Como morar perto de uma ferrovia pode prejudicar a saúde

Do estresse crônico ao aumento do risco de câncer, os cientistas dizem que a exposição constante aos trens afeta o corpo humano.

Por Jason Bittel
Publicado 27 de fev. de 2023, 10:15 BRT

Trem de passageiros atravessando a cidade de Thiruvananthapuram, na Índia, em 2019.

Foto de Creative Touch Imaging Ltd. NurPhoto, Getty Images

Em 9 de fevereiro, um trem da Norfolk Southern descarrilou perto de East Palestine, Ohio (Estados Unidos) e derramou 11 vagões de materiais perigosos no solo. Embora ninguém tenha ficado ferido no acidente, funcionários do governo evacuaram a cidade para que os bombeiros realizassem uma explosão controlada de alguns dos contêineres que continham um composto químico tóxico chamado cloreto de vinila, usado na fabricação de PVC.

Isso fez com que uma nuvem apocalíptica de fumaça negra se elevasse sobre a área e gerou preocupações sobre a poluição do ar e da água por parte dos residentes locais, alguns dos quais reclamaram de dores de cabeça e náuseas logo que foram autorizados a voltar para suas casas.

Infelizmente, os acidentes de trem são comuns nos EUA: nos primeiros dois meses de 2023, o governo já registrou mais de dez descarrilamentos. A cada ano, mais de mil trens saem dos trilhos.

E embora sejam frequentes as manchetes de jornais sobre colisões violentas com enormes nuvens de fumaça, há estudos que sugerem que os trens têm custos de saúde mesmo quando não descarrilam.

A poluição sonora e as vibrações são algumas das maiores preocupações, principalmente para as pessoas que vivem a menos de 500 metros de ferrovias ou pátios ferroviários, diz Natalia Caldeira Loss Vincens, especialista em saúde pública da Universidade de Gotemburgo, na Suécia. 

“O assunto é que essas exposições ao ruído e a outras coisas são estressantes”, diz Vincens. Níveis elevados de cortisol, um tipo de hormônio do estresse, podem levar a vários problemas de saúde.

Por exemplo, em um estudo de 2022 na revista Environmental Research, Vincens encontrou uma ligação entre o ruído ferroviário e a incidência de diabetes, mesmo considerando variáveis como fatores sociodemográficos e de estilo de vida.

O estresse crônico pode levar a “uma cascata de alterações fisiopatológicas”, explica Vincens, como alterações na sensibilidade à insulina de uma pessoa, inflamação e alterações no apetite.

Barulho e estresse

Embora os vagões possam ser extremamente barulhentos, “se os sons são relativamente estáveis, no final, não os percebemos”, diz Luca Fredianelli, técnico acústico do Conselho Nacional de Pesquisa da Itália.

São os ruídos menos intensos, porém mais imprevisíveis, como guinchos, assobios e freios rangendo, que realmente incomodam já que é difícil para as pessoas se acostumar a eles, diz Fredianelli.

Esses “ruídos não convencionais”, como ele os chama, também são muito mais difíceis de quantificar e vincular diretamente aos impactos na saúde, admite.

Mas é provável que esses ruídos de baixo nível possam contribuir para dificuldades de saúde mental, cognição e sono.

Por exemplo, em estudos do sono realizados no laboratório de Vincens, pessoas expostas a vibrações como as que emanam do tráfego ferroviário manifestaram ciclos de sono fragmentados, que são revelados por mudanças na frequência cardíaca, diz ela.

“Nós pensamos que, se você continua tendo esses efeitos repetidamente e mora perto dessa ferrovia, isso pode levar a mudanças crônicas no seu funcionamento fisiológico”, esclarece Vincens.

“Mas ainda são teorias”, diz ela. Também é difícil provar a causalidade, por exemplo, que o ruído ferroviário causa diabetes. Contudo, os cientistas estão reunindo cada vez mais dados que apontam para os diversos riscos à saúde decorrentes da exposição ao ruído.

Poluição causada pelos trens

Os trens são geralmente considerados uma alternativa ecológica aos modos de transporte pesados ​​com combustíveis fósseis, como carros e aviões. Porém, há muitos tipos de trens que ainda queimam óleo diesel. E essas emissões podem aumentar, principalmente em áreas fechadas.

Um estudo da Estação Ferroviária de Paddington, no Reino Unido, descobriu que seus trens contribuíram para as emissões de dióxido de nitrogênio que excederam os limites da União Europeia para a qualidade do ar externo. E esses níveis permaneceram elevados também na rua, onde todas as medições de material particulado (dióxido de enxofre e dióxido de nitrogênio) aumentaram.

Os pátios ferroviários (locais para armazenamento e reparo de veículos ferroviários) apresentam outra camada de risco à comunidade, devido à concentração de veículos movidos a diesel, como caminhões, guindastes, locomotivas manobreiras e locomotivas de linha.

Em um estudo realizado no BNSF Railway Hobart Railyard, em Los Angeles (EUA), a Agência de Proteção Ambiental da Califórnia estimou que os residentes que vivem perto de um pátio ferroviário tiveram um risco maior de exposição a carcinógenos. Isso significa que o aumento do risco de câncer se elevou entre 100 e 3 mil vezes em comparação com as áreas vizinhas.

Benefícios ferroviários para a saúde

Embora haja evidências crescentes de que morar perto de trilhos tem inúmeros impactos na saúde humana, também deve ser notado que a proximidade de certos tipos de trens também traz benefícios.

Jennifer D. Roberts, professora associada da Escola de Saúde Pública da Universidade de Maryland (EUA), diz que o acesso a sistemas de trens leves em áreas urbanas pode nos beneficiar.

“A pesquisa mostrou repetidas vezes que as pessoas que moram perto de trens leves sobre trilhos aumentaram significativamente sua atividade física e reduziram o excesso de peso”, diz Roberts.

Isso ocorre porque os sistemas ferroviários geralmente exigem que as pessoas caminhem até um quilômetro ou mais para chegar a uma parada de trem. Eles também conectam comunidades carentes com áreas que talvez não tinham acesso antes, diz Roberts.

Finalmente, Roberts diz que há vantagens e desvantagens, mas que qualquer linha ferroviária (seja de carga ou de passageiros, pesada ou leve) sempre terá considerações de justiça ambiental que precisam ser investigadas minuciosamente.

“Precisamos observar estas questões de maneira crítica”, diz Roberts. “Todos nós devemos assumi-las, e não apenas algumas comunidades. ”

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