Por que temos árvores de Natal? A surpreendente história por trás da tradição

Antes um símbolo pagão, o objeto assumiu formas inusitadas em praticamente todos os continentes – até na Antártida.

Por Amy McKeever
Publicado 24 de dez. de 2020, 07:00 BRT

Em dezembro de 1848, uma ilustração mostrava a Rainha Vitória, o Príncipe Alberto e seus filhos admirando uma árvore de Natal. Muitas variações desta imagem começaram a circular pelo mundo, popularizando a tradição.

Foto de Hulton Archive, Getty Images

Se pararmos para pensar, as árvores de Natal são uma tradição inusitada – todo mês de dezembro, pessoas em regiões de todo o mundo se dirigem à floresta mais próxima, derrubam uma árvore, arrastam-na para suas casas, enfeitam-na com luzes, bugigangas e enfeites e, em janeiro, jogam, sem cerimônia, a árvore na sarjeta.

Mas os pinheiros são uma decoração sazonal essencial desde a antiguidade, parte das comemorações pagãs do solstício de inverno. “Os pinheiros em festivais de inverno são tradicionais desde a antiguidade, significando a vitória da vida e da luz sobre a morte e as trevas”, escreveu por e-mail Carole Cusack, professora de estudos religiosos da Universidade de Sydney.

É difícil apontar exatamente quando e onde essas tradições pagãs se transformaram na tradição atual – diversos países alegam ser o local de origem da árvore de Natal e existem diferentes mitologias para explicar todo o seu significado. Contudo, embora as árvores de Natal estejam presentes em todo o mundo, suas origens remontam a regiões com abundantes florestas de pinheiros, principalmente no norte da Europa. Descubra a seguir como a árvore de Natal evoluiu até se tornar um símbolo moderno – e como inspirou novos costumes ao longo da história.

A árvore de Natal do Centro Rockefeller, em Nova York, é uma das mais famosas do mundo. Com 22 metros de altura, o pinheiro-da-noruega é iluminado por mais de 50 mil luzes de LED.

Foto de Diane Bondareff, AP Images for Tishman Speyer/Xinhua/Alamy Stock Photo

Diferentes donos no norte da Europa

Tanto a Letônia quanto a Estônia afirmam ter sido o local de origem da primeira árvore de Natal. A Letônia remonta a 1510 as tradições da árvore de Natal, quando uma associação de mercadores denominada Irmandade dos Cabeças Negras carregou uma árvore pela cidade, decorou-a e, por fim, queimou-a. Por outro lado, a Estônia contesta essas alegações, afirmando ter evidências da organização de um festival semelhante da mesma associação em sua capital Tallinn em 1441.

mais populares

    veja mais

    Historiadores duvidam de ambos. Gustavs Strenga, da Biblioteca Nacional da Letônia em Riga declarou ao jornal New York Times em 2016 que as festividades da associação provavelmente não estavam relacionadas ao Natal. Mas nem assim os países deixaram de lutar pelo direito de se gabar disso. Na Praça da Câmara Municipal de Riga, uma placa faz um tributo ao local da primeira árvore de Natal.

    Origem da árvore de Natal na Alemanha

    Por outro lado, Cusack afirma que é mais provável que a árvore de Natal em sua forma atual tenha nascido na região da Alsácia durante o século 16 (atualmente parte da França, a região era considerada território alemão na época). Registros históricos indicam que uma árvore de Natal foi erguida na catedral de Estrasburgo em 1539 – e que a tradição se popularizou tanto em toda a região que a cidade de Friburgo proibiu o corte de árvores no Natal de 1554.

    (Relacionado: Onde o Papai Noel está enterrado?).

    Há ainda várias explicações folclóricas diferentes para o significado da árvore. Alguns sugerem que ela foi inspirada na árvore do paraíso, símbolo do Jardim do Éden apresentado em uma popular peça teatral da Idade Média sobre Adão e Eva. Outros acreditam que a árvore de Natal tenha sido uma evolução das pirâmides de Natal, estruturas de madeira decoradas com galhos de pinheiros e figuras religiosas. Cusack não acredita que haja nenhum fundamento nessas teorias; pelo contrário, segundo ela: “a árvore de Natal foi criada para ser religiosamente neutra no contexto do cristianismo”.

    Ainda assim, a tradição se popularizou entre as famílias alemãs e evoluiu gradualmente ao longo dos anos até sua forma atual. Cusack afirma que é comum atribuir a Martinho Lutero, responsável pela reforma protestante, a primeira decoração iluminada de uma árvore de Natal – com velas em vez das luzes elétricas atuais, inventadas apenas em 1882 – após um passeio noturno pela floresta sob o céu estrelado. Os alemães mantiveram a tradição ao migrar a outros países. No século 18, segundo Cusack, a tradição das árvores de Natal já estava enraizada por toda a Europa.

    A moda das árvores no Reino Unido

    A rainha Carlota – princesa de um ducado alemão casada com o rei Jorge III em meados do século 18 – parece ter introduzido a primeira árvore de Natal na residência real. Mas foi outra rainha britânica que tornou as árvores de Natal o atual símbolo sazonal.

    A árvore de Natal Nacional é montada na face sul da Casa Branca, sede do governo americano, em Washington, DC.

    Foto de Yasin Ozturk, Anadolu Agency/Getty Images

    Em 1848, a rainha Vitória e seu marido, o príncipe Alberto (outro imigrante alemão), instigaram a imaginação dos admiradores da realeza em todo o mundo quando o jornal  Illustrated London News publicou uma ilustração da família reunida em torno de uma árvore de Natal decorada. A rainha Vitória ditava tendências na época e, assim, a tradição se popularizou em todo o mundo.

    Atualmente, a árvore de Natal mais famosa de Londres é a que ilumina a praça Trafalgar a cada inverno. Essa árvore tem uma rica história internacional própria: em 1947, a Noruega iniciou a tradição de enviar ao Reino Unido uma árvore de Natal todos os anos em sinal de gratidão por sua aliança durante a Segunda Guerra Mundial, quando o governo norueguês se refugiou no Reino Unido após a invasão nazista.

    Cerimônias de iluminação de árvores nos EUA

    A tradição das árvores de Natal na Alemanha provavelmente também chegou aos Estados Unidos no fim do século 18, quando as tropas do estado alemão de Hesse se juntaram aos britânicos na Guerra da Revolução Americana. Nos anos seguintes, imigrantes alemães também levaram a tradição aos Estados Unidos e, com o tempo, segundo escreveu o historiador Penne Restad, “cativaram os norte-americanos”.

    As famílias dos Estados Unidos adotaram essa tradição das árvores de Natal mais amplamente após 1850, quando a revista da Filadélfia Godey’s Lady’s Book republicou a cena natalina da família real do jornal Illustrated London News. Mas a revista fez alguns ajustes, editando a coroa da rainha Vitória e a faixa real de Alberto para fazê-los parecer com uma família norte-americana.

    Atualmente, a iluminação de duas amadas árvores de Natal dos Estados Unidos está incorporada ao ritual de festas do país. Em 1923, o presidente Calvin Coolidge supervisionou a iluminação da primeira Árvore de Natal Nacional; passada uma década, em 1933, a cidade de Nova York acendeu a primeira árvore de Natal no Centro Rockefeller, que, desde então, se tornou visita obrigatória a turistas e nova-iorquinos a cada época de festas de fim de ano. Ambas as árvores são iluminadas todos os anos desde então, à exceção de alguns anos na década de 1940, quando ficaram apagadas devido às restrições de iluminação para não chamarem atenção durante a Segunda Guerra Mundial.

    Árvores de Ano Novo na Rússia

    As árvores de Natal são uma tradição de longa data na Rússia. No entanto, as árvores com belas decorações que iluminam a Praça da Catedral no Kremlin todo mês de dezembro não têm relação com o Natal. São árvores de Ano Novo, ou yolka, tradição que surgiu a partir da proibição das árvores de Natal após a Revolução Russa.

    Na década de 1920, o recém-empossado governo soviético lançou uma campanha contra religiões – começando pelo que considerava tradições burguesas como o Natal. Com a proibição das árvores de Natal e outros costumes, o regime laico começou a incentivar os cidadãos a trocar as comemorações natalinas pelas de ano-novo.

    A praça Syntagma, em Atenas, Grécia, mantém uma antiga tradição em homenagem aos marinheiros: iluminar um barco com luzes de Natal durante as festividades de fim de ano.

    Foto de Wassilis Aswestopoulos, NurPhoto/Getty Images

    Mas, em 1935, os líderes soviéticos mudaram de ideia em relação às árvores. Pavel Postyshev, oficial de alto escalão, publicou um artigo de jornal sugerindo que as famílias comemorassem o ano-novo com “pinheiros decorados com luzes multicoloridas”. Embora o Natal tenha finalmente retornado ao calendário russo na década de 1990 após a dissolução da União Soviética, a árvore de ano-novo permaneceu como a tradição.

    Árvore de Natal de sucata na Antártida

    Até mesmo a Antártida teve sua parcela de tradições de árvores de Natal – apesar da ausência de árvores no Polo Sul. Em 1946, membros da tripulação de uma expedição da Marinha dos Estados Unidos à Antártida comemoraram o Natal no mar amarrando um abeto-falso do Canadá ao mastro. Mais de meio século depois, pesquisadores na Estação do Polo Sul Amundsen-Scott dos Estados Unidos montaram uma árvore de Natal de sucata, decorada com ornamentos personalizados. Embora a tradição tenha se perpetuado por um breve período com o acréscimo de novos adornos por metalúrgicos a cada ano – a Fundação Nacional da Ciência dos Estados Unidos declarou que a árvore de sucata não faz mais parte das comemorações de Natal na estação de pesquisa da Antártida.

    Barcos de Natal na Grécia

    Na Grécia, as pessoas decoravam barcos de Natal em vez de árvores em homenagem a São Nicolau, santo padroeiro do país e protetor dos marinheiros. Famílias traziam pequenos barcos de madeira para dentro de suas casas como símbolo de boas-vindas aos marinheiros que retornavam de navegações e, além disso, barcos iluminados também ocupavam um lugar de honra em praças públicas de cidades como Thessaloniki.

    Nos dias atuais, entretanto, os barcos de Natal foram ofuscados pelas árvores. Mas esses barcos ainda podem ser encontrados nas ilhas de algumas comunidades.

    Árvores depenadas na Escandinávia

    Desde o século 17, as famílias escandinavas dedicam um dia de festividades para saquear as árvores de Natal em busca de doces antes de jogá-las fora. O dia 13 de janeiro é o dia de São Canuto, rei que governou no século 11. Comemorado principalmente na Suécia, o feriado é considerado o vigésimo e último dia do Natal – diferentemente de outros países onde o período de Natal tem duração de 12 dias.

    Para comemorar o dia de São Canuto, as famílias penduram biscoitos e outras guloseimas nas árvores de Natal para divertir as crianças. Depois de depenada a última decoração da árvore, as famílias cantam enquanto atiram a árvore cerimoniosamente porta afora (na Noruega, a árvore é cortada e jogada na lareira).

    As tradições do Dia de São Canuto desapareceram quando os suecos começaram a retirar suas decorações de Natal mais cedo, mas o folclorista sueco Bengt af Klintberg contou à agência de notícias TT em 2015 que a tradição permanece viva nos poemas e rimas tradicionais do país.

    Um Tió de Nadal, tradição natalina na Catalunha, espera para ser vendido em um mercado de Barcelona, na Espanha.

    Foto de Cisco Pelay, Alamy Stock Photo

    Tradição indigesta na Catalunha

    Uma tradição ligada às árvores é o Tió de Nadal da Catalunha, um tronco oco com um rosto pintado trazido pelas famílias para casa nas semanas anteriores ao Natal. As crianças precisam cuidar do Tió de Nadal enrolando-o em uma manta e deixando-lhe alimentos e água à noite. Chegado o dia de Natal, batem na tora com pedaços de madeira até “defecar” os presentes e guloseimas a partir de um orifício na parte traseira.

    Segundo o site de notícias NPR, essa tradição peculiar pode ser uma evolução de um ritual pagão em que as pessoas ateavam fogo a troncos de árvores para se aquecerem durante o inverno. Mas por que a tora precisaria defecar seus tesouros? Cusack pondera que pode ser uma referência ao Caganer, figura de um camponês defecando presente nos presépios catalães que representa “o mundo invertido, quando, em certas épocas, os pobres ou destituídos são homenageados e os nobres humilhados”, explica Cusack. “A ideia é que as fezes fertilizam a terra; o caganer incorpora virtudes humanas.”

    Mas as verdadeiras origens desse ritual catalão permanecem envoltas em mistério – e, assim como outras tradições de árvores de Natal, podem ter ficado perdidas no tempo.

    mais populares

      veja mais
      loading

      Descubra Nat Geo

      • Animais
      • Meio ambiente
      • História
      • Ciência
      • Viagem
      • Fotografia
      • Espaço
      • Vídeo

      Sobre nós

      Inscrição

      • Assine a newsletter
      • Disney+

      Siga-nos

      Copyright © 1996-2015 National Geographic Society. Copyright © 2015-2024 National Geographic Partners, LLC. Todos os direitos reservados