplo, os dados são escassos; há menos de 100 estações de contagem de pólen nos Estados Unidos. O monitoramento do pólen também é trabalhoso, exigindo que uma pessoa treinada identifique e conte manualmente os grãos de pólen.

    "Medimos e monitoramos o pólen muito menos do que quase todos os outros poluentes atmosféricos, mas precisamos desses dados para podermos identificar as tendências de longo prazo do pólen", diz Anderegg. Mas também há boas notícias: as soluções podem estar no horizonte. 

    Várias empresas estão desenvolvendo técnicas de IA para automatizar a contagem, tornando-a mais eficiente. Além disso, uma possibilidade que pode resultar dessa pesquisa poderia ser projeções semanais de contagens de pólen semelhantes às previsões de qualidade do ar que já são a norma em muitas regiões do país.

    Isso, diz Anderegg, poderia "desenvolver a capacidade local e regional de lidar com as mudanças no pólen e minimizar os danos à saúde das pessoas".

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