Famosos lêmures de Madagascar correm risco de perder sua floresta até 2080

O desmatamento e as mudanças climáticas podem devastar grande parte das florestas tropicais, segundo novo modelo.

Por Erica Tennenhouse
Publicado 3 de fev. de 2020, 17:30 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Um varecia preto-e-branco olha para a câmera no Lincoln Children’s Zoo, Nebraska, EUA.
Um varecia preto-e-branco olha para a câmera no Lincoln Children’s Zoo, Nebraska, EUA.
Foto de Joël Sartore, National Geographic Photo Ark

No alto dos dosséis das florestas tropicais do leste de Madagascar, vivem duas espécies do lêmure varecia criticamente ameaçadas de extinção, que estão entre as mais conhecidas da vida selvagem na ilha. Hoje, novos modelos de mudanças climáticas e perdas florestais preveem um futuro ainda mais sombrio para os primatas: seu habitat poderá desaparecer completamente até 2080.

Assim como a maior parte da fauna e da flora de Madagascar, o varecia-preto-e-branco e o varecia-vermelho só podem ser encontrados nessa nação do Oceano Índico e figuram entre as 96 das 101 espécies de lêmures do país ameaçadas de extinção.

Visto que essas duas espécies habitam exclusivamente árvores grandes, sua população é reduzida drasticamente quando as florestas são desmatadas ou fragmentadas, tornando a presença desses animais um sinal importante de florestas saudáveis. Além disso, são essenciais para espalhar sementes.

Os modelos de computador, publicados na revista científica Nature Climate Change, mostram que uma combinação de desmatamento e clima flutuante pode causar o desaparecimento das florestas tropicais em até 60 anos, transformando-as em pastagens e áreas de cultivo degradadas. Cerca de 45% da cobertura total da floresta já desapareceu desde a década de 1950.

“Faço esse tipo de modelagem há cerca de uma década”, afirma o autor do estudo, Adam Smith, ecologista do Jardim Botânico de Missouri, “e, durante esse período, em apenas duas ocasiões fiquei horrorizado com o que vi na tela do computador”.

Ainda assim, Smith recomenda que as pessoas não se sintam impotentes devido aos resultados do estudo. “Previsões são tentativas de saber o que acontecerá no futuro, ao passo que cenários apontam opções”, adiciona.

Varecias-vermelhos pousam para a foto no Miller Park Zoo em Bloomington, Illinois, EUA.
Foto de Joël Sartore, National Geographic Photo Ark

Com opções ainda restantes, há esperança para as florestas de Madagascar. A nova pesquisa pode, por exemplo, ajudar os cientistas e governos a decidirem onde canalizar seus esforços para salvar o habitat do lêmure varecia.

Parques de papel

Para descobrir o destino do habitat dos lêmures, os pesquisadores calcularam a rapidez com que as florestas tropicais de Madagascar encolheram entre 2000 e 2014 e projetaram essas taxas de perda para o futuro. Além disso, estimaram o quão secos, úmidos e quentes os habitats atuais dos lêmures estarão nas próximas décadas, com base nas previsões climáticas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, órgão das Nações Unidas dedicado à ciência climática.

Embora a exploração madeireira e agrária e as mudanças climáticas sejam as principais responsáveis pelo habitat cada vez mais reduzido dos lêmures, os efeitos do desmatamento já superam os das mudanças climáticas, de acordo com os modelos.

Aproximadamente 100 áreas protegidas estão espalhadas pelas florestas tropicais de Madagascar. Na teoria, as árvores nessas zonas devem permanecer intactas. Mas, na realidade, muitas das áreas protegidas do país são meros “parques de papel” — delimitam-se como protegidas no mapa, mas não possuem nenhuma proteção de fato, dizem os autores, permitindo o desmatamento em ritmo desenfreado.

A maior parte do desmatamento do país ocorre em pequena escala. Os moradores locais desmatam partes da floresta e ateiam fogo. As cinzas resultantes fertilizam o solo de baixa qualidade, o que possibilita a essas pessoas o uso da terra para agricultura de subsistência familiar.

“Mesmo com a ameaça das mudanças climáticas, as perdas florestais acontecem tão rapidamente que as florestas não existirão por tempo suficiente para serem afetadas pelas mudanças climáticas”, afirma a autora do estudo, Andrea Baden, antropóloga biológica da Hunter College, em Nova York. “Isso é o que mais me assusta”.

Travis Steffens, ecologista de conservação e diretor executivo da organização sem fins lucrativos Planet Madagascar, acrescenta que a perda das florestas em Madagascar talvez seja muito pior do que sugere o estudo.

“Os autores estão tentando ser conservadores ao máximo”, reitera, mas “é surpreendente o horrível cenário que se apresenta mesmo quando se usam estimativas conservadoras”.

Uma visão otimista

No entanto, quando os pesquisadores adotaram um cenário mais otimista — em que nenhuma floresta dentro das áreas protegidas seria dizimada — o resultado foi que metade das florestas da ilha permaneceriam intactas até 2070.

Agora, os cientistas possuem uma perspectiva clara de como conservar as florestas levando em conta o melhor cenário possível. “Esperamos realmente fomentar a conservação ambiental, bem como fazer as regras valerem para esses parques e não deixar que continuem sendo parques de papel”, declara Baden.

“Devemos também ter a consciência de trabalhar localmente para ajudar a melhorar os meios de subsistência e a saúde das pessoas dessas regiões”, adverte.

Steffens apresenta outra solução: plantar novas árvores. “Diria que os esforços de reflorestamento devem ser outra prioridade, com o manejo florestal sendo a primeira delas, porque é mais barato”, explica.

Porém, com florestas tropicais tão diversas e únicas em risco de desaparecer ainda neste século, Smith afirma que também é hora de implementar ideias mais ousadas. “Talvez precisemos repensar radicalmente a definição de conservação ambiental bem-sucedida”, finaliza.

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